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RECOMENDAÇÃO SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO - SME/CME Nº 7 de 9 de Dezembro de 2021

Dispõe sobre a  Busca Ativa Escolar.

CONSELHO MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO

SEI: 6016.2021/0129560-2

Interessado: Conselho Municipal de Educação - CME

Assunto: Busca Ativa Escolar

Conselheiras Relatoras: Maria Cecília Carlini Macedo Vaz (Presidente), Fátima Cristina Abrão, Maria Adélia Gonçalves Ruotolo e Silvana Lucena dos Santos Drago.

Recomendação CME nº 07/2021

Aprovado em Sessão Plenária de 09/12/2021

 

I – RELATÓRIO

1. Histórico

O Conselho Municipal de Educação (CME), órgão normativo e deliberativo, com incumbência de propor encaminhamentos para o funcionamento do Sistema Municipal de Ensino, no uso de suas atribuições, propõe orientações para que as unidades educacionais elaborem os seus planos de ação para assegurar localização, acesso e permanência de todos os estudantes, considerando os dados da sua realidade em relação às condições de aprendizagem, retenção, abandono e evasão, efetivando ações de Busca Ativa Escolar.

2. Introdução

A crise mundial provocada pela Pandemia da Covid 19 impôs um novo cenário, um ambiente completamente desafiador, instável e inseguro que impactou, significativamente, os modos de vida, os valores, os princípios, as prioridades que, até então, regiam a sociedade em todo mundo. Prevenir a doença e manter-nos física e emocionalmente saudáveis constituíram-se ações prioritárias. Além disso, tornou-se imperioso criar novas formas para realizar atividades cotidianas e restabelecer os relacionamentos pessoais, bem como promover oportunidades de interação, mesmo que de forma virtual. Na educação, os formatos não presenciais apresentam-se como um dos caminhos para ensinar e aprender. Considerando-se as condições socioeconômicas e de formação midiática, a utilização da tecnologia digital para a continuidade das atividades educacionais afeta, de modo desigual, as famílias e os diferentes grupos de professores. Consequentemente, observa-se a ampliação das desigualdades quando comparadas as condições mínimas de acesso ao conhecimento e aos bens culturais entre estudantes das redes públicas e privadas.

Nóvoa (2020) reconhece o esforço dos professores que, em colaboração uns com os outros e com as famílias, conseguiram organizar estratégias pedagógicas significativas para este tempo tão difícil e considera inaceitável que a escola pública fechasse as portas e não quisesse saber dos seus alunos.

[...]De um modo geral, ninguém estava preparado para esta situação e a avaliação que, hoje, já podemos fazer revela aspectos negativos, como as desigualdades e o empobrecimento pedagógico, mas também positivos, como a ligação com as famílias e a inventividade de muitos professores. p.8 (Nóvoa 2020)

A situação inusitada, provocada pela Pandemia, traz o reconhecimento da sociedade sobre a importância da escola e do trabalho desenvolvido pelos educadores. O papel da escola, enquanto promotora do direito à educação, sai fortalecido enquanto instituição que tem, no bojo da sua competência, a função precípua de educação e de proteção social. Torna-se evidente a preocupação dos educadores com um público que sente, de forma bastante singular, os impactos da pandemia nas suas vidas: os estudantes que fazem parte dos grupos de maior vulnerabilidade social e econômica e que não podem ser alijados do direito à educação de qualidade.

No campo dos desafios e das dificuldades, localizar esses estudantes e promover condições para o desenvolvimento e para as aprendizagens, são compromissos dos quais não se pode abrir mão, sob nenhuma circunstância. Paulo Freire (1996) afirma que a ação dos Educadores está além do ensino dos conteúdos: é uma forma de intervenção no mundo.

“Assim como não posso ser professor sem me achar capacitado para ensinar certo e bem os conteúdos de minha disciplina não posso, por outro lado, reduzir minha prática docente ao puro ensino daqueles conteúdos. Esse é um momento apenas da minha atividade pedagógica. Tão importante quanto ele, o ensino dos conteúdos, é o meu testemunho ético ao ensiná-los. É a decência com que o faço.” p. 116 (FREIRE 1996)

3. Estratégias Pedagógicas em tempos de Pandemia

As alternativas pedagógicas desenvolvidas durante a pandemia não foram poucas: aula remota (síncrona/assíncrona), utilização de plataformas digitais, redes sociais, telefone, televisão, material impresso. Contudo, as dificuldades de acesso digital acentuaram-se durante a pandemia, especialmente para os grupos considerados mais vulneráveis.

Pesquisas sobre educação escolar em tempos de pandemia como as realizadas pela Fundação Carlos Chagas (2020), Gestrado-CNT (2020) destacam a capacidade de inventividade e dedicação das professoras e dos professores. Havia, sim, o desejo de que ninguém fosse deixado para trás, mas somente o desejo dos educadores não se consubstancia o suficiente para, no período do afastamento social, localizar os estudantes que não dispunham de qualquer condição para acesso às atividades não presenciais. SALES e EVANGELISTA (2020), ao realizar pesquisa com objetivo de analisar os impactos sobre o trabalho docente na educação básica pública, decorrentes das medidas protetivas, consideram:

A questão socioeconômica é um fator importante que nos ajuda a pensar nos desafios impostos pela pandemia. Estudantes com condições econômicas desfavorecidas acabam por enfrentar mais dificuldades em acompanhar os novos formatos de ensino remoto, tendo em vista que, muitas vezes, esses possuem a exigência do uso de recursos tecnológicos para garantir a continuidade dos processos de ensino-aprendizagem. p. 862 (SALES e EVANGELISTA - 2020)

Localizar os estudantes, afastados da vida escolar, é prioridade. As causas que levaram a esse afastamento podem ser diversas: deficiência, gravidez na adolescência, desemprego na família, situação de rua, abrigamento, conflito com a lei, falta de transporte, trabalho infantil, preconceito ou discriminação racial, transfobia, xenofobia, violência doméstica, violência na escola ou na comunidade, ou mesmo evasão por considerar a escola desinteressante.

Conhecer e compreender essas causas são pontos fundantes para a construção de estratégias que possibilitem o retorno, o fortalecimento dos vínculos e a garantia da permanência na escola.

4. Busca Ativa Escolar

A Busca Ativa Escolar é uma estratégia pautada em metodologia social sob a responsabilidade de todas as instâncias da Educação e caracteriza-se como uma ferramenta fundamental para concretização da função social da escola. (Plataforma Busca Ativa Escolar UNICEF - 2021)

No Brasil, segundo dados do Censo Escolar de 2020, são 47,3 milhões de matrículas nas 179,5 mil escolas de educação básica. Deste total de matrículas, 81,5% pertencem a redes públicas, sendo 48,4% municipal, 32,1% estadual e 1% União. A rede privada conta com 18,5%.

Pesquisa realizada, em 2020, no período de novembro a dezembro, pelo Instituto Datafolha, constatou que cerca de 2 milhões de estudantes da educação básica abandonaram a escola em 2020. A taxa de abandono foi de 4,6% no ensino fundamental e 10,8% no ensino médio, sendo que, em 2019, o índice foi de 1,2% e 4,8%, respectivamente, de acordo com dados oficiais do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep). Ainda de acordo com a pesquisa, 11,4% dos(as) estudantes do ensino fundamental, que abandonaram a escola ano passado, não pretendiam voltar em 2021. Entre aqueles(as) do ensino médio, a taxa dobra (22,8%). Problemas financeiros, dificuldades com o ensino remoto ou mesmo falta de aulas são alguns dos motivos alegados pelos(as) entrevistados(as) para o abandono escolar.

Outro estudo, que vem sendo realizado pela Fundação Carlos Chagas (2021), refere-se ao “Abandono escolar e a pandemia no Brasil: efeitos nas desigualdades escolares”. Neste estudo, os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios - COVID19 (PNAD COVID19) são analisados pela perspectiva da interseccionalidade levando-se em conta duas faixas etárias (11 a 14 anos e 15 a 17 anos), sexo, raça/cor e deficiência. A PNAD não apresenta dados desagregados sobre pessoas com deficiência, o que inviabiliza a análise e atenção adequada às trajetórias desse grupo. Os resultados indicam que a questão racial é o primeiro eixo divisor nas condições de acesso às estratégias educacionais na pandemia. No ensino fundamental em termos de Brasil, observa-se:

De acordo com os resultados encontrados, a população de crianças e adolescentes entre 11 e 14 anos é formada por 30% de meninos negros; 29,3% de meninas negras; 20,7% de meninos brancos e 19,9% de meninas brancas. Apesar de representarem a maior porcentagem de pessoas nessa faixa etária, os meninos negros são os que têm menos acesso às atividades (40,6%), os que não fizeram as atividades escolares (44,5%) e a maioria dos que não frequentam a escola (45,1%).

As marcas de gênero também estão presentes entre os meninos brancos e meninas brancas. Nos grupos “não recebem” e “não realizam” atividades, as diferenças entre as porcentagens de meninos brancos e meninas brancas são de aproximadamente 5 pontos percentuais favorável às meninas brancas (entre os que não recebem atividades, 10,1% são meninas brancas, 14,2% são meninos brancos e, entre os que não realizam atividades, 12,7% são meninas brancas e 17,4% são meninos brancos). As meninas negras representam 29,3% da população geral; mas, quando considerado o recorte "não receberam atividades escolares em casa", esse índice sobe para 35,1%.

O estudo ainda destaca que no Ensino Médio os meninos negros representam a maioria da população brasileira na faixa etária de 15 e 17 anos, porém sua presença na escola não tem a mesma representatividade.

Os meninos negros somam quase 10 pontos percentuais a mais em relação aos meninos brancos (30,8% versus 20,4%) na população brasileira. No entanto, os meninos negros representam 45,1% dos que não frequentam a escola, mais de 10 pontos percentuais do que a soma dos meninos brancos (15,3%) e meninas brancas (16,0%) que não frequentam (31,3%). Eles também têm a maior porcentagem entre os adolescentes na mesma faixa etária que não receberam (40,6%) e que não entregaram as atividades escolares (44,5%). (Fundação Carlos Chagas/ Departamento de Pesquisas Educacionais 2021)

O panorama apresentado pelas pesquisas traz um recorte da situação e, também, suscita a necessidade de investigar outras tantas variáveis que interferem na vida dos estudantes e de suas famílias. Documento elaborado pelo Grupo do Banco Mundial alerta que vivemos desafios sem precedentes:

Os efeitos da pandemia transcendem o impacto direto na aprendizagem ou escolaridade: permeiam muitas outras esferas da vida dos estudantes e, provavelmente, persistirá por um longo tempo. Muitos estudantes, particularmente os oriundos dos grupos de renda mais baixa e aqueles que já estavam aprendendo muito pouco mesmo antes da crise, têm agora um risco muito maior de abandonar os estudos por causa da pandemia. Isto é ainda mais verdadeiro em um contexto de dificuldade econômica e recessão, como ocorre na América Latina e no Caribe. Algumas simulações sugerem que o abandono escolar na América Latina e Caribe pode aumentar em 15% por causa da pandemia. p.7 (Grupo Banco Mundial 2021)

5. Cidade de São Paulo: Identificando desafios para promoção da equidade

A determinação de afastamento social, em consequência da Pandemia do Covid 19 no território nacional, representou o fechamento das escolas por 178 dias. Durante esse período, a escola reinventou-se e trabalhou com diversas iniciativas para localizar estudantes que, por diferentes motivos, afastaram-se da vida escolar, mesmo na forma virtual.

No caso da Rede Municipal de Ensino da cidade de São Paulo, com 1.070 milhões de estudantes (Sistema EOL set.2021), distribuídos em cerca de quatro mil unidades educacionais localizadas em regiões que apresentam diferenças sociais e econômicas significativas, foram desenvolvidas ações conjuntas envolvendo todas as instâncias da SME e, também, outras Secretarias para realizar o monitoramento e acompanhamento da frequência, com foco na identificação das necessidades dos estudantes e de suas famílias que pudessem impossibilitar a participação nas atividades escolares.

Ao analisar os dados do CadÚnico Município de São Paulo, cadastro que organiza um conjunto de informações sobre as famílias brasileiras em situação de vulnerabilidade social, evidencia-se a severa realidade em que se encontram as famílias dos estudantes da rede municipal de ensino, uma vez que 583.504, mais de 50% deste contingente, factualmente, enquadram-se nas características deste cadastro, sendo 295.174 em situação de extrema pobreza; 96.583 em situação de pobreza; 138.085 no grupo de população de baixa renda e, por fim, 53.652, com ganhos acima de 1/2 salário mínimo.

Segundo dados do Núcleo de Apoio e Acompanhamento para a Aprendizagem - NAAPA, no período de fechamento das escolas, foram priorizados o atendimento e acompanhamento de 10.426 estudantes que cursavam os 3º e 6º anos do ensino fundamental. Destes estudantes, a indicação inicial era que: 2.229 apresentavam dificuldade de aprendizagem; 2.849 referia-se à permanência na escola; 3.188 questões relativas à saúde/saúde mental ou apresentavam dificuldade nas interações sociais; 3.045 em situação de vulnerabilidade social e outros 633 apresentavam questões diversas. Deste total, 8.024 foram considerados estudantes com sério risco de evadirem da escola.

Outra situação identificada, que afeta a vida das meninas, é a gravidez. Segundo dados do SINASC, CEIinfo – SMS/SP de dezembro de 2020 o total de mães adolescentes na cidade de São Paulo foi de 12.120 nas idades entre 15 a 19 anos e 370 com idade inferior a 15 anos, perfazendo o total de 12.490. Estudo realizado por Garcia e Da Silva (2004), em pesquisa intitulada “Juventudes e Sexualidade”, levantou um dado de que no Brasil: uma de cada dez estudantes engravida antes dos 15 anos. (anexo 2)

Com relação a participação dos estudantes do ensino fundamental, médio e da EJA, durante o ensino remoto, os dados levantados pela SME são bem preocupantes, tendo em vista que, aproximadamente, 30% do total de estudantes não entregaram nenhuma ou somente parte das atividades propostas durante o período de fechamento das escolas. Evidencia-se, portanto, o risco iminente de evasão, caso providências urgentes não sejam tomadas para proceder a Busca Ativa Escolar.

Busca Ativa Escolar, prevista em legislação nacional, Constituição Federal/1988 (CF), (art. 208) (inciso VIII, § 2º), condiciona como responsabilidade do poder público “recensear os educandos no ensino fundamental, fazer-lhes a chamada e zelar, junto aos pais ou responsáveis, pela frequência à escola”, bem como o controle e o acompanhamento do acesso à educação escolar, a identificação de estudantes que apresentem frequência irregular, com o objetivo de assegurar o direito à educação e a prevenção do abandono e da evasão escolar. Esta ação prevista no Plano Nacional de Educação, aprovado pela Lei nº 13.005, de 25 de junho de 2014, determina diretrizes, metas e estratégias para a política educacional no período de 2014 a 2024 e, também consubstanciada no PME (Plano Municipal de Educação), aprovado pela Lei 16.271/15, nas Metas 5 (estratégia 5.8), 6 (estratégia 6.3), 8 e 10 (estratégia 10.2), sendo que especificamente na Meta 6, a Estratégia 6.3 estabelece a necessidade de “[...]Promover, em regime de colaboração com o Estado de São Paulo e a União, a Busca Ativa de crianças e adolescentes fora da escola, em parceria com órgãos públicos de assistência social, saúde e proteção à infância, adolescência e juventude”.

Nesse sentido, o CME publicou, em 20 de agosto de 2020, a Recomendação e a Resolução nº 4 para que as Unidades Educacionais (UE), atentas às determinações do Comitê de Contingência da COVID-19, aos protocolos da Secretaria Municipal de Saúde e às orientações da Secretaria Municipal de Educação, desenvolvessem ações na busca de contato com seus estudantes, visando o vínculo de todos com suas escolas, turmas/agrupamentos e as aprendizagens.

Nas referidas normativas foram determinadas a implantação de processo intensivo de Busca Ativa, por meio de ações conjuntas da SME, DRE, UE e equipamentos da Saúde, Ação Social, Direitos Humanos, bem como foram realizadas orientações às Equipes Gestoras das DRE, das U.E para o estabelecimento de estratégias de Busca Ativa e o desenvolvimento de ações preventivas para evitar o abandono e a evasão escolar, com enfoque também no acolhimento e ações flexibilização.

Em relação a Busca Ativa foram indicadas estratégias envolvendo ações conjuntas e diálogo constante entre SME, DREs e UEs.

A Secretaria Municipal de Educação de São Paulo ao ser informada pelas equipes das unidades educacionais do número significativo de estudantes que não estavam participando das atividades ou acessando os materiais e/ou as orientações de atividades, elaborou diversas Instruções Normativas (INs SME nº 55/2020, 03/2021, 07/2021, 29/2021, e 35/2021), conforme se apresentavam as condições sanitárias e a evolução da pandemia, a fim de favorecer a participação efetiva destes estudantes.

Ao analisar as inúmeras iniciativas das Unidades Educacionais, das Diretorias Regionais de Educação e dos setores da Secretaria Municipal de Educação é importante destacar, a relevância do trabalho do(a) Professor(a) realizado nos diferentes espaços educativos podendo ser considerado, metaforicamente, como a “ponta de lança” do enfrentamento da desigualdade de acesso, evidenciado pela pandemia. As ações desenvolvidas pelos educadores mostram-se determinantes para prevenir a evasão e para estimular a manutenção de vínculo entre estudantes e escolas. Pesquisa realizada por GABRIEL, MARÇAL e IMBERNON (2021) relata estratégias utilizadas pela equipe de uma escola municipal de ensino fundamental, junto à comunidade, para que os estudantes não perdessem o vínculo com a escola.

Saímos nas ruas do bairro de carro e com um megafone para divulgar o Google Sala de aula para os estudantes e famílias, fizemos vários vídeos de divulgação e orientação e postamos na página do Facebook da escola, nossa diretora criou grupos de WhatsApp para todas as turmas da escola e incluímos os pais e responsáveis, trabalho que continua até hoje diariamente incluímos pessoas nos grupos, o que se tornou um canal de comunicação muito importante. pág. 6 GABRIEL, MARÇAL e IMBERNON (2021)

Ações como a relatada na pesquisa, foram incontáveis na RME, bem como o compromisso dos Educadores com os estudantes e com a sua comunidade. Chegamos a um ponto central, como diz ARROYO (2000), a escola é antes de tudo um tempo-espaço de encontro de gerações, de pessoas em tempos diversos de socialização, interação, formação e aprendizagem das artes de ser humano. [...] A escola e os docentes têm que estar atentos à construção social do conhecimento, à construção cultural dos sujeitos. p.231

Neste sentido, é ofício dos educadores despertar em todos o desejo de aprender e, especialmente, em pessoas que têm sua trajetória interrompida por privação de direitos sociais básicos. Por isso, não se pode aceitar como irrefutável a máxima de que danos irreparáveis acometeram nossos estudantes. Este argumento serviria apenas para aumentar as desigualdades educacionais presentes, de forma estrutural, na sociedade brasileira.

6. Aprendizados da Pandemia

A educação, conforme previsto no Marco Legal Brasileiro, é um direito inalienável, mesmo durante crises e emergências, sendo, portanto, inaceitável a privação de direitos educacionais de crianças, jovens e adultos independentemente de qualquer condição ou diferença.

Arroyo (2000) alerta para a necessidade de “recuperar a humanidade roubada” supõe que ainda que nós, adultos, nos revelamos tão humanos quanto os educandos precisamos refletir e aprender que “educar é revelar saberes, significados, mas antes de mais nada revelar-nos como docentes em nossa condição humana. É nosso ofício. É nossa humana docência” pg.67

A reflexão coletiva sobre o que aprendemos nesse tempo de isolamento é absolutamente necessária, pois pensar ações que não passem única e exclusivamente pela sondagem de conhecimentos mensuráveis na forma escrita é de fundamental importância. É flagrante a insustentável verdade de que muitos estudantes não puderam acessar as propostas oferecidas. Torna-se, portanto, imperioso recusar qualquer medida excludente, classificatória ou automática para que se faça valer o genuíno direito à Educação. Como diz SINGER (2021) “A urgência de transformação que a pandemia traz deve orientar agora os esforços no sentido de reconhecer, valorizar e multiplicar as escolas que existem sobre outros pilares e de refletir coletivamente sobre os muitos aprendizados da pandemia.”

II – AÇÕES A SEREM DESENVOLVIDAS

A presente Recomendação traz indicação de ações para a realização da Busca Ativa Escolar, compreendida aqui não como procedimento técnico, burocrático de identificação dos sujeitos, mas sim como um campo de possibilidades em defesa da vida, da cidadania e da humanização.

1. Busca Ativa

A busca ativa, parte integrante das estratégias cotidianas das UEs, deve estar incluída nos planos de ação de forma articulada ao Projeto Político Pedagógico (PPP) para a prevenção do abandono e da evasão escolar. Organizar ações que atentem para questões como:

* frequência, análise de faltas consecutivas e/ou interpoladas;

* defasagem idade/ano, trajetória escolar; (ANEXO 2)

* falta de acessibilidade ao currículo;

* conhecimento do perfil do estudante em relação a sua participação:

- participação nas atividades;

- interesse/desinteresse pelas propostas oferecidas;

- interesses específicos de conhecimento acima do apresentado para o coletivo;

- relações interpessoais com colegas e equipe escolar;

- dificuldades de aprendizagem;

- dificuldades de aprendizagem por descontinuidade;

- eventos de indisciplina, dificuldade habitual para seguir as regras propostas de convivência.

2. Acolhimento

O cuidado na Escola vai além do espaço físico. Envolve diálogo, sinergia, amorosidade. Acolher se transforma em atitude, deixa de ser um ato pontual, em momentos específicos do contexto pedagógico, para tornar-se parte integrante, constante e contínua, do Projeto Político Pedagógico. Ações envolvendo atividades colaborativas entre escola e território constituem um meio para estreitar laços.

3. Identificar causas e providenciar encaminhamentos para os órgãos competentes

Ações que demandam intervenções ao identificar motivos que afetam a participação dos estudantes na vida escolar e que precisam ser foco das reflexões nas diferentes instâncias democráticas da Unidade Educacional, com o cuidado ético de preservar a pessoa. Pode-se destacar alguns exemplos: gravidez na adolescência, cuidador de irmãos, cuidador de idosos, cuidador de pessoas com deficiência, cuidador de pessoas doentes, trabalho infantil, violência doméstica, conflito com a Lei, abuso psicológico, abuso sexual, falta de apoio de adulto responsável, situação de pobreza extrema, situação de rua, falta de acessibilidade ou recursos (ex: cadeira de rodas, órtese, prótese, recursos de tecnologia assistiva).

A Busca Ativa é responsabilidade de toda a sociedade e a divisão de ações entre as diferentes instâncias das Secretarias e dos territórios é fundamental para potencializar os ganhos neste processo.

Entendendo então que a Busca Ativa Escolar, meta estabelecida no Plano Municipal de Educação, aprovado pela Lei 16.271/15, é responsabilidade da Secretaria Municipal de Educação, dos órgãos regionais, bem como das unidades educacionais públicas da RME e privadas de educação infantil do Sistema Municipal de Ensino e envolve o compromisso de todos na sua realização, recomenda-se:

1. à SME

* Organizar programas e projetos específicos que aumentem o interesse e a motivação dos jovens em situação de risco;

* Rever a legislação para melhorar o fluxo escolar, no que se refere à reprovação dos estudantes, nos ensinos fundamental e médio;

* Propor diferentes perspectivas para os estudantes, possibilitando opções mais atrativas no seu processo educacional;

* Criar condições para a participação dos profissionais da Unidades Educacionais em atividades formativas;

* Organizar propostas para atividades híbridas e de ampliação de tempo de permanência;

* Divulgação das ações de busca ativa, realizadas pelas UEs, intensificando o fluxo de informações no território, mobilizando a comunidade para a conscientização do processo.

A divulgação pode ser realizada por meio de:

- Campanhas midiáticas conscientizadoras;

- Distribuição de panfletos, cartazes.

2. à DRE

* Identificar as causas do abandono e da evasão;

* Criar equipes internas para análise e planejamento nas Unidades Educacionais;

* Potencializar a ação da Rede de Proteção Social no território;

* Criar comissões Intersetoriais nas regionais e participar das centrais;

* Organizar formas para utilização de informações do CADÚnico;

* Organizar formação continuada dos educadores e socialização de informações.

* Criar e oferecer condições necessárias para participação das equipes escolares em cursos de formação, promovidos pelo CEFAI, NAAPA, DIPED, entre outros, com foco em temas que subsidiem a atuação dos educadores.

3. à Unidade Educacional

* Localizar famílias dos bebês e das crianças para identificar motivos de ausência e orientar sobre a importância das atividades que promovam o desenvolvimento integral;

* identificar adolescentes grávidas que evadem, propondo ações de acolhimento para o regresso no convívio escolar;

* repensar a avaliação e os procedimentos de recuperação das aprendizagens considerando o contexto vivido pelos estudantes;

* organizar atividades específicas direcionadas aos estudantes em situação de vulnerabilidade ou cuja família pode ter passado por um processo de pauperização, em decorrência da crise gerada pela Covid-19;

* planejar atividades, com conteúdos significativos, que atendam as singularidades dos estudantes;

* realizar avaliação e a autoavaliação, com o objetivo de assegurar a dialogicidade entre os atores do processo de ensino e aprendizagem;

* utilizar metodologias e estratégias que favoreçam a participação de todos nas atividades propostas e contribuam para a aprendizagem de estudantes que retornem em qualquer tempo;

* promover atividades artísticas, culturais, esportivas que possibilitem o desenvolvimento de múltiplas habilidades dos estudantes, contribuindo para sua permanência na escola;

* realizar processos de classificação, reclassificação, recuperação/reforço, compensação de ausências, previstos na LDB, artigos 23 e 24, contribuem para prevenir o abandono do processo educacional e, portanto, minimizar a defasagem idade/ano escolar; (ANEXO 3)

* formação de comissões - participação de representantes dos diferentes segmentos da comunidade educacional: Conselhos de CEI/Escola/CIEJA/CEU, APMs, Grêmios Estudantis, Comissões de Mediação de Conflitos, entre outros, objetivando:

- a organização de fóruns de discussão e/ou encontros sobre Busca Ativa envolvendo comissões intersetoriais dos territórios e todos os atores do processo de vida escolar;

- o cruzamento de informações entre a escola e a comunidade do território;

- o diálogo entre as UEs da região;

- o (re)planejamento de ações e estratégias;

- a avaliação periódica da eficácia das estratégias propostas.

* mapeamento e monitoramento - conhecer o perfil dos estudantes, por meio do levantamento e monitoramento de informações sobre as vulnerabilidades em que se encontram, é importante para prevenir o abandono escolar, sendo necessárias ações como:

- registro periódico e o acompanhamento constante da participação dos estudantes nas atividades educacionais presenciais e/ou híbridas;

- atualização dos registros cadastrais, com os endereços e telefones dos estudantes, de parentes, de amigos, de vizinhos, facilita a busca de informações, em relação aos estudantes ausentes;

- levantamento e registro de informações de famílias com bebês e crianças, não atendidas nas UEs, contribui para o planejamento de ações, que possam garantir o ingresso destes bebês e crianças no CEI, EMEI e Educação Básica;

- compartilhamento de dados, por meio de recursos digitais, agiliza o fluxo de informações e o planejamento de ações entre os envolvidos no processo de busca ativa.

III – CONCLUSÃO

Paulo Freire ao ser questionado se “O Brasil tem jeito?”

Responde que sim! Só que tem jeito na medida em que nos determinamos a forjá-lo.

Nenhum jeito aparece por acaso. Paulo Freire (2001)

Conforme revela Paulo Freire, "nada aparece por acaso”; é preciso que “nos determinemos a forjá-lo”. Este é o nosso compromisso, o “nosso ofício”: incluir. Este é apenas o passo inicial, porém não é o suficiente. É preciso, sim, incluir todos na escola, uma vez que muitos encontram-se privados do direito à educação e, principalmente, é preciso identificar os motivos e os obstáculos que afastam da escola crianças, adolescentes, jovens, adultos e idosos. A localização e a manutenção do vínculo, ainda no final deste ano, são determinantes para assegurar que nenhum estudante torne-se um dado estatístico da exclusão em 2022.

Compreender quem são, localizar onde estão e por que não estão estudando é a base para elaborar o diagnóstico do abandono e da evasão escolar, passo essencial para traçar planos de ação visando promover condições necessárias para assegurar o acesso, a permanência, aprendizagem, desenvolvimento integral e a plena participação dos bebês, crianças, jovens, adultos e idosos na escola.

IV – DELIBERAÇÃO DO PLENÁRIO

O Conselho Municipal de Educação aprova, por unanimidade, a presente Recomendação.

Sala do Plenário, 09 de dezembro de 2021

___________________

Conselheira Rose Neubauer

Presidente do Conselho Municipal de Educação - CME SP

 

V – ANEXOS: https://bityli.com/0UW4VI

Ata da 774ª Sessão Ordinária do Pleno – 12/05/16

Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo