processo n° 2017-0.130.909-9
INTERESSADO: Teo Vilela Gomes
ASSUNTO: Pedido de aquisição de área municipal.
Informação n. 1270/2020-PGM.AJC
PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO
COORDENADORIA GERAL DO CONSULTIVO
Senhor Coordenador Geral
Trata o presente de pedido de aquisição, com fundamento no art. 112, § 1o, I, "b", do imóvel municipal situado na Rua João Moura, 1298, Pinheiros.
O imóvel foi incorporado ao patrimônio municipal por força de desapropriação, realizada para execução do melhoramento previsto pela Lei n. 7.350/69. No entanto, com a revogação, o melhoramento não chegou a ser implantado, passando a haver uma área pública defronte ao remanescente do lote original, não expropriado (fls. 42/44). Agora, o titular desse remanescente pretende a aquisição da área municipal, a fim de que possa ter regular acesso ao logradouro existente (fls. 2).
PROJ não se opôs ao pedido sob o aspecto viário (fls. 58/59 e 66/67).
SUB-PI levantou a possibilidade de um projeto de feira orgânica para o local (fls. 82), o que foi inicialmente confirmado por SMTE (fls. 87).
DEUSO informou as regras urbanísticas incidentes para o local e opinou no sentido de que a área seria aproveitável do ponto de vista urbanístico (fls. 101/102).
OBRAS esclareceu que imóvel não é atingido por galeria de águas pluviais, sendo desnecessária a observância de faixa não edificável (fls. 119).
CGPATRI providenciou descrição para a área (fls. 123) e avaliou o imóvel (fls. 162/163). Em seguida, encaminhou os autos para análise da viabilidade do pedido formulado (fls. 191/192).
É o relatório do essencial.
O caso em exame poderia enquadrar-se de modo mais preciso na figura da retrocessão e do direito de preferência do expropriado para a aquisição do bem desapropriado ao qual não foi dada destinação alguma - a chamada adestinação. Vários dos trechos desapropriados lindeiras, aliás, foram restituídos aos expropriados por meio de escrituras de retrocessão, diante da revogação do melhoramento antes previsto (fls. 44).
No entanto, décadas depois, não cabe falar em direito de preferência em virtude da não utilização do imóvel aqui considerado para a finalidade pública que justificou a desapropriação, já que houve sua transmissão não somente causa mortis, mas também inter vivos, sendo aplicável, assim, o disposto no art. 520 do Código Civil, que veda a cessão do direito de preferência. É bem possível, aliás, que a questão já tenha sido suscitada no passado, conduindo-se pela inviabilidade do negócio em razão da morte da antiga proprietária.
Não obstante, a situação dos autos não se limita ao aspecto meramente patrimonial, ou seja, ao direito de preferência que se extinguiu com a morte da antiga proprietária do trecho desapropriado. Há também a questão urbanística, particularmente no que diz respeito ao encravamento do imóvel remanescente. Não se trata, com efeito, apenas de deixar de dar aproveitamento a um trecho desapropriado, mas de gerar uma situação que priva de acesso o restante do lote original, parcialmente atingido pela desapropriação.
Por isso, parece ser aplicável aqui, em boa medida, o entendimento relativo ao direito de preferência em favor do lote fronteiriço em caso de mudança de alinhamento, ao qual ora se faz remissão (Ementa n. 12.141 - PGM-AJC). De fato, durante algum tempo, entre as leis n. 7.350/69 e n. 8319/75, houve um alinhamento projetado, para o qual era necessário o trecho em questão, que foi retirado compulsoriamente do patrimônio particular. Com a revogação da primeira lei, que previa o melhoramento, a desapropriação passou a ter como resultado o encravamento da área remanescente.
Não tendo sido evitada a adjudicação do bem à Municipalidade, nem tendo sido providenciada a retrocessão, enquanto eventualmente possível, o fato é que a intervenção da Municipalidade no local gerou uma situação de encravamento, semelhante àquela que existiria caso tivesse sido efetuado o estreitamento de um logradouro antes existente.
Por isso, ainda que sob o aspecto civil tenha perecido o direito de preferência, este parece persistir sob a perspectiva do direito urbanístico, já que esse encravamento é incompatível com o conceito de lote adotado na legislação (Lei Federal n. 6.766/79, art. 2o, §§ 4o a 7o e Lei Municipal n. 16.402/16, Quadro 1), não podendo persistir após a revogação da lei que previa a alteração do alinhamento no local.
Até hoje, o proprietário lindeira tem obtido acesso a seus imóveis por meio da área desapropriada, à qual nenhuma destinação foi dada. Fosse alienada a área a terceiro, seria consumada uma situação de encravamento, pela qual o Município responderia, até mesmo para fins de indenização dos prejuízos econômicos correspondentes (Ementa n. 11.760 - PGM-AJC). Diante disso, é preciso reconhecer ao proprietário desse lote o direito de preferência na aquisição desse espaço, de modo que, unificado ao lote, este passe a confinar com o logradouro na sua configuração original, como ocorre no caso dos terrenos lindeiras.
A eventual venda do trecho desapropriado a um terceiro seria questionável do ponto de vista urbanístico, pois geraria uma inaceitável configuração fundiária. De fato, por mais eficiente que deva ser a gestão econômica do patrimônio público e mesmo que a licitação fosse um meio viável, no caso, para maximizar o proveito a ser obtido com a venda, não caberia fazê-lo à custa de direitos dos munícipes - tais como o direito de acesso ao lote, exercido, como decorrência da propriedade, em a intermediação de terceiros - e com a geração de conflitos entre particulares.
Por outro lado, tendo em vista a ausência de acesso ao lote remanescente, o possível aproveitamento isolado do bem em si considerado teria apenas por consequência tornar viável, em tese, sua utilização no serviço público, hipótese em que teria de ser considerada a desapropriação do imóvel encravado, de forma a dar cabo à questão urbanística decorrente da intervenção restritiva sobre o viário. No entanto, não havendo tal interesse nessa utilização, o desfecho possível é a alienação direta do bem ao proprietário lindeira.
Ademais, convém observar que não parece possível, na situação aqui analisada, avaliar a possibilidade de aproveitamento isolado do bem sem considerar o contexto em que ele se encontra inserido. De fato, mesmo que a área seja aproveitável em si, persistiria a necessidade de solução da questão existente em relação ao lote confinante, para a qual há duas alternativas: expor o Município à indenização dos prejuízos correspondentes à eliminação do acesso ou garantir um direito de passagem sobre o bem, aspectos que parecem fulminar tal aproveitamento isolado. Assim sendo, apesar de as dimensões da área em si permitirem seu aproveitamento como espaço edificável, essa utilização seria inviável, porque implicaria negar aos lotes acesso a via oficial.
Dessa sorte, embora não se trate rigorosamente do conceito clássico de investidura, que se refere à área que era integrante de viário implantado, mas deixou de sê-lo, poderia ser cabível aplicar o regime do instituto, a fortiori, à área que nem sequer chegou a integrar efetivamente o logradouro, tendo permanecido, por breve período, na qualidade de área necessária ao melhoramento.
No entanto, a situação dos autos é peculiar a ponto de dificultar a subsunção dos fatos ao disposto no art. 112, § 1o, I, "b", da Lei Orgânica do Município, e não somente em razão da informação de DEUSO no sentido do caráter aproveitável do bem - que poderia, como visto, ser discutida em razão da necessidade de manter o acesso ao lote encravado. De fato, embora tenha havido alteração de alinhamentos projetados, não houve efetivamente obra pública alguma, nem mesmo uma intervenção urbana, que pudesse ser enquadrada no dispositivo por meio de uma razoável interpretação extensiva.
Por outro lado, tampouco se pode afirmar que teria havido manifestação do Legislativo quanto à área que poderia vir a ser objeto de investidura, uma vez que a revogação do melhoramento ocorreu em 1975 e o imóvel foi adjudicado à Municipalidade somente em 1990. Houve, de fato, um erro em prosseguir com a desapropriação, situação que não enseja a incidência de um regime excepcional. Nesse contexto, parece mais apropriado que o assunto seja objeto de apreciação por parte da Câmara Municipal, que poderia autorizar o negócio e eventualmente estabelecer exigências a serem atendidas.
Em síntese, parece apropriado entender o caso como uma desapropriação efetuada indevidamente, que já não pode ser revista por meio de uma escritura de retrocessão, mas por alienação comum. Para essa alienação é inexigível a licitação - até porque as hipóteses legais de inexigibilidade não são taxativas, nos termos do art. 25, caput, da Lei n. 8.666/93 - mas não parece possível prescindir da autorização legislativa, tendo em vista a dificuldade de enquadrar o caso na hipótese excepcional prevista na Lei Orgânica do Município.
Assim sendo, sugere-se o retorno do presente a CGPATRI com conclusão quanto à viabilidade jurídica da alienação, que poderia ser realizada diretamente ao requerente, após a obtenção da correspondente autorização legislativa, razão pela qual poderá ser dado prosseguimento à tramitação do presente.
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São Paulo, 23/11/2020.
JOSÉ FERNANDO FERREIRA BREGA
PROCURADOR ASSESSOR - AJC
OAB/SP 173.027
PGM
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De acordo.
São Paulo,
TICIANA NASCIMENTO DE SOUZA SALGADO
PROCURADORA ASSESSORA CHEFE - AJC
OAB/SP 175.186
PGM
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processo n° 2017-0.130.909-9
INTERESSADO: Teo Vilela Gomes
ASSUNTO: Pedido de aquisição de área municipal.
Cont. da Informação n° 1270/2020-PGM.AJC
CGPATRI
Senhora Coordenadora
Com o entendimento da Assessoria Jurídico-Consultiva desta Coordenadoria Geral do Consultivo, que acolho, no sentido de que, embora o caso enseje o reconhecimento de uma inexigibilidade de licitação para a venda do bem ao proprietário lindeiro, parece necessário a obtenção de autorização legislativa para tal alienação, dada a impossibilidade de enquadramento no disposto no art. 112, § 1o, I, "b", da Lei Orgânica do Município.
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São Paulo, / 2020.
TIAGO ROSSI
PROCURADOR DO MUNICÍPIO
COORDENADOR GERAL DO CONSULTIVO
OAB/SP 195.910
PGM
Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo