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PARECER PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO - PGM Nº 12.182 de 21 de Setembro de 2020

EMENTA N° 12.182
Ação de usucapião. Confrontação do lote usucapiendo com córrego, depois canalizado. Possibilidade de interferência apenas com áreas de álveo abandonado em razão de retificação realizada por utilidade pública (art. 27 do Código de Águas) ou de áreas apossadas por ocasião da canalização. Possibilidade de análise de acordo com os elementos constantes do Mapa Digital da Cidade.

processo nº 6021.2019/0019297-8

INTERESSADA: Maria Aldenora de Souza

ASSUNTO: Ação de usucapião. Proc. n. 1117669-24.2018.8.26.0100 - 1ª Vara de Registros Públicos.

Informação n. 1007/2020 - PGM-AJC

PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO
COORDENADORIA GERAL DO CONSULTIVO
Senhor Coordenador Geral

O presente foi instaurado para acompanhar ação de usucapião relativa ao imóvel situado na Rua Flor de Natal, n. 58, Vila Jacuí.

A Divisão Técnica de Apoio de DEMAP elaborou estudo de sobreposição (doc. 018658332), no qual foi identificada uma possível interferência com leito do córrego Jacuí, ressalvada a inexistência de planta pericial ou memorial descritivo (doc. 018735630 e 019179124).

SEHAB-CRF informou que o lote é oriundo de parcelamento irregular, para o qual não consta planta de regularização, nem mesmo em elaboração (doc. 019761289).

A Diretoria de DEMAP observou a necessidade de esclarecer se houve ou não, no trecho em questão, canalização do córrego pela Municipalidade, com vistas a verificar eventual aplicação do artigo 27 do Código de Águas (doc. 021143659).

SUB-MP informou que o córrego foi canalizado pela Prefeitura em galeria fechada (doc. 021543165), o que foi confirmado por vistoria (doc. 022799468).

Em nova sobreposição (doc. 023094367), DEMAP-3 identificou que realmente o córrego se encontra canalizado, havendo sobre ele uma via de circulação não oficializada, com a qual foi também cogitada interferência (doc. 023155693).

Foi formulado pedido em juízo para apresentação dos elementos técnicos necessários à análise do caso (doc. 023370076), bem como foram apresentados quesitos (doc. 029466237).

SUB-MG esclareceu que a obra de canalização foi feita pela Prefeitura, não constando, contudo, plantas nem as built (doc. 032459864).

OBRAS não localizou levantamento contemporâneo às obras de canalização (doc. 032934353).

DEMAP-3 informou que o levantamento aerofotogramétrico mais próximo dos anos 2009 e 2010 é o que gerou o Mapa Digital da Cidade - 2004 (doc. 032964137). Posteriormente, juntou imagem obtida do Google Earth Pro (doc. 032974844), mas observou que ela, por não ser ortorretificada, não poderia ser utilizada para a demarcação do antigo leito em planta (doc. 033010974).

Por isso, sugere a Diretoria de DEMAP que sejam realizados com base no MDC os estudos para apuração do antigo leito do córrego, de modo semelhante ao que se faz, com base no levantamento GEGRAN, em casos análogos (doc. 033026243).

É o breve relatório.

Há duas possíveis causas de aquisição do domínio público envolvidas no caso em questão.

Conforme já se observou, o álveo de um curso d'água privado pertence aos proprietários lindeiros até o respectivo eixo (Ementa n. 11.805 - PGM-AJC). Por outro lado, mesmo que se tratasse de curso d'água público, o que não se cogita no caso do córrego em exame, de pequenas dimensões, o álveo não pertenceria ao Município, pois, desde a Constituição de 1946, as águas públicas são divididas somente entre União e Estados1. Assim, os álveos de cursos d'água não pertencem ordinariamente ao Município, exceto na qualidade de confrontante, podendo ser incorporados ao domínio municipal nos casos de afetação, retificação da corrente ou desapropriação (Informação n. 055/2014 - SNJ-G -p.a. n. 2013-0.249.883-1).

Estando excluída a existência de desapropriação e não sendo o Município proprietário lindeiro à corrente, cabe investigar eventual aplicação do art. 27 do Código de Águas. Para tanto, deve ser verificado se a obra de canalização ocorreu com retificação da corrente, hipótese em que as áreas antes ocupadas pelo curso d'água e não utilizadas para o novo curso pertencem ao Município.

Para tanto, parece apropriado que se utilize o levantamento realizado por ocasião da elaboração do Mapa Digital da Cidade, elemento oficial dotado de precisão técnica, já que não consta outro levantamento cuja qualidade se possa afirmar superior, ainda que possam existir elementos mais contemporâneos, tais como fotografias, que não se prestam à mesma análise.

Por outro lado, a execução de obras de canalização, com a concomitante execução de viário, acarreta a incorporação do bem ao patrimônio municipal (Informação n. 2036/2013 - SNJ-G). Em tese, seria também possível que a Municipalidade fizesse somente a execução de uma galeria, hipótese em que deveria efetuar a desapropriação voltada à instituição de uma servidão de passagem, mantido o domínio privado dos bens envolvidos.

No caso presente, claramente não houve opção pela instituição de uma servidão sob os imóveis particulares que se estendiam até o eixo do córrego. Ao que parece, com a realização da obra pública, ocorreu apossamento administrativo do trecho envolvido por parte da Urbe, cuja exata extensão parece tormentoso afirmar, até mesmo em vista da inexistência de as built de tais obras de canalização.

De todo modo, é preciso que o Município finalize as providências já tomadas no local. Tudo indica que há o propósito de destinar a superfície a uma via pública, sendo possível observar, pelas fotos disponíveis no sítio Google Maps, que esse uso aparentemente já vem sendo efetuado pelos lotes vizinhos. Caso haja, de fato, o propósito de abrir uma via no local, será preciso que a Municipalidade defina os respectivos alinhamentos, que devem servir para a consolidação das divisas dos lotes lindeiros, em benefício da qualidade urbanística do local. O mesmo deve ocorrer caso se opte pela destinação do espaço a faixa sanitária, podendo ser considerada a necessidade de escoamento de águas superficiais ou de manutenção da galeria subterrânea.

Evidentemente, seria preferível que as obras em questão tivessem ocorrido com base em um plano, o que levaria à desnecessidade de invocação da figura do apossamento administrativo. Sem embargo, o apossamento parece já ter ocorrido, de modo que nada resta que não dar cabo a todos os seus efeitos, especialmente sob a perspectiva da inserção urbana das obras realizadas.

Assim sendo, sugere-se o retorno do presente a DEMAP, para prosseguimento, podendo ser efetuados os estudos relativos à existência de álveo abandonado decorrente da retificação, recomendando-se, ainda, o encaminhamento à Subprefeitura, para manifestação acerca da possível abertura de viário ou faixa sanitária no local, que deverá ser objeto das medidas técnicas adequadas para sua caracterização e oficialização, elementos que permitirão definir o alinhamento a ser observado pelo lote usucapiendo, mantida a contestação ao pedido.

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São Paulo, 21/09/2020

JOSÉ FERNANDO FERREIRA BREGA
PROCURADOR ASSESSOR – AJC
OAB/SP 173.027
PGM

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De acordo.

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São Paulo, 21/09/2020

TICIANA NASCIMENTO DE SOUZA SALGADO
PROCURADORA ASSESSORA CHEFE – AJC
OAB/SP 175.186
PGM

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1Brega, José Fernando Ferreira. Aspectos da aquisição e perda da propriedade imobiliária pelo município. In: Boletim de direito municipal: BDM, v. 26, n. 5, maio, 2010, p. 324.

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processo nº 6021.2019/0019297-8

INTERESSADA: Maria Aldenora de Souza

ASSUNTO: Ação de usucapião. Proc. n. 1117669-24.2018.8.26.0100 - 1ª Vara de Registros Públicos.

Cont. da Informação n. 1007/2020 - PGM-AJC

DEMAP
Senhor Diretor

De acordo com o entendimento desse Departamento, conforme parecer da Coordenadoria Geral do Consultivo, que acolho, no sentido da possibilidade de utilização do Mapa Digital da Cidade para apuração do antigo leito do córrego, acrescentada a necessidade de delimitação da área objeto de apossamento administrativo em virtude das obras de canalização realizadas no local.

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São Paulo, 23/09/2020

TIAGO ROSSI
PROCURADOR DO MUNICÍPIO
COORDENADOR GERAL DO CONSULTIVO
OAB/SP 195.910
PGM

Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo