Processo nº 6021.2019/0010493-9
INTERESSADA: Administração Municipal
ASSUNTO: Ação de reintegração de posse, com pedido de liminar. Proc. n. 1007168-18.2016.8.26.0053 -9ª VFP.
Informação n. 2111/2023 - PGM-AJC
PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO
COORDENADORIA GERAL DO CONSULTIVO
Senhor Coordenador Geral
Trata o presente de acompanhar ação de reintegração de posse de área municipal lindeira ao Piscinão São Mateus, que foi objeto de sucessivas suspensões, apesar do deferimento da ordem liminar de reintegração.
A Diretoria de DEMAP solicita análise do caso quanto ao prosseguimento, considerando que a área foi entendida por SEHAB como passível de regularização fundiária, ressalvada a necessidade de remoções pontuais para a execução de obras, tendo SVMA informado a possibilidade de requalificação ambiental no âmbito da regularização.
Afirma a Diretoria que não há um posicionamento firme das Pastas envolvidas quanto à necessidade de remoção, parcial ou integral, ou desistência da ação. Seria uma situação frequente em processos dessa natureza, em que a regularização da área municipal ocupada, em andamento ou em planejamento, depende de grandes investimentos.
A unidade oficiante entende que a ação poderia prosseguir, com julgamento de mérito, para que no futuro sejam efetuadas as remoções necessárias. No entanto, a Diretoria aponta que não há intenção da Administração no sentido de realizar a remoção integral das ocupações, sendo provável que o processo, caso prossiga, consuma recursos públicos sem finalidade prática alguma.
Observa-se, ainda, que o art. 31, § 8°, da Lei n. 13.465/17 prevê a manutenção dos moradores na área objeto de regularização e que esta é a tendência da jurisprudência.
Por isso, solicita análise quando à melhor estratégia a ser adotada no caso e em casos semelhantes, questionando: "Quando há expresso parecer da Administração no sentido da viabilidade da regularização fundiária, é razoável o prosseguimento dos processos de reintegração de posse, especialmente quando não há situação de risco alto ou muito alto caracterizada, e a possível futura remoção de moradias é justificada por uma possível futura necessidade de remoção de moradias para viabilizar a realização de obras?" (doc. 078210974).
É o breve relato.
Embora casos como o presente, de modo geral, ensejem características próprias, o que dificulta afirmações apriorísticas, parece que há aspectos a serem considerados sob uma perspectiva normativa que podem contribuir para o deslinde da questão colocada por DEMAP.
De fato, não parece que a avaliação quanto à possibilidade de regularização possa ser considerada de modo totalmente destituído de eficácia.
Vale lembrar, a propósito, que a PGM já se manifestou no sentido do não ajuizamento de ação de reintegração em caso no qual CRF havia informado estarem atendidos requisitos temporais da Lei Federal n. 13.465/17, de modo que ela seria incluída no planejamento estratégico daquele órgão para início do processo de regularização fundiária, com a elaboração de elementos técnicos assim que fosse concluída a contratação dos serviços correspondentes (Informação n. 1219/2022 - PGM-AJC).
De todo modo, considerando a situação de uma ação ajuizada, parece realmente apropriado que a fundamentação seja acompanhada de outras cautelas jurídico-formais. Neste caso, o regime da regularização fundiária parece vir ao encontro das ponderações de DEMAP.
De início, cabe ponderar que o art. 31, § 8°, da Lei Federal n. 13.465/17 não constitui rigorosamente uma garantia substancial à permanência da população no local, eis que se refere ao período em que o Município deve decidir a respeito da instauração da Reurb, quando requerida. Nos termos do dispositivo, só o fato de haver um requerimento pendente já seria motivo para manter os ocupantes no local, até análise final. O dispositivo teria, portanto, um caráter cautelar.
É claro que, havendo manifestação de interesse do Município na regularização, poderia, em tese, incidir a previsão do dispositivo. No entanto, se o Município decidir pela regularização, já não haverá cautelaridade alguma: os ocupantes permanecem no local porque em razão do posicionamento de mérito adotado pelo Município. A questão colocada por DEMAP, contudo, diz respeito à situação em que a regularização foi entendida como viável pelo Município, mas este não tomou uma decisão expressa a respeito. É preciso identificar, pois, como se dá a decisão do ente local a respeito da regularização, principalmente em relação a como esta é influenciada pelas questões de planejamento, sobretudo sob o ponto de vista da efetiva disponibilidade de recursos humanos e materiais.
Sob essa perspectiva, as normas municipais parecem trazer elementos relevantes. Assim é que dispõe a Lei n. 17.734/22:
Art. 24. A fixação da modalidade da Reurb de núcleo urbano informal consolidado preexistente a esta Lei por quaisquer dos legitimados garante aos ocupantes das áreas públicas a serem regularizadas a permanência em suas respectivas unidades imobiliárias, preservando-se as situações de fato já existentes, até a conclusão da Reurb, excetuadas eventuais remoções necessárias à implantação da infraestrutura essencial e/ou obras complementares de urbanização do núcleo urbano informal, desde que tecnicamente justificadas.
(...)
Art. 26. A classificação da Reurb será efetuada pelo órgão competente pela Reurb de acordo com as seguintes modalidades:
I - Regularização Fundiária de Interesse Social (Reurb-S): aplicável aos núcleos urbanos de vinculação ou aos núcleos urbanos para fins de moradia ocupados, predominantemente, por população de baixa renda, nos casos:
a) de áreas públicas ou particulares situadas em ZEIS, ZC-ZEIS, ZMIS e ZMISa, nos termos do Plano Diretor Estratégico e da Lei de Uso e Ocupação do Solo; ou
b) de áreas públicas ou particulares, declaradas de interesse social para fins de regularização fundiária;
II - Regularização Fundiária de Interesse Específico (Reurb-E): aplicável aos núcleos urbanos para fins de moradia ocupados por população não qualificada na modalidade caracterizada no inciso I deste artigo, ou aos núcleos urbanos informais de uso não residencial;
III - A declaração de interesse social prevista na alínea "b" do inciso I do art. 26 desta Lei será firmada pelo Secretário Municipal de Habitação, após fundamentação da equipe técnica, para núcleos urbanos ocupados predominantemente por população de baixa renda, que não estejam gravados como ZEIS, ZC-ZEIS, ZMIS e ZMISa.
Art. 27. A classificação do núcleo urbano como Reurb-S não implica na sua inclusão automática no planejamento estratégico e orçamentário da Secretaria Municipal de Habitação.
Como se vê, a manutenção da situação de fato - em especial, da ocupação - não depende necessariamente da existência de um procedimento de regularização, mas apenas da fixação da modalidade de regularização (art. 24), o que, no caso da Reurb-S, mostra-se ainda mais relevante, tendo em vista o interesse social envolvido. De todo modo, a lei não condiciona a aplicação do dispositivo à existência de um procedimento de regularização em curso, até porque a classificação como Reurb-S independe até mesmo da inclusão da área no planejamento de SEHAB (art. 27).
Além disso, antes da própria instauração da Reurb, o que levaria à inclusão da área de interesse no planejamento estratégico e orçamentário de SEHAB, existe a possibilidade de que um determinado perímetro seja declarado de interesse social pelo Secretário de SEHAB (art. 26, III), desde que a área não esteja classificada como ZEIS (Zona Especial de Interesse Social), ZC-ZEIS (Zona Centralidade lindeira à ZEIS), ZMIS (Zona Mista de Interesse Social) e ZMISa (Zona Mista de Interesse Social Ambiental).
Nos casos dessas áreas, portanto, existe a possibilidade de que o assunto seja submetido à autoridade competente, que poderá formalmente declarar o interesse da Municipalidade na regularização de interesse social, mesmo que esta não venha a ser inserida imediatamente no planejamento de SEHAB.
Se as áreas em geral, não necessariamente vocacionadas ao atendimento ao interesse social, podem ser objeto de tal declaração, deve-se entender que as áreas classificadas como ZEIS, ZC-ZEIS, ZMIS e ZMISa nem sequer precisariam de manifestação equivalente, devendo ser entendidas como presumidamente destinadas à regularização de interesse social. Evidentemente, alguma análise a respeito deve ser feita pelo órgão técnico - no caso, CRF -, nos termos do "caput" do art. 26, até mesmo para excluir, se necessário, a caracterização de cada caso como Reurb-S ou para identificar algum impedimento à regularização. No entanto, em não sendo identificado algum óbice dessa espécie, é de se concluir pela regularização, por força da diretriz legal no nesse sentido.
Assim sendo, em atenção à consulta formulada por DEMAP, é possível concluir, à luz da legislação municipal, que os casos de ocupação de áreas públicas deverão ser submetidos a SEHAB, para que, independentemente da abertura de um procedimento de regularização específico ou da inclusão de um determinado perímetro no planejamento da Pasta, efetue a avaliação a respeito: a) de eventual impedimento à regularização de interesse social, no caso de áreas enquadradas em ZEIS, ZC-ZEIS, ZMIS e ZMISa, o que deverá ser analisado por CRF; b) de eventual declaração de interesse social, pelo titular de SEHAB, após análise técnica, nos termos do art. 26, III, da Lei n. 17.734/22, em caso de área situada nas demais zonas do Município.
Essa análise propiciará a oportunidade necessária para que se identifiquem eventuais peculiaridades dos casos concretos, que podem envolver, é claro, ocupações cujas características não ensejem a regularização. De todo modo, em ambos os casos, por força do dispositivo legal, a ausência de um procedimento instaurado de regularização ou de inclusão da área no planejamento de SEHAB não afastará o posicionamento municipal - por lei ou por decisão administrativa - no sentido da regularização, o que parece suficiente para descartar o ajuizamento de ações possessórias ou a continuidade daquelas já ajuizadas, continuidade esta que, como bem ponderado por DEMAP, somente serviria para sobrecarregar o Poder Judiciário e o próprio Departamento, sem benefício prático algum.
Evidentemente, em sendo identificadas questões específicas, elas deverão ser consideradas. No caso da eventual existência de riscos, medidas deverão ser tomadas pelos órgãos competentes, cabendo observar, de todo modo, que a mera pendência de uma ação judicial não implica, por si, o afastamento de responsabilidades, até porque medidas mitigadoras podem e devem ser tomadas, até mesmo em ocupações irregulares de áreas privadas. Por outro lado, eventual desastre ocorrido na pendência do cumprimento de uma ordem judicial de caráter liminar certamente levaria a questionamento quanto às responsabilidades correspondentes.
Por fim, é preciso considerar que a conformação da regularização fundiária parece oferecer outros contornos para a questão da remoção pontual, conforme a necessidade, proposta pela unidade oficiante. Se a decisão municipal a respeito da regularização somente se mostrasse possível num momento posterior, em que se revelasse simultaneamente a necessidade de remoção de certas moradias, haveria sentido em manter a ação até que se revelasse a opção pela regularização e a extensão de tais remoções. No entanto, havendo desde logo decisão a respeito da regularização, e não havendo como afirmar que será necessária remoção judicial de algumas moradias, não há sentido em prosseguir na ação possessória apenas para atender a essa hipotética situação.
No caso presente, considerando que a área foi informada como enquadrada em ZEPAM (doc. 016110840 e 045630513), eventual decisão a respeito do interesse social na regularização caberá ao Secretário de SEHAB, após análise técnica, na forma do art. 26, III, da Lei n. 17.734/22, razão pela qual se sugere a remessa do presente a SEHAB, para tais providências.
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São Paulo, 29/02/2024
JOSÉ FERNANDO FERREIRA BREGA
PROCURADOR ASSESSOR - AJC
OAB/SP 173.027
PGM
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De acordo.
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São Paulo, 29/02/2024
MÁRCIA HALLAGE VARELLA GUIMARÃES
PROCURADORA ASSESSORA CHEFE - AJC
OAB/SP 98.817
PGM
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Processo nº 6021.2019/0010493-9
INTERESSADA: Administração Municipal
ASSUNTO: Ação de reintegração de posse, com pedido de liminar. Proc. n. 1007168-18.2016.8.26.0053 -9ª VFP.
Cont. da Informação n. 2111/2023 - PGM.AJC
PGM
Senhora Procuradora Geral
Encaminho-lhe o presente, com o entendimento da Assessoria Jurídico-Consultiva, que acolho, com proposta de remessa do presente a SEHAB, para as providências sugeridas.
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São Paulo, 29/02/2024
CAYO CÉSAR CARLUCCI COELHO
PROCURADOR DO MUNICÍPIO
COORDENADOR GERAL DO CONSULTIVO
OAB/SP 168.127
PGM
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Processo nº 6021.2019/0010493-9
INTERESSADA: Administração Municipal
ASSUNTO: Ação de reintegração de posse, com pedido de liminar. Proc. n. 1007168-18.2016.8.26.0053 -9ª VFP.
Cont. da Informação n. 2111/2023 - PGM.AJC
SEHAB
Senhor Secretário
Nos termos do entendimento da Coordenadoria Geral do Consultivo, que endosso, encaminho-lhe o presente, para decisão a respeito de eventual declaração de interesse social na regularização da área em questão, independentemente da abertura de procedimento específico para tanto ou de inclusão no planejamento dessa Secretaria, na forma dos artigos 26 e 27 da Lei n. 17.734/22.
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São Paulo, 29/02/2024
MARINA MAGRO BERINGHS MARTINEZ
PROCURADORA GERAL DO MUNICÍPIO
OAB/SP 169.314
PGM
Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo