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PARECER PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO - PGM Nº 11.655 de 27 de Maio de 2014

EMENTA N° 11.655 
Emenda n° 36 à Lei Orgânica do Município. Alteração do artigo 88 da LOM, dispondo sobre as atribuições da Guarda Civil Metropolitana e sobre a aposentadoria de seus integrantes. Instituição de aposentadoria especial, com proventos integrais e paridade. Violação ao disposto no artigo 40 da Constituição Federal e na Lei Federal n° 9.717/98. Vício de iniciativa. Matéria que não se insere na competência legislativa do Município. Inconstitucionalidade.

processo 2013-0.378.867-1

INTERESSADA: CÂMARA MUNICIPAL DE SÃO PAULO

ASSUNTO: Emenda n° 36 à LOM. Alteração do artigo 88, dispondo sobre as atribuições da Guarda Civil Metropolitana e sobre a aposentadoria de seus integrantes. Análise da viabilidade jurídica do cumprimento. Implicações em decorrência do disposto no artigo 40 da Constituição Federal e na Lei Federal n° 9.717/98.

Informação n° 831/2014-PGM.AJC

PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO

ASSESSORIA JURÍDICO-CONSULTIVA

Senhor Procurador Assessor Chefe

1 - No dia 17/12/2013, a Câmara Municipal promulgou a Emenda n° 36 à Lei Orgânica do Município, decorrente do Projeto de Emenda à Lei Orgânica do Município n° 16/2011, de autoria dos Vereadores Abou Anni e Edir Salis, conferindo nova redação ao art. 88 da LOM, que passou a dispor sobre as atribuições da Guarda Civil Metropolitana e sobre a aposentadoria especial dos seus integrantes.

O art. 88 da LOM, em sua redação originária, dispunha apenas que "O Município poderá, mediante lei, manter Guarda Municipal, subordinada ao Prefeito e destinada à proteção dos bens, serviços e instalações municipais".

A nova redação, conferida pela Emenda n° 36 à LOM, passou a ser a seguinte:

Art. 88. O Município manterá sua Guarda Municipal, a qual se denomina Guarda Civil Metropolitana, destinada à proteção da população da cidade, dos bens, serviços e instalações municipais, e para a fiscalização de posturas municipais e do meio ambiente.

§ 1°. Os seus integrantes serão aposentados, de forma voluntária, nos termos do art. 40, § 49, II e III, da Constituição da República, sem limite de idade, com paridade e integralidade do último salário que receber, desde comprovem:

I - 25 (vinte e cinco) anos de contribuição, contando com pelo menos 15 (quinze) anos de efetivo exercício em cargo da Carreira de Guarda Civil Metropolitano, para mulher;

II - 30 (trinta) anos de contribuição, contando com pelo menos 20 (vinte) anos de efetivo exercício em cargo da Carreira de Guarda Civil Metropolitano, para homem,

§ 2°. A Guarda Civil Metropolitana poderá exercer dentro de suas funções a segurança e proteção nas escolas públicas municipais, no âmbito da cidade de São Paulo.

A Assessoria Técnico-Legislativa de SGM solicitou o pronunciamento de SEMPLA acerca da viabilidade jurídica do cumprimento do texto aprovado pelo Legislativo (fl. 23).

Inicialmente, foi registrada manifestação anterior da Assessoria Jurídica do Departamento de Recursos Humanos acerca do Substitutivo ao Projeto de Emenda à LOM n° 16/2011, o qual havia suprimido do texto original em discussão apenas a competência da Guarda Civil Metropolitana para a fiscalização do trânsito. Na ocasião, o DERH observou que a projeto pretendia acrescentar atribuições de natureza policial à GCM, extrapolando a norma contida no art. 144, § 8°, da Constituição Federal. Observou, também, que a aposentadoria especial dos integrantes da corporação contrariava os ditames do art. 40 da Constituição, que o Supremo Tribunal Federal já havia definido ser de observância obrigatória pelos Estados-membros. Apontou, por fim, vício de iniciativa na propositura da Câmara, na medida em que a Constituição atribuiu à União competência privativa para legislar sobre seguridade social (art. 22, XXIII) e competência concorrente com os Estados e o Distrito Federal para legislar sobre previdência social (art. 23, XII). Por tudo isso, a propositura seria inconstitucional (fls. 25/28).

Em seu pronunciamento de fls. 35/37, SEMPLA/ATEG pontuou que, sob o aspecto formal, o Supremo Tribunal Federal ainda discute - em sede de repercussão geral (RE 598.259/MG) - a competência do Poder Legislativo municipal para dispor, de forma originária na LOM e por iniciativa própria, sobre vantagens destinadas a servidores municipais, considerando a prerrogativa conferida ao Poder Executivo no art. 61, § 1°, I, alíneas "a", "b" e "c". A competência derivada seria, pois, igualmente questionável. No mérito, acrescentou que a integralidade e a paridade dos proventos são benefícios excepcionais que as regras de transição contidas nas Emendas n° 20/98, 41/03 e 47/05 asseguram apenas aos servidores que já se encontravam no serviço público quando das respectivas promulgações. As modalidades de aposentadoria previstas no art. 40 da Constituição (em seu corpo permanente) não contemplam paridade nem integralidade dos proventos, e não caberia ao Município ampliar ou estender garantias constitucionais a servidores por ela não favorecidos. Além disso, incidiria na espécie a proibição contida no art. 5°, parágrafo único, da Lei n° 9.717/98, que veda a concessão de aposentadoria especial, nos termos do § 4° do art. 40 da Constituição Federal, até que lei complementar federal discipline a matéria. O ente que infringir esta regra estará sujeito a sanções como a não obtenção de Certificado de Regularidade Fiscal e a suspensão de transferências voluntárias de recursos federais, entre outras. Assim, conclgiu que o texto aprovado pela Emenda à Lei Orgânica n° 36 estaria em desacordo com as disposições constitucionais e legais sobre a matéria.

Foi solicitada a manifestação do IPREM, que ratificou os pronunciamentos anteriores quanto à inconstitucionalidade da nova redação atribuída ao art. 88 da LOM, no que se refere à aposentadoria especial, por violação aos dispositivos constantes do art. 40 da Constituição Federal (fls. 36/39).

Sobreveio nova manifestação de SEMPLA/ATEG, que desta vez acrescentou que o Ministro da Previdência Social aprovou, por meio da Portaria MPS n° 264, de 28/05/2013, o Parecer n° 16/2013/CONJUR-MPS/CGU/AGU, por meio do qual a Advocacia Geral da União, revendo seu posicionamento anterior, conferiu nova interpretação à norma contida no parágrafo único do art. 5° da Lei n° 9.717/98. O novo entendimento orienta-se no sentido de que "a vedação do art. 5°, parágrafo único, da Lei n° 9.717/98, tem validade apenas no âmbito federal e não impede que os demais entes federativos legislem sobre a aposentadoria especial de seus servidores públicos com base no art. 24, § 3°, c/c art. 30, incisos I e II, da CF/88", ficando ressalvado que "quando do advento da lei complementar federal a que se refere o art. 40, § 4° da CF/88, as normas estaduais, distritais e municipais em sentido contrário terão as respectivas eficácias suspensas, conforme o art. 24, § 4°, da CF/88" (fls. 64/65). Observou-se, ainda, que tramita no Congresso Nacional o Projeto de Lei Complementar n° 554/2010, que regulamenta a aposentadoria especial do servidor que exerce atividade de risco (fl. 65v°).

Por fim, SEMPLA-COJUR ressaltou que aparentemente não foi considerada a necessidade legal de preservação do equilíbrio financeiro e atuarial do Regime Próprio de Previdência Social (fl. 66).

Tendo sido solicitada a manifestação desta Procuradoria Geral, passo ao exame.

2 - A Emenda n° 36 à Lei Orgânica do Município de São Paulo padece do vício de inconstitucionalidade, como foi bem exposto nas manifestações precedentes.

A questão afigura-se de grande complexidade, impondo-se o seu exame detalhado.

A Lei Orgânica promulgada em 1990 previa em seu art. 88 que "O Município poderá, mediante lei, manter Guarda Municipal, subordinada ao Prefeito e destinada à proteção dos bens, serviços e instalações municipais". A Guarda Civil Metropolitana, vale observar, havia sido criada em 1986 pela Lei n° 10.115, ao passo que a carreira de Guarda Civil Metropolitana fora criada pela Lei n° 10.272/87.

As atribuições da Guarda Civil Metropolitana foram fixadas no art. 1° da lei n° 13.866/2004, a saber:

Art. 1°. A Guarda Civil Metropolitana de São Paulo, principal órgão de execução da po|ítica municipal de segurança urbana, de natureza permanente, uniformizada, armada, baseada na hierarquia e disciplina, tem as seguintes atribuições:

I - exercer, no âmbito do Município de São Paulo, o policiamento preventivo e comunitário, promovendo a mediação de conflitos e o respeite aos direitos fundamentais dos cidadãos;

II - prevenir e inibir atos que atentem contra os bens, instalações e serviços municipais, priorizando a segurança escolar;

III - realizar atividades preventivas voltadas à segurança de trânsito, nas vias e logradouros municipais;

IV - proteger o patrimônio ecológico, cultural, arquitetônico e ambiental do Município, adotando medidas educativas e preventivas;

V - promover, em parceria com as comissões civis comunitárias, mecanismos de interação com a sociedade civil, a fim de identificar soluções para problemas e implementar projetos locais voltados à melhoria das condições de segurança nas comunidades;

VI - atuar, em parceria com outros Municípios e órgãos estaduais e da União, com vistas à implementação de ações integradas e preventivas;

VII - atuar, de forma articulada com os órgãos municipais de políticas sociais, visando a ações interdisciplinares de segurança no Município, em conformidade com as diretrizes e políticas estabelecidas pela Secretaria Municipal de Segurança Urbana;

VIII - estabelecer integração com os órgãos de poder de polícia administrativa, visando a contribuir para a normatização e a fiscalização das posturas e ordenamento urbano municipal;

IX - fiscalizar o comércio ambulante nas vias e logradouros públicos;

X - intervir, gerenciar e mediar conflitos e crises em bens, serviços e instalações municipais ou relacionadas ao exercício de atividades controladas pelo poder público municipal.

Os incisos I e IX do art. 1° foram questionados por meio de ações direta de inconstitucionalidade. O Tribunal de Justiça julgou improcedente a ADIn 115.604-0/3, que questionava, entre outras, a atribuição contida no inciso IX do art. 1° ("fiscalizar o comércio de ambulantes nas vias e logradouros públicos"). No tocante à fiscalização do comércio de ambulantes, também a ADIn 0244740-79.2011.8.26.0000, que dizia respeito ao Decreto n° 52.432/11 e à Resolução n° 01/2011-GABSEG-PREF/2011, foi julgada improcedente pelo Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo. Todavia, foi julgada procedente a ADIn 154.743-0/0, na qual o Órgão Especial do Tribunal de Justiça declarou a inconstitucionalidade do inciso I do art. 1° ("exercer, no âmbito do Município de São Paulo, o policiamento preventivo e comunitário, promovendo a mediação de conflitos e o respeito aos direitos fundamentais dos cidadãos"). A Câmara Municipal interpôs recurso extraordinário (RE 608.588), no qual o Supremo Tribunal Federal reconheceu a repercussão geral do tema (656): "Limites da atuação legislativa local para disciplinar as atribuições das guardas municipais destinadas á proteção de bens, serviços e instalações do município1".

Assim, no tocante às atribuições conferidas à Guarda Civil Metropolitana na nova redação do "caput" do art. 88 da LOM ("proteção da população da cidade, dos bens, serviços e instalações municipais, e para a fiscalização de posturas municipais e do meio ambiente"), é preciso levar em conta que ainda pende de decisão do STF os limites da atuação legislativa local para disciplinar as atribuições das guardas municipais (tema 656), sendo certo que o Tribunal de Justiça de São Paulo já declarou a inconstitucionalidade do dispositivo legal que atribuiu à GCM a competência para exercer o policiamento preventivo e comunitário, embora o v. acórdão não tenha transitado em julgado (ADIn 154.743-0/0).

3 - Feita esta observação inicial, passo então ao exame dos aspectos previdenciários da Emenda n° 36 à LOM, que instituiu um novo benefício a ser concedido pelo Regime Próprio de Previdência Social do Município de São Paulo - qual seja, a aposentadoria especial dos integrantes da Guarda Civil lyietropolitana, com proventos integrais e paridade.

Aos servidores titulares de cargos efetivos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fundações, a Constituição Federal assegurou, no seu art. 40, "regime de previdência de caráter contributivo e solidário, mediante contribuição do respectivo ente público, dos servidores ativos e inativos e dos pensionistas, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial e o disposto neste artigo".

A própria Constituição deixou claro, no § 1° do art. 40, que os servidores efetivos "serão aposentados, calculados os seus proventos a partir dos valores fixados na forma dos §§ 3° e 172: I - por invalidez permanente, sendo os proventos proporcionais ao tempo de contribuição, exceto se decorrente de acidente em serviço, moléstia profissional ou doença grave, contagiosa ou incurável, na forma da lei; II - compulsoriamente, aos setenta anos de idacje, com proventos proporcionais ao tempo de contribuição; III - voluntariamente, desde que cumprido tempo mínimo de dez anos de efetivo exercício no serviço público e cinco anos no cargo efetivo em que se dará a aposentadoria, observadas as seguintes condições: a) sessenta anos de idade e trinta e cinco de contribuição, se homem, e cinqüenta e cinco anos de idade e trinta de contribuição, se mulher; b) sessenta e cinco anos de idade, se homem, e sessenta anos de idade, se mulher, com proventos proporcionais ao tempo de contribuição3. Esta, pois, a regra geral, prevista no corpo permanente da Constituição: aposentadoria voluntária com proventos calculados pela média das contribuições, sem paridade.

Vale destacar, aqui, que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é firme no sentido de gue "entre os princípios de observância obrigatória pela Constituição e pelas Leis dos Estados-membros, se encontram os contidos no artigo 40 da Carta Magna Federal (assim, nas ADINs 101, 178 e 755)" (STF-Tribunal Pleno, ADI 369/ES, Rel. Min. Moreira Alves, julg. 09/12/1998, DJ 12/03/1999). Justamente por isso, a Constituição do Estado de São Paulo reproduz, no seu art. 126i, as disposições do art. 40 da Carta Magna. Da mesma forma, a Lei Orgânica do Município prevê expressamente, no parágrafo único do seu art. 96, a aplicação do disposto nos artigos 40 e 41 da Constituição da República aos servidores ocupantes de cargo público da administração direta, das autarquias e das fundações.

Aos servidores efetivos a Constituição vedou "a adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria", ressalvados - "nos termos definidos em leis complementares" - apenas os portadores de deficiência, os que exerçam atividades de risco e aqueles cujas atividades sejam exercidas em condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física (art. 40, § 4°). É assente que a aposentadoria especial desses últimos depende da edição de lei complementar, e neste sentido a Lei Federal n° 9.717/98 (que estabeleceu regras gerais para a organização e o funcionamento dos regimes próprios de previdência social dos servidores públicos) vedou expressamente "a concessão de aposentadoria especial, nos termos do § 4° do art. 40 da Constituição Federal, até que lei complementar federal discipline a matéria" 4. Registro que esta questão já foi abordada por esta Assessoria na informação n° 1.167/2011, proferida no processo administrativo 2010-0.249.970-0.

O Supremo Tribunal Federal já reconheceu, em centenas de mandados de injunção, a mora do legislador federal em editar as leis complementares previstas no § 4° do 40 da Constituição, todas elas de iniciativa privativa do Presidente da República. Até que sejam editadas tais leis complementares (de caráter nacional), a aposentadoria especial dos servidores efetivos deve observar a norma prevista no art. 57 da Lei n° 8.213/91. Neste sentido, confira-se recentíssima decisão proferida pelo Plenário do STF:

CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO MANDADO DE INJUNÇÃO. APOSENTADORIA ESPECIAL DE SERVIDOR PÚBLICO MUNICIPAL. NECESSIDADE DE ATUAÇÃO NORMATIVA DA UNIÃO. ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL CORRENTE NO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL PELO RECONHECIMENTO DA OMISSÃO DO LEGISLADOR NA CONCRETIZAÇÃO DO ART. 40, § 4°, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. APLICABILIDADE DO ART. 57 DA LEI FEDERAL N° 8.213/91 ATÉ QUE SpBREVENHAM AS LEIS COMPLEMENTARES QUE REGULAMENTEM O CITADO DISPOSITIVO CONSTITUCIONAL. EFICÁCIA DO DIREITO À APOSENTADORIA ESPECIAL QUE EXIGE REGULAMENTAÇÃO MEDIANTE LEI COMPLEMENTAR DE INICIATIVA PRIVATIVA DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA.

1. A aposentadoria especial de servidor público cujas atividades sejam exercidas sob condições que prejudiquem a saúde ou a integridade física é assegurada medianje o preenchimento dos requisitos do art. 57 da Lei Federal n° 8.213/91, até que seja editada a lei complementar exigida pelo art. 40, § 4°, da Constituição Federal. Precedentes do STF: Ml 721/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, Tribunal Pleno, DJe 30/11/2007, Ml 795/DF, Rel. Min. Cármen Lúcia, Tribunal Pleno, DJe 22/5/2009, e ARE 727.541-AgR/MS, Rei. Min. Marco Aurélio, 1§ Turma, DJe de 24/4/2013.

2. A competência concorrente para legislar sobre previdência dos\ servidores públicos não afasta a necessidade da edição de norma regulamentadora de caráter nacional, cuja competência é da União. Precedente. 3. Agravo regimental improvido.

(STF-Tribunal Pleno, Ml 5598 AgR/DF, Rel. Min. Luiz Fux, julg. 10/04/2014, DJe 25/04/2014).

Discrepando dessa jurisprudência pacífica do STF, o Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo já admitiu haver mora do legislador municipal em regulamentar a aposentadoria especial, tal como foi exposto na já mencionada informação n° 1.167/2011-PGM.AJC:

MANDADO DE INJUNÇÃO - SERVIDOR PÚBLICO MUNICIPAL - GUARDA CIVIL METROPOLITANO - DIREITO A APOSENTADORIA ESPECIAL -PREVISÃO CONSTITUCIONAL - OMISSÃO LONGEVA E INJUSTIFICADA DO PREFEITO MUNICIPAL EM PROPOR PROJETO DE LEI REGULAMENTANDO A NORMA CONSTITUCIONAL DE EFICÁCIA LIMITADA - ORDEM CONCEDIDA COM EFEITO "ERGA OMNES".

"A Lei Orgânica do Município de São Paulo prevê a aplicação do disposto no artigo 40, da Constituição Federal, desde o ano de 2001, quando editada a Emenda n° 24. Destarte, seja porque o direito a aposentadoria especial já existia desde a Emenda Constitucional n° 20, de 15.12.98, seja porque a condição de risco como fator de diferenciação foi encampado automaticamente com a supervesniência da Emenda Constitucional n° 47, de 07.07.05, teve o chefe do executivo municipal tempo suficiente para implementar a necessária regulamentação. Nesse caso, reconhecida a mora do legislador municipal, tem-se que a posição concretista geral, em casos envolvendo interesses multitudinários, é a melhor solução a ser adotada pelo Poder Judiciário. A uma, porque os efeitos erga omnes advindos do Mandado de Injunção não ofendem a tripartição dos poderes em razão de sua natureza precária, isto é, subsistem até que o legislador implemente a regulamentação necessária e, a duas, porque, uma vez reconhecido o direito sobre o qual versa a injunção, "não faz sentido remeter todos os servidores que venham a se encontrar na mesma condição para a via judicial".

(TJSP-Órgão Especial, Mandado de Injunção ns 994.09.231479-8, Rel. Des. Artur Marques, julg. 04/08/2010)


Todavia, mesmo este único precedente do Tribunal local admite ser privativa do Prefeito a iniciativa do projeto de lei destinado a regulamentar a aposentadoria especial dos integrantes da Guarda Civil Metropolitana. Vale dizer: quando muito, o Prefeito poderia dispor da matéria mediante projeto de lei de sua iniciativa. Nem poderia ser diferente; afinal, seguindo - por simetria - a norma do art. 61, § 1°, II, "c", da Constituição Federal, a Lei Orgânica do Município prevê a iniciativa privativa do Prefeito para as leis que 'disponham sobre "servidores públicos municipais, seu regime jurídico, provimento de cargos, estabilidade e aposentadoria"(art. 37, § 2°, III)5

Na espécie, a aposentadoria especial dos integrantes da GCM, com paridade e integralidade, foi estabelecida à revelia do Chefe do Executivo Municipal, por meio da Emenda n° 36 à Lei Orgânica do Município, decorrente do Projeto de Emenda à Lei Orgânica do Município n° 16/2011, de autoria de apenas dois vereadores. Não bastasse o patente vício de iniciativa, vislumbra-se, também, flagrante violação da norma contida no art. 36, I, da própria LOM, que exige proposta de 1/3 (um terço), no mínimo, dos membros da Câmara Municipal para apresentação de proposta de emenda à LOM.

Ademais, uma vez que o Supremo Tribunal Federai definiu que a regulamentação da aposentadoria especial dos servidores efetivos deverá ser feita "mediante lei complementar de iniciativa privativa do Presidente da República", resta evidente a falta de competência do Município para legislar sobre a matéria - que demanda, como visto, "norma regulamentadora de caráter nacional" (Ml 5598 AgR/DF).

Neste sentido, registro a recente aprovação, pelo Supremo Tribunal Federal, na Sessão Plenária de 09/04/2014 (DJe 24/04/2013), da Súmula Vinculante 33: "Aplicam-se ao servidor público, no que couber, as regras do regime geral da previdência social sobre aposentadoria especial de que trata o artigo 40, § 4° inciso III da Constituição Federal, até a edição de lei complementar específica".

Além disso, inafastável o argumento - bem desenvolvido por SEMPLA - no sentido de que a integralidade e a paridade dos proventos são benefícios excepcionais que as regras de transição contidas nas Emendas n° 20/98, 41/03 e 47/05 asseguram apenas aos servidores que já se encontravam no serviço público quando das respectivas promulgações. Uma vez que tais benefícios não estão previstos no art. 40 da Constituição Federal, de observância obrigatória por todos os entes da federação, não pode a Lei Orgânica concedê-los apenas aos integrantes da Guarda Civil Metropolitana6.

Igualmente pertinente a observação feita por SEMPLA no sentido de que o art. 40 da Constituição Federal impõe aos Regimes Próprios de Previdência Social a observância de "critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial e o disposto neste artigo", o que é reafirmado no art. 1° da Lei n° 9.717/98. No caso, não há notícia de que a aposentadoria especial instituída no art. 88 da LOM tenha sido precedida de estudos atuariais que assegurem o equilíbrio do regime.

Por fim, cabe destacar que o Projeto de Lei Complementar que tramita no Congresso Nacional, destinado a regulamentar o inciso II do § 4° do art. 40 da Constituição, considera atividades que exponham o servidor a risco contínuo apenas a de polícia e a exercida no controle prisional, carcerário ou penitenciário, nelas não incluindo os guardas municipais (fls. 61/63).

4 - Diante do exposto, acompanhando as manifestações precedentes cjo DERH, de SEMPLA e do IPREM, entendo que a Emenda n° 36 à Lei Orgânica do Município padece de patente inconstitucionalidade (mesmo frente às disposições da Constituição do Estado de São Paulo, que reproduz em seu art. 126 as normas de observância obrigatória do art. 40 da Constituição Federal), motivo pelo qual opino pelo ajuizamento de ação direta de inconstitucionalidade.

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São Paulo, 27/05/2014.

LUIZ PAULO ZERBINI PEREIRA

 Procurador Assessor - AJC

OAB/SP 113.583

PGM

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De acordo.

São Paulo, 28/05/2014.

TIAGO ROSSI

Procurador Assessor Chefe - AJC

OAB/SP 195.910

PGM

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1 "RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. ATRIBUIÇÕES DE GUARDA CIVIL METROPOLITANA. DISCUSSÃO ACERCA DOS LIMITES E DO ALCANCE DA RESERVA LEGAL CONTIDA NO ART. 144, § 8°, DA LEI MAIOR. NECESSIDADE DE FIXAÇÃO DE PARÂMETROS OBJETIVOS E SEGUROS PARA NORTEAR A ATUAÇÃO LEGISLATIVA MUNICIPAL DA MATÉRIA. AUSÊNCIA DE PRECEDENTE ESPECÍFICO E DE ALCANCE GERAL. NECESSIDADE pE DEFINIÇÃO DO PLENÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA" (STF-Plenário, RE 608.588 RG/SP, Rel. Min. Luiz Fux, julg. 23/05/2013, DJe 07/06/2013).

2 § 3°. Para o cálculo dos proventos de aposentadoria, por ocasião da sua concessão, serão consideradas as remunerações utilizadas como base para as contribuições do servidor aos regimes de previdência de que tratam este artigo e o art. 201, na forma da lei. (Redação dada pela Emenda Constitucional n° 41, 19.12.2003)

§ 17. Todos os valores de remuneração considerados para o cálculo do benefício previsto no § 3° serão devidamente atualizados, na forma da lei. (Incluído pela Emenda Constitucional n" 41, 19.12.2003)

3 Redação dada pela Emenda Constitucional n° 20, de 1998.
4 O STF rejeitou as ADI's que discutiam a inconstitucionalidade da Lei n° 9.717/98 (ADI n° 1.993/DF, Rel Min. Octávio Gallotti, DJ de 3/9/99; ADI n° 2.009/DF, Rel. Min. Moreira Alves, DJ 9/5/03; ADI n° 2033/DF, Rel. Min. Dias Toffoli, DJe 31/1/12).

5 "O Supremo Tribunal Federal fixou jurisprudência no sentido de que o artigo 61, § 1°, da Constituição do Brasil, confere ao Chefe do Poder Executivo a competência privativa para iniciar os processos de elaboração de textos legislativos que disponham sobre a criação de cargos, funções ou empregos públicos na Administração Direta e Autárquica, o aumento da respectiva remuneração, bem como os referentes a servidores públicos da União e dos Territórios, seu regime jurídico, provimento de cargos, estabilidade e aposentadoria. Esta cláusula da reserva de iniciativa, inserta no § 1° do artigo 61 da Constituição de 1988, é corolário do princípio da harmonia e nterdependência entre os Poderes, sendo de compulsória observância pelos entes-federados, inclusive no exercício do poder reformador que lhes assiste. Precedentes" (STF-2" Turma, RE 554536 ÁgR/RJ, Rel. Min. Eros Grau, julg. 09/09/2008, DJe 09/10/2008).

6 "Incumbe apenas à autoridade administrativa competente para analisar o pedido de aposentadoria especial perquirir sobre as condições de fato e de direito previstas no ordenamento jurídico para a sua concessão, inclusive quanto aos pleitos de paridade e integralidade do benefício previdenciário"( STF-Tribunal Pleno. MI 3564 AgR/DF. Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julg. 17/10/2013, DJe I4/1 1/2013).

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processo n° 2013-0.378.867-1

INTERESSADA: CÂMARA MUNICIPAL DE SÃO PAULO

ASSUNTO:  Emenda n° 36 à LOM. Alteração do artigo 88, dispondo sobre as atribuições da Guarda Civil Metropolitana e sobre a aposentadoria de seus integrantes. Análise da viabilidade jurídica do cumprimento. Implicações em decorrência do disposto no artigo 40 da Constituição Federal e na Lei Federal n° 9.717/98.

Cont. da informação n9 831/2014-PGM.AJC

SECRETARIA DOS NEGÓCIOS JURÍDICOS

Senhor Secretário

Encaminho o presente a Vossa Excelência com a manifestação da Assessoria Jurídico-Consultiva, que acolho, concluindo pela inconstitucionalidade da Emenda n° 36 à Lei Orgânica do Município e propondo o ajuizamento de ação direta de inconstitucionalidade.

O Ofício n° 260/2014-32°GV, de 08/05/2014, da Vereadora Edir Sales, foi anexado ao presente.

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São Paulo, 28/05/2014.

ROBINSON SAKIYAMA BARRERINHAS

Procurador Geral do Município

OAB/SP n° 173.527

PGM

Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo