CASA CIVIL DO GABINETE DO PREFEITO

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PARECER PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO - PGM Nº 12.039 de 10 de Setembro de 2019

EMENTA N. 12.039
Projeto de lei autorizativa. Contratação de operação de crédito para financiar a quitação de precatórios judiciais. Regularidade formal e adequação à Lei Orgânica do Município. Exclusão de dispositivo que, nominando-se garantia, cede ativos municipais em caráter irrevogável e irretratável, em caráter pro solvendo e com outorga de poderes de mandato em causa própria. Desnaturação do caráter condicional da garantia. Transferência antecipada da titularidade dos créditos. Simulação e pacto comissório. Nulidade absoluta dos negócios jurídicos resultantes.

Processo nº 6017.2019/0036173-5

INTERESSADA: Secretaria da Fazenda

ASSUNTO: Minuta de projeto de lei que autoriza o Poder Executivo a contratar operação de crédito para financiar a quitação de precatórios judiciais.

Informação n. 1316/2019 - PGM.AJC

PGM.AJC

Senhora Procuradora Chefe

O Núcleo de Precatórios da PGM encaminhou a consulta formulada no documento SEI 020097365, solicitando que se analise a minuta do projeto de lei que integra o SEI 018746507.

Trata-se de projeto de lei autorizativa, destinada a possibilitar que o Município contrate operações de crédito para financiar a quitação de precatórios judiciais.

A motivação da lei foi exposta no SEI 018881496, referendada nas manifestações posteriores.

É de competência privativa do Prefeito, segundo previsto nos incisos X e XIV do art. 69 da Lei Orgânica do Município, respectivamente, "propor à Câmara projetos de lei relativos a operações de crédito" e "propor à Câmara a contratação de empréstimos para o Município".

Cabe à Câmara, por sua feita, "deliberar sobre a concessão de empréstimos e operações de crédito, bem como sobre a forma e os meios de pagamento" (art. 13, V, da LOM), mediante lei cuja aprovação dependerá do voto favorável da maioria absoluta de seus integrantes (art. 40, § 3°, VIII), com eventual manifestação do Tribunal de Contas (art. 48, b, VI).

A lei também é necessária para instrução do pedido de autorização destinado ao Ministério da Fazenda, nos termos do art. 32, § 1°, I, parte final, da Lei Complementar n. 101/2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal) e art. 21, II, da Resolução n. 43/2001 do Senado Federal, ou, se externa a captação, ao próprio Senado.

Segundo acentua na Exposição de Motivos (SEI 018881496),

A Emenda Constitucional n° 99/2017 manteve a inovação trazida pela Emenda Constitucional n° 94/2016 quanto à possibilidade de financiamento do montante que superar a média de comprometimento da RCL no período anterior a vigência do regime especial, sem a aplicação de quaisquer limites de endividamento.

Cumpre reforçar que, embora prevista a não aplicação dos limites de endividamento ao caso, é de se observar que o Município de São Paulo ostenta situação de endividamento confortável uma vez que a Dívida Consolidada Liquida no 1° quadrimestre de 2019 representou 61,47% da RCL, enquanto o limite legal fixado pela Resolução do Senado Federal n° 43/2001 é de 120%, sendo a ele permitida a contratação de operações de crédito.

De fato, o art. 101, § 2°, inciso III do ADCT, com a redação prevista pela Emenda Constitucional n. 99/2017, prevê que os empréstimos admitidos como recursos adicionais para quitação dos precatórios excetuam-se dos limites de endividamento de que cuidam os incisos VI e VII do art. 52 da Constituição Federal, abstraindo-se o fato informado pela SF/SUTEM, em relação à contenção ao mesmo limite da Dívida Consolidada Líquida.

Outro ponto potencialmente obstativo ao projeto, embora não referido nos encaminhamentos anteriores, decorre do "contrato de confissão, consolidação, promessa de assunção e refinanciamento de dívidas que, entre si, celebram a União e o Município de São Paulo" (SEI n. 6017.2019/0036173-5) cuja cláusula 12ª estipula que "somente poderá contrair novas dívidas, inclusive empréstimos ou financiamentos externos junto a organismos financeiros internacionais e operações de antecipação de receita orçamentária, se a dívida financeira do Município for inferior à sua RLR (Receita Líquida Real) anual.

Este limite foi estabelecido de maneira convencional e diverge daquele adotado pelo Senado Federal (art. 52, VI e VII da CF) com o qual não se confunde, concluindo-se, portanto, pela inaplicabilidade da ressalva formulada no inciso III do § 2° do art. 101 do ADCT.

Não se aplicam ao caso concreto as exceções previstas no parágrafo único da cl. 12ª do contrato (operações de crédito instituídas por programas federais, destinadas à modernização e ao aparelhamento da máquina administrativa dos municípios; tomadas ao BID, no limite de US$ 100.400.000,00 e ao BNDES, no limite de R$ 741.197.458,00, relativos, respectivamente, aos projetos PROCENTRO e Programa Prioritário dos Investimentos de Transportes do Município).

Este possível óbice deverá ser verificado - quanto à dívida financeira, tomando-se como parâmetro a RLR anual - de maneira a prevenir a aplicação de sanções contratuais e eventual impedimento para realização das operações de crédito.

Portanto, o projeto de lei parece cumprir o desiderato legal, no que colhe à oportunidade e legalidade.

A minuta enviada atende a estes pressupostos, com exceção do disposto no art. 6°, que deverá ser excluído.

Explica-se: o art. 5° da minuta prevê a autorização para constituição de garantias ao ente mutuante, especialmente a vinculação de receitas de impostos, cuja proibição, constante do art. 167, IV, da Constituição Federal, foi superada pelo art. 101, § 2°, III, do ADCT (EC 99/2017), para o caso concreto, isto é, os empréstimos destinados à quitação de precatórios.

Esta garantia, contudo, está redigida de maneira inadequada, no art. 6°.

Isto porque a cessão ou vinculação de direitos ou créditos é realizada de imediato, em caráter irrevogável e irretratável (inciso I), a título pro solvendo (inciso II), outorgando-se poderes ao credor para cobrar e receber diretamente do devedor estes mesmos créditos (já teriam sido cedidos - incisos III e IV).

Note-se que a garantia, ao menos como tal, é sujeita a uma condição suspensiva, que é o inadimplemento do devedor.

A cessão irretratável e irrevogável do crédito desnatura esta condição, transformando a operação de crédito em securitização, tornando-a nula (nulidade absoluta) por simulação (art. 167, § 1°, II, do Código Civil).

A cessão pro solvendo e a outorga de poderes para cobrança e recebimento do crédito, por sua feita, transferem ao credor mutuante a titularidade antecipada da garantia, configurando-se em pacto comissório, proibido pelo Código Civil, tanto na instituição de garantias reais quanto fiduciárias (artigos 1428 e 1365), sob pena de nulidade.

Para Luciano de Camargo Penteado (Direito das Coisas, RT, 2008, p. 437), a vedação ao pacto comissório aponta a necessidade de tutelar a própria função de garantia, deturpada se fosse lícita a sua contratação.

O art. 6°, ademais, implica subtração indevida e desproporcional do patrimônio municipal - seus ativos - em possível prejuízo de si e suas demais obrigações.

A título meramente ilustrativo, o acórdão proferido pelo Superior Tribunal de Justiça no Recurso Especial n. 954.903-RS expõe a natureza e os efeitos da vedação legal: "No caso, resta perfeitamente configurada a figura do pacto comissório, pois, simulando a celebração de contratos de compromisso de compra e venda, foram instituídas verdadeiras garantias reais aos ajustes de factoring, permitindo que, em caso de inadimplência, fossem os bens transmitidos diretamente ao credor. Avença nula de pleno direito."

O artigo 6°, nos seus incisos III e IV também outorga ao mandato em causa própria (art. 685 do Código Civil), que permite ao credor verdadeira transferência para si mesmo dos bens objeto do mandato, dispensada a prestação de contas, desnaturando-se a natureza do crédito, que perderá as suas características e privilégios originais (créditos tributários).

Logo, a permanência do art. 6° na minuta induz a negócio jurídico nulo, motivo pelo qual deverá ser excluído, ou substituído por outro que não permita a configuração do pacto comissório, não configure mandato em causa própria e não retire da execução da garantia sua natureza naturalmente condicional.

O art. 5°, caput, já basta, no âmbito da autorização que se deseja obter do Poder Legislativo. Note-se que a obtenção de garantias da União, capitulada no parágrafo único, não foi especificada por dispositivo correlato ao art. 6°, o que, em si, já evidencia sua natureza dispensável, abstraindo-se a nulidade que dele poderá defluir.

Propõe-se, então, o acolhimento da proposta, verificando-se eventual óbice decorrente do contrato de refinanciamento de dívidas formulado com a União, e excluindo-se da minuta o art. 6°.

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São Paulo, 10/09/2019

Celso A. Coccaro Filho

Procurador Municipal - JUD.G

OAB n.° 98.071

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Processo nº 6017.2019/0036173-5

INTERESSADA: Secretaria da Fazenda

ASSUNTO: Minuta de projeto de lei que autoriza o Poder Executivo a contratar operação de crédito para financiar a quitação de precatórios judiciais.

Concordo com o encaminhamento proposto.

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São Paulo, 10/09/2019

Ticiana Nascimento de Souza Salgado

Procuradora Assessora Chefe- AJC.CGC-PGM

OAB/SP 175.186

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Processo nº 6017.2019/0036173-5

INTERESSADA: Secretaria da Fazenda

ASSUNTO: Minuta de projeto de lei que autoriza o Poder Executivo a contratar operação de crédito para financiar a quitação de precatórios judiciais.

Continuação da Informação n. 1316/2019 - PGM.AJC

Procuradoria-Geral do Município

Senhor Procurador-Geral

Encaminho-lhe o parecer da AJC, que acolho, nos aspectos enfocados: a.- regularidade formal da proposta; b.- verificação antecipada de eventual óbice à captação de operações de crédito em função do contrato de refinanciamento avençado com a União Federal; c.- exclusão do artigo 6° da minuta, com base nos fundamentos expostos.

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São Paulo, 11/09/2019

TIAGO ROSSI

COORDENADOR GERAL DO CONSULTIVO

OAB/SP 195.910

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Processo nº 6017.2019/0036173-5

INTERESSADA: Secretaria da Fazenda

ASSUNTO: Minuta de projeto de lei que autoriza o Poder Executivo a contratar operação de crédito para financiar a quitação de precatórios judiciais. Considerações adicionais.

Informação n. 1453/2019 - PGM.AJC

PGM.AJC

Senhora Procuradora Chefe

Em acréscimo ao parecer SEI 020462970, teço as presentes considerações.

A motivação é a existência de diplomas anteriores (Leis Municipais 15.390/2011 e 16.985/2018), dos quais consta redação de dispositivo relativo à garantia a ser dada às operações de crédito, semelhante àquela cuja alteração foi sugerida (art. 6°).

O fato poderia ter efeito contestatório, tendo em vista que os diplomas anteriores foram promulgados sem restrições.

Observo que padrões redacionais são bem vindos, mas não indistintamente aplicáveis.

Na Lei Municipal 13.609/2003 previu-se a vinculação de cotas do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e Serviços - ICMS (art. 4°), sem qualquer alusão à cessão irretratável, ao caráter pro solvendo e à outorga da cobrança, até porque desnecessários.

Na Lei Municipal 14.656/2007 (art. 3°), a garantia consistia na cessão, sob a forma de reservas de pagamento, das verbas de que trata o art. 159, III e § 4° da Constituição (art. 177, § 4° da CF).

Nos diplomas referidos inicialmente, cuja redação é semelhante àquela adotada no PL, as garantias previstas eram as receitas do art. 158 e 159, I, "b" e "d" da CF (Lei 15.389/11), além da menção genérica a "garantias admitidas em direito" (apenas na Lei 16.985/2018).

Nestas hipóteses a garantia foi estabelecida com base nas receitas oriundas da repartição constitucional, tanto indiretas como diretas.

Há vício técnico, eis que não se trata a garantia como obrigação exigível em caso de inadimplemento, mas como forma direta de pagamento.

Porém, como o fluxo do capital garantidor é oriundo da União ou dos fundos de participação, cuja retenção é em regra proibida (art. 160 da CF), há certa fungibilidade entre o que se concebe como "garantia", de caráter eventual, e forma de adimplemento obrigacional, que não é eventual, e o defeito no texto legal tende a ser inócuo e facilmente suprível na redação dos negócios jurídicos de mútuo.

Na presente hipótese, porém, o capital garantidor tem natureza diversa, como havia sido acentuado:

Explica-se: o art. 5° da minuta prevê a autorização para constituição de garantias ao ente mutuante, especialmente a vinculação de receitas de impostos, cuja proibição, constante do art. 167, IV, da Constituição Federal, foi superada pelo art. 101, § 2°, III, do ADCT (EC 99/2017), para o caso concreto, isto é, os empréstimos destinados à quitação de precatórios.

Esta garantia, contudo, está redigida de maneira inadequada, no art. 6°.

Isto porque a cessão ou vinculação de direitos ou créditos é realizada de imediato, em caráter irrevogável e irretratável (inciso I), a título pro solvendo (inciso II), outorgando-se poderes ao credor para cobrar e receber diretamente do devedor estes mesmos créditos (já teriam sido cedidos - incisos III e IV).

Note-se que a garantia, ao menos como tal, é sujeita a uma condição suspensiva, que é o inadimplemento do devedor.

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A cessão pro solvendo e a outorga de poderes para cobrança e recebimento do crédito, por sua feita, transferem ao credor mutuante a titularidade antecipada da garantia, configurando-se em pacto comissório, proibido pelo Código Civil, tanto na instituição de garantias reais quanto fiduciárias (artigos 1428 e 1365), sob pena de nulidade.

......................................................................................

O art. 6°, ademais, implica subtração indevida e desproporcional do patrimônio municipal - seus ativos - em possível prejuízo de si e suas demais obrigações.

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O artigo 6°, nos seus incisos III e IV também outorga ao mandato em causa própria (art. 685 do Código Civil), que permite ao credor verdadeira transferência para si mesmo dos bens objeto do mandato, dispensada a prestação de contas, desnaturando-se a natureza do crédito, que perderá as suas características e privilégios originais (créditos tributários).

Tratando-se de receita de impostos, a serem pagos pelos contribuintes ordinários e deles cobrados, há regime jurídico diverso, que não é compatível com a cessão antecipada irrevogável e irretratável desta mesma receita, não recomenda que esta cessão se faça em caráter pro solvendo, sob pena de criação de "garantia rotativa", nem que se confira ao mutuante a faculdade de cobrança, que desnaturará a natureza tributária da receita, mediante mandato que dispensa a prestação de contas.

Tal o motivo pelo qual o padrão redacional adotado em diplomas anteriores não deve ser reproduzido neste PL, e tal é a razão pela qual o parecer teceu aquela singular ressalva, consistente na exclusão ou alteração do art. 6°, de modo a evitar os efeitos acima cogitados.

Observo que o Decreto n. 57.647/2017, que dispõe sobre o processo de contratação de operações de créditos, prevê que a escolha da proposta de financiamento seguirá os princípios da Administração Pública (art. 6°) e deverá levar em consideração o "custo financeiro, fluxo de pagamentos, comprometimento anual da receita com serviços da dívida, diversificação cambial e risco de juros" (art. 9°), de maneira que avaliações relativas a dispositivos de lei ou de contratos, que possam gerar desequilíbrios, são servis ao ato normativo.

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São Paulo, 10/10/2019

Celso A. Coccaro Filho Procurador Municipal - JUD.G

OAB n.° 98.071

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Processo nº 6017.2019/0036173-5

INTERESSADA: Secretaria da Fazenda

ASSUNTO: Minuta de projeto de lei que autoriza o Poder Executivo a contratar operação de crédito para financiar a quitação de precatórios judiciais. Considerações adicionais.

Nada a opor ao acréscimo proposto, cujo teor acolho.

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Ticiana Nascimento de Souza Salgado

Procuradora Assessora Chefe- AJC.CGC-PGM

OAB/SP 175.186

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Processo nº 6017.2019/0036173-5

INTERESSADA: Secretaria da Fazenda

ASSUNTO: Minuta de projeto de lei que autoriza o Poder Executivo a contratar operação de crédito para financiar a quitação de precatórios judiciais. Considerações adicionais.

Continuação da Informação n. 1453/2019 - PGM.AJC

Procuradoria-Geral do Município

Senhor Procurador-Geral

Encaminho-lhe o adendo ao parecer, que acolho e que contrapõe a redação dada ao art. 6° do PL com diplomas legislativos anteriores e que recomenda a sua exclusão ou alteração.

Reitero a proposta anterior, não alterada.

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São Paulo, 10/10/2019

TIAGO ROSSI

COORDENADOR GERAL DO CONSULTIVO

OAB/SP 195.910 

PGM
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Processo nº 6017.2019/0036173-5

INTERESSADA: Secretaria da Fazenda

ASSUNTO: Minuta de projeto de lei que autoriza o Poder Executivo a contratar operação de crédito para financiar a quitação de precatórios judiciais. Considerações adicionais.

Continuação das Informações n. 1316/2019 e 1453/2019 - PGM.AJC

CASA CIVIL

ASSESSORIA TÉCNICO-LEGISLATIVA

Senhora Procuradora Chefe

Encaminho-lhe o pronunciamento da AJC - parecer e adendo - que acolho.

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São Paulo, 11/10/2019

MARINA MAGRO BERINGHS MARTINEZ

PROCURADORA GERAL DO MUNICÍPIO

OAB/SP 169.314

PGM

Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo