processo n° 2017-0.051.640-6
INTERESSADO: SECRETARIA MUNICIPAL DE ASSISTÊNCIA E DESENVOLVIMENTO SOCIAL
ASSUNTO: Termo de colaboração para implantação e operação de centro de acolhida. Consulta quanto a necessidade de chamamento público prévio, considerando o disposto no art. 30, VI, da Lei federal n° 13.019/14 e no art. 7o da Lei municipal n° 13.153/01.
Informação n° 1.325/2017-PGM.AJC
COORDENADORIA GERAL DO CONSULTIVO
Senhora Coordenadora Geral
Trata-se de consulta formulada por SMADS às fls. 163/174, a respeito da necessidade da realização de chamamento público prévio à celebração de parcerias com entidades sem finalidade lucrativa na área da assistência social.
Segundo parecer da assessoria jurídica da pasta interessada, os casos de dispensa e inexigibilidade de chamamento público previstos na Lei federal n° 13.019/14, por constituírem normas gerais de contratação, prevalecem sobre as eventuais disposições conflitantes previstas em diplomas legais dos entes federados. Assim, a Lei municipal n° 13.153/01, embora não tenha sido afastada pela nova lei federal - por não ser incompatível com esta -, deve ter a sua leitura harmonizada com ela, de forma que, embora deva ser, em regra, realizado chamamento público, este pode ser discricionariamente dispensado com base no art. 30, VI, da Lei federal n° 13.019/14, mediante despacho devidamente motivado.
SMADS/AJ lembrou que, mesmo antes da vigência da Lei federal n° 13.019/14 (ou seja, no regime da Lei federal n° 8.666/93 e da Lei municipal n° 13.153/01, que prevê a realização de chamamento público para atividades de assistência social), a pasta interessada eventualmente não realizava procedimento competitivo, tendo como fundamento o disposto nos arts. 24 e 25 da Lei federal n° 8.666/93, de forma que sempre foram aplicadas as hipóteses de dispensa e inexigibilidade previstas nas normas gerais federais.
Questionou, ao final, (1) se a lei municipal n° foi revogada ou teve a eficácia suspensa pela Lei federal n° 13.019/14; e se (2) é permitido ao administrador público municipal valer-se da hipótese de dispensa de chamamento público prevista no art. 30, VI, da Lei federal n° 13.019/14, para celebração de termos de colaboração ou fomento para desenvolvimentos de atividades de assistência social.
É o relato do necessário.
Como bem coloca SMADS/AJ, as normas gerais federais editadas com fulcro nas disposições constitucionais (no caso, com base no art. 22, inc. XXVII, da Constituição da República1) prevalecem sobre as normas dos entes federativos incompatíveis com elas2. Ainda, estamos de acordo com a assessoria jurídica da pasta quando afirma que normas sobre dispensa e inexigibilidade de licitação - ou, no caso, de chamamento público constituem 'normas gerais', conforme pregam doutrina e jurisprudência amplamente majoritárias. Desnecessário nos estendermos a respeito de tais pontos, uma vez que não há qualquer disputa em relação a eles.
A Lei federal n° 13.019/14, que passou a disciplinar as parcerias dos entes federativos com entidades sem finalidade lucrativa, previu a obrigatoriedade de chamamento público para sua celebração, cf. disposto no art. 24, verbis:
"Art. 24 - Exceto nas hipóteses previstas nesta Lei, a celebração de termo de colaboração ou de fomento será precedida de chamamento público voltado a selecionar organizações da sociedade civil que tornem mais eficaz a execução do objeto."
Também previu algumas hipóteses de dispensa de chamamento, dentre as quais para celebração de parcerias na área de assistência social:
"Art. 30. A administração pública poderá dispensar a realização do chamamento público: (...)
VI - no caso de atividades voltadas ou vinculadas a serviços de educação, saúde e assistência social, desde que executadas por organizações da sociedade civil previamente credenciadas pelo órgão gestor da respectiva política."
A questão que se coloca é que, muito antes do advento da Lei federal supracitada, o Município já realizava, como regra, procedimento de chamamento público para atividades de assistência social, por determinação da Lei municipal n° 13.153/01, que "dispõe sobre a política pública de atenções de assistência social, sem fins lucrativos, operada através de convênios no âmbito do Município de São Paulo". Nos termos do art. 7o do referido diploma:
"Art. 7o - O poder público municipal editará no Diário Oficial do Município e na grande imprensa a necessidade de implantação de atenções de assistência social através de convênio indicando a modalidade do serviço, a região em que se localizará, a forma e os prazos de apresentação da proposta pelos interessados."
Conforme esclarecido por SMADS/AJ, o procedimento competitivo de seleção com base na apresentação de propostas somente não era realizado nos casos em que a Lei federal n° 8.666/93 - que disciplinava, sucintamente, os convênios - permitia a contratação direta.
Agora, a Lei federal que regula as parcerias com entidades sem finalidade lucrativa passou a dispensar o chamamento público para todas as atividades de assistência social, o que coloca em dúvida a necessidade da sua realização, considerando as disposições da lei municipal supracitada. Este é o âmago da controvérsia.
Parece-nos que, no Município, a regra para parcerias no âmbito da assistência social deve continuar a ser a realização prévia de procedimento competitivo, nos termos do disposto no art. 7o da Lei municipal n° 13.153/01, não se aplicando, diretamente, a hipótese de dispensa prevista no art. 30, VI, da Lei federal n° 13.019/14, ainda que seja viável a aplicação de outras hipóteses de dispensa e inexigibilidade previstas na legislação federal. Isto em razão da natureza das hipóteses de dispensa previstas na legislação. Expliquemo-nos.
As hipóteses de dispensa de procedimento competitivo são casos em que tal procedimento seria viável, mas o legislador facultou ao gestor público a sua não realização. Constituem, de fato, normas gerais, o que significa que o ente federativo não pode ampliar as hipóteses legais de dispensa contempladas na lei federal. Mas nada obsta que a unidade administrativa realize o procedimento competitivo, mesmo sendo legalmente possível a dispensa.
Ora, se é possível que o ente federativo subnacional disponha sobre normas específicas a respeito de contratações públicas, e se a norma geral em matéria de dispensa de procedimento competitivo confere apenas uma faculdade ao gestor público - ou uma margem de discricionariedade, como apontou SMADS/AJ -, é possível que o ente subnacional colha ou limite, de alguma forma, a discricionariedade que lhe foi inicialmente outorgada, por meio de lei ou outro instrumento normativo. É possível, em suma, que o ente federativo legisle para prever que, mesmo em alguma(s) hipótese(s) de dispensa previstas nas normas gerais, o referido ente deverá seguir procedimento competitivo de seleção. Se o próprio Poder Executivo prever, por portaria ou decreto, a realização de processo de seleção mesmo nos casos de dispensa contemplados na lei federal, teremos uma autolimitação da discricionariedade. Mas não há óbice para que tal limitação esteja contida em uma lei formal do ente federativo - como ocorre no caso sob análise. A grande maioria das leis direcionadas à atividade da Administração Pública, a propósito, tem como objetivo reduzir ou moldar a discricionariedade da Administração estatal na gestão dos interesses públicos.
Portanto, parece-nos que a realização de chamamento público para atividades de assistência social, prevista na Lei municipal n° 13.153/01, é totalmente compatível com a legislação federal, eis que, ao dispensar a realização de chamamento públicos em tais hipóteses, a norma geral não proibiu a sua realização e, consequentemente, deixou margem para que os entes subnacionais imponham a realização de procedimento seletivo e o disciplinem.
O fato da Lei municipal n° 13.153/01 ser anterior à lei federal não altera em nada a solução jurídica da questão. Ao revés, reforça a necessidade de realização de processo seletivo, uma vez que, se antes do advento da Lei federal o Município já promovia chamamento para atividades de assistência social, mesmo (em tese) não sendo obrigada a tanto por nenhuma norma geral3, como justificar o abandono deste procedimento justamente quando chamamento público? Vale lembrar que tal procedimento reforça a observância de princípios como da isonomia, transparência e eficiência. Uma contratação direta pode ser proba, transparente e eficiente, mas, quando não antecedida de processo de seleção com regras claras e objetivas, sempre ficará suscetível a maiores questionamentos. A realização de chamamento público confere maior proteção e segurança à relação jurídica entabulada e aos decisores.
Isso não significa que a hipótese de dispensa prevista no art. 30, VI, da Lei federal n° 13.019/14 não produziu qualquer efeito para o Município. Uma vez que a lei federal dispensou o processo de chamamento para atividades de assistência social, isso significa, conforme já apontamos, que o Município poderá ele próprio disciplinar a questão, podendo, portanto, prever procedimento diferente do previsto na lei federal para celebração de parcerias na área de assistência social4 - como, aliás, aparentemente SMADS está em vias de fazer. Tal procedimento, se regulamentado por portaria, deverá, obviamente, observar as leis municipais sobre o tema, incluindo a Lei n° 13.153/01.
O entendimento exposto neste parecer, a propósito, não é uma novidade. Há anos (desde 2005), no Município, há decreto prevendo a realização de procedimento de cotação eletrônica para aquisição de bens e serviços comuns, quando dispensada a licitação com base no art. 24, inc. II, da Lei federal n° 8.666/93.
No mais, o entendimento aqui colocado não impede que SMADS se valha das demais hipóteses de dispensa e inexigibilidade previstas na Lei federal n° 13.019/14.
Recomenda-se, assim, que SMADS passe a realizar chamamento público, nos termos do art. 7o e ss. da Lei municipal n° 13.153/01, para atividades de assistência social. Considerando a razoabilidade do entendimento manifestado pela assessoria jurídica da pasta5, a inviabilidade de solução de continuidade dos serviços em questão, e o tempo necessário para a realização de um processo seletivo bem instruído, a situação dos atuais convênios não precedidos de processo de seleção (com fulcro no art. 30, VI, da Lei federal n° 13.019/14) poderá ser analisada caso a caso pela Secretaria, de forma a evitar a interrupção das atividades em curso.
Sub censura.
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São Paulo, 31/08/2017.
RODRIGO BRACET MIRAGAYA
Procurador Assessor - AJC
OAB/SP 227.775
PGM
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processo n° 2017-0.051.640-6
INTERESSADO: SECRETARIA MUNICIPAL DE ASSISTÊNCIA E DESENVOLVIMENTO SOCIAL
ASSUNTO: Termo de colaboração para implantação e operação de centro de acolhida. Consulta quanto a necessidade de chamamento público prévio, considerando o disposto no art. 30, VI, da Lei federal n° 13.019/14 e no art. 7o da Lei municipal n° 13.153/01.
Cont. da Informação n° 1.325/2017-PGM.AJC
PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO
Senhor Procurador Geral
Encaminho, o presente, a Vossa Senhoria, com manifestação da Assessoria Jurídico-Consultiva desta Coordenadoria Geral do Consultivo, que acompanho, no sentido de que SMADS passe a realizar, ordinariamente, chamamento público, nos termos do art. 7o e ss. da Lei municipal n° 13.153/01, para atividades de assistência social, guardada a possibilidade da pasta interessada (i) valer-se das hipóteses específicas de dispensa e inexigibilidade previstas na Lei federal n° 13.019/14 (excluindo a previsão do art. 30, VI); (ii) disciplinar o chamamento público para atividades de assistência social, observados os preceitos da Lei municipal n° 13.153/01 e das demais normas eventualmente aplicáveis; (iii) avaliar as parcerias já celebradas, de forma a evitar a interrupção dos serviços.
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São Paulo, 31/08/2017.
TICIANA NASCIMENTO DE SOUZA SALGADO
Coordenadora Geral do Consultivo Substituta
OAB/SP 175.186
PGM
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processo n° 2017-0.051.640-6
INTERESSADO: SECRETARIA MUNICIPAL DE ASSISTÊNCIA E DESENVOLVIMENTO SOCIAL
ASSUNTO: Termo de colaboração para implantação e operação de centro de acolhida. Consulta quanto a necessidade de chamamento público prévio, considerando o disposto no art. 30, VI, da Lei federal n° 13.019/14 e no art. 7o da Lei municipal n° 13.153/01.
Cont. da Informação n° 1.325/2017-PGM.AJC
SECRETARIA DE ASSISTÊNCIA E DESENVOLVIMENTO SOCIAL
Senhor Secretário
Encaminho a Vossa Senhoria manifestação da Coordenadoria Geral do Consultivo desta Procuradoria Geral, que endosso, ementada sob o n° 11.785, no sentido de que SMADS passe a realizar, ordinariamente, chamamento público, nos termos do art. 7o e ss. da Lei municipal n° 13.153/01, para atividades de assistência social, guardada a possibilidade da pasta interessada (i) valer-se das hipóteses específicas de dispensa e inexigibilidade previstas na Lei federal n° 13.019/14 (excluindo a previsão do art. 30, VI); (ii) disciplinar o chamamento público para atividades de assistência social, observados os preceitos da Lei municipal n° 13.153/01 e das demais normas eventualmente aplicáveis; (iii) avaliar as parcerias já celebradas, de forma a evitar a interrupção dos serviços.
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São Paulo, 01/09/2017.
RICARDO FERRARI NOGUEIRA
PROCURADOR GERAL DO MUNICÍPIO
OAB/SP n° 175.805
PGM
Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo