Razões de Veto ao Projeto de Lei nº 737/07
OF ATL nº 44/09
Ref.: Ofício SGP-23 nº 00121/2009
Senhor Presidente
Por meio do ofício em epígrafe, Vossa Excelência encaminhou à sanção cópia autêntica da lei decretada por essa Egrégia Câmara, em sessão de 18 de dezembro de 2008, relativa ao Projeto de Lei nº 737/07, de autoria do Vereador Goulart, que institui o Programa São Paulo - Capital do Natal, e inclui o referido Programa e suas atividades no Calendário Oficial de Eventos do Município de São Paulo.
De acordo com a justificativa apresentada por seu autor, a instituição do Programa tem o intuito de revestir a Cidade do espírito natalino e produzir encantamento e beleza, a fim de, juntamente com a oportunidade de bons negócios, boas compras, lazer e entretenimento, atrair visitantes e movimentar diversos setores econômicos, dentre os quais o turismo.
Acolhendo o texto aprovado, por seu reconhecido mérito, sou compelido, porém, a apor-lhe veto parcial, atingindo o inteiro teor de seus artigos 2º, 4º, 5º, 6º e 8º, na conformidade das razões a seguir aduzidas.
Como se sabe, durante o mês de dezembro, já é realizado, na Cidade de São Paulo, o Projeto Natal Iluminado, evento consolidado e bastante conhecido, que tem despertado grande interesse nos paulistanos e em milhares de turistas que vêm a São Paulo nesse período, motivados pelas diversas atrações promovidas, além do habitual destaque para compras e espetáculos, guardando certa semelhança com o programa instituído pelo texto aprovado, o qual, todavia, apresenta algumas disposições revestidas de impropriedades, comportando reparo, conforme ocorre com seus artigos 2º e 6º.
Com efeito, supracitados dispositivos estipulam a efetivação de diversas ações e providências, a serem cumpridas pela Administração Municipal, bem como o modo de execução do programa, interferindo nas atribuições próprias dos órgãos e entes municipais, em especial das Subprefeituras, das Secretarias Municipais de Transportes e da Cultura e da São Paulo Turismo S/A .
No que tange à alínea “f” do inciso IV de seu artigo 2º, cabe ressaltar que, de acordo com os artigos 178 e 179 da Lei Orgânica do Município de São Paulo, as tarifas dos serviços públicos de transporte – dentre os quais inclui-se o táxi – são de competência exclusiva do Município e devem ser fixadas pelo Executivo, do que decorre a inviabilidade da medida, por seu evidente vício de iniciativa.
A par disso, grande parte dessas disposições impõe ao Executivo novas incumbências e encargos de natureza inteiramente estranha a seu âmbito de competências constitucionais, tais como aquelas que determinam a promoção de atividades comerciais, pacotes especiais e descontos aos turistas em hotéis, restaurantes, “shopping centers”, lojas, supermercados, companhias aéreas, agências e operadoras de turismo, assim como a disponibilização de intérpretes e a criação e distribuição do Cartão de Compras e Serviços “São Paulo - Capital do Natal”, as quais, evidentemente, vinculam-se ao exercício de atividades de caráter privado, reservado à iniciativa particular dos respectivos setores, não se inserindo nem se coadunando com o âmbito de atuação da Administração Pública.
Acresça-se, ainda, que, ao descreverem minudentemente todas as ações e atividades que deverão ser realizadas, tais dispositivos acabam também por tornar estáticas atividades que, por sua própria natureza, comportam alteração a cada ano, conforme as circunstâncias, os recursos angariados, as parcerias ajustadas e outros fatores imprevistos, não consultando ao interesse público sua estipulação nos moldes rígidos acima mencionados.
Igualmente inafastável, o veto ao artigo 4º da propositura, que faculta o funcionamento do comércio, durante o mês de dezembro, em horário livre, respeitada a legislação trabalhista pertinente, por sua incontornável desconformidade com a normatização federal e municipal da matéria.
No âmbito federal, o horário de funcionamento do comércio é regido pelas normas trabalhistas e convenções coletivas de trabalho, que não admitem “horário livre” para o comércio, sob pena da questão restar sem qualquer regulação; no plano municipal, os artigos 174 e 175 da Lei de Uso e Ocupação do Solo (Lei nº 13.885, de 25 de agosto de 2004) estabelecem horários de funcionamento para as atividades não-residenciais nas diversas zonas de uso, a fim de minimizar a incomodidade que possam produzir sobre os demais usos e atividades urbanas.
No tocante aos domingos e feriados, a questão é regulada pelos artigos 6º, 6º-A e 6º-B, todos da Lei Federal nº 10.101, de 19 de dezembro de 2000, com a redação dada pela Lei Federal nº 11.603, de 5 de dezembro de 2007, que autorizam o trabalho aos domingos e em feriados nas atividades do comércio em geral, observada a legislação municipal, consubstanciada na Lei nº 13.473, de 26 de dezembro de 2002, alterada pela Lei nº 14.776, de 18 de julho de 2008, que condiciona esse funcionamento à autorização, precedida de convenção coletiva do trabalho, firmada entre os sindicatos representantes das categorias econômicas e profissionais respectivas, ou de acordo de trabalho, celebrado entre o sindicato profissional e a empresa requerente.
Já o artigo 5º do texto vindo à sanção, que isenta os eventos natalinos credenciados pelo Poder Público do pagamento de taxas e preços de que trata a Lei nº 14.072, de 18 de outubro de 2005, caracteriza também renúncia de receita, desatendendo as regras pertinentes da Lei de Responsabilidade Fiscal. Além disso, contraria o disposto no “caput” e no parágrafo único do artigo 2º da citada lei, segundo os quais a gratuidade se destina apenas aos eventos de caráter exclusivamente religioso, político-partidário ou social, quando promovido por entidade declarada de utilidade pública, às manifestações que tragam expressão pública de opinião sobre determinado fato e às manifestações de caráter cívico, de notório reconhecimento social, não fazendo jus, porém, a esse benefício, as atividades que envolvam a comercialização de bens ou serviços, “shows” artísticos e exposição de marcas e/ou logotipos visando à divulgação comercial de produtos ou serviços, como aquelas de que trata a propositura, do que deflui sua ilegalidade e descompasso com o interesse público, a par do vício de iniciativa de que se reveste.
Finalmente, a aplicação do programa instituído pela propositura dispensa regulamentação, bastando, para tanto, a adoção de providências administrativas pelos órgãos e entes municipais competentes, no âmbito de suas atribuições, pelo que se impõe veto a seu artigo 8º.
Ante o exposto, seja porque eivados de inconstitucionalidade ou de ilegalidade, seja porque contrários ao interesse público, os artigos 2º, 4º, 5º, 6º e 8º não detêm condições de se converter em lei, razão pela qual vejo-me compelido a vetá-los em seu inteiro teor, na forma acima exposta, com fundamento no disposto no § 1º do artigo 42 da Lei Orgânica do Município de São Paulo.
Assim sendo, devolvo o assunto à apreciação dessa Egrégia Câmara, renovando a Vossa Excelência, na oportunidade, meus protestos de apreço e consideração.
GILBERTO KASSAB
Prefeito
Ao
Excelentíssimo Senhor
ANTONIO CARLOS RODRIGUES
Digníssimo Presidente da Câmara Municipal de São Paulo
Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo