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PARECER PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO - PGM Nº 1.102 de 6 de Setembro de 2016

Informação n° 1.102/2016-PGM.AJC
Doação de material de iluminação pública para outro ente federativo. Análise da incidência do disposto no art. 73, §10, da Lei federal n° 9.504/97 (Lei eleitoral).

Processo n° 2016-0.018.090-2

INTERESSADO: SECRETARIA MUNICIPAL DE SERVIÇOS

ASSUNTO: Doação de material de iluminação pública para outro ente federativo. Análise da incidência do disposto no art. 73, §10, da Lei federal n° 9.504/97 (Lei eleitoral).

Informação n° 1.102/2016-PGM.AJC

COORDENADORIA GERAL DO CONSULTIVO

Assessoria Jurídico-Consultiva

Senhor Procurador Assessor Chefe

Trata-se de processo autuado para doação de bens (material de iluminação pública) considerados, pelo ILUME, como inservíveis, para outros entes federativos possivelmente interessados.

Na manifestação de fls. 50/52, a d. assessoria jurídica da Secretaria do Governo Municipal expôs - dentre outras questões - entendimento de que a doação só poderia ser feita após o encerramento do ano eleitoral, considerando a vedação contida no art. 73, §10, da Lei federal n° 9.504/97. Por outro lado, a d. assessoria jurídica de SES, no parecer de fls. 59/63, manifestou-se no sentido da inaplicabilidade da vedação legal no caso concreto, considerando que a doação se fará a outro ente da Federação - e não a eleitores -, o que afasta o risco de tal conduta desequilibrar o pleito em favor de certos candidatos.

Em razão da divergência de posicionamentos, SES/AJ sugeriu o encaminhamento do processo a esta Procuradoria Geral, para que a questão relativa à incidência da vedação contida no art.73, §10, da Lei federal n° 9.504/97 seja dirimida.

É o relato do necessário.

Nos termos do dispositivo legal sobre o qual pesa a divergência:

Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais:

(...)

§ 10. No ano em que se realizar eleição, fica proibida a distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios por parte da Administração Pública, exceto nos casos de calamidade pública, de estado de emergência ou de programas sociais autorizados em lei e já em execução orçamentária no exercício anterior, casos em que o Ministério Público poderá promover o acompanhamento de sua execução financeira e administrativa (Incluído pela Lei n° 11.300, de 2006).

A d. assessoria jurídica de SGM, ao sugerir a aplicação da norma ao caso concreto, propôs uma interpretação literal da disposição, fiada, ainda, em precedente do Tribunal Superior Eleitoral (acórdão de fls. 44/49), o qual, embora não tenha analisado situação semelhante a do caso em tela (por não se tratar de doação exclusivamente entre entes federativos), também incorporou interpretação literal do comando normativo, afastando a possibilidade de doação, pelo IBAMA, de bens perecíveis apreendidos em decorrência do exercício do poder de polícia ambiental a órgãos e entidades públicos ou privados, apesar de tal doação estar autorizada em lei e inobstante pareceres favoráveis tanto da assessoria do TSE quanto do Ministério Público (fls. 45/46 e 56/58).

Por outro lado, a d. assessoria jurídica de SES propôs uma interpretação teleológica do dispositivo citado, ao ressalvar que a doação pretendida não apresenta potencial para desequilibrar o pleito em favor de qualquer candidato concorrente a cargos eletivos no Município doador, pois o beneficiário não é eleitor, e sim um ente federativo.

Julgamos que a interpretação de SES/AJ é razoável, já que, no caso concreto, não se antevê potencialidade lesiva da conduta em relação ao pleito eleitoral. Parece-nos, em princípio, que, quando o §10 do art. 73 da Lei eleitoral menciona "distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios por parte da Administração Pública", a disposição pretende abranger a doação a pessoas físicas ou jurídicas privadas, que podem influenciar o pleito, retribuindo o benefício na forma de apoio. As exceções previstas no corpo da disposição legal (casos de calamidade pública, de estado de emergência ou de programas sociais autorizados em lei e já em execução orçamentária no exercício anterior) tendem a reforçar tal entendimento, na medida em que se dirigem, ordinariamente, à distribuição de bens e benefícios a pessoas privadas.

Ademais, eventual argumentação de que a doação, embora não tenha o condão de beneficiar os atuais gestores da Administração Pública doadora, poderia desequilibrar o pleito no âmbito do Município donatário em favor dos atuais gestores, esbarra na falta de vedação, pela lei eleitoral, de transferências de recursos entre Municípios, eis que o art. 73, VI, alínea 'a', apenas proíbe, nos três meses antecedentes ao pleito, a "transferência voluntária de recursos da União aos Estados e Municípios, e dos Estados aos Municípios, sob pena de nulidade de pleno direito, ressalvados os recursos destinados a cumprir obrigação formal preexistente para execução de obra ou serviço em andamento e com cronograma prefixado, e os destinados a atender situações de emergência e de calamidade pública".

Nada obstante, a interpretação literal - e mais rígida - do dispositivo legal encontra certa ressonância na jurisprudência do TSE, que, ao cuidar das vedações previstas no art. 73, por vezes afasta a possibilidade de interpretação finalística ao supor que o prejuízo ao pleito é presumido, inerente a própria conduta. Neste sentido:

"Representação. Conduta vedada. Art. 73, VI, b e § 10, da Lei n° 9.504/97. [...]. 3. Ainda que a distribuição de bens não tenha caráter eleitoreiro, incide o § 10 do art. 73 da Lei das Eleições, visto que ficou provada a distribuição gratuita de bens sem que se pudesse enquadrar tal entrega de benesses na exceção prevista no dispositivo legal. [...]."

(Ac. de 19.8.2010 no AgR-AI n° 12165, rel. Min. Arnaldo Versiani.)

"Ação de investigação judicial eleitoral. Candidatos a prefeito e vice-prefeito. Eleições de 2012. Conduta vedada. Ofensa ao art. 275 do código eleitoral. Não configurada. Preliminares de ilegitimidade recursal e cerceamento de defesa. Rejeitadas. Art. 73, inciso IV e §§ 4º, 5º e 10, da Lei n° 9 504/97. Doação gratuita de bens durante o ano eleitoral. Inexistência. Conduta não caracterizada. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, provido [...]. 6. No ano eleitoral, é possível a distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios, desde que no bojo de  programas sociais autorizados em lei e já em execução orçamentária no exercício anterior. 7. As condutas do art. 73 da Lei n° 9.504/97 se configuram com a mera prática dos atos, os quais, por presunção legal, são tendentes a afetar a isonomia entre os candidatos, sendo desnecessário comprovar a potencialidade lesiva. (Ac. de 5.8.2014 no REspe n° 1429, rel. Min. Laurita Vaz.)

"Conduta vedada. Distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios. 1. À falta de previsão em lei específica e de execução orçamentária no ano anterior, a distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios, em ano eleitoral, consistente em programa de empréstimo de animais, para fins de utilização e reprodução, caracteriza a conduta vedada do art. 73, §10, da Lei n° 9.504/97. [...]"

(Ac. de 13.12.2011 no RO n° 149655, rel. Min. Arnaldo Versiani.)

"[...] 1. A conduta vedada do art. 73, VI, b, da Lei n° 9.504/97, qual seja, veiculação de publicidade institucional nos três meses anteriores ao pleito, reclama, para sua configuração, apenas e tão somente a realização do ato ilícito, tornando-se desnecessária a comprovação de potencialidade lesiva [...]

(Ac. de 14.5.2015 noAgR-REspe n° 20871, rel. Min. Luiz Fux.)

"[...] conforme jurisprudência desta Corte, no que tange ao tema das condutas vedadas do art. 73 da Lei das Eleições, o requisito da potencialidade é examinado apenas quando se cogita da cassação do registro ou do diploma [...]."

(Ac. de 25.11.2010 no AgR-AI n° 31488, rel. Min. Arnaldo Versiani.)

"[...] Conduta vedada a agente público. [...] Propaganda política em imóvel público. Ocorrência. Potencialidade. Inexigibilidade em razão de presunção legal. Proporcionalidade na sanção. Multa no valor mínimo. 1. Uso em benefício de candidato de imóvel pertencente à administração indireta da União. 2. Inexigível a demonstração de potencialidade lesiva da conduta vedada, em razão de presunção legal. 3. Juízo de proporcionalidade na aplicação da sanção. 4. Recurso ordinário a que, se dá provimento para aplicar multa no mínimo legal.

(Ac. de 28.10.2009 no RO n° 2.232, rel: Min. Ricardo Lewandowski.)

"[...] 1. A jurisprudência do TSE considera que a configuração da prática de conduta vedada independe de sua potencialidade lesiva para influenciar o resultado do pleito, bastando a mera ocorrência dos atos proibidos para atrair as sanções da lei. [...]"NE: No caso concreto, "[...] a propaganda eleitoral na escola pública municipal configurou a prática de conduta vedada pelo art. 73, I, da Lei n° 9.504/97". Embora tenha reconhecido a ocorrência de tal prática, o Tribunal Regional deixou de aplicar as sanções cabíveis em razão de não ter ficado demonstrada a potencialidade de tal conduta influir no resultado do pleito.

(Ac. de 4.12.2007 no REspe n° 27.737, rel. Min. José Delgado.)

Em sentido contrário, pela necessidade de existir, no caso concreto, potencialidade para causar desequilíbrio no pleito:

"Consulta. Banco do Brasil. Projeto Criança Esperança. Apoio e doação. Natureza de processo administrativo. Prioridade constitucional absoluta à criança. Dever do Estado. Inexistência de objetivo eleitoral. Possibilidade."

(Res. n° 22.323, de 3.8.2006, rel. Min. Carlos Ayres Britto.)

"[...] 2. Representação. Conduta vedada. Art. 73 da Lei n° 9.504/97. Potencialidade de a conduta comprometer o resultado do pleito. Condição indispensável para configuração do ilícito eleitoral. Precedentes. A potencialidade de a conduta interferir no resultado das eleições, segundo posicionamento atual e dominante do TSE, é requisito essencial à caracterização do ilícito eleitoral previsto no art. 73 da Lei n° 9.504/97. [...] 3. Conduta vedada. Captação ilícita de sufrágio. Pressupostos de configuração. Equiparação. Impossibilidade. É inviável equiparar os pressupostos de configuração dos ilícitos previstos nos arts. 41-A e 73 da Lei Eleitoral, pois a vedação á captação de sufrágio visa a proteger o voto livre do eleitor, e não o equilíbrio entre os candidatos no pleito. [...]"

(Ac. de 19.6.2008 no ARESPE n° 27.197, rel. Min. Joaquim Barbosa; no mesmo sentido, Ac. de 7.5.2009 no RO n° 1.516, rel. Min. Marcelo Ribeiro.) 

"1. Ação de investigação judicial eleitoral. Art. 73, I, III e V, da Lei n° 9.504/97. [...] 2. Influência no equilíbrio do pleito. Inexistência. Ausência de configuração de conduta vedada a agente público. Precedente. [...] Para configuração de conduta vedada a agente público, segundo os tipos da Lei das Eleições, o fato deve apresentar capacidade concreta para comprometer a igualdade do pleito."NE: Trecho do voto do relator: "[...] para que se configure o tipo do art. 73 da Lei das Eleições, deve-se verificar, no caso, se o fato apresenta capacidade concreta - não teórica, pois essa decorre do texto legal - de comprometer a igualdade entre os candidatos do pleito. [...] Se a Corte Regional, analisando os fatos à luz das provas, entendeu que não houve comprometimento da igualdade entre os candidatos, inexistindo potencialidade nos fatos para influenciar o resultado da eleição, o tipo não se realizou, de modo que se não justifica pena alguma."

(Ac. de 22.3.2007 no AgRgREspe n° 25.758, rel. Min. Cezar Peluso.)

 

"[...] 1. A existência de potencialidade para desequilibrar o resultado do pleito é requisito indispensável para o reconhecimento da prática de conduta vedada. [...]"

(Ac. de 10.10.2006 no AgRgREspe n° 25.754, rel. Min. Caputo Bastos.)

Vê-se, portanto, há séria controvérsia no TSE acerca de como devem ser interpretados os tipos legais previstos no art. 73 da Lei eleitoral. Em alguns julgados, a Corte entendeu ser necessária potencialidade lesiva, enquanto, em outros, se posicionou no sentido de que o mero enquadramento no tipo legal seria suficiente para atrair suas conseqüências.

Isso atrai uma incerteza jurídica para a doação que se deseja realizar, agravada pelo fato de não termos localizado decisões judiciais a respeito de situações semelhantes às do caso em tela (doação para entes federativos). Caberá à Superior Administração ponderar os riscos e decidir a respeito, nos termos da competência outorgada pelo Decreto municipal n° 55.117/141.

Sub censura

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São Paulo, 06/09/2016.

RODRIGO BRACET MIRAGAYA

Procurador Assessor - AJC

OAB/SP 227.775

PGM

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De acordo.

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São Paulo, 08/09/2016.

TIAGO ROSSI

Procurador Assessor Chefe - AJC

OAB/SP 195.910

PGM

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1 Art. 2° Fica delegada ao Secretário do Governo Municipal a competência para autorizar a doação dos bens móveis de que trata este decreto, obedecidos os parâmetros legais vigentes.

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Processo n° 2016-0.018.090-2

INTERESSADO: SECRETARIA MUNICIPAL DE SERVIÇOS

ASSUNTO: Doação de material de iluminação pública para outro ente federativo. Análise da incidência do disposto no art. 73, §10, da Lei federal n° 9.504/97 (Lei eleitoral).

Cont. da Informação n° 1.102/2016-PGM.AJC

PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO

Senhor Procurador Geral do Município

Encaminho estes autos a Vossa Excelência, com a manifestação da Assessoria Jurídico-Consultiva desta Coordenadoria Geral, que acompanho, no sentido de que, embora razoável a interpretação de SES/AJ segundo a qual seria inaplicável o disposto no art. 73, §10, da Lei federal n° 9.504/97 ao caso em análise, por - considerando a natureza do donatário - inexistir potencialidade de prejuízo ao equilíbrio eleitoral, há profunda divergência na jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral acerca da necessidade de haver potencialidade de prejuízo ao equilíbrio do pleito para o enquadramento da conduta nos tipos legais previstos no art. 73 da Lei eleitoral. Consequentemente, por não haver segurança jurídica na operação, sugerimos que eventual doação seja realizada somente após o período eleitoral.

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São Paulo, 05/10/2016.

ANTÔNIO CARLOS CINTRA DO AMARAL FILHO

COORDENADOR GERAL DO CONSULTIVO

OAB/SP 162.363

PGM

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Processo n° 2016-0.018.090-2

INTERESSADO: SECRETARIA MUNICIPAL DE SERVIÇOS

ASSUNTO: Doação de material de iluminação pública para outro ente federativo. Análise da incidência do disposto no art. 73, §10, da Lei federal n° 9.504/97 (Lei eleitoral).

Cont. da Informação n° 1.102/2016-PGM.AJC

SECRETARIA MUNICIPAL DE SERVIÇOS

Senhor Secretário

Encaminho estes autos a Vossa Excelência, para ciência da manifestação da Coordenadoria Geral do Consultivo, que endosso, no sentido de que, embora razoável a interpretação de SES/AJ segundo a qual seria inaplicável o disposto no art. 73, §10, da Lei federal n° 9.504/97 ao caso em análise, por - considerando a natureza do donatário - inexistir potencialidade de prejuízo ao equilíbrio eleitoral, há profunda divergência na jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral acerca da necessidade de haver potencialidade de prejuízo ao equilíbrio do pleito para o enquadramento da conduta nos tipos legais previstos no art. 73 da Lei eleitoral. Consequentemente, por não haver segurança jurídica na operação, sugerimos que eventual doação seja realizada somente após o período eleitoral.

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São Paulo, 05/10/2016.

ROBINSON SAKIYAMA BARREIRINHAS

PROCURADOR GERAL DO MUNICÍPIO

OAB/SP 173.527

PGM

Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo