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PARECER PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO - PGM Nº 26 de 9 de Janeiro de 2017

Informação n° 0026/2017-PGM.AJC
Pedido de transferência hereditária da titularidade certidão de potencial construtivo transferível.

processo n° 2016-0.207.793-9 

INTERESSADO: José Fernando Rodrigues de Moraes e outro

ASSUNTO: Pedido de transferência hereditária da titularidade certidão de potencial construtivo transferível.

Informação n. 26/2017-PGM.AJC

PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO

ASSESSORIA JURÍDICO-CONSULTIVA

Senhora Procuradora Assessor Chefe

José Fernando Rodrigues de Moraes e Eduardo Rodrigues de Moraes, na condição de herdeiros de Joffre Freitas de Moraes, requerem que lhes seja transferida a titularidade da Certidão de Potencial Construtivo Transferível n° 001/2015 - Paraisópolis, afirmando tratar-se do único bem de titularidade do falecido, não tendo sido, assim, realizado seu inventário (fls. 1). Foi juntada cópia da certidão de potencial transferível e da certidão de óbito (fls. 2/3).

Analisando o pedido, SMDU-AJ afirmou que não há previsão expressa para a formalização da transmissão causa mortis de tais direitos na legislação municipal, mas não haveria dúvida de seu caráter patrimonial. Eventual negativa de expedição de nova certidão pela Municipalidade poderia causar prejuízos aos requerentes, impedindo que tais direitos sejam negociados no mercado. De todo modo, como a questão poderia verificar-se em casos semelhantes, seria o caso de adotar uma solução homogênea por parte da Municipalidade, sendo assim oportuno solicitar a orientação da Procuradoria Geral do Município (fls. 6). Em vista disso, o Gabinete de SMDU solicitou tal orientação (fls. 7).

É o breve relatório.

Embora não existam dúvidas quanto ao caráter patrimonial dos direitos contidos na certidão em questão, não parece haver, diante do quadro legal em vigor, a possibilidade de que a Municipalidade proceda diretamente à formalização da transferência de tal certidão para os herdeiros do falecido.

Com efeito, o procedimento existente para a formalização da transferência de bens aos herdeiros é o inventário, no qual se efetua a respectiva partilha (art. 610 do Código de Processo Civil). O inventário e a partilha podem ser feitos até mesmo extrajudicialmente, se todos os envolvidos forem capazes e concordes (§ 1° do mesmo dispositivo). Não sendo efetuado o inventário, pode ser até cabível a obtenção de alvará judicial, mecanismo muitas vezes utilizado, na prática, para liberação de bens quando não há nada mais a inventariar.

Diante de tais preceitos, a Municipalidade não tem competência legal para aferição da cadeia sucessória e para declaração dos efeitos patrimoniais próprios da sucessão. Tais medidas são reservadas pela lei aos responsáveis pelos procedimentos acima mencionados - juízo ou tabelião. De fato, a Municipalidade nem sequer teria meios plenos de aferir se os requerentes são realmente os únicos sucessores do falecido, nem lhe caberia efetuar a retenção da respectiva tributação incidente sobre a herança, muito menos apurar seu respectivo valor.

Não se trata, ademais, de direitos contemplados pela Lei Federal n. 6.858/80, que simplificou o pagamento de valores relativos a FGTS, PIS-PASEP, restituições de imposto de renda e saldos bancários de pequena monta. A situação aqui existente, na verdade, é semelhante à da transferência de veículos, feita pela autoridade estadual mediante apresentação de documento relativo à partilha da herança.

Não há dúvida de que há muitas decisões do Poder Judiciário no sentido de, com base na economia processual, conceder alvará para a transferência de veículo de pequeno valor, situação em que não seria necessário inventário1. De todo modo, vale observar que esse entendimento, baseado em uma interpretação extensiva da Lei n. 6.858/80, não pode ser tido como pacífico, havendo decisões em sentido contrário, sobretudo tendo em vista que a referida lei não alcança expressamente outros tipos de bem que não as disponibilidades em numerário2. Ademais, não estaria demonstrado, no caso presente, que o bem em questão seria de pequeno valor. Por outro lado, não se pode reconhecer à Municipalidade poderes semelhantes aos do Judiciário, sobretudo em procedimentos de jurisdição voluntária, para dar interpretação extensiva à lei3.

De todo modo, nada obsta que o interessado, fazendo prevalecer sua tese, obtenha alvará judicial baseado no entendimento acima mencionado, o que propiciará a regular transferência da certidão de potencial construtivo transferível. Vale observar, em especial, que os precedentes mencionados, em que se entendeu cabível a expedição do alvará, não foram originados a partir de ações judiciais em que se questionava a decisão das autoridades administrativas que se recusaram a efetuar certa transferência, mas em meros procedimentos de jurisdição voluntária iniciados a partir de pedidos de expedição de alvará judicial. Não se questionou, assim, a atuação da autoridade administrativa, que apenas recebeu posteriormente a ordem judicial e a cumpriu - o que pode, em tese, acontecer também no caso presente.

Por outro lado, em situação semelhante, relativa à transferência de alvará para exploração de serviços de táxi, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo já entendeu indispensável a abertura do inventário e a partilha de bens:

"Via de regra, o meio processual adequado para apurar bens, haveres, bem como chamar os herdeiros para realização da partilha da herança é o inventário ou arrolamento.

Referido procedimento constitui formalidade obrigatória, pois, apesar de a herança ser transmitida desde logo aos herdeiros do de cujus quando do óbito (princípio da saisine), permanece em um estado de indivisão até que se promova a partilha, conforme prevê o art. 1.791 do CC.

O artigo 666 do Novo CPC (antigo 1.037) estabelece uma exceção que dispensa expressamente a abertura de inventário, qual seja, a das situações previstas na Lei n°. 6.858/80.

Desta forma, correta a colocação do Município de que o alvará não foi objeto de sucessão, de modo que o impedimento da transferência para o impetrante mostra-se correto '"4.

Não há dúvida de que não cabe ao Poder Público sobrecarregar ainda mais os cidadãos com exigências burocráticas. No entanto, exige-se das unidades administrativas o cumprimento das normas legais aplicáveis, o que envolve o desempenho de atividades de interesse público no âmbito de competências relativo a este ou aquele órgão ou entidade. Nesse sentido, não compete ao Município desempenhar a atividade de controle de direitos sucessórios, o que seria imprescindível para viabilizar a transferência de titularidade da certidão em questão.

Por outro lado, exigir-se que os bens sejam transferidos a partir da observância do procedimento legalmente previsto não constituiria nenhuma exigência excessiva por parte da Urbe. Conforme já se observou:

"Por fim, deixe-se anotado que ao se fazer cumprir a norma não se dificulta em nada a solução jurídica dos herdeiros da falecida Anésia, pois ao promoverem em simples arrolamento, lá poderão, cumpridas as formalidades legais, obter, igualmente, alvará para a alienação do bem herdado, com o que se vê que existe no ordenamento o meio correto de se realizar o quanto pretendido nas razões recursais, não tendo motivo de insistir em fazê-lo por vias transversas". 5

De todo modo, é preciso enfatizar, conforme já mencionado, que a transferência da titularidade da certidão em questão poderá ser normalmente realizada, desde que tal providência conste regularmente de partilha judicial ou extrajudicial, ou mesmo em alvará expedido em juízo especialmente para tal fim, não cabendo ao Município, por sua conta, efetuar diretamente tais providências. Por essa razão, não parece ser o caso de imediata rejeição do requerimento, mas de comunicação aos interessados para que apresentem um desses documentos, sob pena, então, de indeferimento do pedido.

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São Paulo, 09 / 01 / 2017.

JOSÉ FERNANDO FERREIRA BREGA

PROCURADOR ASSESSOR - AJC

OAB/SP 173.027

PGM

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De acordo.

São Paulo, 10/01/2017.

TIAGO ROSSI

PROCURADOR ASSESSOR CHEFE - AJC

OAB/SP 195.910

PGM

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1 A título de exemplo, os seguintes julgados do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo: Agravo de Instrumento n° 2232335-35.2015.8.26.0000, 8a Câmara de Direito Privado, j. 16.12.15, Rel. Des. Grava Brazil; Apelação n° 1000007-27.2014.8.26.0699, 10a Câmara de Direito Privado, j. 27.01.15, Rel. Des. Cesar Ciampolini; Apelação n° 0003674-92.2012.8.26.0348, 7a Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Walter Barone, j. 11.12.13 (com citação de vários outros precedentes); Apelação n° 0013368-29.2010.8.26.0066, 5a Câmara de Direito Privado,Rel. Des. A.C. Mathias Coltro, j. 6.07.11 (com citação de outros precedentes); Apelação Cível sem Revisão n° 517.346-4/8-00, 5a Câmara de Direito Privado, Rel. Des.Oldemar Azevedo, j. 29.08.07; Apelação Cível sem Revisão n° 485.782-4/0-00, 1a Câmara "A" de Direito Privado, Rel. Des. Roberto Stucchi, j. 10.04.07).
2 Também em caráter exemplificativo, mencionem-se como precedentes do Tribunal de Justiça paulista: Agravo de Instrumento n° 2194021-20.2015.8.26.0000, 3a Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Mareia Dalla Déa Barone, j. 15.12.15 (com citação de precedentes); Agravo de Instrumento n° 2196529-70.2014.8.26.0000, 6a Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Ana Lúcia Romanhole Martucci, j. 06.03.15; Apelação n° 0013840-59.2012.8.26.0066, 10a Câmara de Direito Privado, Rel. Des. João Batista Vilhena , j. 9.04.13; Agravo de Instrumento n" 0204567-47.2010.8.26.0000, 10 3 Câmara de Direito Privado, Rei. Des. Octávio Helene, j. 30.11.10.
3 A flexibilidade própria dos procedimentos de jurisdição voluntária, em que o juízo não está obrigado a atender critérios de legalidade estrita (art. 723, parágrafo único, do Código Processo Civil), abre a possibilidade de adoção de soluções alternativas nos casos de expedição de alvará judicial (art. 725, VII, do mesmo Código), poder que não parece igualmente conferido a autoridades administrativas.
4 Apelação / Reexame Necessário n° 1020468-81.2015.8.26.0053, 12a Câmara de Direito Público, Rel. Des. José Luiz Germano, j. 29.11.16.
5 TJSP - Apelação n° 0013840-59.2012.8.26.0066, cit..

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processo n° 2016-0.207.793-9 

INTERESSADO: José Fernando Rodrigues de Moraes e outro

ASSUNTO: Pedido de transferência hereditária da titularidade certidão de potencial construtivo transferível.

Cont. da Informação n° 26/2017-PGM.AJC

SMUL

Senhora Chefe de Gabinete

Encaminho-lhe o presente, com o entendimento da Assessoria Jurídico Consultiva da Procuradoria Geral do Município, que acolho, no sentido de que a transferência da certidão para o nome dos herdeiros do falecido poderá ocorrer por força de partilha, judicial ou extrajudicial, ou em razão de alvará expedido em juízo para tal fim, devendo ser efetuada a comunicação aos interessados para que apresentem um desses documentos, sob pena de indeferimento do pedido.

São Paulo, 11/01/2017.

RICARDO FERRARI NOGUEIRA

PROCURADOR GERAL DO MUNICÍPIO

OAB/SP 175.805

PGM

Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo