Processo nº 6029.2019/0002388-6
Interessado: SECRETARIA MUNICIPAL DE SEGURANÇA URBANA
Assunto: Requisição Administrativo - veículos necessários ao desempenho das funções da Guarda Civil Metropolitada
Informação n° 0833/2019-PGM.AJC
PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO
COORDENADORIA GERAL DO CONSULTIVO
Senhor Coordenador Geral,
A Secretaria Municipal de Segurança Urbana (SMSU), no âmbito de sua competência, aferiu a necessidade incontornável de — enquanto não se ultimar nova contratação, tratada no SEI 6029.2018/0000266-6 — a Guarda Civil Metropolitana permanecer com 224 (duzentos e vinte e quatro) veículos que, em virtude de extinção de contrato de locação de que eram objeto, deverão ser restituídos no próximo dia 29 de junho à CS BRASIL FROTAS LTDA. Conforme informado, "os veículos são utilizados diuturnamente no atendimento de ocorrências, de apoio aos outros órgãos ou realizando o policiamento preventivo em toda cidades na preservação do patrimônio publico contra vandalismos, furtos e roubos, crimes ambientais, uso irregular do espaço publico, infrações de transito, ocupações irregulares e além de inibir os crimes de oportunidade como roubos ou furtos" (documento 018016625).
Entendendo estar configurada situação de iminente perigo público, SMSU concluiu ser imprescindível promover a requisição administrativa de tais bens, de modo a evitar a solução de continuidade na prestação do relevante serviço público e, nesse passo, solicita a esta PGM esclarecimento sobre a "eficácia e aplicabilidade do inciso XXV do artigo 5° da Constituição Federal, que trata da requisição administrativa", bem como quem seria "a autoridade municipal competente para, eventualmente, promover a requisição administrativa de bens de propriedade particular no âmbito do Município de São Paulo".
Pois bem. Conforme preleciona a doutrina, a requisição é caracterizada como "ato de império do Poder Público, discricionário quando ao objeto e oportunidade da medida, mas condicionado à existência de perigo público iminente e vinculado à lei quanto à competência da autoridade requisitante, à finalidade do ato e, quando for ao caso, ao procedimento adequado. Esses quatro últimos aspectos são passíveis de apreciação judicial, notadamente para a fixação do justo valor da indenização" (Hely Lopes Meirelles, Direito Municipal Brasileiro, 15ª ed., SP, Malheiros, 2007, p.433). A requisição, portanto, prescinde do prévio reconhecimento do estado de calamidade pública; em verdade, pretende-se pela requisição justamente escapar da calamidade que estaria a se avizinhar.
A iminência do perigo público, fundamento constitucional da requisição administrativa, (a) deve ser cabalmente revelado em estudos conduzidos pela Pasta incumbida do tema emergencial e (b) declarado pela autoridade competente que, no Município de São Paulo, é o Prefeito. A excepcionalidade da medida autoexecutória que, à maneira do ato expropriatório, afeta o exercício do direito de propriedade privada, empenha a sua produção pelo Chefe do Executivo1.
A Prefeitura de São Paulo já fez uso desse excepcional instrumento de intervenção na propriedade privada em situações que — no parecer técnico das Secretarias envolvidas na tutela do bem público em risco — configurariam o "iminente perigo público" referido na norma constitucional.
Assim, por exemplo, requisitaram-se equipamentos e utensílios de empresas privadas para manutenção da prestação dos serviços de preparo e distribuição de alimentação escolar (Decreto n° 51.772/2010), requisitaram-se imóveis particulares situados na região da Luz necessários à implantação de serviços de atendimento social a pessoas em situação vulnerável (Decreto 52.932/2012), requisitou-se imóvel necessário à manutenção da prestação dos serviços de transporte coletivo público de passageiros na Cidade de São Paulo (Decreto n° 52.894/2012 e Decreto n° 54.103/2013) e autorizou-se a requisição de bens durante a paralisação nacional de caminhoneiros (Decreto n° 58.244/2018, art. 4°).
Porque fundadas em criteriosos estudos técnicos das Pastas envolvidas, o Poder Judiciário chancelou essas iniciativas municipais, nelas divisando a presença dos requisitos constitucionais autorizadores da requisição. Assim:
"Do teor do preceito constitucional tem-se que a requisição não depende de prévia intervenção do Poder Judiciário e é, portanto, nos dizeres de Pontes de Miranda, 'negócio jurídico unilateral' (Salles, José Calos de Moraes, Desapropriação à Luz da Doutrina e da Jurisprudência, Ed. RT, 6ª edição, 2009, pág. 695). Assim, no momento em que zela por interesse social ameaçado por perigo iminente, está o poder público no exercício de atribuição de índole constitucional. Não obstante, o Código Civil não traz o exercício de direito de propriedade de forma desmedida, antes, o parágrafo terceiro do artigo 1228 do Código Civil, preceitua que: 'O proprietário pode ser privado da coisa, nos casos de desapropriação, por necessidade ou utilidade pública ou interesse social, bem como no de requisição, em caso de perigo público iminente'. Assim, é a requisição meio de intervenção legítima do poder público na propriedade particular, ato de império do poder executivo.
Conforme lição de Alexandre de Moraes, são os requisitos para a requisição: i) perigo público iminente, ii) decretação por autoridade competente, iii) finalidade de uso; e iv) indenização posterior no caso de prejuízo (Constituição do Brasil Interpretada e Legislação Constitucional, Ed. Atlas, 2011, 8ª edição, página 194). (...)
Conforme o conteúdo do Decreto Lei n° 52.894/2012, 'a referida garagem, cujos veículos nelas mantidos transportam cerca de treze milhões de passageiros por mês'. Tratando-se o transporte público de serviço essencial (artigo 30, V, da Constituição Federal) e dada a mencionada dimensão do serviço prestado pela agravante proporcionalmente à cidade de São Paulo — que possui pouco mais de onze milhões de habitantes — o possível despejo dos veículos da agravante representa evidente perigo público. (...)" (TJSP, AI n° 000699090.2012.8.26.0000, julgado em 12 de março de 2012)
Posto isso, verifica-se, no caso concreto, que o manejo da requisição administrativa depende exclusivamente da manifestação fundamentada e conclusiva de SMSU da existência desse iminente perigo público "que impossibilita o funcionamento normal das instituições, gerando caos nos serviços e atividades usuais à população" (Uadi Lammego BuBulos, Curso de Direito Constitucional, Ed. Saraiva, 6ª edição. 211, página 602).
A ulterior indenização pelo Poder Público ao proprietário poderá ser balizada pelo preço do contrato em vigor.
Desse modo, com a brevidade ditada pela urgência, é de concluir que a requisição administrativa de uso dos veículos em questão (a) pressupõe manifestação fundada de SMSU afirmando, de forma concreta, e no âmbito de sua competência exclusiva, o iminente perigo público a que se refere o inc. XXV do art. 5° da CR e (b) deve ser declarada pelo Exmo. Prefeito, autoridade municipal competente para tanto, por meio de Decreto.
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São Paulo, 17/06/2019
ANTONIO MIGUEL AITH NETO
Procurador Assessor - AJC
OAB/SP n° 88.619
PGM
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De acordo.
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São Paulo, 17/06/2019
TICIANA NASCIMENTO DE SOUZA SALGADO
Procuradora Assessora Jurídica Chefe - AJC
OAB/SP 175.186
PGM/AJC
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1 "O fundamento político da requisição é a existência de um estado de necessidade pública. Como ensina Diogenes Gasparini, há dois fundamentos constitucionais para o instituto, um, genérico, previsto no inciso III do art. 170 (função social da propriedade), e o outro específico, fincado no inciso XXV do art. 5°. Como é de conhecimento geral, a requisição constitui medida autoexecutória, independendo, sua adoção, de prévia autorização judicial." (Patrícia Maria de Mattos Coelho Rodrigues, Requisição administrativa de bens e serviços de escolas particulares, in Revista Brasileira de Direito Municipal - RBDM Belo Horizonte, ano 15, n. 54, out./dez. 2014)
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Processo nº 6029.2019/0002388-6
Informação n° 0833/2019-PGM.AJC
PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO
Sr. Procurador Geral,
Encaminho-lhe o presente nos termos da manifestação retro desta Coordenadoria Geral do Consultivo, que acolho.
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São Paulo, 17/06/2019
TIAGO ROSSI
Coordenador Geral do Consultivo
OAB/SP 195.910
PGM
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Processo nº 6029.2019/0002388-6
Informação n° 0833/2019-PGM.AJC
SMSU
Sr. Secretário,
Encaminho-lhe o presente para regular prosseguimento com meu acolhimento à manifestação da Coordenadoria Geral do Consultivo desta Procuradoria Geral do Município.
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São Paulo, 17/06/2019
GUILHERME BUENO DE CAMARGO
PROCURADOR GERAL DO MUNICÍPIO
OAB/SP 188.975
PGM
Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo