Razões de Veto ao Projeto de Lei nº 260/07
São Paulo, 15 de maio de 2008.
OF. ATL nº 118/08
Ref.: Ofício SGP-23 nº 1734/2008
Senhor Presidente
Reportando-me ao ofício em referência, mediante o qual Vossa Senhoria encaminhou à sanção cópia autêntica do Projeto de Lei nº 260/07, de autoria do Vereador Aurélio Miguel, aprovado por essa Egrégia Câmara na sessão de 9 de abril do corrente ano, sirvo-me do presente para comunicar minha deliberação pelo veto total da medida proposta, na conformidade das razões a seguir apresentadas.
Preconiza a propositura, conforme consta de seus artigos 1º a 3º, a obrigatoriedade da instalação, pelo Poder Executivo, de um Centro de Atendimento Veterinário – CAVET em cada Subprefeitura, com atribuição para prestar atendimento veterinário a cães e gatos da população do entorno, manter programas de castração e vacinação, efetuar cadastramento de registros gerais de animais (RGAs) e atender denúncias da região relativas a assuntos de zoonoses.
Consoante se infere da natureza das normas que se pretende sejam convertidas em lei, cuida-se aqui de disciplinar matéria pertinente à organização administrativa, cuja iniciativa das leis a seu respeito é privativa do Chefe do Executivo, a teor do estabelecido no § 2º, inciso IV, do artigo 37 da Lei Orgânica do Município, bem assim no § 1º do artigo 61 da Constituição Federal.
Por conseguinte, tendo o projeto de lei em apreço sido apresentado por membro da Câmara Municipal, resta a toda evidência caracterizada a invasão em matéria de competência privativa do Executivo e, por conseqüência, a contrariedade ao princípio da independência e harmonia entre os Poderes de que trata o artigo 2º da Carta Política de 1988, daí a inconstitucionalidade da medida.
Na realidade, com a adoção da aludida cláusula de reserva de iniciativa legislativa em determinadas matérias, de inegável intencionalidade político-jurídica, pretendeu o constituinte neutralizar qualquer gesto tendente a reduzir o exercício pleno da função administrativa, vedando a ingerência do Legislativo em atividade própria do Executivo, como seria a hipótese vertente de criação e disciplina de serviço a ser desempenhado por setores da Administração Municipal, circunstância que atentaria, como já se disse, contra o princípio constitucional da tripartição das funções estatais.
Demais disso, porém como corolário do mesmo princípio, somente o Poder Público, na qualidade de titular do serviço público (Constituição da República, artigo 175), tem condição de estabelecer suas próprias prioridades de ações em face da disponibilidade orçamentária. Com efeito, avessa a esse princípio seria a conduta que permitisse ao Legislativo dar início a projetos de lei disciplinando serviços e que, em decorrência, impusesse ao Executivo despesas não previstas no orçamento e para as quais não estivesse aparelhado.
De outra parte, verifica-se que a medida aprovada, relativamente ao previsto no inciso I do seu artigo 3º, não se conforma com o interesse público, pois impinge ao Executivo local obrigação a toda evidência sob o encargo dos administrados, vale dizer, dos proprietários de cães e gatos da Cidade de São Paulo, criando verdadeiras clínicas veterinárias no âmbito das Subprefeituras.
Com efeito, no que respeita aos animais existentes na Cidade, a atuação legal do Município dá-se apenas sob o prisma da saúde pública, mediante a adoção de medidas de controle das denominadas zoonoses, conforme preceituado no artigo 2º da Lei nº 8.107, de 29 de agosto de 1974, que criou o Centro de Controle de Zoonoses – CCZ na Secretaria Municipal de Saúde. No mesmo sentido é o disposto na Lei nº 13.725, de 9 de janeiro de 2004, instituidora do Código Sanitário do Município de São Paulo, cujo § 3º do seu artigo 2º proclama que as ações de vigilância em saúde abrangem, no que se relaciona com o binômio saúde-meio ambiente, o conjunto de medidas de vigilância sanitária e epidemiológica, incluindo-se as específicas de prevenção e controle das zoonoses e enfermidades transmitidas por vetores. Assim sendo, embora se reconheça o mérito da iniciativa ao pretender criar serviço que contribua para a melhoria da saúde da população de cães e gatos, a destinação de verbas públicas deve priorizar as áreas em relação as quais haja obrigatoriedade de atuação por parte do governo municipal.
Quanto à descentralização das atividades próprias do Centro de Controle de Zoonoses – CCZ, decorrente das restantes disposições contidas na mensagem em apreço, cumpre esclarecer que atualmente já existe, na Supervisão de Vigilância em Saúde (SUVIS) de cada Subprefeitura, o serviço de atendimento aos assuntos concernentes ao controle de zoonoses e agravos provocados por animais domésticos, por meio de vistorias zoossanitárias, vacinação contra a raiva, além do controle de roedores, vetores e outras populações de animais sinantrópicos nocivos, além de atividades educativas. Mas não é só. Realmente, a Secretaria Municipal de Saúde já conta com plano específico de descentralização das ações executadas pelo CCZ, o qual prevê a implantação gradativa de mais quatro unidades municipais com atribuições dessa natureza, bem assim com atuação no controle da população de cães e gatos por meio de cirurgias de esterilização, vacinação, registro e identificação de animais, bem assim o desenvolvimento de ações educativas, visando a posse, propriedade e guarda responsável de animais.
Por derradeiro, é de se dizer que, para o cadastramento de animais mediante a expedição de registros gerais de animais (RGAs), o Centro de Controle de Zoonoses conta com uma rede de estabelecimentos veterinários credenciados para essa finalidade, convenientemente distribuídos pelas diversas áreas da Cidade.
Nessas condições, evidenciadas as razões de constitucionalidade, legalidade e de interesse público que me conduzem a vetar o presente projeto de lei em sua totalidade, o que faço com esteio no artigo 42, § 1º, da Lei Orgânica do Município, devolvo o assunto ao reexame dessa Colenda Casa de Leis.
Na oportunidade, renovo a Vossa Excelência meus protestos de apreço e consideração.
GILBERTO KASSAB
Prefeito
Ao
Excelentíssimo Senhor
ANTONIO CARLOS RODRIGUES
Digníssimo Presidente da Câmara Municipal de São Paulo
Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo