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PARECER PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO - PGM Nº 11.342 de 21 de Agosto de 2024

EMENTA N° 11.342
Poder de Polícia. Apreensão de Termo de Permissão de Uso dos Ambulantes fora das hipóteses legais, ilegalidade. O poder de polícia é limitação à liberdade e à propriedade individual feita em prol do interesse público, mas que deve ser prevista em lei, pois a ninguém é dado fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de um mandamento legal.

TID 2346909

INTERESSADO: ANTONIO CHIQUITA NETO

ASSUNTO:  APREENSÃO DE MERCADORIAS E DE TPU.

Informação n° 1748/2008-PGM.AJC

PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO

ASSESSORIA JURÍDICO-CONSULTIVA

Senhora Procuradora Assessora Chefe

Trata-se de expediente em que a Subprefeítura da Sé consulta-nos sobre a legalidade ou não da apreensão dos Termos de Permissão de Uso pela Guarda Civil Metropolitana tomando por base o caso do permissionário Antônio Chiquita Neto, que foi encontrado comercializando produtos cuja legitimidade não restou comprovada, tendo tido, nesse mesmo ato, apreendida sua via original de sua TPU de n° 260307-34/DFCR/00804100497/100100 class 49.

Note-se que a legalidade da apreensão das mercadorias cuja origem até hoje encontra-se duvidosa não está sendo colocada em pauta, pois não há dúvida de que o comércio desses produtos sem a devida licença deve ser inibida nesta Capital. O que se questiona é a legalidade ou não da apreensão da TPU nessas diligências efetuadas pela Municipalidade através de seus agentes, tendo a assessoria jurídica da Subprefeitura da Sé posicionado-se pela ilegalidade desta atuação, na medida em que entende que a retenção do Termo de Permissão de Uso e do Cartão de Auxiliar do Permissionário só poderiam ser objeto de apreensão no caso em a mesma estivesse sendo utilizada por terceiros ou na hipótese de que, mesmo após ter sido revogada ou cassada, continuasse a ser utilizada pelo ex-permissionário ilegalmente.

O que tem ocorrido na prática, contudo, é a apreensão de tais documentos, independentemente da situação fática ocorrida.

Pois bem.

A fiscalização1 exercida sobre o comércio ambulante é típico ato de poder de polícia2, ou seja, típica limitação aos direitos individuais que é determinada pela lei em prol do bem comum. É atividade administrativa que se consubstancia em verdadeira prerrogativa conferida à Administração Pública, consistente no poder de restringir e condicionar a liberdade e a propriedade.

Como se trata de limitação, todavia, e como é emanação do poder extroverso que possui o Município de fiscalizar os atos dos indivíduos que se encontram no âmbito de sua competência, ela deve ter respaldo legal (exceto em se tratando de situação que exija de tão forma emergencial que aguardar pela aprovação de uma lei significaria um sacrifício injustificado à coletividade, como, por exemplo, o ingresso em casa cujo proprietário é desconhecido e que sabidamente é foco da dengue que está afetando a população do entorno), até porque ao não particular só não é permitido fazer o que a lei proíbe3.

Temos, portanto, que o poder de polícia só pode ser exercido nos termos em que a lei autoriza. Nem mais, nem menos, pois os administrados só estão obrigados a submeter-se àquilo que nela se encontra previsto, e ao administrador só é dado fazer o que a lei estabelece. E o que a lei diz a esse respeito?

Segundo o artigo 32 lei 11.039/91, além de outras obrigações contidas naquela lei, são deveres do ambulante:

a- portar o Termo de Permissão de Uso, o Cartão de Identificação e outros determinados quando da expedição da Permissão;

b- portar o comprovante de pagamento dos preços públicos e de outros impostos devidos;

c- exercer pessoalmente a sua atividade;

d- demonstrar rigorosa higiene pessoal, bem como do seu equipamento;

e- conservar o equipamento dentro das especificações previstas pela Administração Municipal;

f- vender produtos em bom estado de conservação e de acordo com a legislação vigente;

g- manter limpo o seu local de trabalho;

h- observar irrepreensível compostura e polidez no trato público; respeitar o horário de trabalho determinado pela administração;

j- afixar sobre as mercadorias, de modo bem visível, a indicação de seu preço;

k- conservar devidamente aferidos os pesos e balanças utilizados no seu negócio;

I- exibir, quando solicitado pela fiscalização, o documento de origem relativo aos produtos comercializados;

m- cumprir as ordens e decisões emanadas do Poder Público competente.

O descumprimento de qualquer das disposições acima constitui infração passível da multa a ser determinada pela Administração, podendo chegar até a cassação da Permissão de Uso, como previsto no artigo 34 da mencionada lei.

A revogação ou a cassação se darão, por sua vez, por despacho fundamentado do Subprefeito, ouvida previamente a Comissão Permanente de Ambulantes na hipótese de cassação, conforme estatuí o artigo 21 do decreto n° 42.600/02.

Ademais, a lei 11.111/91, que trata especificamente do valor das multas e das infrações relativas ao comércio ambulante estabelece expressamente em seu artigo 2° os casos em que passível a aplicação da pena de multa coma revogação da permissão de uso e lá até temos a previsão de revogação em caso de comercializar mercadorias ou prestar serviços em desacordo com a permissão, mas obviamente, em se tratando de sanção, não é passível de efetivação antes do devido processo legal.

Veja que estamos diante de situação absurda para o munícipe: primeiro ele é punido e depois notificado para apresentar sua defesa. Temos primeiro a sanção e depois o "devido" processo legal. O Termo de Permissão de Uso é cassado imediatamente, tornando irregular imediatamente a atividade do permissionário, que passa a trabalhar na ilegalidade enquanto espera pela apreciação de sua defesa.

Ele é punido a priori e se, mais tarde, consegue comprovar que suas mercadorias tinham origem legal e que sua atuação se deu em conformidade com a lei, ele já terá sofrido uma sanção mesmo sem merecê-la, na medida em que permaneceu sem a TPU sem que houvesse razão para tanto.

Frise-se que não se está aqui a defender a impunidade, mas apenas a necessidade de que sanções de cunho administrativo sejam aplicadas APÓS O DEVIDO PROCESSO LEGAL, TAL COMO DETERMINADO PELA CONSTITUIÇÃO FEDERAL4.

A menos que estejamos diante de suspeita de TPU falsa {quando então caberia sua apreensão a fim de verificar a veracidade da mesma); de TPU revogada ou cassada, mas que está sendo utilizada ilicitamente ou ainda de seu uso por terceiros, nada justifica sua apreensão, por falta de amparo legal.

Posterior revogação do TPU pode vir a ocorrer, comprovado o cometimento de ilegalidade pelo permissionário, mas sempre após o devido processo legal. Não se pode suspender a validade de TPU sem que se tenha respaldo legal, assim como não se pode inviabilizar o exercício da atividade do permissionário com fundamento no cometimento do ilícito quando este ainda sequer se defendeu.

Eis o meu parecer, que submeto ao crivo de V. Sa.

Acompanhante mantido: TID 2456071.

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São Paulo, / / 2008.

FLÁVIA MORAES BARROS

Procuradora Assessora

OAB n° 190.425

PGM/AJC

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De acordo.

São Paulo, 15/09/2008.

Procuradora Assessora Chefe-AJC

OAB/SP 53.274

PGM

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1 Vale a pena transcrever as palavras de José dos Santos Carvalho Filho sobre os atos de fiscalização: "Não adiantaria deter o Estado o poder de impor restrições aos indivíduos se não dispusesse dos mecanismos necessários à fiscalização da conduta destes. Assim, o poder de policia reclama do Poder Público a atuação dos agentes fiscalizadores da conduta dos indivíduos. A fiscalização apresente duplo aspecto: um preventivo, através do qual os agentes da Administração procuram impedir um dano social, e um repressivo, que, em face da transgressão da norma de polícia, redunda na aplicação de uma sanção" (in "Manual de Direito Administrativo", 6a edição, Lúmen Juris:Rio de Janeiro, 2000, p. 59).
2  Conquanto imperfeita, sempre é bom trazermos à baila a definição de poder de polícia dada pelo artigo 78 do Código Tributário Nacional que estabelece que poder de polícia é "a atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou a abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do poder público, à tranqüilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos".
3 Art. 5°, II, CF/88 - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei". 
4 Art. 5", LIV - "ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal". 

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TID n° 2346909    

INTERESSADO: ANTONIO CHIQUITA NETO

ASSUNTO: APREENSÃO DE MERCADORIAS E DE TPU.

Informação n° 1748/2008-PGM.AJC

Secretaria de Negócios Jurídicos

Senhor Secretário:

Encaminho estes autos a Vossa Senhoria com a manifestação da Assessoria Jurídico-Consultiva desta Procuradoria Geral, que acolho, pela ilegalidade da apreensão do Termo de Permissão de Uso de Ambulantes fora das hipóteses legais cabíveis, nas quais deve ser garantido o devido processo legal.

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São Paulo, 15/09/2008.

CELSO AUGUSTO COCCARO FILHO

Procurador Geral do Município de São Paulo

OAB/SP 98.071

PGM

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TID n° 2346909

INTERESSADO: ANTONIO CHIQUITA NETO

ASSUNTO: Apreensão de mercadorias e de TPU.

Informação n° 2917/2008-SNJ.G. 

SECRETARIA MUNICIPAL DE COORDENAÇAO DAS SUBPREFEITURAS

Senhor Secretário

Encaminho o presente ofício a essa Pasta, com a manifestação da Procuradoria Geral do Município, que acolho, opinando pela ilegalidade da apreensão do Termo de Permissão de Uso - Comércio de Ambulante, emitido em favor do Interessado, salientando que eventuais sanções, sejam aplicadas somente após decisão exarada em processo administrativo.

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São Paulo, 22/08/2008.

RICARDO DIAS LEME

Secretário Municipal dos Negócios Jurídicos

Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo