processo n° 6068.2019/0000587-2
INTERESSADO: LP Administradora de Bens Ltda.
ASSUNTO: Aquisição ou concessão de uso de área municipal.
Informação n° 930/2020-PGM.AJC
PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO
COORDENADORIA GERAL DO CONSULTIVO
Senhor Procurador Coordenador
Trata-se de estudo de domínio incidental realizado a pedido de CGPATRI (017207915) no curso do presente processo, que trata de pedido de aquisição ou concessão de uso de área municipal para aproveitamento em um projeto de edificação.
De acordo com a inicial, a área pretendida corresponde ao leito da travessa das Trufas, que serve de acesso exclusivamente aos imóveis de propriedade do requerente.
A via em questão - a passagem com entrada pelo n° 1.922 da Rua Tuiuti -, pode ser observada na quadra fiscal 015604499, p.2.
Conforme fotografias apresentadas (014678891), porém, as casas da vila já foram demolidas e a via descaracterizada, encontrando-se as obras iniciadas.
Após examinar o assunto, o DEMAP concluiu que se trata efetivamente de logradouro público (031944668).
Feito o breve relatório acima, passo a opinar. A conclusão acerca do caráter público da via não merece reparos.
Com efeito, trata-se da PS 279, passagem cuja abertura foi aprovada pelo alvará n° 18.422, de 7 de março de 1946, mediante requerimento de DONATO GIANON,Enos autos do processo n° 78.771/45 [1] (015639783), durante, portanto, a vigência dos artigos 749 a 761 da antiga Consolidação do Código de Obras aprovada pelo Ato n° 663, de 10/08/34, que considerava tais logradouros públicos (artigo 2°, item 14 e artigo 734)[2]
Desse parcelamento do solo resultaram novos lotes, com lançamento fiscal e registro imobiliário individualizados, que foram alienados a terceiros, conforme títulos juntados aos autos.
Vale lembrar ainda que, segundo o artigo 759 do antigo Código de Obras[3], não havia necessidade de um ato oficial de recebimento das passagens abertas para a sua incorporação ao patrimônio público, já que se tratava de uma forma simplificada de parcelamento do solo sujeita a regras próprias.
Seja como for, a passagem em questão foi oficializada pelo Decreto n° 26.524/1988 (015604499, P. 6).
De fato, conforme elementos extraídos do PA 1983-0.032.799-1, que cuidou do assunto, a pedido da Câmara Municipal, a via foi efetivamente aberta, conforme demonstra o relatório da vistoria realizada na ocasião, constando do mesmo inclusive um croqui e fotografia do local (025186476).
A propósito, o Tribunal de Justiça de São Paulo, em recente julgado, proferido na Apelação n° 0018075-45.2011.8.26.0053, decidiu que a abertura de vias e sua disponibilização ao uso comum "deflagra a passagem automática do bem privado para o domínio público, ainda que o termo 'uso comum' refira-se, aqui, apenas aos moradores e interessados diretos da regido habitada, e não toda a coletividade".
Aliás, resumindo a questão, merece ser transcrito o seguinte trecho da decisão proferida pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo na Apelação n° 239.505.1/7:
"Segundo consta, em face de solicitação de interessados e através de processo administrativo instaurado, em 1951 a MUNICIPALIDADE DE SÃO PAULO autorizou, mediante alvará, a abertura de uma via de acesso a uma vila onde seriam construídas 19 habitações (fls. 268), com entrada pela Rua Borges Lagoa, altura do n° 1.565. Posteriormente a referida passagem e o pátio de manobras criado nos fundos foram oficializados pelo Decreto n° 10.145/72, da AR- VM (fls. 265/266).
A passagem aberta foi, inclusive, objeto de averbação no competente Cartório de Registro de Imóveis (fls. 274) e induvidosamente passou a fazer parte integrante do patrimônio público municipal, na categoria de rua pública, ou bem de uso comum do povo, pouco importando a circunstância da área ter sido designada de 'passagem particular'. Embora de uso restrito, eis que destinada principalmente aos moradores da vila, a via sempre foi aberta ao público em geral. Com toda certeza, inclusive, recebeu melhoramentos públicos, como pavimentação, iluminação, etc.
Se o acesso pertencesse com exclusividade aos moradores dos 19 sobrados desnecessário teria sido o projeto para a abertura e aprovação pela Municipalidade."
Tal entendimento, diga-se de passagem, foi confirmado quando do julgamento da Apelação Cível n° 0018075-45.2011.8.26.0053, acima mencionada.
Quanto à inexistência de informações a respeito da execução de intervenções no local pela Administração (029321315), cabe lembrar que o Código "Arthur Saboya" exigia que as obras fossem executadas pelos proprietários das quadras ou terrenos retalhados (art. 753). Seja como for, existia ao menos iluminação pública no local, conforme ficha da vistoria realizada quando da oficialização do logradouro (025186476, p. 1). Além do mais, a quadra fiscal indica ausência de tributação do leito da via.
Ocorre que, conforme observado pelo DEMAP, o caso em exame apresenta uma peculiaridade, uma vez que, das quatro casas da vila, duas foram transmitidas a terceiros com menção a fração ideal do leito da passagem de acesso.
Tal circunstância indicaria que não teria havido a intenção de oferecer o logradouro ao domínio público, o que afastaria a caracterização do concurso voluntário, nos termos do disposto na Súmula n° 1 da PGM (Informação n° 542/17-PGM.AJC), ainda que apenas parte das residências tenha sido alienada com menção às frações ideais (Informação n° 218/17-PGM-AJC).
No caso em exame, porém, convêm examinar como as transmissões ocorreram.
Conforme exposto pelo DEMAP, Donato Gianone, após obter a aprovação da passagem, alienou o terreno com as quatro casas, no ano de 1949, a Vicente Landolfi, nada constando a respeito da passagem na respectiva transcrição.
Na sequência, o espólio de Vicente Landolfi transmitiu, no ano de 1960, por força de partilha homologada por sentença, metade ideal do terreno com as residências a Olinda Landolfi Beccalini e João Cardenuto Landolfi, ocasião em que foi averbada a passagem.
Até este momento, porém, não ficou caracterizado o oferecimento da via ao Poder Público, uma vez que, conforme entendimento consolidado da PGM a respeito do assunto, o parcelamento do solo não ocorre quando as novas casas permanecem sob o domínio do proprietário original, seus sucessores ou são adquiridas conjuntamente por um terceiro (Informação n° 991/2015-PGM-AJC e Ementa n° 11.675, acolhidas por SNJ.G, conforme, respectivamente, Informação n° 2292/2015-SNJ.G, Informação n° 0420/2016-SNJ.G e Ementa 11.715).
Prosseguindo, João Cardenuto Landolfi e Olinda Landolfi Boccaliniacabaram transferindo as quatro casas a terceiros.
A casa 6 foi alienada conforme escritura de 31/01/1968, transcrita em 01/04/1969, e a casa 8 foi transmitida nos termos da escritura de 28/12/1967, transcrita em 10/06/1968, não constando das respectivas transcrições menção a frações ideais da via.
Já a casa 2 foi alienada conforme escritura de 13/02/1968, transcrita em 13/10/1970, enquanto a casa 4 foi transmitida nos termos da escritura de 10/11/1970, transcrita em 05/03/1971, mencionando ambas as transcrições frações ideais da passagem.
Verifica-se, portanto, que ocorreu a consumação do parcelamento do solo com as duas primeiras alienações a terceiros sem a referência a frações ideais da via, com a consequente incorporação da passagem ao domínio público.
Desse modo, as referências posteriores ao leito da passagem foram indevidamente incluídas, não produzindo efeitos, uma vez que os alienantes já não eram mais titulares do domínio da via, tanto que, conforme ressaltado pelo DEMAP, as matrículas posteriores nada mencionam sobre o assunto.
Assim, superada a questão dominial, resta examinar o segundo ponto abordado pelo DEMAP, que envolve a delimitação da área da passagem, uma vez que o logradouro foi implantado em desacordo com o plano aprovado, circunstância que pode ser observada no levantamento GEGRAN (031931933).
Logo, parece-me que deverá ser considerado o alinhamento efetivamente implantado (Ementas 11.773 ou 12.088), conforme constatado na vistoria realizada quando da oficialização do logradouro (025186476, p. 2).
Por fim, cabe enfatizar que o leito da passagem em questão corresponde ao imóvel n° 23 do anexo único da Lei n° 17.216/2019. Portanto, o logradouro foi desafetado pelo mencionado diploma legal, que também autorizou o Executivo a promover a sua desestatização, constando que o CMDP aprovou a inclusão da área em questão no PMD, na modalidade alienação. Do assunto cuida o SEI 6071.2019/0000390-6.
Portanto, afastada a competência de CGPATRI, nos termos do Decreto n° 59.658/20, parece-me que o presente deverá acompanhar o referido processo.
.
São Paulo, 10/09/2020.
RICARDO GAUCHE DE MATOS
PROCURADOR ASSESSOR - AJC
OAB/SP 89.438
PGM
.
De acordo.
São Paulo,10/09/2020
TICIANA NASCIMENTO DE SOUZA SALGADO
PROCURADORA ASSESSORA CHEFE - AJC
OAB/SP 175.186
PGM
.
[1] Os dispositivos citados disciplinavam o retalhamento de quadras ou de porções de terrenos já servidos por vias públicas para a construção de casas populares.
2. "Art. 2 Para todos os efeitos dêste Código, as seguintes palavras ficam assim definidas:
.................................
14 - Passagem:
Denomina-se "passagem" a via pública de largura mínima de quatro metros, subdividindo quadras, ou porções de terrenos, encravados ou não, para a construção de "casas populares" nos têrmos definidos neste Código.
Art. 734 - Para os efeitos dêste Código, ficam as vias públicas do Município classificadas nas seguintes categorias:
..................................
3a categoria - passagens (só para a construção de "casas populares") largura mínima de quatro metros;
[3] Art. 759 - Para a construção de casas populares, fica dispensada a prova a que se referem as letras "a" e "b" do art.723, e essas passagens não serão recebidas oficialmente pela Prefeitura.
.
.
processo n° 6068.2019/0000587-2
INTERESSADO: LP Administradora de Bens Ltda.
ASSUNTO: Aquisição ou concessão de uso de área municipal.
Cont. da Informação n° 930/2020-PGM.AJC
SGM/CDP
Senhor Coordenador
Considerando que, nos termos das manifestações do DEMAP e da AJC, que acompanho, foi confirmada a natureza pública do leito da Travessa das Trufas, que corresponde ao imóvel n° 23 do anexo único da Lei n° 17.216/2019, encaminho o presente para alcançar o SEI 6071.2019/0000390-6.
.
São Paulo, / /2020.
TIAGO ROSSI
PROCURADOR DO MUNICÍPIO
COORDENADOR GERAL DO CONSULTIVO
OAB/SP 195.910
PGM
Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo