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PARECER PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO - PGM Nº 12.235 de 10 de Dezembro de 2020

EMENTA N° 12.235
Patrimônio imobiliário. Estudo de domínio. Faixa de terreno ligando duas vias públicas. Afetação não consumada. Concurso voluntário não caracterizado.

processo nº 6021.2020/0009960-0

INTERESSADO: Magda Volker e outros

ASSUNTO: Ação declaratória. Autos n° 1010767-23.2020.8.26.0053 - 11ª VFP.

Informação n° 1.365/2020 - PGM-AJC

PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO
COORDENADORIA GERAL DO CONSULTIVO
Senhora Procuradora Coordenadora Substituta

A questão objeto do presente processo foi examinada no Parecer PGM/CGC 036190487 (Ementa n° 12.230).

Após a referida manifestação, porém, Maria Paula Costa Bertran requereu a revisão do mencionado parecer quanto ao trecho que liga a travessa Antonieta Medeiros à rua Professor João Marinho, antiga rua Copacabana, que não foi considerado público. Pretende também que a Municipalidade "se abstenha de afirmar que a área, não sendo pública, pode ser fechada". Foram apresentadas ainda declarações de que o trecho em questão sempre foi utilizado pela população como passagem (036513016).

DEMAP encaminhou o processo, propondo a manutenção da conclusão a respeito do assunto (036513058).

Com efeito, o trecho em discussão corresponde à pequena passagem existente no final da travessa Antonieta Medeiros, podendo o local ser observado na fotografia aérea 029872976, dentro do círculo azul, bem como nas fotografias 030045245.

Depois de analisar o assunto, o DEMAP, cuja manifestação foi acolhida pela PGM.CGC, conclui que os elementos existentes não permitem sustentar a incorporação da faixa em questão ao domínio público.

Desse entendimento, porém, discorda a ora requerente.

Assim, parece-me oportuno resgatar o conceito do denominado concurso voluntário, tal como exposto por Eduardo Vianna Motta, ao examinar os modos de aquisição dos bens de uso comum do povo pelas pessoas jurídicas de Direito Público.1

Em resumo, como se sabe, compete ao poder público municipal a abertura de vias de circulação urbanas. Contudo, os particulares podem colaborar com a Administração nessa tarefa, transferindo gratuitamente ao patrimônio público os bens destinados a essa finalidade.

Tal transferência ocorre mediante o chamado concurso voluntário, que já era admitido pela doutrina e pela jurisprudência mesmo antes da sua consagração na legislação brasileira. Por essa razão, aliás, é que não há necessidade de registro imobiliário dos bens de uso comum.

No entanto, para a caracterização do concurso voluntário é indispensável, em primeiro lugar, a manifestação de vontade do particular no sentido de oferecer o bem, seja de forma expressa, mediante o requerimento de aprovação de parcelamento do solo, seja de forma tácita, mediante a simples abertura das ruas.

Mas para o aperfeiçoamento do contrato administrativo do concurso voluntário, com a consequente transferência do domínio das vias e logradouros abertos, deve ocorrer também a aceitação desses espaços pela Administração, pois, se assim não fosse, o interesse particular estaria se sobrepondo ao interesse público, já que os munícipes decidiriam quando e onde implantar as vias públicas. A respeito do assunto, merece ser reproduzida a seguinte lição de Eduardo Vianna Motta:

"Do fato do loteamento inicia-se o processo de formação do concurso voluntário. A vontade do particular, como vimos, pode decorrer de expressa manifestação, de formal declaração, ou decorrer de fatos, e então será de manifestação tácita. Para consumar-se o concurso voluntário, será de mister o acasalamento das duas vontades: a do particular e a da administração. Também está pode dar-se de maneira formal ou tácita. A manifestação da vontade da administração dá-se através da afetação. Sem a afetação, a coisa, embora oferecida irrevogavelmente, ainda é particular.(...) Essa afetação poderá ser tácita: a execução de obras, por exemplo." 2

No mesmo sentido, a manifestação da então Secretaria dos Negócios Jurídicos no PA 2006-0.277.7590 (informação n° 3.308/2013-SNJ.G), ressaltando que a afetação ao uso público pode assumir uma variedade de formas, expressas ou tácitas, como a regularização de um loteamento, a oficialização de vias ou mesmo a realização de obras públicas em logradouros abertos, não sendo possível o reconhecimento do uso público de um determinado espaço até a prática de algum desses atos, ainda que o local apresente as características correspondentes.

Portanto, deve existir, em qualquer hipótese, um ato da Administração para a configuração da afetação (Ementas 11.812, 11.889, 12.104, 12.206).

Logo, no caso em exame, cabe verificar se ocorreu, efetivamente, o concurso voluntário, nos termos assim resumidos por Eduardo Vianna Motta na RT 338/43:

"O que é preciso, sim, para que se realize o contrato administrativo do concurso voluntário é a existência de inequívoca vontade de contratar pelas partes: inequívoca vontade de ofertar por parte do particular, e inequívoca vontade de aceitar, por parte da administração. Desde então, conjugadas as vontades, dar-se-á a transferência do domínio."

Pois bem, a instrução realizada no presente processo demonstrou que a faixa em estudo não integra o parcelamento do solo que originou a travessa Antonieta de Medeiros, conforme pode ser observado no croqui patrimonial 105831 (030045448), tampouco tem sua origem em qualquer outro plano de loteamento aprovado.

Portanto, a faixa em estudo não foi oferecida ao Poder Público, tanto que a área correspondente foi expressamente destinada a permitir o acesso às garagens dos imóveis 96 e 98 da antiga rua Copacabana, atual Rua Professor João Marinho, ou seja, os lotes fiscais 68 e 69 da quadra fiscal 030045538, mediante a instituição de uma servidão devidamente inscrita. De outro modo, se a intenção do proprietário tivesse sido a de transformar a faixa em logradouro público, não haveria necessidade da instituição da servidão.

Por outro lado, nada consta a respeito da aceitação do trecho em questão pela PMSP, uma vez que não foram localizados registros a respeito de melhoramentos públicos executados no local (035178250), 

não podendo a ausência de tributação da faixa em questão (035180635), isoladamente, alterar tal conclusão, especialmente porque a faixa sequer aparece na respectiva quadra fiscal (030045538).

Além do mais, a denominação da travessa Antonieta Medeiros pelo Decreto n° 23.020/1986 não atingiu a faixa em estudo (029983867), circunstância que confirma a não aceitação da área correspondente.

Vale lembrar também, mais uma vez, que a abertura da atual travessa Antonieta Medeiros foi aprovada como acesso apenas às casas da vila, nos termos do artigo 750, § 4°, do antigo Código de Obras "Arthur Saboya".

Diante de todo o exposto, não há que se falar em aquisição da propriedade pela Municipalidade por usucapião, conforme sustenta a requerente, cabendo ressaltar, ademais, que a conclusão a respeito da possibilidade de fechamento da área particular decorreu do ajuizamento da ação objeto do presente processo, em virtude da fiscalização realizada pela PMSP no local.

Assim, parece-me que o presente processo poderá ser devolvido ao DEMAP para prosseguimento, em razão da ausência de questão relevante sobre a qual não exista entendimento jurídico consolidado (art. 18, inciso V, alínea a, do Decreto n° 57.263/2016), não havendo também fundamento para a revisão das conclusões do DEMAP no exercício da sua competência a respeito do assunto, nos termos do artigo 23, inciso IV, do mesmo decreto (Ementa n° 12.128).

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São Paulo, 10/12/2020

RICARDO GAUCHE DE MATOS
PROCURADOR ASSESSOR – AJC
OAB/SP 89.438
PGM

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1 RT volumes 332/49, 333/49, 334/57, 335/67, 336/39, 337/44, 338/43, 339/47 e 390/51.

2 RT 338/43.

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processo nº 6021.2020/0009960-0

INTERESSADO: Magda Volker e outros

ASSUNTO: Ação declaratória. Autos n° 1010767-23.2020.8.26.0053 - 11ª VFP.

Cont da Informação n° 1.365/2020 - PGM-AJC

DEMAP G
Senhor Diretor

Considerando que não foi suscitada nova questão a respeito da qual não exista entendimento jurídico consolidado (Ementa n° 12.128), restituo o presente para prosseguimento.

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São Paulo, 10/12/2020

TICIANA NASCIMENTO DE SOUZA SALGADO
PROCURADORA DO MUNICÍPIO
COORDENADORA GERAL DO CONSULTIVO - SUBSTITUTA
OAB/SP 175.186
PGM

Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo