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PARECER PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO - PGM Nº 11.780 de 23 de Agosto de 2017

EMENTA N° 11.780

Patrimônio Imobiliário. Passagem. Abertura aprovada pela municipalidade. Logradouro denominado. Concurso voluntário caracterizado. Domínio público confirmado.

TID 16729038

INTERESSADAS: Claudia Ribeiro de Aquino Padilha e outras

ASSUNTO: Pedido de desoficialização de logradouro. Rua Dr. Elpídio Reali.

Informação n° 1.264/2017-PGM.AJC

PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO

COORDENADORIA GERAL DO CONSULTIVO

Senhora Procuradora Coordenadora Substituta

Pretendem as interessadas a reforma da decisão que, nos autos do PA 2000-0.098.521-6, indeferiu o pedido de desoficialização da rua Dr. Elpídio Reali. Para tanto, alegam que não foram parte no mencionado processo.

Conforme exposto pelo DEMAP (fls. 64), porém, a conclusão acerca do caráter público do logradouro deve ser mantida, uma vez que as interessadas não apresentaram qualquer fato ou argumento capaz de alterar a decisão impugnada. 1

Em síntese, nos termos expostos nos referidos autos (fls. 45/56), especialmente na Informação n° 277/2016-PGM-AJC, trata-se de via pública com origem em plano de abertura de passagem aprovado pela PMSP e devidamente denominada pelo Decreto n° 35.727/93, cuja integração ao domínio público ocorreu mediante o chamado concurso voluntário.

Assim, para a devida apreciação do assunto, convém resgatar, antes de mais nada, o exato conceito do instituto, tal como exposto por Eduardo Vianna Motta, ao examinar os modos de aquisição dos bens de uso comum do povo pelas pessoas jurídicas de Direito Público.2

Em resumo, como se sabe, compete ao poder público municipal a abertura de vias de circulação urbanas. Contudo, os particulares podem colaborar com a Administração nessa tarefa, transferindo gratuitamente ao patrimônio público os bens destinados a essa finalidade, uma vez que, de acordo com o nosso ordenamento jurídico, tais bens são públicos.

Tal transferência ocorre mediante o chamado concurso voluntário, que já era admitido pela doutrina e pela jurisprudência mesmo antes da sua consagração na legislação brasileira.Por essa razão, aliás, é que não há necessidade de registro imobiliário dos bens de uso comum.

No entanto, para a caracterização do concurso voluntário e indispensável, em primeiro lugar, a manifestação de vontade do particular no sentido de oferecer o bem, seja de forma expressa, mediante o requerimento de aprovação de parcelamento do solo, seja de forma tácita, mediante a simples abertura das ruas.

Além do mais, para o aperfeiçoamento do contrato administrativo do concurso voluntário, com a consequente transferência do domínio das vias e logradouros abertos, deve ocorrer também a aceitação desses espaços pela Administração, pois, se assim não fosse, o interesse particular estaria se sobrepondo ao interesse público, já que os munícipes decidiriam quando e onde implantar as vias públicas. A respeito do assunto, merece ser reproduzida a seguinte lição de Eduardo Vianna Motta:

"Do fato do loteamento inicia-se o processo de formação do concurso voluntário. A vontade do particular, como vimos, pode decorrer de expressa manifestação, de formal declaração, ou decorrer de fatos, e então será de manifestação tácita. Para consumar-se o concurso voluntário, será de mister o acasalamento das duas vontades: a do particular e a da administração. Também está pode dar-se de maneira formal ou tácita. A manifestação da vontade da administração dá-se através da afetação. Sem a afetação, a coisa, embora oferecida irrevogavelmente, ainda é particular.(...) Essa afetação poderá ser tácita: a execução de obras, por exemplo. "3

No mesmo sentido, a manifestação da então Secretaria dos Negócios Jurídicos no PA 2006-0.277.759-0 (informação n° 3.308/2013-SNJ.G), ressaltando que a afetação ao uso público pode assumir uma variedade de formas, expressas ou tácitas, como a regularização de um loteamento, a oficialização de vias ou mesmo a realização de obras públicas em logradouros abertos, não sendo possível o reconhecimento do uso público de um determinado espaço até a prática de algum desses atos, ainda que o local apresente as características correspondentes.

Logo, no caso em exame, cabe verificar se ocorreu, efetivamente, o concurso voluntário, nos termos assim resumidos por Eduardo Vianna Motta na RT 338/43:

"O que é preciso, sim, para que se realize o contrato administrativo do concurso voluntário é a existência de inequívoca vontade de contratar pelas partes: inequívoca vontade de ofertar por parte do particular, e inequívoca vontade de aceitar, por parte da administração. Desde então, conjugadas as vontades, dar-se-á a transferência do domínio."

Pois bem, a abertura da passagem, identificada como PS 108, foi aprovada pela Municipalidade mediante o alvará n° 10.104, expedido em 12/10/1940, nos autos do processo administrativo n° 67.682/40, durante, portanto, a vigência dos artigos 749 a 7614 da antiga Consolidação do Código de Obras aprovada pelo Ato n° 663, de 10/08/34, que considerava tais logradouros públicos (artigo 2o, item 14 e artigo 734).5

Desse parcelamento do solo resultaram novos lotes, com lançamento fiscal e registro imobiliário individualizados, que foram alienados a terceiros sem a correspondente fração ideal do leito da via.

Além do mais, a passagem em questão, foi denominada pelo Decreto n° 35.727/93, sendo irrelevante que tenha sido designada inicialmente como particular.

Com efeito, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo já decidiu na Apelação Cível n° 239.505-1/7:

"Dispensável é, com efeito, o registro da passagem como via pública. Os modos de aquisição de domínio imobiliário em direito público diferem das formas de aquisição do direito privado. Uma vez aprovada e realizada materialmente, ocorre automaticamente a sua transferência do domínio particular para o domínio público, independente de outro ato qualquer, consoante a teoria do concurso voluntário, aplicável à espécie."

Seja como for, a denominação apenas reforçou o caráter público do logradouro, uma vez que, de acordo com o artigo 759 do antigo Código de Obras, as passagens não precisavam ser oficialmente recebidas pela Prefeitura, já que a sua abertura representava uma forma simplificada de parcelamento do solo.

Além do mais, o relatório de vistoria e fotografias existentes no PA 1991-0.009.959-7, que tratou da denominação do logradouro, demonstram a abertura da via e a sua afetação ao uso público, podendo ser observada, inclusive, a pavimentação asfáltica típica das vias públicas.

Portanto, em decorrência do parcelamento do solo executado no local, o logradouro foi oferecido ao domínio público, que, por sua vez, aceitou a via, ocorrendo, assim, a sua transferência para o patrimônio municipal como bem de uso comum do povo, em consonância com a teoria do concurso voluntário. Reforçando tal conclusão, o Decreto n° 27.568/88, com as alterações introduzidas pelo Decreto n° 34.049/94, considera oficiais as vias que sirvam de acesso a lotes que possuam registro junto à circunscrição imobiliária competente, bem como os logradouros que tenham sido denominados, como no caso em exame.

Nesse sentido, as Informações 1.736/2014-PGM-AJC (Informação 0085/2015-SNJ.G), 846/2015-PGM-AJC, 1.268/2015 PGM-AJC e 1.036/2015 PGM-AJC. Aliás, ainda que o projeto de abertura da passagem não tivesse sido aprovado pela Municipalidade, a conclusão seria a mesma, de acordo com precedentes a respeito da matéria (Informações 423/2015-PGM.AJC e 1.115/2015-PGM.AJC, acolhidas por SNJ.G, conforme, respectivamente Informação n° 1025/2015-SNJ.G e Informação n° 2465/2015-SNJ.G).

Os interessados, porém, ajuizaram em face da Municipalidade uma ação por apossamento administrativo do leito da via, julgada improcedente pela sentença de primeiro grau em razão do reconhecimento do domínio público sobre o logradouro decorrente do parcelamento do solo executado no local.

Já o acórdão mencionado pelas requerentes, manteve a improcedência do pedido, mas por outro fundamento, ou seja, que não houve apossamento do bem e tampouco afetação ao uso público, ressalvando a possibilidade de os autores buscarem, pela via administrativa ou mediante o ajuizamento de ação autônoma, o "restabelecimento do pleno domínio sobre o imóvel" (fls. 34). Portanto, ao contrário do que sustentam as requerentes (fls. 07), não existe decisão judicial transitada em julgado reconhecendo a natureza particular da via.

Aliás, ao examinar questão semelhante, o próprio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, no precedente acima mencionado (Apelação Cível n° 239.505-1/7), decidiu o seguinte:

"Segundo consta, em face de solicitação de interessados e através de processo administrativo instaurado, em 1951 a MUNICIPALIDADE DE SÃO PAULO autorizou, mediante alvará, a abertura de uma via de acesso a uma vila onde seriam construídas 19 habitações (fls. 268), com entrada pela Rua Borges Lagoa, altura do n° 1.565. Posteriormente a referida passagem e o pátio de manobras criado nos fundos foram oficializados pelo Decreto n° 10.145/72, da AR-VM (fls. 265/266).

A passagem aberta foi, inclusive, objeto de averbação no competente Cartório de Registro de Imóveis (fls. 274) e induvidosamente passou a fazer parte integrante do patrimônio público municipal, na categoria de rua pública, ou bem de uso comum do povo, pouco importando a circunstância da área ter sido designada de 'passagem particular'. Embora de uso restrito, eis que destinada principalmente aos moradores da vila, a via sempre foi aberta ao público em gerai Com toda certeza, inclusive, recebeu melhoramentos públicos, como pavimentação, iluminação, etc.

Se o acesso pertencesse com exclusividade aos moradores dos 19 sobrados desnecessário teria sido o projeto para a abertura e aprovação pela Municipalidade." (Apelação n° 239.505.1/7).

O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, diga-se de passagem, em recente julgado, ao examinar caso semelhante, confirmou o entendimento anterior (Apelação Cível n° 0018075-45.2011.8.26.0053).

Diante do exposto, opino no sentido do indeferimento do novo pedido de desoficialização da rua Dr. Elpídio Reali, podendo o presente expediente, na sequência, alcançar o PA 2000-0.098.521-6.

Por fim, antes do despacho decisório, SMUL deverá convocar as interessadas para o recolhimento da taxa de recepção de requerimentos e documentos para autuação.

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São Paulo, 23/08/2017.

RICARDO GAUCHE DE MATOS

PROCURADOR ASSESSOR - AJC

OAB/SP 89.438

PGM

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1. Aliás, o requerimento anterior teve como fundamento o mesmo acórdão proferido na Apelação n° 921.747-5/2-00, que é mencionado na inicial.
2 RT volumes 332/49, 333/49, 334/57, 335/67, 336/39, 337/44, 338/43, 339/47 e 390/51.
3 RT 338/43.
4 Os dispositivos citados disciplinavam o retalhamento de quadras ou de porções de terrenos já servidos por vias públicas para a construção de casas populares.
2. "Art. 2 Para todos os efeitos deste Código, as seguintes palavras ficam assim definidas:
14 - Passagem:
Denomina-se "passagem" a via pública de largura mínima de quatro metros, subdividindo quadras, ou porções de terrenos, encravados ou não, para a construção de "casas populares" nos termos definidos neste Código.
Art. 734 - Para os efeitos deste Código, ficam as vias públicas do Município classificadas nas seguintes categorias:
3a categoria - passagens (só para a construção de "casas populares") largura mínima de quatro metros;

 .

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TID 16729038

INTERESSADAS: Claudia Ribeiro de Aquino Padilha e outras

ASSUNTO: Pedido de desoficialização de logradouro. Rua Dr. Elpídio Reali.

Cont. da Informação n° 1.264/2017-PGM.AJC

 SMUL G

Senhora Chefe de Gabinete

Encaminho o presente com as manifestações do DEMAP e da AJC, que acompanho, para deliberação a respeito do pedido de desoficialização do logradouro em questão.

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São Paulo, 28/05/2017.

TICIANA ANSCIMENTO DE SOUZA SALGADO

PROCURADORA DO MUNICÍPIO

COORDENADORA GERAL DO CONSULTIVO - SUBSTITUTA

OAB/SP 175.186

PGM

Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo