processo 2009-0.110.739-1
INTERESSADA: SECRETARIA MUNICIPAL DA SAÚDE
ASSUNTO: PL do Executivo que reorganiza a Residência Odontológica e revoga a Lei 9951/85.
Informação n° 1.639/2010-PGM.AJC
PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO
ASSESSORIA JURÍDICO-CONSULTIVA
Senhora Procuradora Assessora Chefe
1 - A Secretaria Municipal da Saúde elaborou, às fls. 02/04, anteprojeto de lei destinado a reorganizar a Residência Odontológica em Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial no âmbito daquela Pasta, com a revogação da Lei n° 9.951/85. A exposição de motivos encontra-se às fls. 05, ao passo que às fls. 08/09 foram propostas alterações na redação original dos arts. 9° e 12. A estimativa de impacto orçamentário-financeiro da medida, que compreende a concessão de 36 bolsas, mediante seleção pública, está às fls. 10, totalizando R$ 269.854,73 a cada exercício.
No ano passado, o anteprojeto foi submetido à apreciação da Secretaria de Modernização, Gestão e Desburocratização. As críticas e sugestões apresentadas pelo DRH-G (fl. 15) ensejaram novo texto e nova estimativa de impacto orçamentário-financeiro (fls. 16/19), ficando esclarecido que o valor da bolsa a ser atribuída aos residentes será equivalente a 75% do valor do padrão inicial da carreira de Especialista em Saúde (J-40), o que corresponde a R$ 1.394,64 (fl. 20).
Após a aprovação do DRH e da CGP (fl. 22), o anteprojeto foi então submetido à análise da Assessoria Jurídica da Pasta de Gestão, que se pronunciou às fls. 59/63, aludindo inicialmente à Lei Federal n° 11.129/05 e às Portarias Intersecretariais MEC/MS n° 45/07 e 593/08, que tratam da Residência Multiprofissional em Saúde e estipulam que as bolsas pagas aos residentes na área da saúde terão valores isonômicos aos destinados para a residência médica. Na sequência, foi sugerido que não conste do projeto a previsão de pagamento da bolsa no período correspondente à licença maternidade, pois se trata de benefício previdenciário que decorrerá da relação estabelecida com o regime geral, mantendo-se o prazo em apenas 120 dias, tal como previsto no art. 71 da Lei Federal n° 8.213/91, e não em 180 dias. O mesmo vale para o bolsista que estiver percebendo o auxílio-doença, lembrando que o bolsista deverá estar filiado ao regime geral como contribuinte autônomo. Quanto ao adicional de 1/3 de férias e ao décimo-terceiro salário, foi sugerido que se observe a legislação federal que trata da residência médica, que não prevê tais benefícios.
Por fim, foi solicitado o pronunciamento desta Procuradoria Geral a respeito da necessidade de readequação dos direitos conferidos aos residentes médicos no âmbito da Municipalidade, preservando-se os direitos assegurados pela Lei n° 10.912/90 aos médicos residentes que tenham ingressado sob a sua vigência.
Feita a síntese do essencial, passo a opinar.
2 - Ainda que este processo trate do anteprojeto de lei reorganizando a Residência Odontológica em Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofaciai no âmbito de SMS, a consulta formulada por SMG, como visto, restringe-se à eventual necessidade de readequação dos direitos conferidos aos residentes médicos no âmbito da Municipalidade, à luz do disposto na Lei Federal n° 11.129/05 e nas Portarias Intersecretariais MEC/MS n° 45/07 e 593/08, que tratam da Residência Multiprofissional em Saúde.
A consulta decorre da circunstância de serem discrepantes os direitos que se pretende assegurar aos residentes odontológicos, de acordo com o anteprojeto em questão, e aqueles que a legislação municipal em vigor efetivamente confere aos residentes médicos, cabendo destacar, quanto a estes, que a Administração deliberou, no passado, que o valor da bolsa fixado em lei federal não vincula o Município, que teria autonomia para fixar o valor das suas próprias bolsas.
Pois bem. O Município de São Paulo conta, há vários anos, com legislação local disciplinando, no âmbito da sua competência, tanto a residência médica (Lei n° 10.912/90, com as alterações feitas pelas Leis n° 11.744/95 e 14.730/08) quanto a odontológica (Lei n° 9.951/85).
Em nível federal, a residência médica já era disciplinada pela Lei n° 6.932/81, ainda hoje em vigor, com algumas alterações introduzidas, entre outras, pela Lei n° 11.381/06, que assegurou ao médico residente bolsa no valor correspondente a R$ 1.916,45, em regime especial de treinamento em serviço de 60 (sessenta) horas semanais (fls. 40/42).
Após anos de vigência dos diplomas municipais, sobreveio a Lei Federal n° 11.129/05, que: (a) instituiu a "Residência em Área Profissional da Saúde", "(...) definida como modalidade de ensino de pós-graduação lato sensu, voltada para a educação em serviço e destinada às categorias profissionais que integram a área da saúde, excetuada a médica" (art. 13), e (b) criou, no âmbito do Ministério da Educação, a "Comissão Nacional de Residência Multiprofissional em Saúde" - CNRMS, cuja organização e funcionamento deveriam ser disciplinados em ato conjunto dos Ministros de Estado da Educação e da Saúde (art. 14).
A mesma Lei Federal instituiu, também, o "Programa de Bolsas para a Educação pelo Trabalho", destinado aos estudantes de educação superior, prioritariamente com idade inferior a 29 anos, e aos profissionais diplomados em curso superior na área da saúde, visando ao aperfeiçoamento e especialização de jovens para atuação em regiões prioritárias para o Sistema Único de Saúde, mediante a concessão de bolsas que estão sob a responsabilidade técnico-administrativa do Ministério da Saúde (art. 15).É de se ver, contudo, que apenas as bolsas concedidas no âmbito deste Programa, entre elas a "Bolsa Residente", é que terão, nos termos da referida lei, "valores isonômicos aos praticados para a iniciação científica no Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - CNPq e para a residência médica", conforme está previsto no § 1° do art. 16.
Portanto, o tratamento isonômico cogitado pela Assessoria Jurídica de SMG é restrito ao referido "Programa de Bolsas" criado pela Lei Federal n° 11.129/05, não se estendendo às outras instituições e esferas que concedam semelhantes bolsas, em especial nas hipóteses de que trata o presente.
Considerando que a residência médica não pode ter caráter multidisciplinar1, é de se notar que as disposições da Lei Federal n° 11.129/05 não se aplicam ao médico residente vinculado a instituições municipais, uma vez que: (a) a "Residência em Área Profissional da Saúde" criada pelo art. 13 não inclui a área médica; (b) a "Comissão Nacional de Residência Multiprofissional em Saúde" - CNRMS instituída pelo art. 14 igualmente não compreende os profissionais formados em Medicina, como deixa claro o § 2° do art. 1° da Portaria Intersecretarial n° 45/20072; (c) o "Programa de Bolsas para a Educação para o Trabalho" instituído pelo art. 15 é voltado à formação de jovens profissionais para atuação em regiões prioritárias para o SUS, ficando as respectivas bolsas sob a responsabilidade técnico-administrativa do Ministério da Saúde.
Logo, a residência médica do bolsista vinculado a instituições municipais é regida pelas normas gerais da Lei Federal n° 6.932/81 e pelas demais disposições específicas da legislação municipal correlata (Lei n° 10.912/90, com as alterações introduzidas pelas Leis n° 11.744/95 e 14.730/08).
Isto significa que, sem prejuízo de outros direitos assegurados na legislação local, as disposições da Lei Federal n° 6.932/81 devem ser observadas, indistintamente, por todas as instituições de ensino que concedem bolsas a médicos residentes, seiam elas públicas ou privadas, o que obviamente vale, também, para o Município de São Paulo.
Confira-se, neste sentido, este elucidativo acórdão do Superior Tribunal de Justiça:
ADMINISTRATIVO. RESIDÊNCIA MÉDICA. BENEFÍCIOS. ALIMENTAÇÃO E ALOJAMENTO. LEI FEDERAL NQ 6.932/81. PAGAMENTO EM PECÚNIA. ADICIONAL SOBRE A BOLSA DEVIDA. FALTA DE PREVISÃO LEGAL. IMPOSSIBILIDADE.
I - O art. 4S, § 1°, da Lei n° 6.932/81 denota que os benefícios de alimentação e alojamento deverão ser oferecidos aos médicos residentes in natura.
II - A instituição responsável pela residência médica colocará à disposição dos beneficiários os serviços de alimentação e alojamento, não sendo devido o pagamento de auxílio em pecúnia com essa finalidade, ainda que aqueles serviços não sejam oferecidos, por falta de previsão legal.
III - Recurso especial improvido.
(STJ-1- Turma, REsp 793.013-RS, Rel. Min. Francisco Falcão, DJ 06/03/2006)
3 - Cabe aqui destacar que a residência constitui uma etapa da formação do profissional da saúde, vale dizer, é uma etapa do ensino3 - daí não caracterizar vínculo algum com a instituição, seja trabalhista, seja estatutário, não caracterizando sequer tempo de serviço público e entendimento jurisprudencial:
MÉDICO - Botucatu - LF n° 6.932/81 - Pretensão à contagem de serviço prestado como médico residente para fins de licença prêmio, sexta-parte e aposentadoria. - 1. Residência médica - Natureza - A residência médica vem definida no art. 19 da LF n° 6.932/81 como 'modalidade de ensino de pós-graduação, destinada a médicos, sob a forma de cursos de especialização, caracterizada por treinamento em serviço, funcionando sob a responsabilidade de instituições de saúde, universitárias ou não, sob a orientação de profissionais médicos de elevada qualificação ética e profissional'. Não há, entre o médico-residente e a instituição em que feita a residência, vínculo que caracterize emprego ou prestação de serviços. Ao contrário, a instituição é que presta serviços de ensino e treinamento em serviço ao médico. - 2. Residência médica - Remuneração - Estágio curricular prestado sem vínculo empregatício com o órgão público, com remuneração por bolsa e não por salário, não transforma o residente em 'funcionário' nem em 'servidor público' e, em tese, não se presta a inclusão como tempo de serviço para qualquer efeito legal. - 3,. Honorários advocaticios - A verba honorária foi fixada em R$-250,00, valor módico e compatível com a situação social e profissional da autora. Não há razão para redução. Sentença de improcedência. Recurso voluntário desprovido. (TJSP-7- Câmara de Direito Público, Apelação Cível n° 159.338-5/6-00, Rel. Des. Torres de Carvalho, j. 21/02/2005, v.u.)
Não é por outro motivo que, desde 2003, o médico residente é classificado como contribuinte individual do Regime Geral de Previdência Social, nos termos do art. 9°, § 15, X, do Decreto n° 3.048/99:
Art. 9° São segurados obrigatórios da previdência social as seguintes pessoas físicas:
(...)
V - como contribuinte individual: (Redação dada pelo Decreto n° 3.265. de 1999)
j) quem presta serviço de natureza urbana ou rural, em caráter eventual, a uma ou mais empresas, sem relação de emprego; (Incluída pelo Decreto n° 3.265, de 1999)
I) a pessoa física que exerce, por conta própria, atividade econômica de natureza urbana, com fins lucrativos ou não; (Incluída pelo Decreto ng 3.265, de 1999) (...)
§ 15. Enquadram-se nas situações previstas nas alíneas "j" e "I" do inciso V do caput, entre outros: (Redação dada peto Decreto n° 3.265, de 1999)
(...)
X - o médico residente de que trata a Lei ns 6.932, de 7 de julho de 1981. (Redação dada peto Decreto n° 4.729, de 2003)
Este, também, o entendimento da jurisprudência:
TRIBUTÁRIO E PREVIDENCIÁRIO. CONTRIBUIÇÃO. INCIDÊNCIA. MÉDICO-RESIDENTE. VALORES RECEBIDOS A TÍTULO DE BOLSA DE ESTUDO. PRECEDENTE.
1. Tratam os autos de mandado de segurança movido pelo Sindicato Médico do Rio Grande do Sul - Simers, insurgindo-se contra a exigência de contribuição previdenciária dos médicos residentes nos termos da Lei n° 10.666/03. Recurso especial interposto pelo sindicato autor diante do acórdão proferido pelo TRF da 4- Região, segundo o qual:
O médico-residente é contribuinte individual (inciso X do § 159 do artigo 9° do Decreto 3.048/99). 2. A Lei n° 10.666/03 não criou contribuição social nova (bis in idem). Ela extinguiu escala transitória de salário-base instituída pela Lei n° 9.876/99, obrigando os médicos-residentes a contribuir com 20% daquilo que obtiverem como renda mensal, incluída a bolsa instituída pela Lei n° 6.932/81.
Na via especial, alegam-se negativa de vigência dos artigos 19, 4° 5S, § 25, da Lei n° 6.932/81, 21, 28, III, da Lei n° 8.212/91 e divergência jurisprudencial. Em suas razões, em síntese, sustenta que: a) a interpretação conferida à legislação que embasa a questão controvertida é de que a atividade desenvolvida pelo médico-residente é, em essência, educacional, e a bolsa percebida a tal título não dispõe de natureza remuneratória; desse modo, não há razão para que incida contribuição previdenciária; b) o médico-residente não se enquadra na condição de segurado obrigatório para fins previdenciários.
2. Quando do julgamento do REsp 760.653/PR, DJ de 05/12/2005, a Primeira Turma, por unanimidade, expressou entendimento de que é devida a contribuição previdenciária sobre os valores recebidos a título de bolsa de estudo pelos médicos-residentes, dado que prestam serviço autônomo remunerado, enquadrando-se, portanto, na qualidade de "contribuinte individual", conforme disposto na Lei n° 8.212/91.
3. Recurso especial não provido.
(STJ-1° Turma, REsp 963.602-RS, Rel. Min. José Delgado, DJ 25/02/2008)
Assim, com a ressalva de que o médico residente é contribuinte individual do RGPS, concorda-se com as demais ponderações feitas pela Assessoria Jurídica de SMG, na parte final de seu pronunciamento de fls. 59/63, no tocante aos outros direitos conferidos aos bolsistas municipais pelas Leis n° 10.912/90, 11.744/95 e 14.730/08, os quais devem ser preservados.
4 - Do exposto, conclui-se que a residência médica está adstrita às normas gerais da Lei Federal n° 6.932/81 e demais disposições da legislação municipal (Leis n° 10.912/90, 11.744/95 e 14.730/08), ao passo que a residência odontológica rege-se pelas disposições da Lei Federal n° 11.129/05 e da Portaria Intersecretarial MEC/MS n° 45/2007, motivo pelo qual recomendo: (a) o retorno do presente à origem, para revisão do anteprojeto de fls. 17/19, à luz dos citados diplomas, bem como da estimativa de impacto orçamentário-financeiro de fl. 16, à vista do tempo decorrido; (b) a autuação de expediente autônomo para examinar a eventual necessidade de revisão da legislação municipal atinente à residência médica, à luz das observações feita na manifestação de fls. 59/63 e neste parecer.
São Paulo, 06/08/2010.
LUIZ PAULO ZERBINI PEREIRA
Procurador Assessor - AJC
OAB/SP 113.583
PGM
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De acordo.
São Paulo, 19/08/2010.
LEA REGINA CAFFARO TERRA
Procuradora Assessora Chefe - AJC
OAB/SP 53.274
PGM
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processo 2009-0.110.739-1
INTERESSADA: SECRETARIA MUNICIPAL DA SAÚDE
ASSUNTO: PL do Executivo que reorganiza a residência odontológica e revoga a Lei 9951/85.
Cont. da informação n° 1.639/2010-PGM.AJC
SECRETARIA DOS NEGOCIOS JURÍDICOS
Senhor Secretário
Encaminho o presente a Vossa Excelência com a manifestação da Assessoria Jurídico-Consultiva, que acolho, recomendando o retorno deste processo à origem para revisão do anteprojeto de fls. 17/19, à luz das disposições da Lei Federal n° 11.129/05 e da Portaria Intersecretarial MEC/MS n° 45/2007, além da estimativa de impacto orçamentário-financeiro de fl. 16, à vista do tempo decorrido, bem como a autuação de expediente autônomo para examinar a eventual necessidade de revisão da legislação municipal atinente à residência médica, à luz das observações feitas pela Assessoria Jurídica de SMG e por esta Procuradoria Geral.
Acompanha o processo 1990-0.031.271-0.
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São Paulo, 19/08/2010.
CELSO AUGUSTO COCCARO FILHO
Procurador Geral do Município
OAB/SP 98.071
PGM
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processo 2009-0.110.739-1
INTERESSADA: SECRETARIA MUNICIPAL DA SAÚDE
ASSUNTO: Parecer de Ementa n° 11.524. Anteprojeto de lei elaborado pela Secretaria Municipal da Saúde destinado a reorganizar a Residência Odontológica em Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial no âmbito daquela Pasta. Discrepância com os direitos conferidos aos residentes médicos pela legislação municipal. Análise do texto à luz das disposições legais aplicáveis à residência na área da saúde.
Informação n.° 2589/2010-SNJ.G.
SECRETARIA MUNICIPAL DA SAÚDE
Senhor Secretário
Retomo o presente processo a essa Secretaria, com o parecer de Ementa n° 11.524 da Procuradoria Geral do Município, que acolho, no sentido da revisão do anteprojeto à luz das disposições da Lei Federal n° 11.129/05 e da Portaria Intersecretarial MEC/MS n° 45/2007, além da estimativa de impacto orçamentário-financeiro, à vista do tempo decorrido, bem como a autuação de expediente autônomo para examinar a eventual necessidade de revisão da legislação municipal atinente à residência médica, tendo em vista as observações feitas pela Assessoria Jurídica de SMG e pela Procuradoria Geral do Município.
Acompanha o p.a. 1990-0.031.271-0.
São Paulo, 31/08/2010
CLAUDIO LEMBO
Secretário Municipal dos Negócios Jurídicos
Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo