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PARECER PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO - PGM Nº 83 de 27 de Janeiro de 2016

Informação n° 0083/2016-PGM-AJC
Empregos públicos na Administração Indireta

TID 14432045

INTERESSADO: Administração

ASSUNTO: Empregos públicos na Administração Indireta

Informação n° 0083/2016-PGM-AJC

PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO

ASSESSORIA JURÍDICO-CONSULTIVA

Senhor Procurador Assessor Chefe

Trata-se de expediente inaugurado a partir da comunicação da SPTuris à Prefeitura de São Paulo, acerca do ajuizamento de ação civil pública pelo Ministério Público Estadual, em face da empresa de economia mista, questionamento a existência válida dos cargos em comissão no âmbito da administração indireta.

No ofício encaminhado a Subsecretaria do Tesouro Municipal da Cidade de São Paulo, há um relatório do processado na ação civil n° 1049059-87.2014.8.26.0053, em trâmite perante a 13a Vara da Fazenda Pública. Há informações, ainda, acerca da ação popular movida por dois ex-empregados da SPTuris, sob n° 1023972-95.2015.8.26.0053, que foi reunida para julgamento conjunto com a Ação Civil Pública.

A SPTuris, ao final, solicita o empenho da Municipalidade para, em conjunto com a empresa, evitar possíveis e nefastas consequências que um provimento da medida judicial pode ocasionar na prática em relação às empresas públicas e de economia mista.

Houve uma deliberação do Comitê de Acompanhamento da Administração Indireta (CAAI) sobre o assunto, que segundo o item 3 da ata de reunião de 28/09/2015, limitou-se à ciência do conteúdo do ofício.

O Sr. Diretor do Departamento de Defesa dos Capitais e Haveres do Município de São Paulo solicitou manifestação da Procuradoria Geral do Município acerca da possibilidade de contratação de comissionados por empresas estatais e os requisitos e cuidados a serem observados para as contratações.

Para instrução do expediente, junta-se a petição inicial do Ministério Público na ação civil pública ajuizada em face da SPTuris, a contestação da empresa de economia mista, bem como outras manifestações que entendemos pertinentes à fundamentação da conclusão da Procuradoria Geral do Município.

É o relatório do presente.

Preliminarmente, dos fundamentos da ação civil pública extrai-se a conclusão, salvo melhor juízo, simplista, de vedação do cargo ou emprego em comissão na Administração Indireta, que implica a admissão de trabalhadores sem o prévio concurso público, salvo para os membros dos Conselhos de Administração e Fiscal, bem como da Diretoria Executiva.

A conclusão reputada simplista porque decorre da interpretação literal do artigo 37, II da Constituição Federal, sem compatibilizar o dispositivo com os artigos 61, II, a, 173, § 1o, II, todos da Constituição Federal e artigo 19, § 2o, do ADCT.

Notemos que o artigo 37, II da Constituição Federal ao estabelecer a regra geral do concurso público para investidura no cargo ou emprego público, faz a ressalva para as "nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração".

Por se limitar a mencionar cargo em comissão, a primeira conclusão que se extrai é que para o emprego público não há previsão de livre nomeação e exoneração de servidor/trabalhador para uma função de confiança.

O artigo 37, V, da Constituição Federal, por sua vez, esclarece que as funções de confiança e os cargos em comissão destinam-se apenas às atribuições de direção, chefia e assessoramento, estabelecendo a ocupação da seguinte forma: as funções de confiança, só podem ser exercidas por servidores ocupantes dos cargos efetivos; os cargos em comissão podem ser preenchidos por servidores de carreira nos casos, condições e percentuais mínimos previstos em lei.

Assim é que, se todos os cargos dependem de lei para a sua criação, o cargo em comissão depende da lei para ser criado, assim como para estabelecer suas condições de provimento.

Da leitura conjunta com o artigo 173 da Constituição Federal, a interpretação que parece fiel à intenção do legislador constituinte é que a Empresa Pública ou a Sociedade de Economia Mista dependem de Lei autorizando sua criação. A regra geral para o regime jurídico dos trabalhadores da Empresa Pública e da Sociedade de Economia Mista é o trabalhista, regido pela CLT.

Como regra suplementar devemos nos voltar ao artigo 37, II, da CF e estabelecer que a regra para a contratação dos trabalhadores, sob o regime celetista é a realização prévia de concurso.

Daí a concluir pela impossibilidade de existência de cargos dentro da empresa que se destinam exatamente às atribuições de direção, chefia e assessoramento, previstas no artigo 37, V, da CF, que possam ser preenchidos a partir de uma relação de confiança não parece ser adequada, mormente se tomarmos como cenário a atividade econômica muitas vezes desenvolvida pelas empresas públicas e sociedades de economia mista, em regime de livre concorrência com empresas privadas. Não se justifica, pois, a rigidez maior do legislador constituinte com os empregos públicos do que em relação aos cargos públicos, como pretende a interpretação do Ministério Público na argumentação da ação civil pública.

Note-se que o princípio tutelado pelo concurso público é o princípio da isonomia. Pretende-se dar oportunidade a todos os que preenchem as condições exigidas pelo cargo ou emprego a concorrer pela vaga. A seleção deve ser objetiva, de forma a espancar qualquer dúvida quanto a opção por um candidato em detrimento de outro.

Assim sendo, os cargos em comissão consistem numa exceção constitucional à regra que visa garantir a isonomia. Se a exceção é possível para a Administração Direta, que trata de atribuições eminentemente estatais, por que não seria possível no âmbito da Administração Indireta, para as empresas públicas e sociedades de economia mista que têm regime jurídico próprio das empresas privadas e por vezes com elas assumem um papel de concorrência?

Nesse sentido, a Constituição Federal, em outras passagens dá o tom de que é possível a existência de postos de trabalho no âmbito das empresas públicas e sociedades de economia mista que possibilitem a admissão sem concurso e a demissão "ad nutum" de servidores que tenham atribuições de direção, chefia e assessoramento, como por exemplo no artigo 54 da CF:

"Art. 54. Os Deputados e Senadores não poderão:

I - desde a expedição do diploma:

a) firmar ou manter contrato com pessoa jurídica de direito público, autarquia, empresa pública, sociedade de economia mista ou empresa concessionária de serviço público, salvo quando o contrato obedecer a cláusulas uniformes;

b) aceitar ou exercer cargo, função ou emprego remunerado, inclusive os de que sejam demissíveis ad nutum, nas entidades constantes da alínea anterior."

Outro exemplo, mais direto é o artigo 19, §2° do ADCT:

Art. 19. Os servidores públicos civis da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, da administração direta, autárquica e das fundações públicas, em exercício na data da promulgação da Constituição, há pelo menos cinco anos continuados, e que não tenham sido admitidos na forma regulada no art. 37, da Constituição são considerados estáveis no serviço público.

(...)

§ 2o. O disposto neste artigo não se aplica aos ocupantes de cargos, funções e empregos de confiança ou em comissão, nem aos que a lei declare de livre exoneração, cujo tempo de serviço não será computado para os fins do caput deste artigo, exceto se se tratar de servidor."

Com efeito, concluímos assim como a SPTuris, no âmbito de sua contestação que as referência explícitas a "emprego em comissão" nos mencionados dispositivos, conduzem à interpretação de que a expressão "cargo em comissão" prevista no artigo 37, II, da CF refere-se ao sentido lato, no qual se insere o emprego público. Dessa feita, possível existência válida de empregos públicos, com características dos cargos públicos em comissão, destinados exclusivamente às atribuições de direção, chefia e assessoramento.

Importante frisar que a posição encontra resistência no Ministério Público do Trabalho.

Quanto aos requisitos para a existência, notemos que para os casos de cargos público em comissão, não há dúvida quanto a necessidade de lei para criação e definição das condições para provimento. Ocorre que a disciplina das empresas de economia mista observa outro regramento.

O artigo 37, XIX da Constituição Federal estabelece que: "somente por lei específica poderá ser criada autarquia e autorizada a instituição de empresa pública, de sociedade de economia mista e de fundação, cabendo à lei complementar, neste último caso, definir as áreas de sua atuação".

Convém ressaltar que o dispositivo constitucional exigiu lei para autorizar a instituição de sociedade de economia mista. Também a Lei 6404/76, no artigo 236 invoca a necessidade de autorização legal. No caso em apreço, mesmo se tratando de empresa de economia mista anterior à Constituição Federal, tem-se a autorização legal para a participação majoritária do Município de São Paulo, conforme se depreende da Lei 8180/74.

Vale ressaltar, ainda, que não se exige lei para criação do emprego público a ser preenchido através de seleção por concurso público, tal como os cargos públicos propriamente ditos. Entendemos que a mesma regra deve ser estendida aos demais empregos públicos providos a partir da confiança para as funções de direção, chefia e assessoramento.

Considerando tratar-se de sociedade constituída sob a forma de sociedade anônima, a Sociedade de Economia Mista observa as diretrizes da Lei 6.404/76 e sujeição ao artigo 173 da Constituição Federal. Coerente, portanto o sistema jurídico com as finalidades da pessoa jurídica de direito privado, que desenvolve atividade econômica: deve regrar-se pelas exigências do mercado, a fim de alcançar os objetivos primordinais da empresa, para os quais foi criada.

Ante o exposto, orientando-se pelo disposto na Lei das Sociedades por ações:

Art. 143. A Diretoria será composta por 2 (dois) ou mais diretores, eleitos e destituíveis a qualquer tempo pelo conselho de administração, ou, se inexistente, pela assembléia-geral, devendo o estatuto estabelecer:

I - o número de diretores, ou o máximo e o mínimo permitidos;

II - o modo de sua substituição;

III - o prazo de gestão, que não será superior a 3 (três) anos, permitida a reeleição;

IV - as atribuições e poderes de cada diretor.

§ 1o Os membros do conselho de administração, até o máximo de 1/3 (um terço), poderão ser eleitos para cargos de diretores.

§ 2o O estatuto pode estabelecer que determinadas decisões, de competência dos diretores, sejam tomadas em reunião da diretoria. 

(...)

Art. 235. As sociedades anônimas de economia mista estão sujeitas a esta Lei, sem prejuízo das disposições especiais de lei federal.

§ 1o As companhias abertas de economia mista estão também sujeitas às normas expedidas pela Comissão de Valores Mobiliários.

§ 2o As companhias de que participarem, majoritária ou minoritariamente, as sociedades de economia mista, estão sujeitas ao disposto nesta Lei, sem as exceções previstas neste Capítulo.(grifos nossos).

Constituição e Aquisição de Controle

Art. 236. A constituição de companhia de economia mista depende de prévia autorização legislativa.

Conselho Fiscal

Art. 240. O funcionamento do conselho fiscal será permanente nas companhias de economia mista; um dos seus membros, e respectivo suplente, será eleito pelas ações ordinárias minoritárias e outro pelas ações preferencias, se houver.

Nessa esteira, a partir do estatuto vigente da São Paulo Turismo S/A extraímos do artigo 29, que compete privativamente ao Diretor Presidente da São Paulo Turismo "definir a estrutura organizacional da empresa, funções, cargos e atribuições de cada unidade administrativa", bem como "admitir, promover, transferir, licenciar, punir e dispensar os funcionários da empresa, bem como, conceder aumentos de salários e atribuir gratificações, abonos ou auxílios, observando o regulamento próprio e a legislação pertinente.".

No que se refere às Sociedades de Economia Mista, sabemos que sua constituição se dá necessariamente pela adoção da forma de sociedade anônima. Quanto às empresas estatais, podem assumir qualquer forma prevista no ordenamento jurídico para a constituição de sociedade. Oportuno citar as lições de Maria Sylvia Zanella Di Pietro1 a respeito:

"Quanto à forma de organização, o artigo 5o do Decreto-lei n° 200/67 determina que a sociedade de economia mista seja estruturada sob a forma de sociedade anônima e, a empresa pública, sob qualquer das formas admitidas em direito: isso decorre que a primeira é sempre sociedade comercial e a segunda pode ser civil ou comercial."

Neste caso, o instrumento de regência será, da mesma forma, as leis aplicáveis à sociedade, bem como seu instrumento constitutivo.

Com efeito, ao que parece o ordenamento jurídico dispensou a edição de lei específica para a criação de cargos em sociedade de economia mista. Na prática, tem-se uma autonomia administrativa da sociedade. É o entendimento do Ministério Público de Contas do Distrito Federal, pelo TRT do Distrito Federal com o qual esta Procuradoria Geral do Município comunga.

Ademais, vale destacar que a criação de "cargos em comissão" no âmbito das Sociedades de Economia Mista não é tão aleatória ou arbitrária como pretendem fazer crer.

Além do respeito à Lei das Sociedades por Ações e a responsabilidade dos administradores na condução dos negócios societários, há o acompanhamento da Administração Direta Municipal quanto as deliberações mais importantes no âmbito da Companhia.

É importante destacar o Decreto 53.687/13, que criou a Junta Orçamentário-Financeira, e no artigo 1o, X, "h", com a redação atribuída pelo Decreto 53.916/13 estabeleceu a competência para a JOF deliberar sobre propostas da Administração Indireta referente a quantitativo de pessoal próprio, acordo ou convenção coletiva de trabalho, programa de desligamento de empregados, planos de cargos e salários, criação e remuneração de cargos comissionados, inclusive os de livre nomeação e exoneração, e participação dos empregados nos lucros ou resultados das empresas.

Também com a intenção de maior controle sobre a gestão das empresas controladas pelo Poder Público Municipal foi criado o Comitê de Acompanhamento da Administração Indireta, através do Decreto 53.916/13, ao qual compete a análise prévia das questões a serem submetidas à JOF.

Com efeito, não é aleatória a criação de um cargo de livre provimento no âmbito da Sociedade de Economia Mista, cujos gestores têm responsabilidades legais e seus planos de gestão são submetidos constantemente ao crivo do Poder Executivo. No mais, entende-se que se não é necessária lei para criação dos empregos públicos em geral, não há que se falar em lei para os empregos públicos de livre provimento, que deverão respeitar, todavia, os critérios da Constituição Federal, quais sejam, destinar-se às atribuições de direção, chefia e assessoramento.

Apontamos de outro lado, que a posição ora adotada não é pacífica na jurisprudência que ainda não se consolidou a respeito. Assim, é possível que no futuro não muito distante a Administração tenha que vir a se ajustar ao posicionamento que restar consolidado nos Tribunais, mas por ora, entendemos defensável a sistemática das empresas públicas e sociedades de economia mista no âmbito do Município de São Paulo, desde que os cargos de livre provimento respeitem os critérios da Constituição Federal, que seriam os mesmos a serem observados se eventual lei fosse editada a respeito.

Submetemos, portanto, o presente à análise da Superior Administração que melhor deliberará a respeito.

 

São Paulo, 27/01/2016

TATIANA BATISTA MALATESTA

Procuradora Assessora - AJC

OAB/SP 249.209

PGM

 

De acordo.

São Paulo, 28/01/2016.

TIAGO ROSSI

PROCURADOR ASSESSOR CHEFE- AJC

OAB/SP 195.910

PGM

1 in Direito Administrativo, Editora Atlas, 28a Edição. São Paulo, 2015, p. 557.

 

 

TID n° 14432045

INTERESSADO: Administração

ASSUNTO: Empregos públicos na Administração Indireta

Cont. da Informação n° 0083/2016-PGM.AJC

SNJ/GAB

Senhor Secretário

Encaminho o presente para ciência da manifestação da Assessoria Jurídico-Consultiva da Procuradoria Geral do Município, que acompanho, no tocante a consulta formulada pela Junta Orçamentário-Financeira, ressaltando a possibilidade de futura consolidação jurisprudencial a respeito do tema implicar revisão da sistemática de cargos públicos no âmbito da Administração Indireta Municipal.

 

São Paulo, 12/02/2016.

ANTÔNIO CARLOS CINTRA DO AMARAL FILHO

PROCURADOR GERAL DO MUNICÍPIO

OAB/SP n° 162.363

PGM

 

Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo