CASA CIVIL DO GABINETE DO PREFEITO

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RAZÕES DO VETO AO PROJETO DE LEI Nº 75/2003; OFÍCIO DE 18 de Janeiro de 2005

Razões de Veto ao Projeto de Lei nº 75/03

OF. ATL . nº 014/05

Ref.: Ofício SGP 23 nº 4.171/04

Senhor Presidente

Por meio do ofício referenciado, Vossa Excelência encaminhou à sanção cópia autêntica do Projeto de Lei nº 75/03, aprovado por essa Egrégia Câmara, em sessão de 23 de dezembro de 2004, de autoria do então Vereador Nabil Bonduki, que institui o Conselho Municipal da Cultura de Paz e dá outras providências.

Sem embargo dos meritórios propósitos que nortearam seu autor, a medida não reúne condições de ser convertida em lei, impondo-se seu veto total, com fulcro no § 1º do artigo 42 da Lei Orgânica do Município de São Paulo, por inconstitucionalidade, ilegalidade e contrariedade ao interesse público, nos termos das considerações a seguir aduzidas.

A mensagem aprovada, além de criar o Conselho Municipal da Cultura de Paz, vinculando-o à Secretaria do Governo Municipal, estabelece seus princípios norteadores, composição e competências, dentre as quais a de realizar bienalmente a Conferência Municipal da Cultura de Paz e estimular a criação de núcleos locais que atuem no âmbito das Subprefeituras, em consonância com as orientações do colegiado.

Desde logo, resta patente que a medida dispõe sobre assunto relacionado a organização administrativa, serviços públicos e matéria orçamentária, impondo novas atribuições e conseqüentes encargos à Administração Pública, com nítida interferência nas atividades e funções dos órgãos municipais, o que é defeso ao Legislativo, por expressa disposição legal.

Acresça-se, ainda, que a propositura implica dispêndio de verbas para a adoção das amplas ações e providências nela previstas, como a criação de núcleos locais nas Subprefeituras e a realização bienal da conferência municipal e de eleições para escolha de representantes, envolvendo, pois, questão também de natureza orçamentária.

Com efeito, as leis que tratam de organização administrativa, serviços públicos e matéria orçamentária são de iniciativa privativa do Prefeito, “ex vi’ do disposto no artigo 37, § 2º, inciso IV, combinado com os artigos 69, inciso XVI, e 70, inciso XIV, todos da Lei Maior local.

Destarte, é forçoso inferir que, ao extrapolar o campo de atribuições do Legislativo e invadir a esfera de competências exclusivas do Executivo, a propositura fere o princípio constitucional da independência e harmonia entre os Poderes, consagrado no artigo 2º da Carta Magna e reproduzido no artigo 6º da Lei Orgânica do Município de São Paulo, ao mesmo tempo em que desatende a Lei de Responsabilidade Fiscal, circunstâncias que a inquinam simultaneamente de inconstitucionali-dade e ilegalidade, vez que a efetivação das medidas e eventos por ela instituídos importa aumento de despesas, onerando os cofres municipais. Todavia, a medida não conta com a indicação dos recursos corresponden-tes, achando-se, pois, quanto a esse aspecto, em desacordo com a Lei Complementar Federal nº 101, de 4 de maio de 2000, em seus artigos 15 e 16.

Aliás, o Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, em casos análogos, tem proclamado reiteradamente a inconstitucionalidade de textos legais como o ora vetado:

“Dessa forma, determinando, por meio de lei a adoção de medidas específicas de execução, houve ingerência de um Poder em relação ao outro, com nítida invasão de competência e infringência ao artigo 5º, “caput”, da Constituição do Estado.

................................................................................

A par disso, é evidente que a execução da indigitada lei iria provocar despesas. Sem constar a indicação dos recursos disponíveis próprios para atender aos novos encargos, era de rigor o veto, nos termos do artigo 25 da Constituição do Estado”. (ADIN nº 44.255.0/5-00 – Rel. Des. Franciulli Netto, v.u.,j. em 19.05.99: no mesmo sentido: ADIN nº 59.744.0/1 – Rel. Des. Mohamed Amaro; ADIN nº 11.676-0 – Rel. Des. Milton Coccaro; ADIN nº 11.803-0 – Rel. Des. Yussef Cahali; ADIN nº 65.779-0/0 – Rel. Des. Flávio Pinheiro).

Por outro lado, além de eivada de inconstitucionalidade e ilegalidade, a propositura não se coaduna com o interesse público, haja vista que, além de impor à Administração os ônus já mencionados, os princípios e competências do novo colegiado acabam por se sobrepor aos de outros conselhos, coordenadorias e comissões municipais, resultando em duplicidade de atribuições e atividades.

Veja-se, por exemplo, que os princípios estampados em seu artigo 2º, em especial em seus incisos I, II, III, V, VI, VII e VIII, já norteiam a atuação dos órgãos da Administração Municipal Direta e Indireta, pautada pelo respeito à vida e à dignidade humana, pela prática da não-violência e da defesa da liberdade de expressão e da diversidade cultural.

A par disso, grande parte das competências constantes de seu artigo 3º corresponde exatamente àquelas conferidas à Coordenadoria Especial da Mulher, instituída pela Lei nº 11.336, de 30 de dezembro de 1992, alterada pela Lei nº 13.169, de 11 de julho de 2001, à Coordenadoria Especial da Juventude, criada pela citada lei nº 13.169, de 2001 (artigo 76, inciso III), ao Grande Conselho Municipal do Idoso, criado pela Lei nº 11.242, de 24 de setembro de 1992, à Comissão Municipal de Direitos Humanos, criada pela Lei nº 13.292, de 14 de janeiro de 2002, e ao Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente, instituído pela Lei nº 11.123, de 22 de novembro de 1991.

Por fim, a vinculação do colegiado em referência à Secretaria do Governo Municipal também não se compatibiliza com as diretrizes da atual gestão, visto que os conselhos e coordenadorias municipais acima mencionados acham-se vinculados à Secretaria Especial para Participação e Parceria.

Assim sendo, é forçoso inferir que a reunião, num só conselho, de temas cuja natureza, amplitude e complexidade demandaram a criação de colegiados e coordenadorias específicas pelo Poder Público Municipal, com intensa atuação, não apenas configura impropriedade administrativa, pela sobreposição de encargos e atribuições, como também dificulta o efetivo tratamento e solução das questões que pretende abarcar, pela diversidade da matéria coligida, restando, portanto, em desconformidade com o interesse público.

Por todo o exposto, vejo-me na contingência de não dar acolhida ao texto aprovado, vetando-o na sua totalidade, por sua inconstitucionalidade e contrariedade ao interesse público, com amparo nos fundamentos acima expendidos.

Restituo, pois, o assunto à reapreciação dessa Egrégia Câmara que, com seu elevado critério, se dignará a reexaminá-lo, renovando a Vossa Excelência, na oportunidade, meus protestos do mais alto apreço e consideração.

JOSÉ SERRA

Prefeito

Ao

Exmo. Sr.

ROBERTO TRIPOLI

Presidente da Câmara Municipal de São Paulo

 

Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo