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RAZÕES DO VETO AO PROJETO DE LEI Nº 319/2007; OFÍCIO DE 28 de Janeiro de 2009

Razões de Veto ao Projeto de Lei nº 319/07

Ofício ATL nº 21/09

Ref.: Ofício SGP-23 nº 00085/2009

Senhor Presidente

Por meio do ofício acima referenciado, ao qual ora me reporto, Vossa Excelência encaminhou à sanção cópia autêntica do Projeto de Lei nº 319/07, de autoria da então Vereadora Soninha, aprovado por essa Egrégia Câmara na sessão de 16 de dezembro de 2008, que objetiva alterar dispositivos da Lei nº 11.780, de 30 de maio de 1995, e da Lei nº 11.804, de 19 de junho de 1995, no que se refere aos períodos para emissão de ruídos no Município de São Paulo.

Com esse desiderato, propõe-se nova redação para o disposto: a) no § 2º do artigo 1º da aludida Lei nº 11.780, de 1995, que dispõe sobre as obrigações do Poder Público Municipal e dos proprietários ou incorporadores de edificações, no controle da poluição sonora no Município de São Paulo, e b) nos incisos I e II do parágrafo único do artigo 2º da Lei nº 11.804, também de 1995, que dispõe sobre a avaliação da aceitabilidade de ruídos na Cidade de São Paulo.

Em ambos os casos, o propósito é alterar os horários de emissão de ruídos, delimitando como período diurno o intervalo entre 8 (oito) e 22 (vinte e duas) horas e como período noturno o intervalo entre 22 (vinte e duas) e 8 (oito) horas, salvo em se cuidando de sábados e vésperas de feriado, quando o período noturno será das 22 (vinte e duas) às 9 (nove) horas, tudo com vistas ao conforto da comunidade e ante a necessidade da adequação dessa legislação à NBR 10.151, da Associação Brasileira de Normas Técnicas – ABNT, alterada no ano de 2000.

Entretanto, embora reconhecendo o nobre intento que por certo norteou a apresentação da proposta legislativa, o fato é que não se encontram presentes as condições necessárias à sua conversão em lei, ante sua inconstitucionalidade e ilegalidade, na conformidade das razões a seguir explicitadas, razão pela qual sou compelido a vetar integralmente o texto assim aprovado, o que faço com supedâneo no § 1º do artigo 42 da Lei Orgânica do Município.

No sistema de escalonamento de normas jurídicas, o Planto Diretor tem sua fonte normativa mediata insculpida no § 1º do artigo 182 da Constituição Federal, o qual estipula a obrigatoriedade de sua adoção pelas cidades com mais de 20.000 (vinte mil) habitantes, e sua fonte normativa imediata nas diretrizes gerais fixadas pelo Estatuto da Cidade (Lei Federal nº 10.257, de 10 de julho de 2001). Este último diploma legal dá efetividade ao contido nos artigos 182 e 183 da Carta Magna da República, que tratam especificamente da política urbana, tornando o Plano Diretor o instrumento básico da política de desenvolvimento e expansão urbana, cuja aprovação, no Legislativo local, deve se dar mediante o quórum qualificado de 3/5 (três quintos) de seus membros e submissão a, no mínimo, duas audiências públicas (Lei Orgânica do Município de São Paulo, artigos 40, § 4º, e 41).

O Plano Diretor constitui-se do conjunto de regrais legais que dá a direção da ocupação ordenada do Município, promovendo o seu desenvolvimento global, sob os aspectos físico, social, econômico e administrativo ou, de maneira resumida, é o vetor do administrador público, o qual deste jamais poderá se apartar ou agir sem a observância estrita de suas normas. Portanto, a Lei Orgânica do Município e o Plano Diretor são o sustentáculo de toda a estrutura organizacional da política de desenvolvimento da Cidade.

Assim, desde a edição da Lei nº 13.430, de 13 de setembro de 2002, que institui o Plano Diretor Estratégico e o Sistema de Planejamento e Gestão do Desenvolvimento Urbano do Município de São Paulo, e da Lei nº 13.885, de 25 de agosto de 2004, que estabelece normas complementares ao Plano Diretor Estratégico, institui os Planos Regionais Estratégicos das Subprefeituras, dispõe sobre o parcelamento, disciplina e ordena o uso e ocupação do solo, ambas estatuídas conforme disposições constantes da Constituição Federal, do Estatuto da Cidade e da Lei Orgânica do Município, as ações estratégicas visando o controle das fontes de poluição sonora e a criação de instrumentos para o monitoramento do ruído difuso, bem como os parâmetros gerais para a instalação de usos residenciais e não residenciais e a construção de edificações no território do Município de São Paulo passaram a ter nessas novas regras a sua fonte máxima de fundamentação.

Por conseguinte, toda e qualquer legislação preexistente às leis acima citadas (Leis nº 13.430/02 e nº 13.885/04) deve, necessariamente, ser interpretada em conformidade com essa nova fonte de direito, sob pena de incidir em ilegalidade.

Nesse sentido, é se de registrar que a Lei nº 13.885/04, em seus artigos 174 e seguintes, ao disciplinar o uso e a ocupação do solo, fixou os parâmetros gerais da construção de edificações e da instalação dos usos, incluindo a emissão de ruído como fator de incomodidade, tanto para os usos residenciais quanto para os usos não residenciais, cujo limite varia de acordo com a zona de uso.

No seu artigo 175, § 2º, disciplinou especificamente referida lei que a emissão de ruídos gerados por atividades temporárias, dentre as quais se destacam as obras e reformas, deve observar os parâmetros de incomodidade fixados para a zona ou via onde essas atividades estejam sendo executadas, não deixando dúvida quanto à obrigatoriedade de respeito aos limites de emissão de ruídos estabelecidos pela Lei nº 13.885/04, independentemente de se cuidar de construção ou reforma de edificação de uso residencial ou não residencial. Previu também, no seu artigo 177, § 2º, que a norma básica a ser utilizada para a avaliação dos ruídos é a NBR 10.151, justamente na redação da edição de junho de 2000.

Em virtude desse regramento, constatando-se que a obra ou reforma está produzindo ruídos acima do legalmente permitido, deverá ser aplicada a multa estabelecida no Quadro 09, anexo à Parte III, item 11, da aludida Lei nº 13.885/04, bem como promovido o seu embargo.

Como se pode perceber, esse direcionamento legal da questão esvazia por completo a proposta contida no projeto de lei ora vetado, mormente por restar evidenciado que a Lei nº 13.885/04 já procedeu à pretendida adequação da norma municipal em vigor sobre ruído à indigitada NBR 10.151 (e/ou a qualquer outra que venha a substituí-la ou sucedê-la).

De outra parte, se o controle do ruído encontra-se disciplinado de acordo com o parâmetro de tolerância fixado para a zona de uso ou via onde esteja sendo executada a obra ou reforma, como previsto na Lei nº 13.885/04, devem as Leis nº 11.780/95 e nº 11.804/95, anteriores, ser interpretadas levando-se em consideração a nova disciplina legal para a matéria.

Enfim, a interpretação do arcabouço jurídico que disciplina o controle da emissão de ruídos na Cidade de São Paulo e os horários dentro do quais pode ocorrer a sua produção deve sempre considerar, em primeiro lugar, as normas insertas na Lei nº 13.885/04, sem que seja necessário proceder-se à alteração da legislação preexistente a esse diploma legal e ao Plano Diretor Estratégico do Município.

Em todo caso, havendo a intenção de alterar os parâmetros assim estabelecidos, a respectiva proposta legislativa deverá obedecer ao disposto nos artigos 46 e 40, § 4º, da Lei Orgânica do Município de São Paulo, os quais proclamam que a legislação referente ao Plano Diretor e ao zoneamento urbano só pode ser alterada uma vez por ano e mediante o voto favorável de 3/5 (três quintos) dos membros da Câmara Municipal. Para a propositura em apreço, ainda que se a considere como a lei específica prevista no § 2º do artigo 46 da Lei Maior local, há de ser observado o quórum especial de 2/3 (dois terços) dos membros do Legislativo e a expressa autorização exigida pela alínea “b” do mesmo dispositivo.

Nessas condições, evidenciadas as razões de ordem constitucional e legal que me conduzem a vetar na íntegra a mensagem aprovada, devolvo o assunto ao reexame dessa Colenda Casa de Leis.

Na oportunidade, renovo a Vossa Excelência meus protestos de apreço e consideração.

GILBERTO KASSAB

Prefeito

Ao

Excelentíssimo Senhor

ANTONIO CARLOS RODRIGUES

Digníssimo Presidente da Câmara Municipal de São Paulo

 

 

Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo