Processo nº 2009-0.226.702-3
INTERESSADA: MARIA CÉLIA MATIAS
ASSUNTO: Afastamento para cumprir mandato de dirigente sindical
Informação nº137/2.010-PGM.AJC
PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO
ASSESSORIA JURÍDICO-CONSULTIVA
Senhora Procuradora Assessora Chefe
1 - Tendo sido reeleita Presidente da UNIÃO NACIONAL DOS SERVIDORES PÚBLICOS - depois de ocupar interinamente a presidência entre 09/10/2008 e 06/02/2009 - a interessada requereu o seu afastamento do cargo de Professor de Educação Infantil, a partir de 1º de julho de 2009, para cumprir mandato de dirigente sindical, nos termos da Lei nº 13.883/04 (cf. requerimento de fI. 02, retificado às fls. 62).
A Secretaria Municipal de Modernização, Gestão e Desburocratização, depois de consultar o DRH e a sua Assessoria Jurídica, opinou pelo deferimento do pedido, constatando que a interessada atendia a legislação que rege a matéria, especialmente as condições do art. 2º da Lei Municipal nº 13.883/04 e também o disposto no art. 3º, II, "a", do Decreto nº 45.517/04 (fls. 40/45).
Deste entendimento, entretanto, divergiram o CONAE-2 (fl. 46) e a Assessoria Jurídica da Secretaria Municipal da Educação (fls. 51/55), que sustentam que os profissionais do ensino sujeitam-se a lei especifica, qual seja, a Lei nº 14.660/07, cujo art. 53, XIV, assegura o direito ao afastamento do profissional da Educação, com todos os direitos e vantagens do cargo, "(...) quando investidos em mandato sindical em entidades representativas da Educação do Município de São Paulo, na forma da legislação vigente".
A interessada pugnou pelo acolhimento do entendimento da Pasta de Gestão (fls. 63/65).
Ante a dissensão de entendimentos, foi solicitado o pronunciamento desta Procuradoria Geral.
Esta a síntese do essencial.
2 - A controvérsia - cabe desde logo delimitá-la - consiste em definir se o direito ao afastamento para cumprimento de mandato de dirigente sindical, consagrado na Lei nº 13.883/04, regulamentada pelo Decreto nº 45.517/04, aplica-se indistintamente a todos os servidores municipais, ou se os profissionais do ensino, ao revés, estariam adstritos ao afastamento apenas em entidades representativas da educação no Município de São Paulo, conforme previsto no art. 53, XIV, da Lei nº 14.660/07.
Mister examinar, amiúde, tais diplomas legais.
A Lei nº 13.883/04, que "dispõe sobre o afastamento de servidores da administração direta e autárquica do Município de São Paulo, quando investidos em mandato de dirigente de entidade sindical ou classista, nas condições que especifica", reza o seguinte:
Art. 1º Para atender ao princípio da eficiência, bem assim com vistas ao aprimoramento dos sistemas participativos previstos no artigo 6º da Lei nº 13.303, de 18 de janeiro de 2002, fica assegurado, aos servidores da administração direta e autárquica do Município de São Paulo, o afastamento dos respectivos cargos ou funções exercidos, quando investidos em mandato de dirigente sindical ou classista, na conformidade das disposições constantes desta lei.
Art. 2º Constitui direito dos servidores referidos no artigo 1º desta lei ter assegurado o afastamento de seus cargos ou funções, quando investidos em mandato sindical ou classista, observados os seguintes limites:
I - para entidade de classe ou fiscalizadora de profissão que congregue, no mínimo, 600 (seiscentos) servidores municipais e municipalizados associados, será assegurado o afastamento de 1 (um) dirigente, desde que o número de cargos da categoria esteja por lei limitado a menos de 2.000 (dois mil) servidores;
II - para entidade de classe ou fiscalizadora de profissão que congregue, no mínimo, 2.000 (dois mil) servidores municipais e municipalizados associados, será assegurado o afastamento de 2 (dois) dirigentes;
III - para entidade de classe ou fiscalizadora de profissão que congregue, no mínimo, 2.500 (dois mil e quinhentos) servidores municipais e municipalizados associados, será assegurado o afastamento de 3 (três) dirigentes;
IV - para entidade de classe ou fiscalizadora de profissão cujo número de servidores municipais e municipalizados associados seja superior a 4.000 (quatro mil), será assegurado o afastamento de mais 1 (um) dirigente para cada grupo de 1.000 (um mil) associados, obedecido o limite máximo de 18 (dezoito) afastamentos.
§ 1º Fica assegurada, ainda, a dispensa de ponto de um representante sindical, por unidade de lotação, uma vez a cada bimestre.
§ 2º No caso dos profissionais de educação, a dispensa prevista no § 1º deste artigo dar-se-á na proporção de um representante sindical para cada período de funcionamento da unidade escolar.
Art. 3º São requisitos para autorização do afastamento:
I - quanto à entidade:
a) estar registrada no Registro Público competente;
b) ter como objetivo a representação de servidores municipais e municipalizados ou, ainda, a fiscalização profissional de categorias integrantes do serviço público municipal;
c) contar com o número de associados previsto no artigo 2º desta lei;
II - quanto ao servidor, incluindo o municipalizado:
a) estar no exercício do cargo efetivo há pelo menos 2 (dois) anos ou ser servidor estável;
b) ter sido eleito e empossado no cargo de direção da entidade.
(...)
Art. 11. Ficam mantidas as disposições das leis nº 11.229, de 26 de junho de 1992, nº 11.434, de 12 de novembro de 1993, e nº 12.396, de 2 de julho de 1997, aplicáveis ao afastamento dos profissionais de educação, quando investidos em mandato de dirigente sindical ou classista, que não contrariem os termos da lei.
Parágrafo único. Para os profissionais de educação afastados nos termos desta lei, será mantida a remuneração correspondente:
I - às jornadas de trabalho, integral e especial, a que estejam submetidos à época do afastamento;
II - à acumulação de cargos e funções públicas permitida na forma da legislação específica.
As disposições contidas no art. 1º ("fica assegurado, aos servidores da administração direta e autárquica do Município de São Paulo..."') e no parágrafo único do art. 11 ("para os profissionais da educação afastados nos termos desta lei...") deixam claro que as disposições da Lei nº 13.883/04 seriam também aplicáveis aos profissionais de educação, cabendo destacar que o art. 11 mantém as disposições das Leis nº 11.229/92, 11.434/93 e 12.396/97, aplicáveis ao afastamento desses profissionais de educação, desde que elas não contrariem os termos da Lei nº 13.883/04.
O art. 9º do Decreto nº 45.517/04 corrobora tal assertiva: "Para os profissionais de educação docentes afastados nos termos da Lei n° 13.883, de 2004, e deste decreto, será mantida a remuneração correspondente à jornada de trabalho a que o professor estiver submetido no momento do afastamento, seja a Básica, a Especial Ampliada ou a Especial Integral".
3 - Conquanto não reste dúvida de que as disposições da Lei nº 13.883/04 e do Decreto nº 45.517/04 fossem, desde a origem, aplicáveis também aos profissionais de educação, como visto acima, a Assessoria Jurídica de SME sustenta que tal situação teria se alterado em 2007, com a superveniência da Lei nº 14.660/07, que reorganizou o Quadro dos Profissionais de Educação e consolidou o Estatuto dos Profissionais da Educação Municipal. Assim, por ser lei posterior, a Lei nº 14.660/07 é que regeria os afastamentos dos profissionais de educação, que seria assegurado, então, apenas aos servidores "investidos em mandato sindical em entidades representativas da Educação no Município de São Paulo, na forma da legislação vigente" (art. 53, XIV).
Esta parece ser a melhor exegese.
Isto porque o legislador sempre atribuiu tratamento diferenciado aos afastamentos dos profissionais do ensino, que são historicamente limitados em face da necessidade de que estes profissionais estejam efetivamente dedicados à promoção da educação, seja na sala de aula, seja na direção e na coordenação pedagogia das escolas.
Cite-se, neste sentido, as restrições impostas aos profissionais de educação para se afastar com fundamento no art. 45, § 1º, do Estatuto dos Funcionários Públicos do Município de São Paulo1, cabendo destacar que a matéria foi consolidada no art. 66 da Lei nº 14.660/07, cujo inciso VII reforçou a restrição ao afastamento para exercer mandato de dirigente sindical:
Art. 66. Os titulares efetivos de cargos da Carreira do Magistério Municipal poderão ser afastados do exercício de seus cargos, por autorização do Prefeito, exclusivamente para:
I - exercer cargos em comissão em unidades da Secretaria Municipal de Educação;
II - substituir ou exercer transitoriamente cargos da Carreira do Magistério Municipal em unidades da Secretaria Municipal de Educação;
III - ministrar aulas em entidades conveniadas com a Prefeitura do Município de São Paulo;
IV - titularizar, em regime de acúmulo remunerado lícito de cargos, um cargo em comissão, ou ainda, exercer em substituição, transitoriamente, cargo vago da carreira, desde que comprovada a incompatibilidade de horário ou ultrapassado o limite a que se refere o art. 19 desta lei;
V - exercer, nos termos do § 1º do art. 45 da Lei nº 8.989, de 1979, atividades de magistério em quaisquer dos Poderes Judiciário, Legislativo, Executivo, fundações públicas, autarquias e entidades estatais, de âmbito Federal, Estadual, Distrital ou Municipal;
VI - exercer, nos termos do § 1º do art. 45 da Lei nº 8.989, de 1979, cargos em comissão em quaisquer dos Poderes Judiciário, Legislativo, Executivo, fundações públicas, autarquias e entidades estatais, de âmbito Federal, Estadual, Distrital ou Municipal;
VII - exercer mandato de dirigente sindical, nos termos do disposto no inciso XIV do art. 53 desta lei;
VIII - exercer atividades de magistério em órgãos da Administração Pública, direta ou indireta, do Município de São Paulo;
IX - prestar serviços técnico-educacionais em unidades da Secretaria Municipal de Educação, para:
a) exercer cargos em comissão em regime de acúmulo remunerado e lícito de cargos;
b) atender a situação de caráter excepcional, devidamente justificadas e acolhidas pelo Secretário Municipal de Educação.
Parágrafo único. Os afastamentos dos Profissionais de Educação, concedidos sem prejuízo de vencimentos, para prestação de serviços à Administração Direta, Indireta ou Fundacional, da União, dos Estados, do Distrito Federal e de outros Municípios, serão autorizados exclusivamente mediante o reembolso pelo órgão cessionário.
Vale destacar que o afastamento dos integrantes da carreira do magistério, quando autorizado, deve estar sempre vinculado ao exercício de atividade que também seja voltada ao ensino e à educação, o que explica semelhante limitação, também, para o afastamento do dirigente sindical, conforme está previsto no art. 53, XIV, da Lei nº 14.660/07.
Não é outra, aliás, a explicação para a disposição contida no art. 71 e seu parágrafo único, da Lei nº 14.660/07, que uma vez mais repete a restrição:
Art. 71. Os Profissionais de Educação que forem afastados para exercício em órgãos ou entidades de outros entes federativos, bem assim para outras unidades não integrantes da Secretaria Municipal de Educação, com ou sem prejuízo de vencimentos, perderão a lotação na unidade educacional.
Parágrafo único. Excluem-se das disposições do "caput" deste artigo os afastamentos para exercício de mandato de dirigente sindical nas entidades representativas dos servidores do Magistério Municipal, e para Câmara Municipal de São Paulo.
4 - No cenário exposto, afigura-se pertinente o argumento sustentado pela Assessoria Jurídica de SME, no sentido de que a Lei nº 14.660/07, por ser específica e posterior à Lei nº 13.883/04, é o diploma que rege e disciplina os afastamentos dos profissionais de educação, inclusive para o exercício de mandato de dirigente sindical, do que decorre ser lícita a exigência legal de que tal exercício se dê exclusivamente "em entidades representativas da Educação no Município de São Paulo".
Tal solução - reflexo do prolóquio "lex posterior derogat priori" - decorre do disposto no art. 2º, §§ 1º e 2º, da Lei de Introdução ao Código Civil:
Art. 2º. Não se destinando à vigência temporária, a lei terá vigor até que outra a modifique ou revogue.
§ 1º. A lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare, quando seja com ela incompatível ou quando regule inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior.
§ 2º. A lei nova, que estabeleça disposições gerais ou especiais a par das já existentes, não revoga nem modifica a lei anterior.
Precisa, a propósito, a lição de CARLOS MAXIMILIANO, na sua consagrada obra "Hermenêutica e Aplicação do Direito" (Ed. Forense, 19ª edição, 2008, p. 294-5):
"A disposição especial afeta a geral, apenas com restringir o campo da sua aplicabilidade; porque introduz uma exceção ao alcance do preceito amplo, exclui da ingerência deste algumas hipóteses. Portanto o derroga só nos pontos em que lhe é contrária. Na verdade, a regra especial posterior só inutiliza em parte a geral anterior, e isto mesmo quando se refere ao seu assunto, implícita ou explicitamente, para alterá-la. Derroga a outra naquele caso particular e naquela matéria especial a que provê ela própria".
Daí que a Lei nº 13.883/04, conquanto permaneça em vigor, rege os afastamentos para exercício de mandato de dirigente sindical de todos os servidores da administração direta e autárquica do Município, exceto os dos profissionais do ensino, que estão adstritos às disposições específicas (e posteriores) da Lei nº 14.660/07.
Por fim, vale destacar que o entendimento ora exposto, ao contrário do que sustenta a interessada às fls. 63/65, não importa violação do direito consagrado no art. 8º, I, da Constituição Federal, por não interferir na livre associação profissional ou sindical, nem representar qualquer forma de intervenção na organização sindical.
5 - Ante o exposto, concordando com as manifestações do CONAE (fl. 46) e da Assessoria Jurídica da Secretaria Municipal da Educação (fls. 51/55), opino pelo indeferimento do pedido formulado pela interessada, por falta de amparo legal, uma vez que a entidade para a qual ela pretende se afastar não é representativa dos servidores da Educação no Município de São Paulo, como exige o art. 53, XIV, da Lei nº 14.660/07.
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São Paulo, 27/01/2010.
LUIZ PAULO ZERBINI PEREIRA
Procurador Assessor - AJC
OAB/SP 113.583
PGM
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De acordo.
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São Paulo, 28/01/2010.
LEA REGINA CAFFARO TERRA
Procuradora Assessora Chefe - AJC
OAB/SP 53.274
PGM
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1 Art. 45. Nenhum funcionário poderá ter exercício em unidade diferente daquela em que for lotado, salvo nos casos previstos neste Estatuto ou mediante prévia autorização do Prefeito.
Parágrafo 1°. O funcionário poderá ser, a critério e por autorização do Prefeito, afastado junto à Administração Pública Federal, Estadual ou Municipal.
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Processo nº 2009-0.226.702-3
INTERESSADA: MARIA CÉLIA MATIAS
ASSUNTO: Afastamento para cumprir mandato de dirigente sindical
Cont. da informação nº 137/2.010-PGM.AJC
SECRETARIA DOS NEGÓCIOS JURÍDICOS
Senhor Secretário
Encaminho o presente a Vossa Excelência com a manifestação da Assessoria Jurídico-Consultiva, que acolho, concluindo que os afastamentos dos profissionais de ensino para exercer mandato de dirigente sindical são regidos pela Lei nº 14.660/07, que limita tais afastamentos às entidades representativas da educação no Município de São Paulo, o que conduz ao indeferimento do pedido formulado pela interessada, por falta de amparo legal.
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São Paulo, 28/01/2010.
MARCIA HALLAGE VARELLA GUIMARÃES
Procuradora Geral do Município Substituta
OAB/SP 98.817
PGM
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Processo nº 2009-0.226.702-3
INTERESSADA: MARIA CÉLIA MATIAS
ASSUNTO: Afastamento para cumprir mandato de dirigente sindical.
Informação n.° 0301/2010-SNJ.G.
SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO
Senhor Secretário
Encaminho o presente com a manifestação da Assessoria Jurídico-Consultiva da Procuradoria Geral do Município no sentido do indeferimento do pedido de afastamento formulado pela interessada.
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São Paulo, 03/02/2010
CLAUDIO LEMBO
Secretário Municipal dos Negócios Jurídicos
SNJ.G.
Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo