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PARECER PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO - PGM Nº 22 de 9 de Janeiro de 2017

Informação nº 0022/2017-PGM.AJC
Cessão de área municipal.

Processo n° 2016-0.220.040-4

INTERESSADO: Liga Independente das Escolas de Samba de São Paulo

ASSUNTO: Cessão de área municipal.

Informação nº 0022/2017-PGM.AJC

PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO

ASSESSORIA JURÍDICO-CONSULTIVA

Senhor Procurador Assessor Chefe

Trata o presente da possível cessão, à Liga Independente das Escolas de Samba de São Paulo, de imóvel municipal situado na Av. Dr. Abrahão Ribeiro, Bom Retiro.

DGPI levantou informações cadastrais relativas à área (fls. 39/49 e 55/62) e apresentou descrição para a possível cessão (fls. 66/72).

DEUSO informou que o uso pretendido seria admissível no local, recomendando consulta à SP Urbanismo, uma vez que se trata de área inserida no perímetro da Operação Urbana Água Branca (fls. 74/88).

SP Urbanismo informou que a Lei nº 15.983/13, relativa a tal operação, define a área em questão como Área Pública 11, destinada a "equipamento cultural" (fls. 99/108).

Foi juntado termo de vistoria de entrega parcial da obra efetuada pela Municipalidade no local, bem como o manual de uso da edificação, de autoria da construtora responsável (fls. 111/114).

Em reunião realizada em 12.12 p.p., a Secretaria Municipal de Cultura e a São Paulo Turismo asseveraram que a interessada atua no âmbito da promoção e difusão cultural do samba e participa do carnaval, atestando seu mérito e manifestando-se favoravelmente ao pedido. Já a Subprefeitura da Lapa não se opôs à cessão, por não se pretender outra destinação específica para o bem, propondo que a interessada cumpra como contrapartida a conservação de vias, logradouros e equipamentos públicos do entorno. Constou da ata, ainda, sem atribuição de tal proposta a nenhum dos presentes, que a interessada deveria zelar pelas condições de salubridade e segurança da área, bem como arcar com as taxas e tarifas incidentes, sem prejuízo de outras contrapartidas a serem fixadas por lei ou decreto (fls. 115).

DGPI apresentou minutas de decreto autorizando a permissão, termo de permissão de uso e projeto de lei relativa à concessão de uso e submeteu o caso à CMPT (fls. 116/125).

A CMPT, então, deliberou por recomendar ao Prefeito à outorga de permissão de uso, bem como o encaminhamento de projeto de lei relativo à concessão de uso do bem à Liga Independente das Escolas de Samba de São Paulo, ambas providências condicionadas à análise da viabilidade jurídica por parte da PGM (fls. 126).

É o breve relatório.

Em tese, a Liga Independente das Escolas de Samba de São Paulo pode ser considerada uma entidade carnavalesca para os fins do art. 114, § 3º, prestando serviços de interesse social sem fins lucrativos (cf. art. 1º do estatuto, fls. 4). Assim sendo, estaria presente o interesse social justificado exigido pelo caput do mesmo dispositivo.

Por outro lado, nos termos da redação dada pela Lei nº 16.373/16, a Lei nº 14.652/07 exige que as cessões de áreas municipais sejam feitas a título oneroso, exceto no caso das agremiações carnavalescas, centros desportivos comunitários ou entidades que prestem relevantes serviços sociais e culturais, devidamente propostos e avalizados pela Secretaria Municipal competente, à qual caberá a sua fiscalização (art. 1º). São entendidas como agremiações carnavalescas aquelas que desfilam em ao menos um dos grupos do Carnaval Oficial da Cidade, às quais se impõe como contrapartida, além da participação no evento carnavalesco, a execução de conservação das vias, logradouros e equipamentos públicos do entorno de sua localização, mediante fiscalização da Subprefeitura correspondente (art. 1º, § 1º).

Literalmente, a Liga Independente das Escolas de Samba de São Paulo não poderia ser considerada uma agremiação carnavalesca, já que não é ela que desfila no carnaval oficial, estando sujeita, pois, ao pagamento de retribuição pecuniária. No entanto, o exame mais detido da estrutura proposta poderia levar a conclusão diversa, conforme o detalhamento que lhe viesse a ser conferido.

Com efeito, seria possível outorgar a cessão à liga exclusivamente para que esta efetuasse o repasse gratuito de partes do equipamento às agremiações carnavalescas, estas as destinatárias substanciais da permissão. Neste caso, caso realmente se pretenda a cessão gratuita à liga, seria o caso de impor que as diversas subcessões fossem feitas de forma precária e gratuita, e somente a agremiações enquadráveis no referido art. 1º, § 1º, da Lei nº 14.652/07, sendo o caso, ademais, de que a liga comunicasse a Municipalidade de tais cessões, até mesmo para o controle do cumprimento de tal preceito. Por outro lado, seria necessário que se exigisse das agremiações o cumprimento de regras delineadas em relação à permissionária. Além disso, os diversos instrumentos deveriam ser ajustados para fazer referência a agremiações carnavalescas, e não escolas de samba, nos termos da referida lei.

No entanto, não sendo esta a única alternativa disponível parece necessário que a opção por ela seja devidamente justificada. De fato, nada obstaria que as cessões gratuitas fossem feitas diretamente às agremiações, nem haveria impedimento a que a liga celebrasse alguma espécie de instrumento de convênio com a Municipalidade para a gestão do equipamento, que se assemelharia, neste caso, aos mercados municipais. O modelo em que a liga é permissionária e efetua as subcessões pode ter vantagens, mas elas devem estar expressamente indicadas nos autos, até mesmo para justificar a adoção da interpretação acima indicada.

Por outro lado, o enquadramento da atividade como serviço público social, nos termos da informação de DEUSO, bem como a destinação da área a equipamento público, a ser instalado em área apontada como institucional, nos termos das normas específicas da Operação Urbana Consorciada, tornam indispensável alguma espécie de controle e gestão, por parte da Municipalidade, em relação à atividade fim a ser desempenhada pelas entidades carnavalescas. Em tese, não seria inviável que o uso da área fosse efetuado por meio de uma permissão de uso, mas o essencial seria a existência de uma relação formalizada com o administrador do equipamento, que iria além da mera cessão do bem, até mesmo para que o Poder Público possa fiscalizar a atuação do particular e garantir o adequado funcionamento das atividades de tal equipamento. Isto é o que ocorre, por exemplo, no caso dos Clubes da Comunidade, aos quais são outorgadas permissões de uso, sem prejuízo da cotidiana atividade de acompanhamento de tais equipamentos por parte da Secretaria Municipal de Esportes. Por outro lado, também é possível um modelo em que o administrador do equipamento tenha outra espécie de relação jurídica com a Municipalidade, da qual decorra o uso do bem, sem um ato específico de cessão, como ocorre no caso de várias creches conveniadas. Há notícia, por exemplo, de que o Auditório do Ibirapuera foi objeto de transferência de administração para a SMC, sendo gerido nos termos de convênio celebrado entre aquela Pasta, SVMA e a OSCIP Instituto Música para Todos (cf. Informação n. 1306/08 -PGM.AJC).

Na verdade, a cessão do imóvel ao administrador ou ao usuário do equipamento não é uma imposição; ao contrário, pode até constituir uma exceção em situações semelhantes à presente. O que é essencial, em casos de equipamentos públicos, destinados à prestação de serviços públicos, que sejam administrados por terceiros, é a disciplina dessa atividade por parte do Poder Público, o que não se restringe à simples cessão do bem. É fato que existe uma tradição de cessão de imóveis a agremiações carnavalescas, mas o modelo agora adotado é substancialmente diverso: com efeito, a criação de um equipamento municipal, denominado Fábrica do Samba, aberto até mesmo à visitação turística, até mesmo para o cumprimento da legislação urbanística incidente no local, não se assemelha ao uso privativo de um imóvel por uma entidade carnavalesca, para o atendimento de suas conveniências.

A delegação da gestão de um equipamento não se faz por meio da cessão do bem onde ele está instalado, mas pela fixação de regras a serem observadas continuamente no desempenho das atividades ali previstas, que justificam a existência do equipamento. Nesse sentido, a regulação dessa atividade poderia viabilizar, de forma mais apropriada, o próprio controle do uso do bem, segundo as detalhadas normas técnicas do Manual de Uso e Manutenção, cuja observância diuturna não parece esgotar-se na referência lacônica feita na minuta de termo de permissão de uso.

Eventual delegação da gestão do bem poderia ser acompanhada de uma permissão de uso, de modo que esta não parece, em princípio, inviável. No entanto, como essa possível delegação parece impactar seriamente a própria cessão e o regime que lhe deve ser estabelecido, o assunto deve ser objeto da devida análise, o que ainda não consta dos autos.

De todo modo, em se tratando de um equipamento público, situado em área institucional, destinado à prestação de serviços sociais especiais, não parece fazer sentido a concessão administrativa do bem a uma entidade incumbida das atividades a serem ali exercidas. De fato, a administração do equipamento pode ser delegada a um terceiro, pelo instrumento contratual adequado - questão que não cabe aqui analisar -, sendo o uso do bem uma decorrência dessa delegação. Não caberia, assim, que a cessão do bem, que teria um caráter secundário em relação à administração do equipamento, fosse feito por meio de um contrato cuja função é garantir uma segurança jurídica ainda mais intensa, que acabaria por ser mais forte que a do próprio instrumento de delegação da gestão, inclusive no tocante ao prazo.

Ademais, a própria Municipalidade já efetuou investimentos no local, de modo que não haveria, ao que parece, necessidade de dar garantia de prazo para o cessionário, a fim de viabilizar investimentos, justificativa mais comum para a opção por uma concessão administrativa de uso. De outra parte, eventual necessidade de revogação da concessão, inclusive por alteração na estratégia de gestão do equipamento ou nas atividades por ele disponibilizadas, poderia ensejar indenização ao concessionário, situação que, não acompanhada de uma justificativa específica, por fragilizar a posição da Urbe no tocante às suas possibilidades de ação, não parece ser, em uma primeira análise, favorável aos interesses municipais.

Vale observar, ainda, que a Lei nº 15.893/13, que rege a Operação Urbana Consorciada Água Branca, estabelece que a destinação da área como área institucional seria precedida da oitiva do Grupo de Gestão (art. 10, § 2º), providência que não consta já ter sido tomada até o momento.

Assim sendo, existem questões fundamentais a serem enfrentadas, que incluem até mesmo a necessidade efetiva de que o bem seja objeto de cessão na forma idealizada, não sendo imprescindível, para seu funcionamento ou para sua operação por terceiros, a outorga de uma permissão ou concessão de uso. Eventual manifestação definitiva sobre a cessão depende, portanto, do esclarecimento acerca do modelo a ser adotado, nos termos acima expostos.

Sem embargo, ainda que essas questões ainda estejam pendentes, nada obsta que o material já juntado aos autos seja, desde logo, objeto de análise.

Nesse sentido, caso prospere o propósito da cessão, deveria ser justificada a opção por fazer constar um número específico de agremiações, opção que parece nada recomendável no caso do projeto de lei e pouco recomendável no caso do decreto, já que tornaria sempre necessária uma modificação em tais instrumentos caso houvesse alguma alteração no estado das coisas que viesse a impor a revisão de tal número.

Por outro lado, não parecem suficientemente claras, para fins de controle da atuação da permissionária, as normas relativas à garantia de que as escolas participem de eventos e à manutenção de vias, logradouros e equipamentos públicos no entorno. Neste último caso, é certo que a exigência tem suporte no referido preceito legal relativo às cessões, mas é sempre o caso de que os atos de execução da lei promovam um aumento da densidade normativa envolvida, por meio da fixação de preceitos cujo cumprimento possa ser efetivamente aferido, o que não acontece em relação aos textos em exame.

Por outro lado, é preciso definir como serão aferidas as condições de instalação da atividade, que estão referidas na minuta de termo de permissão (Cláusula 6ª, "i", fls. 120v.), mas sem a indicação da respectiva forma de controle. Eventual exigência de que a permissionária providencie a respectiva licença de funcionamento atenderia a esse propósito; no entanto, poderia ser eventualmente proposta alguma alternativa procedimental que tivesse em conta as características peculiares do equipamento. Fosse o equipamento gerido pelo Poder Público, por exemplo, ainda que com um particular contratado ou conveniado, seria possível carrear ao órgão público a verificação do atendimento da tais regras, como ocorre em outros equipamentos públicos, mas essa estrutura jurídica, como visto, ainda não foi considerada nos autos. De todo modo, não parece possível deixar de analisar a questão, sendo insuficiente a mera referência à necessidade de atendimento a condições de segurança, até mesmo tendo em vista que usos dessa complexidade, pelos riscos correspondentes, não costumam estar isentos de algum controle prévio por parte da Municipalidade.

Observe-se, ainda, que não parece apropriado mencionar especificamente a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano - hoje Secretaria Municipal de Urbanismo e Licenciamento, nos termos do Decreto nº 57.576/17 - como órgão a ser ouvido para eventuais obras ou benfeitorias (Cláusula 6ª, "b", fls. 120), uma vez que se trata de aspecto pertinente aos procedimentos internos da permitente, não alcançando seu relacionamento com a permissionária.

A Cláusula 10ª do termo de permissão de uso (fls. 121) deve prever a possibilidade de correção da irregularidade cometida pelo permissionário, para ajustar-se ao parágrafo 1º da cláusula 9ª, que contempla essa alternativa. O mesmo ocorre na minuta de projeto de lei, em que o art. 5º deveria compatibilizar-se com a alternativa oferecida pelo art. 7º, § 1º

Por outro lado, não parece possível que a lei autorizativa estabeleça o prazo de cinco anos para a formalização da concessão, como consta da minuta em análise, uma vez que esse prazo conflita com aquele estabelecido pela Lei Orgânica do Município (art. 114, §10). Vale notar que tal dispositivo abre a possibilidade de que os prazo de três anos ali estabelecido seja contado da data fixada pela lei autorizativa para a prática do ato, o que, restringindo-se à definição de um termo inicial, é claramente distinto da definição de outro prazo para a prática do ato.

Seria preciso, ainda, ajustar o texto do projeto de lei para delimitar de modo mais preciso a hipótese de revisão do perímetro (art. 3º), a fim de que evitar entendimentos equivocados no sentido da existência de uma espécie de delegação para que o Executivo altere a área a ser concedida. Tudo indica que o propósito do dispositivo seria a possibilidade de aperfeiçoamento na descrição técnica do imóvel, o que, caso fosse confirmado, poderia ser ali referido expressamente.

Assim sendo, sugere-se seja o presente remetido a SGM, para ciência, tendo em vista a necessidade de prosseguimento às medidas cabíveis para a definição da competência para gestão do equipamento, seguindo-se a avaliação da conveniência de que essa gestão seja feita em parceria com a Liga Independente das Escolas de Samba e da efetiva necessidade, sob o ponto de vista da estruturação da ação pública, de que o uso do equipamento seja realmente efetuado por meio de permissão de uso, hipótese que, como visto, não constitui a única alternativa jurídica para viabilização das atividades ali previstas.

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São Paulo, 09/01 /2017.

JOSE FERNANDO FERREIRA BREGA

PROCURADOR ASSESSOR - AJC

OAB/SP 173.027

PGM

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De acordo.

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São Paulo, 10/01/2017.

TIAGO ROSSI

PROCURADOR ASSESSOR CHEFE - AJC

OAB/SP 195.910

PGM

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Processo n° 2016-0.220.040-4

INTERESSADO: Liga Independente das Escolas de Samba de São Paulo

ASSUNTO: Cessão de área municipal.

Cont. da Informação nº 0022/2017-PGM.AJC

SGM

Senhor Secretário

Encaminho-lhe o presente, com o entendimento da Assessoria Jurídico Consultiva da Procuradoria Geral do Município, que acolho, no sentido de que, anteriormente à deliberação acerca da necessidade, oportunidade e conveniência de cessão da área em questão, será necessário definir o modelo de gestão do equipamento público (Fábrica do Samba), bem como o órgão municipal que será competente para tanto e as regras a serem ali observadas.

Acompanha o p. a. n. 2013-0.252.966-4.

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São Paulo, 11/01/2017.

RICARDO FERRARI NOGUEIRA

PROCURADOR GERAL DO MUNICÍPIO

OAB/SP n° 175.805

PGM

 

Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo