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PARECER PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO - PGM Nº 12.013 de 17 de Junho de 2019

EMENTA Nº 12.013
Requisição administrativa. Art. 5°, inciso XXV, da Constituição Federal. Ato de império do Poder Público. Necessária demonstração, fundada em manifestação técnica, do iminente perigo público. Competência do Prefeito Municipal para edição de Decreto requisitório.

Processo nº 6029.2019/0002388-6

Interessado: SECRETARIA MUNICIPAL DE SEGURANÇA URBANA

Assunto: Requisição Administrativo - veículos necessários ao desempenho das funções da Guarda Civil Metropolitada

Informação n° 0833/2019-PGM.AJC

PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO

COORDENADORIA GERAL DO CONSULTIVO

Senhor Coordenador Geral,

A Secretaria Municipal de Segurança Urbana (SMSU), no âmbito de sua competência, aferiu a necessidade incontornável de — enquanto não se ultimar nova contratação, tratada no SEI 6029.2018/0000266-6 — a Guarda Civil Metropolitana permanecer com 224 (duzentos e vinte e quatro) veículos que, em virtude de extinção de contrato de locação de que eram objeto, deverão ser restituídos no próximo dia 29 de junho à CS BRASIL FROTAS LTDA. Conforme informado, "os veículos são utilizados diuturnamente no atendimento de ocorrências, de apoio aos outros órgãos ou realizando o policiamento preventivo em toda cidades na preservação do patrimônio publico contra vandalismos, furtos e roubos, crimes ambientais, uso irregular do espaço publico, infrações de transito, ocupações irregulares e além de inibir os crimes de oportunidade como roubos ou furtos" (documento 018016625).

Entendendo estar configurada situação de iminente perigo público, SMSU concluiu ser imprescindível promover a requisição administrativa de tais bens, de modo a evitar a solução de continuidade na prestação do relevante serviço público e, nesse passo, solicita a esta PGM esclarecimento sobre a "eficácia e aplicabilidade do inciso XXV do artigo 5° da Constituição Federal, que trata da requisição administrativa", bem como quem seria "a autoridade municipal competente para, eventualmente, promover a requisição administrativa de bens de propriedade particular no âmbito do Município de São Paulo".

Pois bem. Conforme preleciona a doutrina, a requisição é caracterizada como "ato de império do Poder Público, discricionário quando ao objeto e oportunidade da medida, mas condicionado à existência de perigo público iminente e vinculado à lei quanto à competência da autoridade requisitante, à finalidade do ato e, quando for ao caso, ao procedimento adequado. Esses quatro últimos aspectos são passíveis de apreciação judicial, notadamente para a fixação do justo valor da indenização" (Hely Lopes Meirelles, Direito Municipal Brasileiro, 15ª ed., SP, Malheiros, 2007, p.433). A requisição, portanto, prescinde do prévio reconhecimento do estado de calamidade pública; em verdade, pretende-se pela requisição justamente escapar da calamidade que estaria a se avizinhar.

A iminência do perigo público, fundamento constitucional da requisição administrativa, (a) deve ser cabalmente revelado em estudos conduzidos pela Pasta incumbida do tema emergencial e (b) declarado pela autoridade competente que, no Município de São Paulo, é o Prefeito. A excepcionalidade da medida autoexecutória que, à maneira do ato expropriatório, afeta o exercício do direito de propriedade privada, empenha a sua produção pelo Chefe do Executivo1.

A Prefeitura de São Paulo já fez uso desse excepcional instrumento de intervenção na propriedade privada em situações que — no parecer técnico das Secretarias envolvidas na tutela do bem público em risco — configurariam o "iminente perigo público" referido na norma constitucional.

Assim, por exemplo, requisitaram-se equipamentos e utensílios de empresas privadas para manutenção da prestação dos serviços de preparo e distribuição de alimentação escolar (Decreto n° 51.772/2010), requisitaram-se imóveis particulares situados na região da Luz necessários à implantação de serviços de atendimento social a pessoas em situação vulnerável (Decreto 52.932/2012), requisitou-se imóvel necessário à manutenção da prestação dos serviços de transporte coletivo público de passageiros na Cidade de São Paulo (Decreto n° 52.894/2012 e Decreto n° 54.103/2013) e autorizou-se a requisição de bens durante a paralisação nacional de caminhoneiros (Decreto n° 58.244/2018, art. 4°).

Porque fundadas em criteriosos estudos técnicos das Pastas envolvidas, o Poder Judiciário chancelou essas iniciativas municipais, nelas divisando a presença dos requisitos constitucionais autorizadores da requisição. Assim:

"Do teor do preceito constitucional tem-se que a requisição não depende de prévia intervenção do Poder Judiciário e é, portanto, nos dizeres de Pontes de Miranda, 'negócio jurídico unilateral' (Salles, José Calos de Moraes, Desapropriação à Luz da Doutrina e da Jurisprudência, Ed. RT, 6ª edição, 2009, pág. 695). Assim, no momento em que zela por interesse social ameaçado por perigo iminente, está o poder público no exercício de atribuição de índole constitucional. Não obstante, o Código Civil não traz o exercício de direito de propriedade de forma desmedida, antes, o parágrafo terceiro do artigo 1228 do Código Civil, preceitua que: 'O proprietário pode ser privado da coisa, nos casos de desapropriação, por necessidade ou utilidade pública ou interesse social, bem como no de requisição, em caso de perigo público iminente'. Assim, é a requisição meio de intervenção legítima do poder público na propriedade particular, ato de império do poder executivo.

Conforme lição de Alexandre de Moraes, são os requisitos para a requisição: i) perigo público iminente, ii) decretação por autoridade competente, iii) finalidade de uso; e iv) indenização posterior no caso de prejuízo (Constituição do Brasil Interpretada e Legislação Constitucional, Ed. Atlas, 2011, 8ª edição, página 194). (...)

Conforme o conteúdo do Decreto Lei n° 52.894/2012, 'a referida garagem, cujos veículos nelas mantidos transportam cerca de treze milhões de passageiros por mês'. Tratando-se o transporte público de serviço essencial (artigo 30, V, da Constituição Federal) e dada a mencionada dimensão do serviço prestado pela agravante proporcionalmente à cidade de São Paulo — que possui pouco mais de onze milhões de habitantes — o possível despejo dos veículos da agravante representa evidente perigo público. (...)" (TJSP, AI n° 000699090.2012.8.26.0000, julgado em 12 de março de 2012)

Posto isso, verifica-se, no caso concreto, que o manejo da requisição administrativa depende exclusivamente da manifestação fundamentada e conclusiva de SMSU da existência desse iminente perigo público "que impossibilita o funcionamento normal das instituições, gerando caos nos serviços e atividades usuais à população" (Uadi Lammego BuBulos, Curso de Direito Constitucional, Ed. Saraiva, 6ª edição. 211, página 602).

A ulterior indenização pelo Poder Público ao proprietário poderá ser balizada pelo preço do contrato em vigor.

Desse modo, com a brevidade ditada pela urgência, é de concluir que a requisição administrativa de uso dos veículos em questão (a) pressupõe manifestação fundada de SMSU afirmando, de forma concreta, e no âmbito de sua competência exclusiva, o iminente perigo público a que se refere o inc. XXV do art. 5° da CR e (b) deve ser declarada pelo Exmo. Prefeito, autoridade municipal competente para tanto, por meio de Decreto.

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São Paulo, 17/06/2019

ANTONIO MIGUEL AITH NETO

Procurador Assessor - AJC

OAB/SP n° 88.619

PGM

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De acordo.

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São Paulo, 17/06/2019

TICIANA NASCIMENTO DE SOUZA SALGADO

Procuradora Assessora Jurídica Chefe - AJC

OAB/SP 175.186

PGM/AJC

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1 "O fundamento político da requisição é a existência de um estado de necessidade pública. Como ensina Diogenes Gasparini, há dois fundamentos constitucionais para o instituto, um, genérico, previsto no inciso III do art. 170 (função social da propriedade), e o outro específico, fincado no inciso XXV do art. 5°. Como é de conhecimento geral, a requisição constitui medida autoexecutória, independendo, sua adoção, de prévia autorização judicial." (Patrícia Maria de Mattos Coelho Rodrigues, Requisição administrativa de bens e serviços de escolas particulares, in Revista Brasileira de Direito Municipal - RBDM Belo Horizonte, ano 15, n. 54, out./dez. 2014)

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Processo nº 6029.2019/0002388-6

 

Informação n° 0833/2019-PGM.AJC

PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO

Sr. Procurador Geral,

Encaminho-lhe o presente nos termos da manifestação retro desta Coordenadoria Geral do Consultivo, que acolho.

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São Paulo, 17/06/2019

TIAGO ROSSI

Coordenador Geral do Consultivo

OAB/SP 195.910

PGM

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Processo nº 6029.2019/0002388-6

Informação n° 0833/2019-PGM.AJC

SMSU

Sr. Secretário,

Encaminho-lhe o presente para regular prosseguimento com meu acolhimento à manifestação da Coordenadoria Geral do Consultivo desta Procuradoria Geral do Município.

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São Paulo, 17/06/2019

GUILHERME BUENO DE CAMARGO

PROCURADOR GERAL DO MUNICÍPIO

OAB/SP 188.975

PGM

Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo