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PARECER PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO - PGM Nº 12.318 de 8 de Novembro de 2022

EMENTA Nº 12.318
Regime de pessoal. Servidora pública. Licença parental de longa duração. Decreto Municipal nº 58.091/2018. Gestação de substituição. Possibilidade de concessão à mãe não gestante, desde que preenchidos os requisitos legais.

Processo nº 6021.2022/0034229-0

INTERESSADA: HELOÍSA SCHVARZMAN DE ARAUJO SILVA

ASSUNTO: Notificação Extrajudicial. Servidora pública. Licença maternidade e Licença parental de longa duração. Decreto Municipal n° 58.091/2018. Possibilidade de concessão à mãe não gestante, desde que cumpridos os requisitos legais.

Informação n° 1.760/2022-PGM.AJC

COORDENADORIA GERAL DO CONSULTIVO

Assessoria Jurídico-Consultiva

Senhor Procurador Coordenador,

Trata-se de Notificação Extrajudicial onde se postula a declaração do direito da Notificante à licença maternidade de 180 (cento e oitenta) dias, para concessão imediata do benefício quando do nascimento com vida de seu filho, por ser servidora pública municipal, atuando como psicóloga, lotada na Secretaria Municipal de Saúde (doc. n° 066748369).

Para tanto, alega que convive em união estável e que sua companheira está grávida, com previsão de nascimento do bebê para outubro/2022. Solicita concessão de licença maternidade de 180 (cento e oitenta) dias prevista no art. 148 da Lei 8989/79, por entender que, mesmo não sendo gestante, é mãe, prevendo essa Lei 8989/79 a concessão da licença maternidade inclusive às mães adotivas, embora seja silente quanto à mãe não gestante; alega que interpretação em sentido contrário feriria o direito à igualdade, à proteção da família e à dignidade da pessoa humana.

Ainda, a notificante entende que " inexiste qualquer oneração aos regimes de previdência ... porque a mãe gestante ... é trabalhadora celetista e terá o beneficio concedido pelo INSS" (grifos nossos).

Cita parecer do MPF no RE 1.211.446/SP; o Mandado de Segurança 0800921-51.22020.4.05.8308, da Justiça Federal de Pernambuco; o RE 778.889, referente à isonomia entre o período de gozo das licenças à gestante e à adotante; dentre outros julgados e pareceres.

Encaminhado à Secretaria de Gestão, foi informado pela SEGES/COGEP/DRH que esta Procuradoria Geral já havia emitido parecer em tema semelhante (Processo SEI n° 6013.2018/0000881-0, Informação n° 0345/2019-PGM-AJC, doc. 015379820), bem como o assunto foi regulamentado, no âmbito deste Município, pelo Decreto Municipal n° 58.091/2018, entendendo que a Interessada faz jus à Licença Parental de Longa Duração (e não à licença gestante, por estar o filho do casal no ventre da sua companheira), nos termos do inciso III do art. 2° do Decreto n° 58.091/2018, devendo, contudo, ser observado o estabelecido nos incisos I e II do § 4° desse mesmo art. 2° (doc. 068203390).

A SEGES/COJUR endossou esse posicionamento, enfatizando que "a Solicitante tem direito à Licença Parental de Longa Duração, quando do nascimento com vida do bebê, desde que fique demonstrada que sua companheira não irá receber beneficio de idêntica natureza decorrente da mesma gestação, nos termos do art. 2°, inciso III e §4°, inciso II, do Decreto n° 58.091/2018" (doc. 068763014).

Restituído ao Gabinete desta Procuradoria Geral, o presente foi encaminhado a esta Coordenadoria para ciência das conclusões alcançadas e eventual manifestação (doc. 071177623).

É o relato do essencial.

Concordamos apenas em parte com as conclusões alcançadas pela Secretaria de Gestão neste expediente, divergindo quanto à possibilidade de aplicação do inciso I do § 4° do art. 2° do Decreto 58.091/2018.

De fato, há precedente desta Procuradoria Geral no sentido da possibilidade da concessão de licença parental de longa duração ao servidor municipal na hipótese de criança gerada por gestação de substituição, como bem exposto por SEGES, inclusive havendo previsão legal expressa nesse sentido no Decreto Municipal n° 58.091/2018.

Todavia, não se pode confundir gestação por substituição - também conhecida como "barriga de aluguel" -, na qual há a participação de um terceiro, estranho ao casal, com o caso ora em exame, em que há a gestação por uma das companheiras, por meio de inseminação artificial.

O Decreto supra citado regulamenta apenas a gestação por substituição.

Assim, no caso de gestação por uma das companheiras e em sendo a mãe gestante uma servidora pública municipal, por óbvio que lhe seria assegurada a licença gestante, prevista no art. 148 da Lei Municipal n° 8.989/79:

"Art. 148. À funcionária gestante será concedida, mediante inspeção médica, licença de 180 (cento e oitenta) dias, com vencimento integral" (g.n.)

Mas, a notificante não é a mãe gestante, conforme relatado na sua notificação, e, portanto, não terá direito à licença gestante.

Restaria, então, analisar a aplicação, por analogia, do quanto disposto no Decreto Municipal n° 58.091, de 16/02/2018, para a concessão de licença parental de longa duração - e não de licença maternidade - embora tenham o mesmo prazo (cento e oitenta dias), concedida no caso de gestação de substituição ("barriga de aluguel"). Esses são os requisitos para a concessão desse benefício:

"Art. 2° A Licença Parental de Longa Duração, correspondente a até 180 (cento e oitenta) dias, tem por fundamento o disposto no artigo 148 da Lei n° 8.989, de 1979, e na Lei n° 9.919, de 21 de junho de 1985, com as alterações introduzidas pela Lei n° 14.872, de 31 de dezembro de 2008, e será concedida ao servidor, por equiparação, independentemente de seu gênero, orientação sexual ou identidade de gênero e estado civil, nas hipóteses de:

III - criança gerada por gestação de substituição, sendo o servidor mãe ou pai biológicos.

§ 1° O disposto neste artigo:

I - não prejudica a vigente regulamentação da licença à gestante em relação à situação expressamente prevista no artigo 148 de Lei n° 8.989, de 1979:

(... )

§ 4° No caso de adoção ou guarda conjunta ou de criança gerada por gestação de substituição, a licença parental de longa duração será concedida:

I    - sendo ambos os adotantes ou genitores servidores públicos municipais, a um deles que por ela optar, conforme a conveniência do casal manifestada por escrito no requerimento;

II    - desde que o cônjuge, companheira ou companheiro, quando vinculado a outro regime de previdência social, declare, em conjunto com o servidor municipal, sob as penas da lei, que não obteve benefício de idêntica natureza decorrente do mesmo processo de adoção ou guarda ou de mesma gestação de substituição." (g.n.)

Portanto, se aplicássemos o quanto disposto às gestações por inseminação artificial em casais homoafetivos, em sendo ambas as mães servidoras municipais, como uma delas - a mãe gestante - inexoravelmente terá direito à licença gestante, não há a possibilidade dessa opção mencionada no inciso I do § 4° do art. 2° do citado decreto, prevalecendo a licença gestante.

De se anotar, em complementação, que embora já tenha sido reconhecida, pela Corte Suprema, no Recurso Extraordinário 1.211.446 (doc. 071326104), a repercussão geral sobre o tema referente à possibilidade extensão de licença à mãe não gestante[1], na própria decisão, na sua parte final, foram expressamente estipulados os limites para a concessão da licença à mãe não gestante, assim dispondo:

"(...)

Outrossim, imperioso destacar que, no caso concreto, (i) a recorrida é servidora pública, enquanto a sua companheira, que vivenciou a gestação, é trabalhadora autônoma e não usufruiu do direito à licença-maternidade, e (ii) a gestação decorreu de procedimento de inseminação artificial heteróloga, no qual fecundado o óvulo da recorrida, de sorte que a criança possui duas mães biológicas. Nesse contexto, emerge relevante questão jurídica que tangencia não só a possibilidade de extensão da licença-maternidade à mãe não gestante, em união homoafetiva, mas também os limites e parâmetros fixados para essa extensão" (grifos nossos)

Portanto, a própria decisão do Supremo Tribunal Federal que estende a licença à mãe não gestante já pressupõe a necessidade de observância a parâmetros e limites a essa extensão - quais sejam, (a) ser a pleiteante da licença mãe biológica e que (b) a mãe gestante não possa usufruir de licença maternidade. Em momento algum cogitou da dupla concessão a ambas às mães, como pretende a ora Notificante.

E, no caso ora em análise, a própria Notificante expressamente consignou que a mãe gestante usufruirá do benefício a ser concedido pelo INSS, de forma que não é possível a aplicação analógica do inciso II do § 4° do art. 2° do Decreto 58.091/18.

Assim, em conclusão, temos que a Notificante, enquanto servidora pública municipal e não sendo a mãe gestante:

a)    Não faz jus à licença gestante prevista no art. 148 da Lei 8989/79; e

b)    Não faz jus à licença parental de longa duração, por ser a sua companheira, que é a mãe gestante, vinculada ao Regime Geral de Previdência Social (INSS), conforme consta do item 23 da notificação, a quem será concedido o benefício quando do nascimento do bebê, não havendo que se falar, portanto, em aplicação, por analogia, do disposto no art. 2°, § 4°, II, do Decreto 58.091/18.

Em ausentes os requisitos para a concessão à Notificante quer da licença gestante, quer da licença parental de longa duração, restará a possibilidade de que lhe seja concedida a licença parental de curta duração, por analogia ao quanto previsto no art. 4°, III, do citado Decreto n° 58.091/2018, que assim dispõe:

"Art. 4° A Licença Parental de Curta Duração, correspondente a 6 (seis) dias, tem por fundamento o disposto na Lei n° 10.726, de 8 de maio de 1989, e será concedida ao servidor, por equiparação, independentemente do seu gênero, orientação sexual ou identidade de gênero e do seu estado civil, nas hipóteses de:

...

III - criança gerada por gestação de substituição, sendo o servidor pai ou mãe biológico, desde que não tenha solicitado a licença prevista no artigo 2° deste decreto."

Tendo em vista que divergimos, em parte, das conclusões da COGEP, sugerimos, sem prejuízo da pronta resposta à Notificação aqui tratada, seja o presente encaminhado à Secretaria de Gestão, para ciência e observação do quanto aqui exposto.

Sugiro, ainda, envio a JUD, para ciência, tendo em vista o assunto aqui tratado, na hipótese de eventual judicialização acerca do tema.

À elevada consideração.

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São Paulo, 08/11/2022

LILIAN DAL MOLIN SCIASCIO

Procuradora do Município - AJC

OAB/SP 179.960

PGM

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De acordo.

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São Paulo, 08/11/2022

MÁRCIA HALLAGE VARELLA GUIMARÃES

Procuradora Assessora Chefe - AJC

OAB/SP 98.817

PGM

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[1] "RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. LICENÇA-MATERNIDADE. UNIÃO HOMOAFETIVA. INSEMINAÇÃO ARTIFICIAL. EXTENSÃO DA LICENÇA-MATERNIDADE À MÃE NÃO GESTANTE. DIREITO À IGUALDADE, À DIGNIDADE HUMANA E À LIBERDADE REPRODUTIVA. MELHOR INTERESSE DO MENOR. PLURIPARENTALIDADE. MANIFESTAÇÃO PELA REPERCUSSÃO GERAL."

(RE 1211446 RG, Relator(a): LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 07/11/2019, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-251 DIVULG 18-11-2019 PUBLIC 19-11-2019 ; aqui juntado como doc. 071326104)

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Processo nº 6021.2022/0034229-0

INTERESSADA: HELOÍSA SCHVARZMAN DE ARAUJO SILVA

ASSUNTO: Notificação Extrajudicial. Servidora pública. Licença maternidade e Licença parental de longa duração. Decreto Municipal n° 58.091/2018. Possibilidade de concessão à mãe não gestante, desde que cumpridos os requisitos legais.

Cont. da Informação n° 1.760/2022-PGM.AJC

PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO

Senhora Procuradora Geral

Encaminho-lhe o presente nos termos da manifestação retro da Assessoria Jurídico-Consultiva, que endosso.

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São Paulo, 08/11/2022

CAYO CÉSAR CARLUCCI COELHO

Procurador Coordenador Geral do Consultivo - CGC

OAB/SP 168.127

PGM

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Processo nº 6021.2022/0034229-0

INTERESSADA: HELOÍSA SCHVARZMAN DE ARAUJO SILVA

ASSUNTO: Notificação Extrajudicial. Servidora pública. Licença maternidade e Licença parental de longa duração. Decreto Municipal n° 58.091/2018. Possibilidade de concessão à mãe não gestante, desde que cumpridos os requisitos legais.

Cont. da Informação n° 1.760/2022-PGM.AJC

PGM.G/Ofícios

Senhora Procuradora Assessora

Para elaboração de resposta à notificação extrajudicial nos termos da manifestação da Coordenadoria Geral do Consultivo, que endosso.

SEGES

Senhora Secretária

JUD

Senhor Procurador Diretor

Para ciência e observação do quanto disposto no parecer ementado sob n° 12.308, que acolho, quanto aos requisitos para a concessão de licença parental de longa duração à mãe não gestante.

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São Paulo, 08/11/2022

MARINA MAGRO BERINGHS MARTINEZ

PROCURADORA GERAL DO MUNICÍPIO

OAB/SP n° 169.314

PGM

Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo