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PARECER PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO - PGM Nº 11.696 de 26 de Janeiro de 2017

EMENTA Nº 11.696
Sanções previstas no artigo 87, incisos III e IV, da Lei n.° 8.666/93. Aplicação por outra entidade federativa: efeito ex nunc, sem prejuízo da possibilidade de se instaurar processo visando à rescisão contratual, desde que remanesça pertinência com a infração contratual, observado, entre outros, o princípio da proporcionalidade. Possibilidade de prorrogação dos contratos em vigor, condicionada à manutenção das condições originárias e à demonstração de interesse público. Aplicação das sanções pelo Município de São Paulo: rescisão dos contratos em vigor. Interpretação do artigo 29, parágrafo único, da Lei municipal n.° 13.278/02.

Processo n.° 2009-0.233.431-6

INTERESSADO: CONSÓRCIO VIGILÂNCIA TELEFÔNICA

ASSUNTO: Proposta de rescisão unilateral do Contrato n.° 09/SMSU/2011. Aplicação de penalidade. Efeitos.

Informação n° 0090/2017-PGM.AJC

COORDENADORIA GERAL DO CONSULTIVO Assessoria Jurídico-Consultiva

Senhor Procurador Assessor Chefe

Cuida o presente do Contrato n.° 09/SMSU/2011, cujo objeto envolve o fornecimento de imagens por meio de 100 (cem) câmaras, celebrado com o Consórcio Vigilância Telefônica, liderado pela empresa Telefônica Inteligência e Segurança Brasil Ltda., consorciada, por sua vez, com a empresa Telecomunicações de São Paulo S.A.-TELESP.

Ocorre que sobreveio notícia de que foi aplicada à empresa pelo setor administrativo da Justiça Federal do Espírito Santo, a penalidade de suspensão temporária de participar em licitação e impedimento de contratar, ex vi do art. 87, inciso III, da Lei 8.666/93 (doravante denominada suspensão temporária). Tal circunstância deu ensejo ao impedimento de participar no processo licitatório promovido pela Pasta (cf. apontado no TID acompanhante, de n.° 15852691).

A questão que se coloca é o alcance do art. 29, parágrafo único, da Lei municipal n.° 13.278/02, pelo qual estaria a Administração local obrigada a rescindir todos os contratos firmados com a referida empresa apenada. Para a Assessoria Jurídica da SMSU, merece realce a plena "possibilidade de mitigação dos efeitos da Lei Municipal, desobrigando a Administração de rescindir os contratos firmados, em consonância com o princípio da segurança jurídica" (fls. 8.471/verso).

Assim, a SMSU formula consulta sobre a possibilidade de manutenção dos contratos com a sociedade Telefônica Brasil S/A., em que pese a penalidade aplicada pela Justiça Federal do Espírito Santo - no exercício da função administrativa, vale repisar - e o contido no art. 29, parágrafo único, da Lei Municipal 13.278/02.

É o que se entende suficiente à guisa de relatório.

O objeto da consulta formulada envolve diversos aspectos relacionados ao regime dos contratos administrativos, motivo pelo qual sua análise será realizada em tópicos, objetivando uma melhor exposição do raciocínio utilizado.

I. SUSPENSÃO TEMPORÁRIA E EXTENSÃO SUBJETIVA DE SEUS EFEITOS

É assente no âmbito da Procuradoria Geral do Município de São Paulo o entendimento segundo o qual detém amplo alcance a penalidade de suspensão temporária revista no art. 87, inciso III, da Lei federal n.° 8.666/93.

Vele registrar que a posição atual decorreu da mudança do entendimento pretérito vertido na Ementa n.° 10.116, que emprestava eficácia restrita à mesma sanção contratual: "A pena de suspensão temporária de participação em licitar e impedimento de contratar aplicada por qualquer órgão da Administração Municipal, direta e indireta e do Poder Legislativo, estende-se a todos os demais". Ou seja, o seu alcance restringia-se a todos os órgãos e entidades do ente político que a aplicou.

Em razão da consolidação de entendimento diverso pelo Superior Tribunal de Justiça, a Procuradoria Geral do Município expediu o parecer ementado sob o n.° 11.607 (Informação n.° 1.359/2012-PGM.AJC), in verbis:

"Alcance da penalidade de suspensão temporária de participação em licitação e impedimento de contratar com a Administração, prevista no inciso III do art. 87 da Lei federal n.° 8.666/93. Efeitos extramuros, atingindo todos os órgãos e entidades da Administração Pública, de todos os entes federativos. Precedentes jurisprudenciais. Idêntico alcance das sanções previstas no inciso IV do art. 87 da Lei federal n.° 8.666/93 (declaração de inidoneidade) e no art. 7º da Lei federal n.° 10.520/02 (impedimento de licitar e contratar, no pregão). Revisão, neste aspecto, da Ementa n.° 10.116-PGM."

Nesse sentido, ampliou-se o efeito subjetivo da suspensão temporária, para alcançar todos os órgãos e entidades da Administração Pública, de todos os entes federativos, de modo que lhe foi conferida idêntica eficácia à declaração de inidoneidade (art. 87, inciso IV, da Lei federal n.° 8.666/93) e ao impedimento de licitar e contratar no pregão (art. 7º da Lei federal n.° 10.520/02).

Esta compreensão foi sedimentada na Orientação Normativa n.° 3/2012-PGM, pela qual "a sanção contratual prevista no inciso III do artigo 87 da Lei federal n.° 8.666/93, tal como as previstas no inciso IV do mesmo artigo e no artigo 7º da Lei federal n.° 10.520/02, projeta efeitos para todos os órgãos e entidades de todos os entes federativos".

Posteriormente, conquanto tenha sido requerida a revisão de tal posição, a Procuradoria Geral do Município manteve-a, haja vista a manutenção da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (cf. parecer emitido na Informação n.° 0459/2014-PGM.AJC).

As razões - de ordem pragmático-jurisprudencial¹ - que embasaram o entendimento desta Procuradoria Geral do Município subsistem, motivo pelo qual se reafirma a diretriz veiculada pela Orientação Normativa n.° 3/2012-PGM.

Tal compreensão deve ser compreendido nos estritos termos em que expedida: a eficácia subjetiva da suspensão temporária. Não houve, assim, expressa análise quanto ao alcance objetivo da mesma penalidade, tema sobre o qual nos debruçaremos a seguir.

II. SUSPENSÃO TEMPORÁRIA E EXTENSÃO OBJETIVA DE SEUS EFEITOS. JURISPRUDÊNCIA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

A Lei municipal n.° 13.278/02 dispõe em seu art. 29, parágrafo único, o seguinte:

"Art. 29. As hipóteses de rescisão contratual são aquelas previstas na legislação federal.

Parágrafo único - Também implicará a rescisão unilateral do contrato a aplicação ao contratado da pena de declaração de inidoneidade ou a suspensão temporária para licitar e contratar com a Administração Pública, ainda que em decorrência de falta cometida em outro procedimento administrativo.”

A prescrição veiculada em tal dispositivo municipal encerra duas veredas interpretativas, na dependência da extensão que seja emprestada à expressão "ainda que em decorrência de falta cometida em outro procedimento administrativo”². Pela primeira, decorre da aplicação da pena de suspensão temporária (bem assim da declaração de inidoneidade) o efeito da rescisão unilateral do contrato pelo Município, independentemente da entidade federativa que tenha cominado a sanção. Pela segunda, somente as penas aplicadas pelo próprio Município autorizam a sua rescisão contratual pelo mesmo ente.

Como se pode notar, o dispositivo carreia a questão referente à extensão objetiva dos efeitos das penalidades contratuais, nomeadamente em relação aos contratos administrativos em vigor. Nesse sentido, remanescem os questionamentos: a cominação de tais sanções acarreta a automática rescisão das avenças vigorantes firmadas com a pessoa apenada? As penas aplicadas por outros entes detêm tal eficácia? A administração deve tomar alguma providência intramuros em virtude da aplicação de sanção contratual por outra entidade?

Vale ressaltar que a dificuldade hermenêutica resulta do próprio laconismo com que o tema é tratado pela legislação federal. Com efeito, no capítulo dentro do qual é disciplinado o tema das sanções contratuais (artigos 86 a 88), a questão ora debatida não sofre disciplina específica pela Lei federal n.° 8.666/93. O mesmo pode ser verificado no tocante aos preceitos que disciplinam a rescisão do contrato (artigos 77 a 80).

Este panorama normativo nos leva a recorrer à interpretação que vem sendo emprestada pelo Superior Tribunal de Justiça - mesmo parâmetro, aliás, que orientou esta PGM-AJC acerca do alcance subjetivo da suspensão temporária.

Os julgados do STJ referem-se, de um modo geral, ao alcance da pena de declaração de inidoneidade e de sua repercussão nos contratos administrativos em vigor³.

A pioneira decisão a respeito foi tomada no âmbito do MS n.° 13.041, que abordou o tema em singelo parágrafo, a seguir transcrito (1ª Seção, Rel. Min. José Delgado, julg. 12/12/2007, DJe 10/03/2008):

"Deve, contudo, ser esclarecido que, em nenhum instante o ato administrativo impugnado propõe-se a ter efeito ex tunc. Por silenciar a respeito, ele só atinge as relações jurídicas futuras. Os já constituídos firmados só serão desconstituídos por decorrência de outro ou outros atos específicos, obedecendo-se ao devido processo legal."

Posteriormente, no bojo da mesma lide, em razão da oposição de embargos de declaração, foi reconhecida a necessidade de constar da ementa do Acórdão o seguinte: "a declaração de inidoneidade reconhecida como legítima só produz efeitos ex nunc" (EDcl no MS n.° 13.041/DF, 1ª Seção, Rel. Min. José Delgado, julg. 28/05/2008, DJe 16/06/2008).

Tal entendimento foi corroborado pelo mesmo Tribunal Superior em diversos outros julgados4, que, paulatinamente, foram precisando o alcance da posição da mesma Corte. Assim, na apreciação do MS 13.964/DF, restou decidido que o efeito ex nunc "inibe a empresa de 'licitar ou contratar com a Administração Pública' (Lei 8.666/93, art. 87), sem, no entanto, acarretar, automaticamente, a rescisão de contratos administrativos já aperfeiçoados juridicamente e em curso de execução, notadamente os celebrados perante outros órgãos administrativos não vinculados à autoridade impetrada ou integrantes de outros entes da Federação (Estados, Distrito Federal e Municípios)" (negrito nosso).

Sob perspectiva diversa, vale destacar o voto da Ministra Eliana Calmon no âmbito dos EDcl no MS n.° 13.101/DF, no sentido de que a rescisão imediata dos contratos pactuados, em razão da declaração de inidoneidade, "pode representar prejuízo maior ao erário e ao interesse público, já que se abrirá o risco de incidir sobre contrato que esteja sendo devidamente cumprido pela contratada, contrariando, assim, o princípio da proporcionalidade, da eficiência e obrigando gasto de verba pública com realização de novo procedimento licitatório".

Outro ponto que merece realce é a própria coerência do STJ acerca da eficácia da pena de proibição de contratar e licitar prevista na Lei de Improbidade Administrativa (Lei n.° 8.429/92). É o que bem aponta Marçal Justen Filho, para quem, "também neste caso decidiu-se que a punição não afeta outros contratos e deve ficar restrita à órbita do ente estatal que impôs a sanção5”.

Trate-se, efetivamente, do melhor entendimento, que encontra suporte em múltiplos princípios constitucionais. O postulado da segurança jurídica afugenta resoluções que acarretam ruptura com o status quo, sobretudo nas relações jurídicas revestidas de juridicidade. É o que se observa nos contratos legais em vigor firmados com pessoas apenadas em outras avenças. No mesmo sentido aponta o princípio da proporcionalidade, assentando na necessidade de cotejamento entre os prejuízos advindos da extinção da avença e a sua manutenção, aspecto que igualmente detém interface com a eficiência. Reitere-se a passagem acima transcrita da Ministra Eliana Calmon no âmbito do julgamento dos EDcl no MS n.° 13.101/DF.

Assim também entende a doutrina, conforme as lições de José dos Santos Carvalho Filho: "Significa, pois, que os efeitos da punição são ex nunc, ou seja, incidem apenas para licitações e contratações futuras. O outro aspecto é o de que nada impede que, a despeito da sanção, os demais contratos sejam regularmente cumpridos pelo contratado.6"

Vale consignar que se trata da posição externada pela Advocacia Geral da União, por meio de sua Procuradoria-Geral Federal, nos termos do Parecer n.° 0008/2013/CPLC/DEPCONSU/PGF/AGU: a aplicação de referidas penalidades (declaração de inidoneidade, suspensão temporária e impedimento do art. 7º da Lei n.° 10.520/02) "não deve gerar a rescisão unilateral automática de contratos administrativos em curso".

Verifica-se, portanto, a imposição de uma primeira conclusão: a necessidade de se aderir à jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça acerca do efeito não-retroativo da declaração de inidoneidade e, a fortiori, da suspensão temporária, quando tais penalidades forem aplicadas por outras entidades federativas. Deste modo, resta afastada a automática rescisão das avenças em vigor firmadas com o contratado apenado em outra seara.

De tal conclusão decorrem três aspectos que merecem análise específica. Em primeiro lugar, a interpretação a ser emprestada ao dispositivo municipal aludido. Em segundo, a ocorrência de outras repercussões nos contratos firmados pelo Município de São Paulo. Por fim, a aplicação desta compreensão no âmbito das prorrogações contratuais. É o que será feito a seguir.

III. INTERPRETAÇÃO DO ART. 29, PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI MUNICIPAL N.° 13.278/02

Como já referido, o art. 29, parágrafo único, da Lei municipal n.° 13.278/02 determina, no caso da aplicação de declaração de inidoneidade e de suspensão temporária, a rescisão de contrato, "ainda que em decorrência de falta cometida em outro procedimento administrativo".

Partindo-se da premissa acima assentada - a de que as sanções aplicadas por outras esferas não têm a aptidão jurídica de fulminar automaticamente os contratos em vigor no Município de São Paulo -, chega-se à conclusão de que somente as penas aplicadas localmente é que apresentam tal efeito.

Vale dizer, a interpretação útil (leia-se, única) a ser emprestada ao dispositivo municipal envolve as situações em que referidas penalidades são aplicadas no âmbito do próprio Município de São Paulo. Ou seja, a "falta cometida em outro processo administrativo" refere-se ao poder disciplinar-contratual exercido por esta Comuna. Neste caso, os contratos em vigor firmados com a pessoa objeto de sanção merecem ser extintos.

Esta compreensão guarda compatibilidade com a prática tomada quando da edição da Lei n.° 13.278/02, em que se dava o bloqueio do Sistema de Execução Orçamentária em relação às pessoas apenadas, de modo a impedir o processamento de pagamento contratual por toda a Prefeitura. A propósito, tal norma guarda coerência com o próprio entendimento então plasmado por esta Procuradoria Geral do Município, quando da emissão do parecer ementado sob o n.° 10.116, pelo qual a pena de suspensão temporária aplicada por qualquer órgão da Administração municipal direta e indireta, estende-se a todos os demais órgãos municipais. Assim, a própria interpretação histórica do diploma normativo municipal corrobora a posição ora adotada.

Assim, como segunda conclusão - prestante a ser desdobramento da primeira -, temos o seguinte: na situação em que as sanções de suspensão temporária e declaração de inidoneidade forem aplicadas pelo próprio Município de São Paulo, seja por intermédio da Administração direta ou da indireta, os contratos em vigor devem ser rescindidos, ex vi do art. 29, parágrafo único, da Lei municipal n.° 13.278/02.

IV. SANÇÕES APLICADAS POR OUTRAS ENTIDADES FEDERATIVAS E REPERCUSSÕES NOS CONTRATOS FIRMADOS PELO MUNICÍPIO DE SÃO PAULO

Outra questão a ser analisada envolve eventuais repercussões - que não a rescisão automática - das sanções contratuais aplicadas por outros entes federativos nos contratos firmados pelo Município de São Paulo. Para tanto, e a fim de manter coesão com o critério que vem sendo adotada pela PGM-AJC, verifiquemos a jurisprudência do STJ a respeito.

Em muitas das decisões que imputaram o efeito ex nunc da declaração de inidoneidade, o Tribunal Superior consignou que "a ausência do efeito rescisório automático não compromete nem restringe a faculdade que têm as entidades da Administração Pública de, no âmbito da sua esfera autônoma de atuação, promover medidas administrativas específicas para rescindir os contratos, nos casos autorizados e observadas as formalidades estabelecidas nos artigos 77 a 80 da Lei 8.666/93" (MS 13.964/DF). Na mesma direção: MS 14002/DF, 1ª Seção, Rel. Min. Teoria Zavaski, DJe 06/11/2009.

Vale dizer, o efeito ex nunc não afasta a possibilidade de que a entidade administrativa instaure processo visando à rescisão contratual, com base nos fatos que levaram à aplicação da penalidade em outra avença, observando-se plenamente os ditames legais correspondentes. O suporte fático que tenha levado à cominação da sanção contratual pode representar fundamento para a rescisão de outro contrato, desde que atendidos os ditames dos artigos 77 e 78 da Lei n.° 8.666/93.

Quanto a isto, convém reproduzir as lições de Marçal Justen Filho, para quem "deverão ser apurados em processo regular os fatos que motivaram a aplicação de sanção (desde que também pertinentes ao contrato em questão)"7. Este o ponto que destaca: a necessidade de pertinência entre o fato que serviu de motivação para a aplicação da sanção contratual e as razões que podem dar ensejo à rescisão de um outro contrato em vigor. Outrossim, o mesmo autor assinala que diversos fatores devem ser levados em consideração na avaliação da rescisão, como o princípio da proporcionalidade e o atendimento dos interesses fundamentais8.

Esta compreensão permite presumir (de modo relativo) uma tendência: os fatos que dão ensejo à aplicação de sanção contratual por outras entidades federativas podem não apresentar a potencial aptidão para repercutir nas relações contratuais do Município de São Paulo. Trata-se, contudo, que aspecto que merece verificação casuística, na dependência da aferição da própria proporcionalidade da extinção contratual. Conforme as lições de Jessé Torres Pereira Júnior, "interessa saber se a só ocorrência do motivo obriga a rescisão, descartada qualquer avaliação quanto à conveniência para o interesse do serviço ou do contratado. A resposta é negativa. A uma, porque, mesmo caracterizado o motivo que renderia azo à rescisão, pode a Administração (...) considerar que melhor atenderia ao interesse do serviço manter o contrato, adotando-se medidas mais severas de fiscalização (...)9".

Mais um ponto que merece consideração envolve a incidência do art. 55, inciso XIII, que impõe ao contratado a obrigação de manter, durante toda a execução do contrato, todas as condições de habilitação e qualificação exigidas na licitação. Nesse sentido, poderia ser suscitado que a aplicação de penalidade contratual fulminaria a condição pessoal do contratado, resultando necessariamente na extinção de avença em vigor.

Conquanto não se possa deixar de reconhecer que o art. 55, inciso XIII, da Lei n.° 8.666/93 representa causa para rescisão contratual10, não menos inequívoca a circunstância de que se trata de causa que merece aplicação cuidadosa, não robotizada.

A propósito disto, vale apontar precioso entendimento exposto no parecer incorporado na Informação n.° 0956/2015-PGM.AJC, em que restou reconhecido que "a cláusula contratual que exige que a contratada mantenha as condições de habilitação durante todo o curso do ajuste deve ser compreendida considerando a influência da perda da condição de qualificação para o cumprimento, pela contratada, das suas obrigações"11.

Tal compreensão foi seguida de uma percuciente consideração: "Com isto não estamos a afirmar que o art. 55, XIII, da Lei federal n° 8.666 pode ser inobservado, mas que ele deve ser observado considerando a proporcionalidade que deve pautar a atuação do agente público e as peculiaridades das situações de fato sobre as quais deve se debruçar, considerando a relevância do referido item de qualificação para a continuidade da execução do pacto".

Assim, da mesma forma como concluído na primeira parte do presente item, a mácula que recai sobre empresa apenada no âmbito de um contrato firmado com outro ente não se presta à rescisão da avença celebrada com o Município de São Paulo, mesmo à luz do art. 55, inciso XIII, da Lei n.° 8.666/93.

Chega-se, assim, à terceira conclusão: o efeito ex nunc acima exposto não afasta a possibilidade de que o Município de São Paulo instaure processo visando à rescisão contratual, com assento nos fatos que levaram à aplicação da penalidade por outro ente, desde que remanesça relação de pertinência entre a infração contratual e a potencial repercussão no contrato em vigor, sem prejuízo da aferição de outros fatores, entre os quais a proporcionalidade e o atendimento dos interesses fundamentais.

V. ANÁLISE QUANTO A POSSIBILIDADE DE PRORROGAÇÃO

Um derradeiro ponto a ser verificado abarca a possibilidade de prorrogação do contrato, haja vista o entendimento firmado no bojo da Orientação Normativa n.° 3/2012-PGM. Assim, na ocorrência da aplicação da pena de suspensão temporária por outra entidade federativa, cabível a prorrogação dos contratos firmados pelo Município de São Paulo?12

Neste particular, a análise concentra-se na própria natureza da prorrogação contratual. Trata-se do firmamento de novo contrato? Constitui, pelo contrário, uma mera extensão da avença inicial? A depender da resposta, cambia-se a conclusão. Caso seja reputado um contrato diverso do anterior, incidiria, a nosso sentir, a vedação contida na ON n.° 3/12, que impõe a vedação de contratar (ex novo). E caso for enquadrada como desdobramento da mesma avença, afastada a prescrição de tal orientação.

De acordo com o entendimento prevalecente, a prorrogação contratual não representa nova contratação, consistindo em mera extensão de um mesmo ajuste, mantidas as condições iniciais. Esta, aliás, a distinção entre prorrogação e renovação de um contrato.

É o que salienta a doutrina que se debruça sobre a teoria geral dos contratos. De acordo com Orlando Gomes:

"A mais importante questão no exame da continuidade de um contrato por tempo determinado consiste em saber se o contrato persiste ou se outro lhe sucede.

Para resolvê-la, separam-se duas hipóteses: 1ª) se as partes conservam as cláusulas, limitando-se a dilatar o prazo de vigência da relação jurídica, numa palavra, prorrogá-lo, não haverá formação de novo contrato. É o mesmo contrato que continua, sujeito, ou não, a novo termo; 2ª) se introduzirem, entretanto, novas cláusulas, modificando o conteúdo do contrato originário, inclusive a relativa à duração, renovando-o, por conseguinte, terão estipulado outro contrato. Distinguir-se-ia, desse modo, a prorrogação da renovação. Ocorrendo prorrogação, um só e mesmo contrato dilatado no tempo.13"

No campo próprio do direito administrativo, Hely Lopes Meirelles assinala entendimento similar, ao apontar que a prorrogação do contrato "é o prolongamento de sua vigência além do prazo inicial, com o mesmo contratado e nas mesmas condições anteriores. Assim sendo, a prorrogação, que é feita mediante termo aditivo, independe de nova licitação, (...)"14. No mesmo sentido Jessé Torres Pereira Júnior, para quem "na prorrogação, não se cogita de contrato novo; é o antigo contrato que se protrai por determinado período, implementado seu termo final. Logo, as condições serão as originárias do contrato"15.

Trata-se do entendimento desta Assessoria Jurídico-Consultiva. Nos termos da parecer Informação n.º 0347/2012-PGM.AJC, "ao prorrogar-se um ajuste, não se está celebrando novo contrato". Tal posição foi reafirmada posteriormente, nos termos da Informação n.° 0015/2014-PGM.AJC.

Considerado tal premissa, e em conformidade com as posições acima expostas (itens II e IV), extrai-se, como quarta conclusão, a possibilidade, em tese, de prorrogação de contrato administrativo envolvendo pessoa apenada em outra esfera, desde que mantidas as condições originárias da avença. Haja vista o conteúdo da sanção - impedimento de contratar, ou seja, de firmar avença originária dessume-se a inaplicabilidade da vedação. Evidentemente, em casos tais, exige-se da Administração uma fundamentação qualificada, adstrita à existência de interesse público em prorrogar o ajuste com pessoa punida.

VI. CONCLUSÃO

Diante de todo o exposto, sintetizam-se as seguintes conclusões:

  1. As penas de suspensão temporária e declaração de inidoneidade (artigos 87, incisos III e IV, da Lei n.° 8.666/93) aplicadas por outras entidades federativas detêm efeito ex nunc, motivo pelo qual resta afastada a automática rescisão das avenças em vigor firmadas pelo Município de São Paulo;
  2. Quando tais sanções forem aplicadas pelo próprio Município de São Paulo, seja por intermédio da Administração direta ou da indireta, os contratos em vigor devem ser rescindidos, ex vi do art. 29, parágrafo único, da Lei municipal n.° 13.278/02;
  3. A conclusão (i) acima não afasta a possibilidade de que o Município de São Paulo instaure processo visando à rescisão contratual, com assento nos fatos que levaram à aplicação da penalidade por outro ente, desde que remanesça relação de pertinência, sem prejuízo da aferição de outros fatores, entre os quais a proporcionalidade e o atendimento dos interesses fundamentais;
  4. Por fim, na situação descrita na conclusão (i), inexiste impedimento para a prorrogação dos contratos, desde que mantidas as condições originárias. Demais, exige-se da Administração uma fundamentação qualificada, adstrita à existência de interesse público em prorrogar o ajuste com pessoa punida.

A consideração superior, sugerindo-se posterior encaminhamento para a Secretaria Municipal de Gestão, para ciência e divulgação.

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São Paulo, 26 de janeiro de 2017

Rodrigo Bordalo Rodrigues

Procurador Assessor – AJC

OAB/SP 183.508

PGM

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¹De acordo com o entendimento exposto na Informação n.° 0459/2014-PGM.AJC: "O que nos levou ao entendimento oposto ao manifestado pelo TCU não foi qualquer convicção íntima ou entendimento pessoal a respeito do alcance da penalidade, e sim a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça acerca do tema, bem como a jurisprudência que vinha (e vem) se formando no Tribunal de Justiça paulista. Ora, no sistema jurídico brasileiro, cabe ao STJ - e não ao TCU, ao TCM, e muito menos a esta Procuradoria - a última palavra em matéria de interpretação da legislação infraconstitucional. Formando-se jurisprudência pelo alcance, a toda a Administração Pública, da sanção de suspensão do direito de licitar e contratar, resta aos órgãos administrativos aplicar o entendimento jurisprudência], salvo, obviamente, a existência de peculiaridades que afastem certo caso concreto da regra geral. Seria temerário, para qualquer administrador público, interpretar um dispositivo de lei federal em total desconformidade com decisões reiteradas do STJ, especialmente em se tratando de matéria sensível como é a admissão à participação em licitações públicas." (grifo no original)

²Conforme já apontado por esta Assessoria Jurídico-Consultiva no âmbito do parecer ementado sob o n.° 10.116, "o texto deixou perguntas sem respostas. O contrato deverá ser rescindido ainda que quaisquer das penalidades tenham sido aplicadas em decorrência de falta cometida em outro procedimento administrativo do mesmo órgão? de qualquer órgão municipal? de qualquer órgão de qualquer ente político?"

³Por óbvio, tais precedentes jurisprudenciais aplicam-se à suspensão temporária, ante o entendimento desta Procuradoria Geral acerca de seu efeito subjetivo.

4MS 13.101/DF, Ia Seção, Rel. Min. Eliana Calmon, DJ 9/12/2008; MS 13.964/DF, 1ª Seção, Rel. Min. Teori Zavaski, DJe 25/05/2009; AgRg no REsp 1148351/MG, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe 30/03/2010.

5Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos, 15. ed., 2012, p. 1.024. O julgado a que o autor faz referência é o seguinte: EDcl no RESp n° 1.021.851/SP, 2ª Turma, Rel. Min. Eliana Calmon, DJe 06/08/2009.

6Manual de direito administrativo, 2012, 25. ed., p. 726.

7Efeitos da declaração de inidoneidade no âmbito de outros contratos administrativos em vigor, Informativo, Justen, Pereira, Oliveira e Talamini, Curitiba, n.° 32, out.2009.

8Idem.

9Comentários à Lei de Licitações e Contratações da Administração Pública, 5. ed., 2002, p. 710.

10Como, aliás, expressamente aponta Marçal Justen Filho: "Além das hipóteses do art. 78, existem outras, implicitamente previstas na Lei. Assim, deve-se dar aplicação ao disposto no art. 55, inc. XIII. Verificando-se, após a contratação, que o contratante não preenchia ou não preenche mais os requisitos para ser habilitado, deverá promover-se a rescisão do contrato" (Comentários à Lei de Licitações e Contratações da Administração Pública, 5.ed., 2002, p. 985).

11Neste ponto, fora reproduzido ensinamento de Marçal Justen Filho acerca de referido art. 55, inciso XIII, no seguinte sentido: "É necessário identificar uma relação de causalidade entre o problema verificado e a satisfação dos interesses fundamentais que o Estado deve realizar. (...) Tem de admitir-se, portanto, que o dispositivo ora examinado relaciona-se com a concretização de evento que torne, de modo definitivo e irremediável, incompatível com a ordem jurídica a manutenção da contratação de um certo sujeito. Ainda assim, o dispositivo não poderá ser aplicado quando tal importar em danos ao interesse estatal superiores aos advindos da manutenção do vínculo." (Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. São Paulo: Dialética, 2010, p. 714). Nesse sentido, esta PGM-AJC sintetiza: "O autor, como se pode verificar, contempla duas situações gerais nas quais não se recomenda a rescisão do pacto pelo descumprimento da cláusula que determina a manutenção das condições de habilitação: (1) quando o evento não torna, de forma definitiva e irremediável, incompatível a manutenção da contratação; (2) quando a rescisão é capaz de provocar maiores prejuízos ao interesse público do que a manutenção do contrato."

12Evidentemente, a questão não se impõe na hipótese de aplicação de penalidade pelo próprio Município de São Paulo, ante a interpretação extraída do art. 29, parágrafo único, da Lei municipal n.° 13.278/02 (cf. retro analisado).

13Contratos, 12. ed., 1993, p. 146.

14Direito administrativo brasileiro, 34. ed., 2008, p. 237.

15Comentários à Lei de Licitações e Contratações da Administração Pública, 5. ed., 2002, p. 583-4.

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Processo n.° 2009-0.233.431-6

INTERESSADO: CONSÓRCIO VIGILÂNCIA TELEFÔNICA

ASSUNTO: Proposta de rescisão unilateral do Contrato n.° 09/SMSU/2011. Aplicação de penalidade. Efeitos.

Cont. da Informação n° 0090/2017-PGM.AJC

PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO

Senhor Procurador Geral

Encaminho a Vossa Excelência a manifestação da Assessoria Jurídico-Consultiva desta Procuradoria Geral, que acolho, no seguinte sentido:

  1. As penas de suspensão temporária e declaração de inidoneidade (artigos 87, incisos III e IV, da Lei n.° 8.666/93) aplicadas por outras entidades federativas detêm efeito ex nunc, motivo pelo qual resta afastada a automática rescisão das avenças em vigor firmadas pelo Município de São Paulo;
  2. Quando tais sanções forem aplicadas pelo próprio Município de São Paulo, seja por intermédio da Administração direta ou da indireta, os contratos em vigor devem ser rescindidos, ex vi do art. 29, parágrafo único, da Lei municipal n.° 13.278/02;
  3. A conclusão (i) acima não afasta a possibilidade de que o Município de São Paulo instaure processo visando à rescisão contratual, com assento nos fatos que levaram à aplicação da penalidade por outro ente, desde que remanesça relação de pertinência, sem prejuízo da aferição de outros fatores, entre os quais a proporcionalidade e o atendimento dos interesses fundamentais;
  4. Por fim, na situação descrita na conclusão (i), inexiste impedimento para a prorrogação dos contratos, desde que mantidas as condições originárias. Demais, exige-se da Administração uma fundamentação qualificada, adstrita à existência de interesse público em prorrogar o ajuste com pessoa punida.

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São Paulo, 26/01/2017

Tiago Rossi

Coordenador Geral do Consultivo

OAB/SP 195.910

PGM

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Processo n.° 2009-0.233.431-6

INTERESSADO: CONSÓRCIO VIGILÂNCIA TELEFÔNICA

ASSUNTO: Proposta de rescisão unilateral do Contrato n.° 09/SMSU/2011. Aplicação de penalidade. Efeitos.

Cont. da Informação n° 0090/2017-PGM.AJC

SECRETARIA MUNICIPAL DE GESTÃO

Senhor Chefe da Coordenadoria Jurídica

Encaminho o presente à Vossa Excelência, com a manifestação da Assessoria Jurídico-Consultiva desta Procuradoria Geral, que acompanho integralmente, no seguinte sentido:

  1. As penas de suspensão temporária e declaração de inidoneidade (artigos 87, incisos III e IV, da Lei n.° 8.666/93) aplicadas por outras entidades federativas detêm efeito ex nunc, motivo pelo qual resta afastada a automática rescisão das avenças em vigor firmadas pelo Município de São Paulo;
  2. Quando tais sanções forem aplicadas pelo próprio Município de São Paulo, seja por intermédio da Administração direta ou da indireta, os contratos em vigor devem ser rescindidos, ex vi do art. 29, parágrafo único, da Lei municipal n.° 13.278/02;
  3. A conclusão (i) acima não afasta a possibilidade de que o Município de São Paulo instaure processo visando à rescisão contratual, com assento nos fatos que levaram à aplicação da penalidade por outro ente, desde que remanesça relação de pertinência, sem prejuízo da aferição de outros fatores, entre os quais a proporcionalidade e o atendimento dos interesses fundamentais;
  4. Por fim, na situação descrita na conclusão (i), inexiste impedimento para a prorrogação dos contratos, desde que mantidas as condições originárias. Demais, exige-se da Administração uma fundamentação qualificada, adstrita à existência de interesse público em prorrogar o ajuste com pessoa punida.

Após ciência dessa Pasta - a quem se roga divulgação aos órgãos municipais interessados -, solicita-se restituição à Secretaria Municipal de Segurança Urbana.

Passa a acompanhar o TID 15852691.

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São Paulo, 27/01/2017

Ricardo Ferrari Nogueira

Procurador Geral do Município

OAB/SP 175.805

PGM

Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo