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PARECER PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO - PGM Nº 11.660 de 2 de Dezembro de 2014

EMENTA Nº 11.660
- Conselho Municipal do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (CADES). Expedição de resolução. Imposição de enquadramento jurídico de infração administrativa de natureza ambiental. Resolução nº 154/CADES/2013. Deliberação desconforme, ante a não observância do processo colegial. O CADES detém atribuição eminentemente consultiva. Atribuições fixadas pela Lei municipal nº 14.887/2009. Ao CADES não compete fixar in genere interpretação sobre a capitulação jurídica envolvendo infração ambiental. Questão jurídica revestida de complexidade. Necessária manifestação dos órgãos jurídico-institucionais do Município de São Paulo. Proposta de ciência e revisão da Resolução nº 154/CADES/2013 pelo próprio colegiado, sem prejuízo de sua anulação pela instância administrativa competente;
- Responsabilização administrativa. Enquadramento jurídico da infração ambiental administrativa. Lei municipal nº 10.365/87. Lei federal nº 9.605/98 c/c. Decreto federal nº 6.514/08. Aplicação concomitante do ordenamento municipal e federal. Infrações administrativas autônomas. Incidência, regra geral, do art. 72, inciso I, do Decreto federal nº 6.514/08.

Processo nº 2014-0.255.387-7

INTERESSADO: SECRETARIA MUNICIPAL DO VERDE E DO MEIO AMBIENTE

ASSUNTO: Resolução nº 124/CADES/2008. Revogação pela Resolução nº 154/CADES/2013. Conformidade.

Informação n° 1.526/2014-PGM.AJC

PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO

ASSESSORIA JURÍDICO-CONSULTIVA

Senhora Procuradora Assessora Chefe

O presente expediente sofreu autuação por força de determinação da Secretaria dos Negócios Jurídicos no âmbito de outro processo administrativo (cf. cópia a fls. 110), em razão de parecer desta Assessoria Jurídico-Consultiva da Procuradoria Geral do Município (cf. fls. 102/109).

Na ocasião, foi determinada a instauração de expediente próprio pela Secretaria do Verde e do Meio Ambiente, para fins de verificação da conformidade da Resolução nº 154/CADES/2013, bem como do entendimento jurídico-institucional acerca do tema, iniciando-se pela Assessoria Jurídica da mesma Pasta (SVMA-AJ).

Diante disto, a SMVA-AJ pronunciou-se a fls. 111/120, tendo-se posicionado da seguinte maneira sobre as questões debatidas:

1º) A Resolução nº 124/CADES/2008 foi expedida nos limites da competência do órgão colegiado municipal;

2º) Esta resolução firmou orientação adequada em relação ao enquadramento das infrações ambientais, subsumidas ao art. 72, inciso I, do Decreto federal nº 6.514/2008;


3º) A revogação da Resolução nº 124/CADES/2008 pela Resolução nº 154/2013 deu-se de modo equivocado, na medida em que inexistiu qualquer estudo prévio sobre o tema, tampouco motivação para a retirada do ato normativo de 2008. Ademais, "as circunstâncias dessa revogação são obscuras", nos termos da leitura da ata da deliberação que deu ensejo à resolução de 2013. Desta forma, SVMA-AJ reputa inválida a Resolução nº 154/2013;


4º) Por conta da conclusão do item anterior, SVMA-AJ propõe a convocação de uma reunião do CADES, "para discussão do assunto e deliberação do colegiado, com vistas à anulação da Resolução CADES nº 154, de 26 de junho de 2013, e o restabelecimento da Resolução CADES nº 124, de 18 de setembro de 2008, em todos os seus efeitos".

É o que se entende como necessário à guisa de relatório.

Duas são as questões centrais da análise que se principia. A validade jurídica da Resolução nº 154, tomada pelo Conselho Municipal do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (CADES) em 26 de junho de 2013, bem como a capitulação jurídica das infrações administrativas contra exemplares arbóreos.

Os aspectos jurídicos envolvidos perpassam por uma série de pontos que merecem análise apartada.

I. Do processo colegial que antecedeu a expedição da Resolução nº 154/CADES/2013

O CADES, na condição de órgão colegiado, detém um mecanismo peculiar para a formação da vontade coletiva. Trata-se do processo colegial, consistente no procedimento pelo qual os membros do órgão se reúnem, deliberam e votam, constituindo, a partir disto, a síntese do entendimento plural: o ato colegiado.

Verifica-se, portanto, um estreito liame entre a validade da declaração colegiada e a observância das respectivas condições procedimentais. Como todo ato administrativo, o ato coletivo pressupõe uma série de requisitos que lhe imprimem conformação jurídica.

Em relação ao caso concreto, a SVMA-AJ pondera a ocorrência de vícios na deliberação tomada pelo CADES. Não houve qualquer estudo prévio sobre a matéria em pauta, seja pela instituição de grupo de trabalho ou de qualquer outro meio. Aliás, sequer é observada justificativa ou motivação para a revogação da Resolução nº 124/2008. Ademais, "as circunstâncias dessa revogação são obscuras", nos termos da leitura da ata da deliberação que deu ensejo à resolução de 2013.

Entende-se, tal qual exposto pela SVMA-AJ, que a deliberação coletiva tomada pelo CADES encontra-se revestida de desconformidade, o que acabou por contaminar a própria higidez jurídica do ato final. O parâmetro de análise consiste na ata da 150ª reunião plenária do CADES, acostada a fls. 5/33.

Ab initio, verifique-se que houve a expressa inserção, na pauta da reunião, do assunto a ser discutido: "revisão da tipificação de conduta para supressão de vegetação" (cf. fls. 4).

No entanto, a leitura da ata colegiada permite extrair uma real ambiguidade em relação ao resultado da votação coletiva, notadamente quanto ao conteúdo do que foi votado. É o que se verifica no trecho da ata acostado a fls. 13, transcrito a seguir:

"Então nós vamos fazer o seguinte: vamos colocar em votação a mudança da resolução, e conseqüentemente, será marcado uma Câmara Técnica, para que os senhores tragam contribuições, e discutam, debatam sobre a resolução. Em votação: alguém... O senhor quer falar alguma coisa? Todos que estiverem de acordo da maneira que estão. Votado. A Câmara Técnica será marcada e os senhores serão informados" (negrito nosso).

Na medida em que inexiste referência expressa à revogação da Resolução nº 124/CADES/2008, incabível se extrair qual foi a matéria objeto de efetiva deliberação.

A ambiguidade é reforçada pelos trechos que antecedem a votação propriamente dita, como se extrai das passagens da ata acostadas a fls. 6/13. Embora tenha sido feita menção à votação para fins de revogação da resolução (cf. fls. 11 - manifestação do conselheiro Luís Eduardo Damasceno), as discussões que se sucederam fizeram alusão à formação de câmara técnica para a discussão do assunto, aspecto referido no trecho em negrito acima colacionado.

Ademais, como observado pela SVMA-AJ, após a formal votação, é feita intervenção por "orador não identificado", propugnando a legitimidade da resolução de 2008, bem como a inocorrência de prévia discussão sobre o tema (fls. 13). No entanto, sucede-se a tal ponderação a continuidade da pauta de deliberação.

Diante do contexto vertido em referida ata, não se tem como certo e inequívoco o real objeto da deliberação e da votação da 150ª reunião plenária do CADES.

Mesmo que assim não fosse - ou seja, admitindo-se que a deliberação tenha se dado efetivamente no sentido da revogação da resolução de 2008 - nota-se uma incompatibilidade entre o tema indicado na ordem do dia (fls. 4) e o resultado da discussão coletiva. Vale lembrar a circunstância de que a Resolução nº 124/2008 contemplava, além do art. 1º (objeto da pauta do CADES, cf. fls. 4), outros cinco dispositivos, que versavam sobre diversos aspectos do ordenamento ambiental. No entanto, a integralidade deste ato normativo foi revogada, sem que as questões contempladas nos demais artigos tenham sido deliberadas, discutidas e votadas.

Tal aspecto, aliás, foi abordado pelo conselheiro André, conforme se verifica pela seguinte passagem da ata da reunião (cf. fls. 12):

"André, da Secretaria do Estado do Meio Ambiente. Só para os Conselheiros terem uma visão talvez, mais clara, da proposta, desculpa, um primeiro questionamento, um desconhecimento, desculpa, não sei se para os outros ficou claro. Para mim não ficou. A resolução consiste apenas desse artigo? Tem algum outro ponto na resolução que, ao suprimir a validade da resolução como um todo ficaria sem regulamentação? Então, estou vendo aqui o texto... Desculpe. Não cabe aqui, fazer uma análise jurídica do meu ponto de vista, aqui da resolução. Mas são 7 artigos, eu não sei se de bate pronto, poderia falar: 'bom, revogando isso, tem alguma outra regra estabelecida nessa resolução que tem que se manter.' Se fosse o caso, poderia suprimir parte da resolução. Mas acho que caberia uma análise um pouco mais...".

A despeito da ponderação formulada no plenário do CADES, todos os dispositivos da resolução de 2008 foram considerados revogados, sem que qualquer discussão sobre o seu conteúdo e a sua conformidade tenha sido feita no âmbito da respectiva sessão colegiada.

Ou seja, patente a ocorrência de uma deliberação cujo tema não constou expressamente na ordem do dia, o que representa violação ao devido processo legal no âmbito da atuação colegiada.

Desta forma, compreende-se que a Resolução nº 154/CADES/2013 padece de ilegalidade.

Diante de tal situação, coloca-se a questão: qual o procedimento a ser adotado?

A SVMA-AJ recomenda a convocação de uma reunião do CADES, "para discussão do assunto e deliberação do colegiado, com vistas à anulação da Resolução CADES nº 154, de 26 de junho de 2013, e o restabelecimento da Resolução CADES nº 124, de 18 de setembro de 2008, em todos os seus efeitos".

No entanto, compreende-se que tal solução não se ajusta integralmente à juridicidade.

Em primeiro lugar, conforme será visto no item a seguir, o CADES não detém atribuição para firmar de modo terminativo a interpretação sobre o enquadramento de infração ambiental no Município de São Paulo.

Em segundo lugar, a teoria da colegialidade orgânico-administrativa baseia-se na noção de autonomia do órgão colegiado, imune, como regra geral, às intervenções exógenas de poderes decorrentes da hierarquia. Desta forma, inadmissível que um órgão da Administração imponha ao conselho a anulação do próprio ato colegial. Quando muito, cabível cientificar o colegiado da desconformidade jurídica vislumbrada, situação que pode gerar a revisão da posição pelo próprio conselho.

Isto não afasta, porém, a possibilidade de que o ato colegial viciado seja objeto de anulação pela Chefia do Executivo, diante da prerrogativa de autotutela detido pelo Prefeito. A autonomia do órgão colegiado não imuniza o controle de legalidade de seus atos pelas instâncias administrativas próprias.

II. A competência jurídico-institucional do Conselho Municipal do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (CADES)

Não obstante as conclusões expostas no item anterior, convém abordar um tema dos mais relevantes, referente à competência institucional do CADES.

A questão referente à atribuição do CADES foi vislumbrada en passant por esta Assessoria Jurídico-Consultiva no âmbito do parecer cuja cópia encontra-se acostada a fls. 87/89. Ponderou-se, na ocasião, em caráter não conclusivo, sobre a aparente incompetência do colegiado ambiental para o firmamento de interpretação jurídica acerca da tipificação in genere de infrações administrativas ambientais e suas respectivas penalidades.

Como já referido, a SVMA-AJ compreende inexistir desconformidade subjetiva do CADES em relação à expedição de resoluções com referido conteúdo. Salienta que tal conselho traçou orientação quanto à necessidade de se conferir especial proteção aos exemplares arbóreos e quanto ao "enquadramento da infração contra tais exemplares" (fls. 113). Tal "diretriz", tal "orientação", não foge à atribuição deste órgão coletivo no sentido de "propor diretrizes, padrões e procedimentos e definir os componentes que merecem especial proteção ambiental" (fls. 113).

Ademais, SVMA-AJ expõe que "todos os órgãos colegiados que integram o Sistema Nacional do Meio Ambiente, tanto na esfera federal como estadual, atuam como órgãos consultivos e deliberativos, estabelecem diretrizes e detêm, inclusive, competência normativa específica" (fls. 113).

A despeito das ponderações bem expostas pela SVMA-AJ, entende-se, data vénia, de modo contrário: o CADES extrapolou de sua atribuição ao expedir atos normativos fixando o enquadramento jurídico de infrações ambientais1. Vejamos as razões que fundamentam tal conclusão.

A competência do CADES - aliás, a de qualquer órgão público2 - deve ser compreendida à luz do regime normativo correspondente. Incabível, portanto, uma apriorística estipulação da atribuição de determinado organismo, sem uma verificação da norma que o rege.

Devem-se buscar as competências do CADES nas Leis municipais nº 11.426, de 18 de outubro de 1993, e 14.887, de 15 de janeiro de 2009. A primeira norma criou, junto à Secretaria do Verde e do Meio Ambiente, o Conselho Municipal do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (art. 22). Trata-se da lei em vigor quando da Resolução nº 124/CADES/2008. Nos termos de seu art. 23, as competências do colegiado ambiental foram assim disciplinadas3:

Art. 23. Ao Conselho Municipal do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável - CADES compete:

I - colaborar na formulação da política municipal de proteção ao Meio Ambiente, à luz do conceito de desenvolvimento sustentável, através de recomendações e proposições de planos, programas e projetos;

II - colaborar na elaboração de planos, programas e projetos intersetoriais, regionais, locais e específicos, de desenvolvimento do Município;

III - (vetado);

IV - apreciar e pronunciar-se sobre Estudos e Relatórios de Impacto Ambiental - EIA/RIMA(vetado) no âmbito do Município de São Paulo;

V - propor diretrizes para a conservação e recuperação dos recursos ambientais do Município;

VI - propor normas, padrões e procedimentos visando à proteção ambiental e ao desenvolvimento do Município;

VII - opinar sobre os projetos de lei e decretos referentes à proteção ambiental no Município de São Paulo, notadamente quanto àqueles relativos ao zoneamento e planejamento ambientais;

VIII - propor projetos de lei e decretos referentes à proteção ambiental no Município de São Paulo;

IX - propor a definição e implantação de espaços territoriais e seus componentes, a serem especialmente protegidos;

X - propor e colaborar na execução de atividades com vistas à educação ambiental;

XI - propor a realização e promover campanhas de conscientização quanto aos problemas ambientais;

XII - manter intercâmbio com entidades, oficiais e privadas, de pesquisa e demais atividades voltadas à defesa do meio ambiente;

XIII - elaborar seu Regimento Interno.

A Lei nº 11.426/93 foi posteriormente objeto de revogação pela Lei nº 14.887/2009, atual regime do colegiado. De acordo com os arts. 31 e 324:

Art. 31. O Conselho Municipal do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável tem as seguintes atribuições:

I - colaborar na formulação da política municipal de proteção ao meio ambiente, à luz do conceito de desenvolvimento sustentável, mediante recomendações e proposições de planos, programas e projetos;

II - colaborar na elaboração de planos, programas e projetos intersetoriais, regionais, locais e específicos de desenvolvimento do Município;

III - opinar sobre planos, programas e projetos, obras, instalações e operações que possam causar significativo impacto ambiental, podendo convocar, para tanto, audiências públicas, bem como requisitar aos órgãos públicos competentes e às entidades privadas as informações e estudos complementares que se façam necessários;

IV - apreciar e aprovar os Estudos de Impacto Ambiental e Relatórios de Impacto Ambiental (EIA/RIMA) e Estudos de Impacto de Vizinhança e Relatório de Impacto de Vizinhança (EIV/RIVI), no âmbito do Município de São Paulo;

V - propor diretrizes para a conservação e recuperação dos recursos ambientais do Município;

VI - propor normas, padrões e procedimentos visando à proteção ambiental e ao desenvolvimento do Município;

VII - opinar sobre projetos de lei e minutas de decreto referentes à proteção ambiental no Município de São Paulo, notadamente quanto àqueles relativos ao zoneamento e planejamento ambientais;

VIII - propor projetos de lei e minutas de decreto referentes à proteção ambiental no Município de São Paulo;

IX - propor a definição e implantação de espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos;

X - propor e colaborar na execução de atividades com vistas à educação ambiental;

XI - propor a realização e promover campanhas de conscientização quanto aos problemas ambientais;

XII - manter intercâmbio com entidades, oficiais e privadas, de pesquisa e demais atividades voltadas à defesa do Meio Ambiente.

Art. 32. Caberá também ao Conselho Municipal do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável estabelecer as diretrizes, prioridades e programas de alocação de recursos do Fundo Especial do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, em conformidade com a Política Municipal de Meio Ambiente, obedecidas as diretrizes federais e estaduais.

Este panorama legal demonstra aspecto nodal em relação ao regime do CADES. Nos termos da lei anterior, as suas competências eram exclusivamente consultivas, atinentes à emissão de propostas e de opiniões sobre as questões ambientais. O atual regime, por sua vez, preservou a atribuição consultiva, acrescendo, contudo, competências deliberativas, a exemplo da aprovação de EIA/RIMA e EIV/RIVI5, da convocação de audiências públicas, bem como do estabelecimento de diretrizes, prioridades e programas de alocação de recursos do Fundo Especial do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável.

Nota-se, assim, a assunção de atribuições eminentemente consultivas, somadas a competências deliberativas específicas, que, a bem da verdade, são parcas. Pode-se afirmar, por conta disto, que o CADES não representa, regra geral, instância decisória no Município de São Paulo. Ou seja, a ele não cabe a emissão de declaração com valor deôntico, de necessária observância pelos demais órgãos municipais. A sua função, como visto, é notadamente propositiva e auxiliar, assentada na emissão de propostas, opiniões e recomendações.

Afasta-se, aliás, a própria competência normativa do CADES, em razão da ausência legal de tal atribuição. Não se concorda com as ponderações da SVMA-AJ, que equipara o regime de todos os conselhos ambientais, federal, estaduais e municipais. Tal equiparação não pode ser pressuposta de modo apriorístico, sem uma análise das atribuições legais de cada um dos órgãos colegiados.

Por exemplo, o Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA), colegiado ambiental no âmbito federal, detém as competências fixadas na Lei nº 6.938/81 (cf. redação dada pela Lei nº 8.028/90), entre as quais (art. 8º):

  • Estabelecer normas e critérios para o licenciamento de atividades efetiva ou potencialmente poluidoras (inciso I);
  • Estabelecer normas, critérios e padrões relativos ao controle e à manutenção da qualidade do meio ambiente com vistas ao uso racional dos recursos ambientais (inciso VII);
  • Determinar a perda ou restrição de benefícios fiscais concedidos pelo Poder Público (inciso V).

Verifique-se que o CONAMA apresenta atribuições eminentemente deliberativas, inclusive de cunho normativo, na medida em que possui a competência para estabelecer atos normativos relativos ao controle da qualidade ambiental6.

Verifica-se, logo, que o CONAMA e o CADES assumem atribuições distintas. Trata-se de colegiados que apresentam regimes diversos, vez que fundamentados em normas legais próprias.

Reitere-se, portanto, o nosso entendimento: o CADES não detém, como regra geral, atribuição decisória. Sua competência é eminentemente consultiva, nos termos da Lei nº 14.887/2009.

Esta conclusão encontra reforço nas situações envolvendo interpretação de cunho jurídico, como aquelas referentes ao enquadramento normativo das infrações administrativas relacionadas à poda e ao corte de exemplares arbóreos. Inexiste preceito conferindo tal atribuição ao CADES.

Ou seja, os motivos que ensejaram a revogação da resolução de 2008 são de cunho eminentemente jurídico. Assim, propugnou-se que o enquadramento da infração ambiental com base no art. 72, I, do Decreto federal nº 6.514/2008 estaria equivocado, eivado de "inconstitucionalidade" (cf. consta na ata da 150ª reunião do CADES - fls. 8), apresentando inconsistência jurídica.

Ocorre que tal pronunciamento foi expedido sem qualquer intervenção de instância jurídico-institucional do Município de São Paulo. Embora não se olvide que a Secretaria dos Negócios Jurídicos assume representação no CADES, a Resolução nº 154/CADES/2013 foi aprovada, s.m.j., sem a participação de SNJ (cf. se extrai do próprio ato normativo, acostado a fls. 02/03, que conta com a relação dos conselheiros, bem assim da ata da 150ª reunião plenária ordinária). Soma-se a isso a inexistência de parecer jurídico institucional - seja da Assessoria Jurídica da SVMA7, seja da Procuradoria Geral do Município ou da Secretaria dos Negócios Jurídicos - a propósito do complexo tema objeto de deliberação pelo colegiado ambiental.

Ou seja, a questão jurídica envolvida não foi objeto de qualquer análise pelas instâncias jurídicas do Município de São Paulo, que, aliás, vinham defendendo a aplicabilidade da interpretação vertida na Resolução nº 124/CADES/2008, quer em juízo (por meio dos departamentos da Procuradoria Geral do Município), quer nos recursos administrativos apresentados no âmbito das penalidades aplicadas (por meio das assessorias jurídicas envolvidas).

Este aspecto foi vislumbrado na 150ª reunião plenária do CADES. Conforme consta a fls. 12, o conselheiro Lucas (representante da SVMA) expõe que "o entendimento da procuradoria é de que, ele defende essa tese da resolução 124 nas ações que estão sendo demandadas." (sic)

Tal circunstância é eloquente, merecendo ser destacada. Para além da inexistência de qualquer intervenção das instâncias jurídicas municipais, a prática administrativa de tais órgãos (Departamentos da PGM e Assessorias Jurídicas) era no sentido da reiterada defesa da interpretação contemplada na Resolução nº 124/CADES/2008.

Consigne-se, nos termos da premissa hermenêutica segundo a qual interpretações são normas, que a mudança interpretativa exige uma carga motivacional qualificada, sob pena de perda de legitimidade8. Trata-se da aplicação no discurso jurídico do princípio da inércia perelmaniano.

Ora, o ônus argumentativo envolve a própria qualificação dos sujeitos envolvidos no discurso, evidenciando que a alteração do enquadramento jurídico das infrações ambientais exigiria, como condição necessária, a intervenção das instâncias jurídicas do Município de São Paulo.

Insista-se nisto. As discussões realizadas no CADES foram eminentemente de direito, sem que qualquer instância jurídica do Município tenha se pronunciado. Desta forma, pode-se questionar se foram legítimas as ponderações feitas, por exemplo, sobre a inconstitucionalidade da aplicação do Decreto nº 6.514/08. Diversos pontos jurídicos não foram considerados, como, verbi gratia, o quanto disposto no Decreto municipal nº 42.833/2003, que, ao regulamentar a fiscalização ambiental no Município de São Paulo, faz expressa referência ao então vigente Decreto federal nº 3.179/999. Também merece consideração, com base em tal raciocínio, a Lei municipal nº 14.902/09, que dispõe sobre as infrações administrativas de provocação de danos em vegetação de porte arbóreo pela colocação de adereços, enfeites, placas e similares. Nos termos de seu art. 1º, parágrafo único, serão aplicadas as penas estabelecidas na Lei Federal nº 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, e no Decreto Federal nº 6.514, de 22 de julho de 2008.

Ou seja, diante de um tema jurídico dos mais complexos, a decisão que impôs a alteração da interpretação jurídica sobre o enquadramento de infração ambiental foi tomada sem qualquer manifestação da instância jurídico-institucional municipal, que, convém reiterar, já vinha defendendo, judicial e extrajudicialmente, a interpretação "revogada". A incoerência é, portanto, de dupla ordem: endógena e exógena.

Diante de tal contexto, inequívoca a conclusão: a Resolução nº 154/CADES/2013 padece de vício de competência10, motivo pelo qual se recomendam as mesmas providências referidas no item anterior, in fine: conferir ciência das desconformidades ao CADES, facultando-lhe o reconhecimento do desvio, sem prejuízo da possibilidade de anulação da Resolução nº 154/CADES/2013 pela instância administrativa competente.

III. Tipificação das infrações administrativo-ambientais envolvendo espécimes arbóreos no Município de São Paulo

Fez-se alusão, nas considerações acima, à alta complexidade envolvida no tema ora discutido: a capitulação das infrações administrativo-ambientais referentes à intervenção indevida - como o corte e a poda - nos exemplares arbóreos situados no Município de São Paulo.

Em outras palavras, a dúvida que se impõe é a seguinte: a corte ou a poda de um exemplar arbóreo subsume-se a qual norma? Qual a infração cometida, bem como o seu fundamento jurídico? A legislação municipal ou a federal? Caso seja a federal, qual o dispositivo específico incidente?

Esta a questão fundamental que subjaz às resoluções do CADES acima referidas, tanto a de 2008 quanto a de 2013.

Tal complexidade não se extrai apenas da matéria jurídica singularmente considerada, mas, sob um viés pragmático, das discussões travadas no âmbito das várias instâncias jurídicas que se deparam com o tema.

Citem-se duas delas, para evidenciar o imbróglio.

No âmbito estadual, nota-se uma diversidade dos enquadramentos ambientais efetuados. No Rio Grande do Sul, por exemplo, foi expedida pelo Conselho Estadual do Meio Ambiente a Resolução nº 06/1999, propugnando a submissão do então Decreto federal nº 3.179/99. Já no Rio de Janeiro, entendeu-se inviável a aplicação da normatização federal, haja vista a existência de lei estadual disciplinando o assunto.11

Em relação às sanções administrativas aplicadas pelo Município de São Paulo, a jurisprudência do Judiciário paulista vem apresentando certa oscilação em relação ao tema12.

Em primeira instância, foram coletadas decisões propugnando a legitimidade de multa com assento no art. 72, inciso I, do Decreto federal nº 6.514/08. Assim se pronunciou o juízo da 5ª Vara da Fazenda Pública (autos nº 0055353-46.2012.8.26.005313). Na mesma direção o juízo da 4ª Vara da Fazenda Pública (autos nº 0013931-57.2013.8.26.005314) e o da 1ª Vara da Fazenda Pública (autos nº 0016389-86.2009.8.26.005315).

A par disto, notam-se sentenças em sentido diverso, reputando ilegítimo o enquadramento das sanções com base na legislação federal. É o que se verifica da decisão extraída dos autos do mandado de segurança nº 0010537-42.2013.8.26.0053, da 2ª Vara da Fazenda Pública.16

Já em segunda instância, verifica-se que o Tribunal de Justiça paulista não consolidou posição sobre o tema. Há decisão da 2ª Câmara Reservada ao Meio Ambiente que, com assento no regulamento anterior ao Decreto federal nº 6.514/08, enquadra a infração ambiental não no art. 49, I, do Decreto federal nº 3.179/99, mas em seu art. 3417 (Apelação nº 0016389-86.2009.8.26.0053, julgamento em 15 de maio de 2014). Por outro lado, verificam-se julgados que afastam o enquadramento da infração ambiental com base no art. 72 do Decreto federal nº 6.514/08, com a incidência da lei municipal. Foi o que já decidiu o TJ no bojo das Apelações nº 0055353-46.2012.8.26.005318 e nº 0013931-57.2013.8.26.005319.

Importante apontar que as considerações dos desembargadores das Câmaras Reservados ao Meio Ambiente fazem alusão expressa à Resolução nº 154/CADES/2013. Vale transcrever a ponderação do Judiciário (apelação autos nº 0055353-46.2012.8.26.0053)20:

"A Resolução nº 124/CADES/2008, que aprovou o Relatório Final da Comissão Especial de Estudos sobre a poda de vegetação de porte arbóreo no Município de São Paulo, determinou no art. 1º que tais infrações fossem enquadradas no inciso I do artigo 72 do DF nº 6.514/08, sem prejuízo das demais sanções e penalidade previstas nesse decreto. No entanto, em 26-6-2013, a Resolução nº 124 foi revogada pela Resolução nº 154/CADES/2013 'considerando as razões expostas em votação na 150ª Reunião Plenária Ordinária do CADES. (...) Mais não é preciso dizer. O claro equívoco de enquadramento foi reconhecido pela administração, de modo que a autuação e sanção são sobrevivem".

A propósito disto, no mesmo julgado, o juízo reputou que "sequer a conclusão a que chegou o CADES na 150ª Reunião está correta; pois cabe à Prefeitura aplicar a sanção prevista na LM nº 10.365/87 e não, perpetuando a dualidade, aquela prevista no art. 56 do DF nº 6.514/08".

Verifica-se, logo, a monumental controvérsia que o tema vem suscitando.

De um modo geral, compreende-se que são três as teses comumente adotadas.

Pela primeira tese, as infrações ambientais envolvendo espécimes arbóreas encontram a sua correspondência normativa na legislação federal, notadamente na Lei nº 9.605/1998, regulamentado pelo Decreto federal nº 6.514/98. Esta concepção desdobra-se em duas.

Existe a posição que enquadra as referidas desconformidades no art. 72, inciso I, inserido na Subseção IV- "Das Infrações Contra o Ordenamento Urbano". Sua redação é a seguinte:

"Art. 72. Destruir, inutilizar ou deteriorar:

I - bem especialmente protegido por lei, ato administrativo ou decisão judicial;

(...)

Multa de R$ 10.000,00 (dez mil reais) a R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais)."

Esta a posição vertida na Resolução nº 124/CADES/2008.

Outro entendimento subsume o fato infracional nos artigos 44 ou 56 do mesmo regulamento federal, insertos na Subseção II - "Das Infrações Contra a Flora". Tais preceitos dispõem:

"Art. 44. Cortar árvores em área considerada de preservação permanente ou cuja espécie seja especialmente protegida, sem permissão da autoridade competente:

Multa de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a R$ 20.000,00 (vinte mil reais) por hectare ou fração, ou R$ 500,00 (quinhentos reais) por árvore, metro cúbico ou fração.

(...)

Art. 56. Destruir, danificar, lesar ou maltratar, por qualquer modo ou meio, plantas de ornamentação de logradouros públicos ou em propriedade privada alheia:

Multa de R$ 100,00 (cem reais) a R$1.000,00 (mil reais) por unidade ou metro quadrado."

Este o entendimento que, de um modo geral, vem se aplicando na SVMA em razão da revogação da Resolução nº 124/CADES/200821.

Pela segunda tese, tais infrações estão subsumidas às leis municipais correlatas, com destaque para a Lei nº 10.365/1987, que disciplina o corte e a poda de vegetação de porte arbóreo existente no Município de São Paulo. Interessa-nos os artigos 9º, 20 e 21, in verbis:

Art. 9º A supressão da vegetação de porte arbóreo, excluídas as hipóteses dos arts. 5º, 6º e 7º desta lei, em propriedade pública ou privada, fica subordinada à autorização, por escrito, do subprefeito competente, ouvido o engenheiro agrônomo ou biólogo responsável.22

(...)

Art. 20. Além das penalidades previstas no artigo 26 da Lei Federal, nº 4771, de 15 de setembro de 1965, e sem prejuízo da responsabilidade penal e civil, as pessoas físicas ou jurídicas que infringirem as disposições desta lei e de seu regulamento, no tocante ao corte da vegetação, ficam sujeitas às seguintes penalidades:

I - Multa no valor de 3 (três) Unidades de Valor Fiscal do Município - UFM por muda de árvore ou árvore abatida, com DAP (Diâmetro do Caule à Altura do Peito) inferior a 0,10m (dez centímetros);

II - Multa no vaíor de 6 (seis) Unidades de Valor Fiscal do Município - UFM por árvore abatida com DAP (Diâmetro do Caule à Altura do Peito) de 0,10 a 0,30m (dez a trinta centímetros);

III - Multa no valor de 12 (doze) Unidades de Valor Fiscal do Município - UFM por árvore abatida, com DAP (Diâmetro do Caule à Altura do Peito) superior a 0,30m (trinta centímetros).

Art. 21 - Ao infrator, tanto pessoa física como jurídica, das disposições desta lei e de seu regulamento, no tocante à poda de vegetação de porte arbóreo, será aplicada multa de 5 (cinco) Unidades de Valor Fiscal do Município - UFM.

Pela terceira tese, as infrações, e respectivas sanções, da Lei federal nº 9.605/98 e da Lei municipal nº 10.365/87 são cumulativas, vez que cada qual disciplina uma categoria particular de ilícito administrativo. Esta tese é amiúde objeto de defesa em juízo pelo Município, principalmente nas situações em que uma mesma intervenção em exemplar arbóreo é objeto de penalidade pela Subprefeitura (com base na lei municipal) e pela SVMA (com assento no ordenamento federal).

IV. Precedentes desta Assessoria Jurídico-Consultiva da Procuradoria Geral do Município

Vale fazer referência a alguns precedentes desta PGM-AJC sobre questão parelha, envolvendo aplicação de sanção ambiental (lato sensu) e o respectivo enquadramento.

Discutiu-se, no âmbito do processo que deu ensejo à elaboração do parecer desta PGM-AJC (Informação nº 2.514/2010-PGM.AJC), a capitulação legal de infração ambiental em sentido largo (despejo de detrito líquido em via pública). Na ocasião, foi apontada pelo Departamento Judicial a ocorrência de erro de enquadramento, diante da contraposição entre a legislação municipal (Lei nº 13.478/2002) e a federal (Lei nº 9.605/98 c/c. o então vigente Decreto nº 3.179/99). O entendimento desta PGM-AJC foi no sentido da prevalência da disciplina federal.

Os argumentos tecidos foram os seguintes:

"(...) enquanto órgão integrante do Sistema Nacional do Meio Ambiente - SISNAMA, a Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambiente é responsável pelo controle da qualidade ambiental no Município de São Paulo, nos termos do parágrafo 1º do artigo 70 da Lei Federal nº 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, possuindo seus fiscais competência legal para proceder à fiscalização ambiental, conforme disposto no Decreto nº 42.833, de 06 de fevereiro de 2003, que regulamenta o procedimento de fiscalização ambiental no Município de São Paulo.

Outrossim, o próprio artigo 8º, desse mesmo Decreto nº 42.833/2003, refere especificamente que 'considera-se infração ambiental toda ação ou omissão que viole as regras jurídicas de uso, gozo, promoção, proteção e recuperação do meio ambiente, contidas nas leis, regulamentos e normas federais, do Estado e do Município, bem como as exigências técnicas delas decorrentes, constantes das licenças ambientais' aplicando-se, em consequência, 'as sanções a que se refere o artigo 9º deste decreto de acordo com o disposto no Decreto Federal nº 3.179, de 21 de setembro de 1999, que regulamentou a Lei Federal nº 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, observando-se, quanto à penalidade de multa, o valor mínimo de R$ 50,00 (cinqüenta reais) e o máximo de R$ 50.000.000,00 (cinqüenta milhões de reais)'".

Por outro lado, ao analisar a aplicação concomitante de sanções referentes à infringência do meio ambiente cultural, a PGM-AJC expediu o parecer ementado sob o n° 11.518 (Informação nº 1.374/2010-PGM.AJC), pelo qual restou concluído que a legislação municipal (Lei nº 10.032/85 c/c. o Decreto nº 47.493/06) prevalece diante do ordenamento federal (Lei nº 9.605/98 c/c. o então Decreto nº 3.179/99). De modo sintético, reproduza-se a seguinte passagem:

"Considerando que há legislação municipal específica para proteger o patrimônio cultural, complementando a legislação federal, inclusive com a fixação de multas mais elevadas, por considerar os danos efetivos ao bem protegido, defendemos que a legislação municipal prevalece no território do Município de São Paulo."

Para além de tal conclusão, destaque seja dado a outro argumento lançado no parecer, admitindo a aplicação da legislação federal. Transcreva-se tal passagem:

"Destaque-se que o Decreto Municipal nº 47.493/06 regulamenta apenas as penalidades aplicáveis em razão do descumprimento das normas de preservação de bens imóveis. Assim, nas hipóteses de danos causados aos bens naturais tombados (por exemplo, corte irregular de árvores de área tombada), compete à Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambiente, fiscalizar e autuar, por força da competência estabelecida no artigo 70, § 1º da Lei federal nº 9.605/98."

Desta feita, não se descartou - ao contrário, houve expressa referência - a incidência da legislação federal no caso de agressão dos bens naturais objeto de tutela.

Tal entendimento foi posteriormente ratificado por esta PGM-AJC na Informação nº 099/2013-PGM-AJC.

Ademais, em diversos pareceres, esta PGM-AJC analisou múltiplos aspectos em relação às sanções ambientais aplicadas com base na legislação federal, sem que o tópico do enquadramento tivesse sido objetado. Cite-se o exemplo do parecer ementado sob o nº 1.600 (Informação nº 551/2012-PGM.AJC), bem como dos pareceres contemplados nas Informações nº 453/2011-PGM.AJC, nº 2.184/2012-PGM.AJC, entre tantos outros.

Outrossim, reitere-se que a tese contemplada na Resolução nº 124/CADES/2008 era maciçamente defendida pelos membros da carreira da Procuradoria Geral do Município, seja em juízo, seja na atividade de assessoramento. A SVMA-AJ igualmente reputa como juridicamente mais adequada tal interpretação, conforme o parecer de fls. 111/120 acostado no presente.

V. Nosso entendimento sobre a tipificação das infrações administrativo-ambientais envolvendo espécimes arbóreos

Em primeiro lugar, conveniente reforçar a legitimidade do Município para legislar sobre o regime ambiental de repressão administrativa. Por conta da disciplina constitucional que rege a competência legislativa em matéria de meio ambiente, extrai-se a possibilidade de que o ente local discipline as infrações e as respectivas sanções.

É certo que as atribuições e atribuições constitucionais em matéria ambiental se sobrepõem. A competência legislativa nesta matéria é concorrente entre União, Estados e Distrito Federal (art. 24 da CF), cabendo aos Municípios, com base em seu artigo 30, suplementar a legislação federal e estadual. Observe-se, portanto, que o regime administrativo de repressão ambiental admite a incidência concomitante de normas federais (caráter geral) e municipais (caráter suplementar), sem prejuízo das normas estaduais.

No âmbito doutrinário, esta tese é amplamente acolhida. Édis Milaré assinala, acerca da "competência para a definição de infrações administrativas ambientais", o seguinte:

"(...) respeitados os princípios gerais estabelecidos nesta Lei Federal, podem Estados, Distrito Federal e Municípios definir infrações administrativas e suas respectivas penalidades. (...) Em consequência, os arts. 70 a 76 da Lei 9.605/98 não são as únicas normas sobre infrações administrativas. A elas somam-se infrações definidas na legislação estadual, na distrital e na municipal relativas ao meio ambiente."23

No tocante à tipificação de infrações administrativas pelo Decreto federal nº 6.514/08, ressalte-se que o nosso entendimento não vislumbra qualquer ofensa ao princípio da legalidade (ou da reserva legal, como apontado por alguns). A legalidade é observada, seja pela estipulação em lei formal da definição de infração administrativa - cf. o art. 70 da Lei nº 9.605/9824, verdadeira norma geral -, seja pela correlação que se vem estabelecendo entre os tipos penais da Lei nº 9.605/98 e as infrações administrativas ambientais25.

Igualmente não se constata infringência ao princípio federativo. Além da doutrina acima referida, convém recordar entendimento do Superior Tribunal de Justiça inaugurado com a decisão proferida no REsp n. 48.753/SP (2ª Turma, Rel. Min. Américo Luz, DJ 17/04/95, p. 355), no sentido que autoridade estadual é legítima para aplicar multa com assento em legislação federal.

Convém analisar, agora, se as infrações contempladas na legislação municipal e federal equivalem-se ou não. Trata-se de premissa lógico-jurídica a definição de qual prevalecerá no caso de uma real equivalência.

Os dispositivos envolvidos, tanto os federais quanto os municipais, já foram acima reproduzidos. Embora possa transparecer, ante o seu conteúdo, uma equivalência, deve-se extrair na verdade uma desequiparação entre os preceitos, na medida da veiculação de tutela a interesses díspares.

A norma municipal dispõe sobre a infração consistente na falta de autorização para intervenções em exemplares arbóreos. A tutela está voltada diretamente para o necessário aval da Administração em casos tais. Já a norma federal disciplina a lesão provocada ao exemplar arbóreo. Aqui o bem ambiental é diretamente atingido.

A despeito de tais situações estarem intrinsecamente relacionadas, são elas autônomas, objeto de tutelas apartadas. Basta imaginar o exemplo em que o particular, muito embora detenha autorização para a poda de árvore, acabe por danificá-la. Neste caso, inexistirá a infração da lei municipal, embora esteja configurada a desconformidade da norma federal.

Outro exemplo abrange a situação inversa, em que o particular não detém autorização para a poda, que, após realizada, acaba por não afetar a condição biótica da espécime arbórea. Na medida em que inexiste lesão ambiental, incabível a medida repressiva com base no regime federal, embora possível a aplicação de sanção pela falta de autorização, tal qual previsto na norma municipal.

Sob o prisma da teoria geral das infrações administrativas, não há despropósito em se admitir que uma única circunstância fática afete bens jurídicos diversos, configurando, diante disto, ilícitos distintos. Assim, embora uno o fato, juridicamente, pode haver diversos ilícitos. Em outras palavras, um mesmo contexto fático pode atrair uma multiplicidade de normas, sendo cabível a pluriqualificação jurídica.

Trata-se de aspecto admitido inclusive pela jurisprudência, nos termos da posição do Superior Tribunal de Justiça, que assim já decidiu (REsp 4.608, 2ª Turma, rel. Min. Vicente Cernicchiaro, DJ 29/10/1990):

"O fato, como acontecimento da experiência jurídica, enseja eventualmente, repercussão plural no Direito. Transitar com veículo, produzindo fumaça em níveis proibidos, interessa tanto ao Direito Ecológico como ao Direito da Circulação. Os respectivos objetos são diferentes. O primeiro busca conservar as condições razoáveis mínimas do ambiente. O segundo policia as condições de uso e funcionamento de veículos."

Desta forma, cabível que um mesmo fato sofra os influxos do ordenamento municipal (Lei municipal nº 10.365/87) e do federal (Lei federal nº 9.605/98 c/c. Decreto nº 9.514/08).

Vale lembrar que esta posição vem sendo defendida em juízo pela Procuradoria Geral do Município, nas situações de aplicação concomitante de sanções pela Subprefeitura e pela Secretaria do Verde e do Meio Ambiente.

Trata-se de posição já acolhida pelo Judiciário, nos termos da decisão expedida pelo juízo da 5ª Vara da Fazenda Pública no âmbito dos autos nº 0055353-46.2012.8.26.0053: "as sanções previstas naquela legislação municipal [Lei nº 10.365/87] são cumulativas com aqueloutras pela Lei 9.605/98". Convém salientar, aliás, o expresso afastamento de bis in idem, "na medida em que a sanção municipal decorre do desrespeito aos procedimentos de postura do município, notadamente no que se refere à necessidade de solicitação de autorização específica do procedimento necessário para a sua obtenção, de quem pode realizar a poda ou a supressão do exemplar, dentre outros, que são próprios de cada município. Já as sanções previstas na Lei Federal 9.605/98 têm por objetivo punir administrativamente o infrator pelo dano ambiental propriamente dito, no caso, pela poda drástica e pelos maus tratos impingidos aos exemplares, os quais, obviamente, causaram lesão ao meio ambiente".

Tal aspecto já foi objeto de consideração por esta Assessoria Jurídico-Consultiva, conforme se extrai do parecer ementado sob o nº 11.518: "se uma das autuações tivesse como amparo legal o Código de Obras e Edificações — promover a demolição sem o necessário alvará — e a outra a legislação de preservação do patrimônio histórico, - demolir bem tombado - as duas multas subsistiriam por restar caracterizada duas condutas infracionais distintas, com punições próprias".

Sob outra perspectiva, vale ressaltar que já se encontra expressamente incorporado no ordenamento municipal a incidência do regime federal. É o que dispõe o Decreto municipal nº 54.421/201326:

"Art. 9º As sanções a que se refere o artigo 8º deste decreto serão aplicadas de acordo com o disposto no Decreto Federal nº 6.514, de 22 de julho de 2008, que regulamenta a Lei Federal nº 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, observando-se, quanto à penalidade de multa, o valor mínimo de R$ 50,00 (cinqüenta reais) e o máximo de R$ 50.000.000,00 (cinqüenta milhões de reais)."

A própria Lei municipal nº 10.365/87 não exclui a incidência da legislação federal, nos termos de seu art. 20, "caput".

Desta forma, admite-se como legítima a aplicação concomitante da legislação municipal e federal.

Cabe, agora, verificar, no âmbito da incidência do ordenamento federal, a capitulação jurídica apropriada.

As interpretações oscilam entre a aplicação da Subseção IV ("Das Infrações Contra o Ordenamento Urbano") ou da Subseção II ("Das Infrações Contra a Flora").

Neste particular, compreende-se que merece aplicação o art. 72, inciso I, do regulamento, referente às infrações contra o ordenamento urbano, sem prejuízo das hipóteses em que aplicável, por exemplo, o seu art. 49.

Isso porque os exemplares arbóreos localizados na área urbana que sejam objeto de tutela estão relacionados com a infração inserida na subseção IV do regulamento, atinente ao meio ambiente urbano.27 Um dos temas relevantes do direito urbanístico, embora comumente olvidado pelos estudiosos, é aquele atinente à arborização nas cidades, que envolve a flora protegida nas áreas urbanas. Trata-se de tutela diversa daquela incidente sobre a flora que integra, por exemplo, uma área de preservação permanente em área rural.

 A própria doutrina tece tal relação, Vladimir Passos de Freitas e Gilberto Passos de Freitas, ao comentarem os tipos penais da Lei nº 9.605/98, assinalam que o art. 6228 apresenta como "objeto material" diversos bens alvo de proteção, a exemplo das "árvores declaradas de preservação permanente"29.

Entende-se, assim, que os artigos 44 e 56 do Decreto nº 6.514/98 não se aplicam como hipótese geral.

O art. 44 do regulamento - cf. trecho acima reproduzido - contempla parcialmente a situação tratada na Lei municipal nº 10.365/87, qual seja, o corte30 de árvore "sem autorização da autoridade competente".

Já o art. 56 incide apenas nas situações envolvendo "plantas de ornamentação", excluindo-se de sua abrangência os exemplares arbóreos. É o que destaca a doutrina em relação ao tipo penal correlato, estampado no art. 49 da Lei nº 9.605/9831. Com efeito, "as árvores não estão incluídas na proteção contida neste dispositivo"32.

Assim, compreende-se que a capitulação jurídica das infrações administrativa contra os exemplares arbóreos subsume-se, regra geral, ao quanto disposto no art. 72, I, do Decreto federal nº 6.514/2008.

É preciso consignar que a incidência da Lei municipal nº 14.902/2009 merece prevalecer. Trata-se de norma específica que disciplina os danos em vegetação de porte arbóreo pela colocação de adereços, enfeites, placas e similares. Diante da especificidade e do caráter suplementar da competência legislativa local, esta lei se sobressai diante do regramento federal.

Exposta a nossa conclusão, convém tecer uma observação.

Não se afasta que o entendimento adotado no presente item seja objeto de contraposição, não se encontrando imunes a controvérsias, sobretudo perante o Judiciário. Vale lembrar as decisões judiciais acima reproduzidas em todos os sentidos, inclusive em desfavor da tese ora adotada. A bem da verdade, qualquer interpretação que se adote resultará em contestações jurídicas, seja em razão das interpretações municiais pretéritas, seja por força da falta de uniformidade da jurisprudência paulista. Daí a necessidade, previamente a uma manifestação conclusiva, de uma análise jurídica exaustiva e ponderada.

VI. Considerações terminativas

Previamente ao fecho do presente parecer, convém destacar que as conclusões ora expostas não fulminam a relevância que o CAPES detém no âmbito da organização administrativa municipal na área ambiental. Suas atribuições legais são das mais proeminentes, pois inserem no processo de decisão administrativa um componente resultante da dialética promovida no palco do colegiado, em que são contrapostas e aglutinadas diversas compreensões sobre o mesmo tema, inclusive por representantes da sociedade civil. Muito embora o ato colegial assuma função eminentemente consultiva ou propositiva, o ônus argumentativo que ele cria para o órgão com competência decisória evidencia o seu impacto no bojo da política pública ambiental no Município de São Paulo.

No entanto, é relevante destacar que as suas atribuições são conduzidas pela lei, quadro dentro do qual devem estar adstritas as declarações emitidas pelo órgão coletivo, que, repita-se, não pode fixar interpretação jurídica sobre a tipificação normativa de infrações ambientais.

O prejuízo que tal desvio ocasiona é de magnitude considerável, porquanto as decisões do CADES reverberam, gerando expectativas e efeitos, a ponto de serem evocadas pelo Judiciário (cf. ponderação realizada no item III, acerca da expressão alusão, pelas Câmaras Reservadas ao Meio Ambiente do Tribunal de São Paulo, à revogação da Resolução nº 124/CADES/2008 pela Resolução nº 154/CADES/2013).

Trata-se de um elemento de instabilidade, ofensiva à segurança jurídica, merecendo, portanto, o devido reparo.

VII. Conclusão

Diante de todo o exposto, dessume-se:

1º) A Resolução nº 154/CADES/2013 foi expedida de modo desconforme com o processo colegial;

2º) A competência jurídico-institucional do Conselho Municipal do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (CADES) é eminentemente consultiva, nos termos da Lei municipal nº 14.887/2009. Desta feita, não cabe ao colegiado expedir resolução veiculando em caráter cogente a interpretação jurídica sobre o ordenamento ambiental, a qual pressupõe, sobretudo nas questões revestidas de complexidade, manifestação das instâncias jurídico-institucionais do Município de São Paulo;

3º) Diante disso, sugere-se que o CADES seja cientificado de tais desconformidades, facultando o reconhecimento do desvio pelo próprio colegiado, sem prejuízo da possibilidade de anulação da Resolução nº 154/CADES/2013 pela instância administrativa competente;

4º) Em relação à tipificação das infrações administrativas envolvendo espécimes arbóreas, e a despeito da controvérsia existente, entende-se que são cumulativas as infrações e as sanções previstas no ordenamento municipal (Lei nº 10.365/87) e no ordenamento federal (Lei nº 9.605/98 c/c. o Decreto nº 6.514/08) contra exemplares arbóreos;

5º) Em relação à incidência do regime federal, a capitulação jurídica das infrações administrativas contra exemplares arbóreos encontra substrato, como regra geral, no art. 72, inciso I, do Decreto federal nº 6.514/08, tal qual consolidado (rectius, recomendado) no âmbito da Resolução nº 124/CADES/2008, com assento em tese objeto de manuseio pelas instâncias jurídicas do Município de São Paulo.

Com essas considerações, sugerimos submeter o presente à Secretaria dos Negócios Jurídicos, para deliberação conclusiva.

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São Paulo, 2 de dezembro de 2014.

RODRIGO BORDALO RODRIGUES

PROCURADOR DO MUNICÍPIO

OAB/SP nº 183.508

PGM/AJC

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De acordo.

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São Paulo, 02/12/2014.

TICIANA NASCIMENTO DE SOUZA SALGADO

PROCURADORA ASSESSORA CHEFE SUBSTITUTA

OAB/SP 175.186

PGM/AJC

1 Isso se deu tanto com a Resolução nº 154/2013 quanto com a própria Resolução nº 124/2008.

2 Compreende-se que a competência representa um dos princípios mais relevantes da organização administrativa brasileira, vez que delimitadora dos poderes e deveres de cada um dos órgãos que compõem a gigantesca estrutura administrativa. Uma de suas características, como cediço, é a plena obediência ao princípio da legalidade.

3 Entende-se que todos os incisos merecem reprodução, para uma compreensão integral do regime.

4 O Decreto nº 52.153/2011, que regulamenta a Lei nº 14.887/2009, faz remissão às competências do art. 31 da lei (cf. art. 6º).

5 A despeito do quanto disposto no art. 33 da mesma lei.

6 Embora não represente tema central do presente parecer, vale consignar que o STJ vem reconhecendo o poder normativo detido pelo CONAMA (cf. REsp 194.617/PR, 2ª Turma, Rel. Ministro Franciulli Netto, DJ 01.07.2002, p. 278): "Possui o CONAMA autorização legal para editar resoluções que visem à proteção das reservas ecológicas, entendidas como as áreas de preservação permanentes existentes às margens dos lagos formados por hidrelétricas. Consistem elas normas de caráter geral, às quais devem estar vinculadas as normas estaduais e municipais."

7 Muito pelo contrário, a SVMA-AJ entende que a interpretação contemplada na Resolução 124/CADES/2008 merece prevalecer.

8 A doutrina aponta no mesmo sentido: "Mesmo para casos novos, a mudança de interpretação consolidada pela prática não é trivial. A existência de práticas administrativas traz um ônus argumentativo suplementar aos intérpretes que decidam contrariá-las em casos novos. E inadmissível que o juiz de direito, ou o administrador público, decida uma matéria sem levar em consideração a experiência acumulada de interpretação e aplicação da legislação envolvida." (SUNDFELD, Carlos Ari; SOUZA, Rodrigo Pagani de; JURKSAITIS, Guilherme Jardim. "Interpretações administrativas aderem à lei?" In: Revista de Direito Administrativo, n. 260, maio/agosto 2012, Belo Horizonte: Fórum, p. 10).

9 Atualmente, vige o Decreto municipal nº 54.421/2013, que, assim como o revogado Decreto nº 42.833/2003, faz expressa referência ao Decreto federal nº 6.514/2008 (art. 9º).
10 Não se olvida que a premissa ora tomada acaba por imputar uma desconformidade originária na própria Resolução nº 124/CADES/2008, que consolidou o enquadramento em relação à tipificação das infrações ambientais. A despeito disto, convém tecer uma consideração, atinente a um relevante aspecto no bojo do processo que resultou na resolução de 2008: a instituição de uma comissão especial de estudos (formada por representantes de órgãos jurídico-institucionais do Município), que analisou os aspectos jurídicos envolvidos em relação à tipificação das infrações ambientais, a par da própria participação, no âmbito da reunião colegiada que deu ensejo ao ato normativo, de representante da Secretaria dos Negócios Jurídicos (cf. fls. 64).

11 Cf. MASCARENHAS, Rodrigo Tostes de Alencar. Infrações administrativas no Estado do Rio de Janeiro. In: Revista da Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro, n. 58, 2004, pp. 241 e ss.

12 A coleta das decisões judiciais baseou-se em pesquisa realizada no sítio eletrônico do Tribunal de Justiça de São Paulo, sem que os Departamentos da Procuradoria Geral do Município tenham sido consultadas a respeito.
13 In verbis: "O aludido artigo [art. 72, I, do Decreto 6.514/08] encontra-se na Subseção IV do referido Decreto, assim denominado 'Das Infrações contra o Ordenamento Urbano e o Patrimônio Cultural'. No caso, os exemplares arbóreos objeto de autuação encontram-se dentro da área urbana de São Paulo, razão pela qual, à evidência, as infrações referidas foram corretamente classificadas, não do que concerto ao patrimônio cultural, mas sim ao ordenamento urbano. Equivocada seria o enquadramento da infração no artigo 44, do Decreto 6.514/08, porquanto a Subseção respectiva trata de infrações contra a Flora. Não se nega que a infração em comento evidentemente foi praticada contra a flora. Contudo, havendo uma Subseção específica para as infrações praticadas dentro do perímetro urbano contra o meio ambiente, ela deve se sobrepor aqueloutra, pelo Princípio da Especialidade"
14 Nos termos da sentença: "Nulidade alguma há na penalidade imposta ao autor, porquanto calcada no Decreto Federal 6.514/2008, que prevê as infrações consistentes em degradação ambiental, cuja coibição é também tarefa do Município, enquanto órgão integrante do Sistema Nacional do Meio Ambiente".
15 Segundo a decisão: "Além do mais, por força do disposto no Art. 1º da Lei Municipal 10.365/87, a vegetação de porte arbóreo se classifica como bem de interesse comum a todos e conta com proteção legal, traduzida no Art. 49 do Decreto Federal nº 3.179/99 (dispositivo equivalente ao art. 72 do Decreto federal 6.514/2008)".
16 De acordo com a sentença: "a legislação municipal engloba totalmente a conduta do Impetrante, não tendo a Administração apresentado, sem mesmo em suas informações, motivação minimamente razoável para justificar a aplicação da lei federal e não da lei municipal. Ou seja, a própria Administração desrespeita o princípio federativa, fazendo aplicar a lei federal em detrimento de lei regularmente editada pelo Legislador municipal".
17 O art. 49, I, do Decreto n.° 3.179/99 corresponde ao quanto previsto no art. 72, I, do Decreto n.° 6.514/2008 ("destruir, inutilizar ou deteriorar bem especialmente protegido por lei, ato administrativo ou decisão judicial"). Já o art. 34 do regulamento de 1999 equivale ao quanto disciplinado no art. 56 do decreto de 2008 ("Destruir, danificar, lesar ou maltratar, por qualquer modo ou meio, plantas de ornamentação de logradouros públicos ou em propriedade privada alheia").
18 Julgamento em 2 de outubro de 2014. Conforme o trecho do Acórdão a seguir reproduzido: "(...) não há como enquadrar a conduta descrita na autuação (pode de árvores sem autorização) no art. 72 do DF n.° 6.514/08, que não cuida de flora ou da fauna".
19 Julgamento em 31 de julho de 2014. Nos termos da decisão: "Avaliando-se os artigos mencionados, tem-se que o impetrante está com a razão. Primeiramente, a legislação municipal realmente é mais específica. Enquanto o Decreto Federal prevê disposição aplicável à destruição de bem especialmente protegido por lei (...), a lei municipal expressamente disciplina o procedimento para a autorização de corte de árvores, prevendo a penalidade decorrente da supressão arbórea não autorizada. Neste ponto, já entendo que plenamente aplicável a lei municipal".
20 No âmbito da Apelação nº 0013931-57.2013.8.26.0053, o TJ-SP igualmente faz referência à Resolução nº 154/CADES/2013. "Portanto, o próprio Município retirou o Decreto Federal de seu âmbito de aplicação, não havendo razão para manter a multa imposta com base em mencionado Decreto".
21 Com efeito, nos termos da informação de fls. 96/97, DECONT aponta que as infrações atuais estão sendo subsumidas nos artigos 44 e 56 do Decreto federal nº 6.514/08, "quando decorrentes da constatação de corte de exemplares arbóreos em Área de Preservação Permanente cuja espécie seja especialmente protegida, bem como de danos contra plantas de ornamentação." E salienta: "Os casos que não se enquadrarem na fundamentação supracitada são encaminhadas para apuração por parte do corpo técnico das subprefeituras, visando à autuação dos responsáveis com fulcro da Lei Municipal nº 10.365/87."
22 Redação dada pela Lei nº 15.425/2011.

23 Direito do ambiente, 4.ed., 2005, São Paulo: RT, pp. 754-755.

24 De acordo com o entendimento que prevalece, trata-se de norma em branco que admite especificação em regulamento. Na doutrina, cite-se o entendimento de Nicolao Dino de Castro e Costa Neto et alli: "(...) considera-se o artigo em comento [art. 70 da Lei n.° 9.605/98] como suficiente para dar suporte à atividade administrativa sancionadora. (...) já se assinalou que 'a utilização de tipos abertos e de normas penais em branco constitui em mal necessário, para que seja possível assegurar maior efetividade à tutela penal ambiental'. Ora, se pode ser sustentada a compatibilidade deste ponto de vista com a ordem jurídica, em se tratando da seara penal, com muito mais razoabilidade tal pode ocorrer cuidando-se das infrações administrativas" (Crimes e infrações administrativas ambientais, 2000, Brasília: Brasília Jurídica, pp. 324-325). Trata-se de posição acolhida pelo Superior Tribunal de Justiça (REsp 1.091.486/RO, 1ª Turma, rel. Min. Denise Arruda, DJe 06/05/2009).

25 A jurisprudência ressalta tal aspecto, conforme se extrai do Acórdão do STJ (REsp 1.245.094/MG, 2ª Turma, rel. Min.Herman Benjamin, DJe 13/04/2012). De acordo com o voto do relator, "tal conduta, ao tempo em que tipificada como crime, constitui também infração administrativa, que, aliás, em nada difere de inúmeros precedentes do STJ, em outros campos do Direito nacional, como nas infrações sanitárias, financeiras, de consumo, de trânsito etc".

26 Da mesma forma como já dispunha o Decreto 42.833/2003.

27 Importa consignar que o meio ambiente é tripartido em espécies: o meio ambiente natural, o cultural e o urbano.

28 A redação do art. 62, I, equivale ao do que disposto no art. 72, I, do Decreto n.° 6.514/08: "bem especialmente protegido por lei, ato administrativo ou decisão judicial".

29 Crimes contra a natureza, 8.ed., 2006, São Paulo: RT, p. 172.
30 Vale atentar que o decreto somente faz referência ao corte, não abrangendo a poda ou qualquer outra forma de intervenção indevida.
31 O art. 49 da Lei n.° 9.605/98 equivale à infração prevista no art. 56 do Decreto federal n.° 6.514/2008.
32 Vladimir Passos de Freitas e Gilberto Passos de Freitas, Crimes contra a natureza, 8.ed., 2006, São Paulo: RT, p. 172. Este aspecto não é isento de controvérsia, conforme a posição exposta por Luis Paulo Sirvinskas (Arborização urbana e meio ambiente - aspectos jurídicos. www.justitia.com.br/artigos/7e2a76.pdf. Acesso em: 9 de outubro de 2014).

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Processo nº 2014-0.255.387-7

INTERESSADO: SECRETARIA MUNICIPAL DO VERDE E DO MEIO AMBIENTE

ASSUNTO: Resolução nº 124/CADES/2008. Revogação pela Resolução nº 154/CADES/2013. Conformidade.

Cont. da Informação nº 1.526/2014-PGM.AJC

SECRETARIA DOS NEGÓCIOS JURÍDICOS

Senhor Secretário

Encaminho à Vossa Excelência a manifestação da Assessoria Jurídico-Consultiva desta Procuradoria Geral, que acolho, no sentido de que:

1º) A Resolução nº 154/CADES/2013 foi expedida de modo desconforme com o processo colegial;

2º) A competência jurídico-institucional do Conselho Municipal do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (CADES) é eminentemente consultiva, nos termos da Lei municipal nº 14.887/2009. Desta feita, não cabe ao colegiado expedir resolução veiculando em caráter cogente a interpretação jurídica sobre o ordenamento ambiental, a qual pressupõe, sobretudo nas questões revestidas de complexidade, manifestação das instâncias jurídico-institucionais do Município de São Paulo;

3º) Diante disso, sugere-se que o CADES seja cientificado de tais desconformidades, facultando o reconhecimento do desvio pelo próprio colegiado, sem prejuízo da possibilidade de anulação da Resolução nº 154/CADES/2013 pela instância administrativa competente;

4º) No que se refere à tipificação das infrações administrativas envolvendo espécimes arbóreas, e a despeito da controvérsia existente, entende-se que são cumulativas as infrações e as sanções previstas no ordenamento municipal (Lei nº 10.365/87) e no ordenamento federal (Lei nº 9.605/98 c/c. o Decreto nº 6.514/08) contra exemplares arbóreos;

5º) No que se refere à incidência do regime federal, a capitulação jurídica das infrações administrativas contra exemplares arbóreos encontra substrato, como regra geral, no art. 72, inciso I, do Decreto federal nº 6.514/08, tal qual vertido na Resolução nº 124/CADES/2008, com assento em tese objeto de manuseio pelas instâncias jurídicas do Município de São Paulo.

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São Paulo,        /          /2014.

ROBINSON SAKIYAMA BARREIRINHAS

PROCURADOR GERAL DO MUNICÍPIO

OAB/SP nº 173.527

PGM

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Processo nº 2014-0.255.387-7

INTERESSADO: SECRETARIA MUNICIPAL DO VERDE E DO MEIO AMBIENTE

ASSUNTO: Consulta acerca dos efeitos da revogação da Resolução nº 124/CADES/2008 nos autos do PA n° 2012-0.306.503-1 (fls. 01/110). Autuação deste expediente com vistas à verificação da conformidade da Resolução nº 154/CADES/2013. Manifestação de SVMA com remessa à PGM (fls. 111/121). Desconformidade na expedição da Resolução. Falta de competência do colegiado para veicular interpretação jurídica em caráter cogente. Ciência das desconformidades, sem prejuízo da possibilidade de anulação do ato normativo em questão. Cumulatividade das infrações e sanções previstas no ordenamento municipal e federal. Capitulação jurídica das infrações administrativas contra exemplares arbóreos na regra do art. 72, inciso I, do Decreto Federal nº 6.514/08. Controvérsias existentes que não desmerecem as teses objeto de manuseio pelas instâncias jurídicas do Município. Acolhimento.

Informação nº 3695/2014 -SNJ.G.

SVMA

Senhor Secretário

Com a manifestação da PGM (fls. 122/158), fixando o entendimento jurídico-institucional acerca do tratamento a ser dado às infrações ambientais cometidas contra exemplares arbóreos no âmbito do Município de São Paulo, que acolhemos, encaminhamos o presente a fim de que seja dada ciência à presidência do Conselho Municipal do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável - CADES acerca da desconformidade da Resolução nº 154/CADES/2013, facultando o reconhecimento do desvio pelo próprio órgão colegiado, sem prejuízo da possibilidade de sua anulação pela instância administrativa competente.

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São Paulo, 09/01/2015.

LUÍS FERNANDO MASSONETTO

Secretário Municipal dos Negócios Jurídicos

SNJ.G.

 

Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo