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PARECER PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO - PGM Nº 11.927 de 21 de Dezembro de 2018

EMENTA N° 11.927
Abertura de processo de tombamento. Notificação pessoal. Art. 14, §1°, da Lei municipal n° 10.032/85. Embora devida, a ausência de notificação pessoal não prejudica a eficácia do tombamento, ou da abertura do processo de tombamento, nos casos em que: (1) ficar comprovado, por outros meios, que o interessado estava ou deveria estar ciente da restrição; (2) a atuação irregular do interessado contribuir para a suposta falta de ciência acerca da restrição, ou, em outros termos, quando ficar comprovado que, se tivesse agido regularmente, requerendo as licenças e autorizações necessárias à atividade edilícia, o interessado teria ficado ciente da restrição.

Processo nº 2010-0.279.289-0

INTERESSADO: CONPRESP

ASSUNTO: Processo de fiscalização e sanção. Demolição de imóvel em processo de tombamento e localizado na área envoltória de prédio tombado (Capela de São Miguel). Construção irregular de edificação no local. Notificação por edital e em jornais de grande circulação da abertura do processo de tombamento. Termo de ajustamento de conduta.

Informação n° 1.560/2018-PGM.AJC

COORDENADORIA GERAL DO CONSULTIVO

Senhor Coordenador Geral

Trata-se de processo sancionatório referente à demolição irregular e construção também irregular em imóvel localizado na área envoltória de bem tombado (Capela de São Miguel, cf. Resolução n° 5/91), e que se encontrava, ele próprio, em processo de tombamento (Resolução n° 26/04). Um breve histórico do ocorrido encontra-se às fls. 102/103 do presente.

Técnica do DPH verificou, em janeiro de 2007, durante a análise do PA n° 2006-0.341.211-0 (que tinha por objeto requerimento, do proprietário, para construção de nova edificação no local), que os prédios antes existentes no local haviam sido demolidos sem autorização do CONPRESP e sem o devido alvará (fls. 63/64). Após comunique-se ao proprietário, verificou-se, poucos meses depois (em março de 2007), que o proprietário já havia iniciado, também sem autorização, nova construção no local, com altura incompatível com o entorno imediato da Capela de São Miguel (fls. 78/79). O CONPRESP, então, deliberou pelo indeferimento do requerimento e determinou o início da ação fiscalizatória.

O proprietário requereu, em seguida, a regularização da edificação (PA 2008-0.227.274-2), que também foi indeferida, por ir de encontro às diretrizes do tombamento.

Este processo documenta a ação fiscalizatória e sancionatória. Após cálculo inicial do valor da penalidade, o expediente foi encaminhado à assessoria jurídica do DPH, que se manifestou no sentido da inexistência de decadência para aplicação da penalidade, dados os efeitos permanentes da infração, bem como da necessidade notificação, ao proprietário, da abertura do processo de tombamento, sob pena de ineficácia deste em relação ao particular não notificado (fls. 105/106).

A Secretaria executiva do CONPRESP apontou, às fls. 115, que foram publicados editais de notificação em jornal de grande circulação (Folha de São Paulo) e no D.O., e que diversos órgãos públicos, como SEHAB e as Subprefeituras, também foram notificados. Destacou, ainda, a grande quantidade de imóveis atingidos.

DPH/AJ manteve o entendimento da necessidade de notificação pessoal para penalização do proprietário, propondo, subsidiariamente, caso mantida a decisão de aplicação da multa, o seu recálculo.

Na manifestação de fls. 123/124, o DPH manifestou-se pela possibilidade de regularização, por entender que, dado que a construção é de 2008 e as diretrizes do tombamento só foram especificadas na Resolução n° 17/2014, o proprietário teria direito à regularização, ainda que, do ponto de vista da paisagem urbana, a edificação não seja adequada e esteja em desacordo com os atuais parâmetros. Promoveu, ainda, o recálculo da multa.

Encaminhado, o caso, ao Conselho, o representante de SMJ propôs a remessa das seguintes questões a esta Coordenadoria: (i) seria necessária, no caso, a notificação pessoal do proprietário quanto à abertura do processo de tombamento? (ii) é possível a celebração de termo de ajustamento de conduta, nos termos dos arts. 34-A e 34-B da Lei municipal n° 10.032/85, já que a multa, a princípio, não fora imposta, tendo havido apenas deliberação do CONPRESP para a sua aplicação?

É o relato do necessário.

Quanto à necessidade de notificação pessoal para a eficácia, em relação à dada pessoa, do tombamento, esta Procuradoria se posicionou no seguinte sentido (Informação n° 15/2013 - PGM.AJC, retroanexada):

Para que a restrição causada por um tombamento ou outra medida de proteção possa produzir todos os seus efeitos em relação a determinada pessoa, a referida pessoa deve ter ciência da limitação que recai sobre o seu imóvel (ou, ao menos, deve ter sido oportunizada a ciência). Parece óbvio que, se não foram outorgados meios para que um determinado cidadão conheça da restrição, não pode ser exigido dele um comportamento de acordo com a limitação imposta.

Justamente para assegurar a ciência, a Lei municipal n° 10.032/85 impõe, no art. 141, que a abertura do processo de tombamento seja publicada no diário oficial, em um jornal de grande tiragem, e que o proprietário do bem tombado seja notificado. Também dispõe, no art. 17, que o tombamento deve ser anotado no Registro de Imóveis (no caso de bens imóveis) ou no Registro de Títulos e Documentos (no caso de bens móveis).

(...)

Podem ocorrer, entretanto, falhas de procedimento. Uma notificação postal pode ser devolvida por erro dos Correios ou em razão da empresa não ter encontrado ninguém para firmar o aviso de recebimento. Nestes casos, a Administração deve lançar mão de medidas complementares, na tentativa de cientificar o interessado e, em último caso, proceder à notificação por edital. Judicialmente2, caso a Administração consiga comprovar que tentou, por todas as vias, notificar o proprietário - ou, ainda melhor, consiga comprovar que ele teve ciência da restrição, ainda que não pela via da notificação postal -, maiores serão as chances de sucesso no reconhecimento, pelo juízo, da validade da aplicação da penalidade. Como já mencionado nos pareceres encartados às fls. 2 e ss., tem recebido grande acolhida jurisdicional a tese de que, nos casos de vício de procedimento, o atingimento da finalidade do ato supre a sua irregularidade.

(...)

Além de falhas de procedimento, podem ocorrer algumas circunstâncias que dificultem a notificação individual aos proprietários, como no tombamento ambiental, que envolve centenas ou milhares de imóveis. Idealmente, deve haver comunicação a todos que tem a propriedade atingida, mas, em atenção ao princípio da razoabilidade, pode haver algum temperamento, especialmente considerando que tais tombamentos são amplamente noticiados pela imprensa. Estas hipóteses devem ser analisadas caso a caso, não sendo apropriado traçar, aqui, uma orientação geral sobre o tema.

Não existe previsão legal quanto à cientificação dos proprietários atingidos por se encontrarem na área envoltória do bem tombado. Nada obstante, convém a sua notificação, para que não seja alegado o desconhecimento da restrição, bem como a anotação na certidão imobiliária.

A regra é, portanto, a notificação pessoal do proprietário do imóvel, a respeito da abertura do processo de tombamento, para que esta produza efeitos em relação ao mesmo, como apontou DPH/AJ. Contudo, como também colocado na manifestação anterior desta Procuradoria, não se pode perder de vista a finalidade da notificação, que é oportunizar a ciência, do munícipe, acerca da restrição sobre o seu imóvel, da mesma forma que é preciso considerar as dificuldades de notificação individualizada no caso de tombamentos que afetam inúmeros imóveis, casos em que pode haver algum temperamento em atenção ao princípio da razoabilidade.

Pois bem. No caso em análise, o proprietário demoliu a construção antes localizada no seu imóvel sem qualquer autorização. Depois, requereu autorização do CONPRESP para nova edificação no local. Durante a análise do processo, e após a expedição do comunique-se, iniciou a nova construção irregularmente, chegando a terminá-la e a locá-la à instituição financeira.

Ainda que pudesse haver dúvida quanto à ciência prévia ou não do proprietário acerca dos tombamentos quando da demolição da edificação, cremos que duas questões não podem passar desapercebidas. Primeiro, caso o proprietário tivesse agido regularmente e requerido, na Subprefeitura, o necessário alvará de demolição dos prédios então existentes, teria ficado ciente da restrição, eis que a Subprefeitura a apontaria. Ao agir irregularmente, demolindo o imóvel sem a devida consulta prévia à Subprefeitura, deve sofrer o ônus da ação irregular e as consequências da própria desídia - afinal, a ninguém é dado se beneficiar da própria torpeza. A própria conduta de não requerer o alvará de demolição, aliás, já indica a possível ciência da restrição, tendo resolvido, o proprietário, agir na surdina.

Em segundo, não há qualquer dúvida quanto à ciência do proprietário acerca da restrição quando da construção irregular no local, eis que ele já havia requerido ao CONPRESP, antes do início da atividade edilícia, autorização para construir. Durante a análise do processo, enquanto pendia COMUNIQUE-SE, o proprietário resolveu iniciar a edificação, e a terminou, tudo irregularmente. Portanto, é indubitável que o proprietário, antes da construção da edificação, tinha ciência da restrição derivada do patrimônio cultural, optando por agir fora da legalidade.

Assim, no caso em análise, julgamos que a falta de notificação pessoal quando da abertura do processo de tombamento não impossibilita a autuação, eis que, quando da demolição, poderia ter tido ciência da restrição, caso tivesse agido regularmente e requerido o devido alvará à Subprefeitura e, quando da construção, ficou comprovado que já tinha ciência do tombamento, na medida em que havia protocolado, anteriormente, requerimento ao CONPRESP.

Quanto ao segundo questionamento, parece-nos possível, em tese, a aplicação dos arts. 34-A e 34-B da Lei municipal n° 10.032/85, introduzido pela Lei n° 16.274/15, que preveem a possibilidade de celebração de termo de ajustamento de conduta antes da imposição da sanção3. Como notado pelo representante de SMJ no CONPRESP, o Conselho apenas deliberou no sentido de determinar a aplicação de multa, mas esta ainda não foi aplicada, mesmo porque ainda estava pendente a questão do seu valor.

Embora a questão da possibilidade de regularização da edificação não tenha sido objeto de questionamento específico, julgamos importante mencioná-la, eis que tem relevância para a celebração do termo de ajustamento de conduta. Os pareceres anteriores do DPH mencionavam a impossibilidade de regularização em razão da incompatibilidade entre a construção e o tombamento. No parecer mais recente, de fls. 123/124, entendeu-se possível a regularização, ao argumento de que o proprietário, por ter construído em 2007, teria direito à regularização, eis que somente com a Resolução n° 17/2014 (tombamento definitivo) foram definidas restrições específicas para o centro de São Miguel.

Cremos que a questão merece reanálise, eis que não nos parece haver direito subjetivo do proprietário que construiu irregularmente, apenas pelo fato das especificações das limitações do tombamento serem posteriores à construção. O fato das restrições ainda não estarem discriminadas e pormenorizadas antes de 2014 não dispensava, como é sabido, a análise e aprovação, pelo CONPRESP, das intervenções no local abrangido pelo tombamento ou pela área envoltória. Portanto, a eventual falta de explicitação das restrições, antes de 2014, importava em uma análise caso a caso pelo DPH e pelo CONPRESP. Tanto assim que, no processo referente ao pedido de regularização, o DPH e o CONPRESP posicionaram-se contrariamente a ela, por entender que a construção era incompatível com o tombamento - isto antes de 2014.

De mais a mais, cabe lembrar que construções irregulares, em regra (salvo lei específica prevendo o contrário), não dão direito à apreciação dos requerimentos de regularização segundo as leis vigentes no momento da realização da atividade edilícia: aplica-se a lei vigente no momento do pedido de regularização, eis que não há 'direito de protocolo' nos casos de construções irregulares, pois não há um 'protocolo' anterior à construção, salvo o próprio pedido de regularização (que, se indeferido, deverá dar origem a novo pedido, com as necessárias correções).

Outra observação diz respeito ao cálculo da penalidade pecuniária. Utilizou-se, na manifestação de fls. 123/124, o Decreto n° 54.805/14, posterior à infração. Contudo, deve ser utilizado o Decreto vigente no momento da irregularidade: s.m.j., o Decreto n° 47.493/06. Ou, ao menos, deve ser adequadamente justificada a utilização da norma posterior à infração, eis que, via de regra, para as penalizações, aplica-se a lei vigente no momento da infração, por mais que a multa seja posterior.

Esse raciocínio não prejudica a celebração de termo de ajustamento de conduta, caso seja do interesse das partes, eis que normas de processo (inclusive, ao nosso ver, os acordos endoprocessuais) aplicam-se imediatamente.

Sub censura.

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São Paulo, 21/12/2018.

RODRIGO BRACET MIRAGAYA

Procurador Assessor - AJC

OAB/SP 227.775

PGM

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De acordo.

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São Paulo, 26/12/2018.

TICIANA NASCIMENTO DE SOUZA SALGADO

Procuradora Assessora Chefe - AJC

OAB/SP 175.186

PGM

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1 "Art. 14. O processo será aberto por resolução do Conselho que será publicada em até 3 (três) dias úteis contados da data da resolução, pelo órgão técnico de apoio, no 'Diário Oficial' do Município e em pelo menos um jornal de grande tiragem.

§ 1°. Independentemente da publicação referida neste artigo, deverá o proprietário ser notificado.

§ 2° Com a abertura do processo de tombamento o bem em exame terá o mesmo regime de preservação do bem tombado até a decisão final do Conselho."

2 No caso de falhas de procedimento, a discussão acaba, normalmente, resvalando para a via judicial.

3 Art. 34-A Poderá o CONPRESP, alternativamente à imposição da sanção, firmar termo de compromisso de ajustamento de conduta, visando à adequação da conduta irregular às disposições legais.

Parágrafo único. O pedido para formalização do termo a que se refere o "caput" deste artigo não será conhecido se apresentado depois da imposição da sanção. (Redação acrescida pela Lei n° 16.274/2015)

Art. 34-B O termo de compromisso previsto no artigo 34-A desta lei será firmado pelo Presidente do CONPRESP, ouvido previamente o Departamento do Patrimônio Histórico da Secretaria Municipal de Cultura.

§ 1º As metas e os compromissos constantes do termo firmado de acordo com o disposto no "caput" deste artigo deverão, no seu conjunto, ser compatíveis com as normas de proteção do patrimônio cultural.

§ 2º Do termo de compromisso deverá constar, necessariamente, a previsão de multa pelo seu descumprímento, cujo valor será correspondente, no mínimo, ao montante da penalidade que seria aplicada, acrescido de 20% (vinte por cento). (Redação acrescida pela Lei n° 16.274/2015)

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Processo nº 2010-0.279.289-0

INTERESSADO: CONPRESP

ASSUNTO: Processo de fiscalização e sanção. Demolição de imóvel em processo de tombamento e localizado na área envoltória de prédio tombado (Capela de São Miguel). Construção irregular de edificação no local. Notificação por edital e em jornais de grande circulação da abertura do processo de tombamento. Termo de ajustamento de conduta.

Cont. da Informação n° 1.560/2018-PGM.AJC

PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO

Senhor Procurador Geral

Encaminho, a Vossa Senhoria, as considerações da Assessoria Jurídico-Consultiva desta Coordenadoria Geral do Consultivo, que acompanho, no sentido de que: (i) embora devida, a ausência de notificação pessoal não prejudica a eficácia do tombamento, ou da abertura do processo de tombamento, nos casos em que: (1) ficar comprovado, por outros meios, que o interessado estava ou deveria estar ciente da restrição; (2) a atuação irregular do interessado contribuir para a suposta falta de ciência acerca da restrição, ou, em outros termos, quando ficar comprovado que, se tivesse agido regularmente, requerendo as licenças e autorizações necessárias à atividade edilícia, o interessado teria ficado ciente da restrição; (ii) é viável a celebração do termo de ajustamento de conduta previsto no art. 34-A da Lei n° 10.032/85, pois ainda não aplicada a multa; (iii) convém a reanálise (com a revisão ou justificação) dos entendimentos referentes à regularização da edificação e à norma empregada para cálculo da multa, às fls. 123/124.

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São Paulo, 08/02/2019.

TIAGO ROSSI

Coordenador Geral do Consultivo

OAB/SP 195.910

PGM

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Processo nº 2010-0.279.289-0

INTERESSADO: CONPRESP

ASSUNTO: Processo de fiscalização e sanção. Demolição de imóvel em processo de tombamento e localizado na área envoltória de prédio tombado (Capela de São Miguel). Construção irregular de edificação no local. Notificação por edital e em jornais de grande circulação da abertura do processo de tombamento. Termo de ajustamento de conduta.

Cont. da Informação n° 1.560/2018-PGM.AJC

CONPRESP

Senhor Presidente

Encaminho, o presente, com a manifestação da Coordenadoria Geral do Consultivo, que endosso, no sentido de que: (i) embora devida, a ausência de notificação pessoal não prejudica a eficácia do tombamento, ou da abertura do processo de tombamento, nos casos em que: (1) ficar comprovado, por outros meios, que o interessado estava ou deveria estar ciente da restrição; (2) a atuação irregular do interessado contribuir para a suposta falta de ciência acerca da restrição, ou, em outros termos, quando ficar comprovado que, se tivesse agido regularmente, requerendo as licenças e autorizações necessárias à atividade edilícia, o interessado teria ficado ciente da restrição; (ii) é viável a celebração do termo de ajustamento de conduta previsto no art. 34-A da Lei n° 10.032/85, pois ainda não aplicada a multa; (iii) convém a reanálise (com a revisão ou justificação) dos entendimentos referentes à regularização da edifieáçlo e à norma empregada para cálculo da multa, às fls. 123/124. 

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São Paulo, 13/02/2019.

GUILHERME BUENO DE CAMARGO

PROCURADOR GERAL DO MUNICÍPIO

OAB/SP 188.975

PGM 

Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo