CASA CIVIL DO GABINETE DO PREFEITO

Acessibilidade

RAZÕES DO VETO AO PROJETO DE LEI Nº 50/2001; OFÍCIO DE 20 de Janeiro de 2004

Razões de Veto ao Projeto de Lei nº 50/01

OF ATL nº 077/2004

Senhor Presidente

Tenho a honra de acusar o recebimento do Ofício nº 18/Leg.3/0878/2003, com o qual Vossa Excelência encaminhou à sanção cópia autêntica do Projeto de Lei nº 50/01, aprovado por essa Egrégia Câmara, na sessão de 19 de dezembro de 2003.

De autoria do Vereador William Woo, o projeto objetiva estabelecer a isenção de pagamento de tarifa de ônibus urbano do Município de São Paulo aos integrantes das Polícias Civil e Militar, bem como da Guarda Civil Metropolitana, fardados ou não, ainda que fora de serviço, mediante a apresentação de identidade funcional.

Sem embargo dos meritórios propósitos que nortearam seu autor, a medida não reúne condições de ser convertida em lei, impondo-se seu veto total, com fulcro no § 1º do artigo 42 da Lei Orgânica do Município de São Paulo, por inconstitucionalidade, ilegalidade e contrariedade ao interesse público, nos termos das considerações a seguir aduzidas.

Primeiramente, cumpre esclarecer que o conteúdo da propositura já se encontra quase que integralmente disciplinado no âmbito deste Município, consoante o disposto na Lei nº 9.939, de 16 de julho de 1985, e nos Decretos nº 21.432, de 9 de outubro de 1985, e nº 22.296, de 11 de julho de 1986, estando prevista nessa disciplina a aludida isenção de tarifa para os integrantes da Polícia Militar do Estado de São Paulo e da Guarda Civil Metropolitana, ainda que fora de serviço, porém sempre fardados ou uniformizados.

Como se vê, o texto aprovado inova a legislação atual em dois aspectos, quais sejam, a) a inclusão dos integrantes da Polícia Civil no rol dos isentos e b) a extensão, para as três categorias, do direito à isenção ainda quando não estejam fardados. Essas inovações, se acolhidas, ocasionarão aumento substancial do número de isenções hoje concedidas.

Nesse sentido, é de se observar que a isenção pretendida interfere claramente no custo do transporte e na fixação da respectiva tarifa, envolvendo, pois, questão que repercute em matéria orçamentária, ao mesmo tempo em que configura ingerência no serviço de transporte coletivo de passageiros, atualmente prestado sob regime de concessão e permissão de serviço público, matérias cuja iniciativa legislativa é exclusiva do Chefe do Executivo, conforme estabelecido no artigo 37, § 2º, inciso IV, e no artigo 69, inciso IX, ambos da Lei Orgânica do Município de São Paulo. Simultaneamente, a propositura incide em ilegalidade, haja vista que contraria o disposto no artigo 178 da Lei Maior local, o qual determina que as tarifas dos serviços públicos de transporte são de competência exclusiva do Município e deverão ser fixadas pelo Executivo.

Desse modo, ao legislar sobre assuntos próprios da esfera privativa de competências do Poder Executivo, o texto vindo à sanção extrapola as atribuições do Legislativo, ferindo o princípio da independência e harmonia entre os Poderes, consa grado no artigo 2º da Carta Magna e reproduzido no artigo 6º da Lei Orgânica.

A par do vício de iniciativa que a inquina de inconstitucionalidade, a medida reveste-se, ainda, de ilegalidade e de contrariedade ao interesse público.

Com efeito, a questão relativa às isenções e reduções tarifárias no sistema de transporte coletivo municipal acha-se devidamente disciplinada por lei específica, que confere ao assunto tratamento amplo e sistemático.

De fato, a Lei nº 13.241, de 12 de dezembro de 2001, que dispõe sobre a organização dos serviços do Sistema de Transporte Coletivo Urbano de Passageiros na Cidade de São Paulo e autoriza o Poder Público a delegar sua execução, estabelece, no § 4º de seu artigo 27, que “as dispensas ou reduções tarifárias de qualquer natureza, além daquelas já vigentes na data da promulgação desta lei, deverão dispor de fontes específicas de recursos”.

Assim, de acordo com a normatização vigente, a concessão de qualquer gratuidade ou desconto demanda, obrigatoriamente, o aporte adicional de recursos por parte da Administração Municipal ou o aumento da tarifa, a onerar o usuário pagante, a fim de atender a despesa resultante do benefício, em razão da atual fonte de receita do sistema, para a remuneração do operador, consistir na arrecadação tarifária.

Constata-se, portanto, que o texto aprovado visa conceder benefício desconsiderando, por completo, a obrigatoriedade de aporte adicional de recursos para atender à despesa gerada pela isenção.

Acresça-se, ademais, que, além dos benefícios já previstos para os Policiais Militares e Guardas Civis Metropolitanos, conforme inicialmente informado, atualmente são também assegurados por lei diversos descontos e isenções a estudantes, idosos, pessoas portadoras de necessidades especiais, integrantes das Forças Armadas, entregadores de correspondência do Correio e oficiais de justiça, estando, pois, contemplados, no vigente elenco de isenções ou reduções os interesses sociais mais relevantes, eventos esses que já oneram sobremaneira o custo da tarifa de ônibus vinculado ao Sistema de Transporte Coletivo Urbano de Passageiros na Cidade de São Paulo.

Destarte, não há dúvida que a ampliação do universo de tais gratuidades concorrerá para o acréscimo de novos custos para esse sistema, já bastante sobrecarregado, cujos ônus recairiam sobre os usuários que pagam a tarifa e ao erário municipal, vindo a comprometer a saúde financeira do sistema o que, a toda evidência, contraria o interesse público.

Por outro lado, não há como deixar de assinalar que, ao impor a necessidade de aporte adicional de recursos - de expressivo montante, frise-se - a medida importa considerável aumento de despesas, sem a indicação dos recursos correspondentes, a par de envolver matéria orçamentária e de interferir na competência exclusiva do Executivo para conduzir a execução orçamentária. Demais disso, acha-se ela em desacordo com o disposto nos artigos 15 e 16 da Lei Complementar Federal nº 101, de 4 de maio de 2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal), o que a inquina, concomitantemente, de inconstitucionalidade e ilegalidade.

Aliás, o Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, em casos análogos, tem proclamado reiteradamente a inconstitucionalidade de textos legais como o ora vetado:

“Dessa forma, determinando, por meio de lei, a adoção de medidas específicas de execução, houve ingerência de um Poder em relação ao outro, com nítida invasão de competência e infringência ao artigo 5º, “caput”, da Constituição do Estado. ................................................................................A par disso, é evidente que a execução da indigitada lei iria provocar despesas. Sem constar a indicação dos recursos disponíveis próprios para atender aos novos encargos, era de rigor o veto, nos termos do artigo 25 da Constituição do Estado”. (ADIN nº 44.255.0/5-00 - Rel. Des. Franciulli Netto, v.u., j. em 19.05.99: no mesmo sentido: ADIN nº 59.744.0/1 - Rel. Des. Mohamed Amaro, ADIN nº 11.676-0, Rel. Des. Milton Coccaro; ADIN nº 11.803-0, Rel. Des.Yussef Cahali; ADIN nº 65.779-0/0, Rel. Des. Flávio Pinheiro).

Por fim, faz-se mister ponderar que boa parte dos integrantes das Polícias Militar e Civil, bem assim da Guarda Civil Metropolitana, quando não se encontrarem fardados, poderão se utilizar dessa gratuidade para fins não relacionados à segurança pública, incentivados pelo benefício, o que, a toda evidência, descaracteriza sua finalidade, fere o interesse público e o salutar princípio constitucional da isonomia (Const. Federal, art. 5º, “caput”) em relação aos demais usuários dos transportes públicos.

Pelo exposto, ante as razões apontadas, que evidenciam a inconstitucionalidade, a ilegalidade e a contrariedade ao interesse público que maculam irremediavelmente o texto aprovado, vejo-me compelida a vetá-lo na integra, com fulcro no § 1º do artigo 42 da Lei Orgânica do Município de São Paulo.

Assim sendo, devolvo o assunto à apreciação dessa Egrégia Câmara que, com seu elevado critério, se dignará a reexaminá-lo.

Na oportunidade, renovo a Vossa Excelência protestos de elevado apreço e distinta consideração.

MARTA SUPLICY

Prefeita

Ao

Excelentíssimo Senhor

ARSELINO TATTO

Presidente da Câmara Municipal de São Paulo

Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo