CASA CIVIL DO GABINETE DO PREFEITO

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RAZÕES DO VETO AO PROJETO DE LEI Nº 569/2001; OFÍCIO DE 13 de Janeiro de 2004

Razões de Veto ao Projeto de Lei nº 569/01

Ofício ATL nº 56/04

Senhor Presidente

Por meio do Ofício nº 18/Leg.3/0777/2003, cujo recebimento acuso, Vossa Excelência encaminhou à sanção cópia autêntica do Projeto de Lei nº 569/01, de autoria do Vereador Carlos Alberto Bezerra Jr., aprovado por essa Egrégia Câmara na sessão de 27 de novembro de 2003, que objetiva instituir o Estatuto da Juventude.

No entanto, embora reconhecendo os meritórios propósitos que com certeza guiaram o seu proponente, a medida não reúne as necessárias condições para sua conversão em lei, ante sua inconstitucionalidade, ilegalidade e contrariedade ao interesse público, na conformidade das razões adiante explicitadas, pelo que me vejo compelida a vetá-la totalmente, fazendo-o com fundamento no artigo 42, § 1º, da Lei Orgânica deste Município.

Por primeiro, sob o aspecto formal, cumpre dizer que o texto aprovado contém vícios de inconstitucionalidade por pretender dispor acerca de matéria legislativa constitucionalmente reservada à União, aos Estados e ao Distrito Federal e, dentro destes, aos respectivos Poderes Executivos, com isso contrariando o princípio federativo e o princípio da independência e harmonia entre os Poderes, aos quais se referem os artigos 1º, 2º e 18 da Constituição Federal.

Com efeito, ao pretender dispor sobre o Estatuto da Juventude, nele prevendo medidas e ações que contribuam para o desenvolvimento integral dos jovens do Município de São Paulo, inclusive onerando o Poder Público, a propositura acaba por invadir competência legislativa concorrentemente atribuída à União, aos Estados e ao Distrito Federal, nos termos do disposto no artigo 24, inciso XV, da Constituição Federal.

Além disso, no âmbito da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, a iniciativa legislativa quanto ao conteúdo e forma de prestação de serviços públicos, cuide-se ou não de assunto pertinente à proteção da juventude, bem como à matéria orçamentária, é privativa dos respectivos Poderes Executivos, de acordo com a regra preconizada pela Constituição Federal no seu artigo 61, inciso II, alínea “b”.

Encerrando esse tópico, bom é esclarecer que, observadas as devidas adequações e proporções, o assunto está disciplinado em idêntico sentido pelos artigos 6º e 37, § 2º, inciso IV, da Lei Orgânica do Município de São Paulo.

A par de sua inconstitucionalidade, como acima demonstrado, a mensagem aprovada é também ilegal por não atender a exigências impostas por legislação federal de caráter nacional e, pois, de observância obrigatória por todos os entes integrantes da República Federativa do Brasil – União, Estados, Distrito Federal e Municípios.

Realmente, de acordo com o disposto nos artigos 26 e 27 do texto aprovado, deverá o Poder Público prever, na Lei de Diretrizes Orçamentárias e na Lei Orçamentária, os recursos financeiros necessários à reinserção e à integração plena dos jovens que especifica à sociedade, de modo a garantir-lhes o acesso a serviços e benefícios sociais.

Trata-se, sem sombra de dúvidas, de criação de despesa obrigatória de caráter continuado, para a qual há a necessidade de demonstração da origem dos recursos para o seu custeio, consoante determina expressamente o artigo 17 da Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000), condição esta não satisfeita pela propositura.

Mas não é só. Ainda sob o enfoque legal, constata-se que o texto aprovado, ao disciplinar o direito ao trabalho (arts. 7º a 9º), o direito à educação (arts. 10 a 15), o direito à saúde (arts. 16 e 17), os direitos sexuais e reprodutivos (arts. 18 a 20), o direito à cultura (arts. 21 e 22), o direito à recreação (arts. 23 a 25), o direito à integração e reinserção social (arts. 26 a 28), o direito à plena participação social e política (arts. 29 a 32), o direito à informação (arts. 33 a 35), o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado (arts. 36 e 37), e o direito à prestação de serviço social (art. 38), todos dirigidos exclusivamente aos jovens com idade entre 18 (dezoito) e 25 (vinte e cinco) anos, nada mais faz do que repetir disposições já previstas no ordenamento constitucional (arts. 3º, III; 6º; 7º; 14 e 225 da Constituição Federal) e legal (Código Civil, Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB, Consolidação as Leis do Trabalho – CLT, Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS, Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA e outros), isso sem cogitar os programas governamentais implementados no âmbito deste Município, dirigidos especificamente ou também para o segmento jovem da população, como são exemplos a Estação Juventude, a Bolsa-Trabalho e outros programas da Prefeitura nas áreas esportiva, educacional, de saúde e social desenvolvidos pelas Secretarias Municipais de acordo com as respectivas competências.

Essas repetições, além de não constituírem garantia da concretização dos direitos por elas preconizados, tornam confuso e esparso o seu regramento aos olhos dos cidadãos, situação incompatível com as diretrizes traçadas pelo artigo 11 da Lei Complementar nº 95, de 26 de fevereiro de 1998 (dispõe sobre a elaboração, a redação, a alteração e a consolidação das leis), editada em cumprimento ao disposto no parágrafo único do artigo 5º da Constituição Federal, que primam pela clareza, precisão e ordem lógica das leis.

Por fim, mister se faz ressaltar a contrariedade da propositura ao interesse público no que respeita aos tópicos a seguir delineados.

O primeiro deles refere-se à criação do Conselho Municipal da Juventude, na forma do artigo 4º. De fato, considerando a consolidação legal da Coordenadoria Especial da Juventude, operada pela Lei nº 13.169, de 11 de julho de 2001, circunstância esta não levada em conta pelo projeto de lei em apreço, previsível é a ocorrência de conflitos negativos e positivos de competências entre o novo Conselho e a atual Coordenadoria, acarretando prejuízos para implementação da política municipal voltada à juventude paulistana. Outro inconveniente verifica-se na representação da sociedade civil no Conselho (artigo 4º, § 1º, inciso II, da propositura), eis que, além de inexistirem algumas das entidade ali discriminadas, dada a impossibilidade de sua identificação em decorrência da generalidade como são indicadas no texto, muitas delas possuem objetivos institucionais semelhantes ou até mesmo idênticos, comprometendo, como se vê, a representatividade da juventude pretendida por meio desses segmentos.

Ainda contrária ao interesse público é a disposição constante do artigo 2º, § 2º, do texto aprovado, que prevê a declaração de utilidade pública municipal das associações e organizações representativas dos jovens cujo objetivo seja a luta por uma vida digna e a promoção da paz e da justiça social. Isso porque a matéria pertinente à declaração de utilidade pública de entidades com reconhecido mérito social já se acha disciplinada pela Lei nº 4.819, de 21 de novembro de 1955, e alterações, não se justificando, pois, do ponto de vista administrativo e isonômico, a coexistência de leis sobre o mesmo assunto, porém com critérios diferenciados em função dos objetivos dessas entidades.

Nessas condições, evidenciadas as razões que conduzem a vetar integralmente a medida assim aprovada, fazendo-o com supedâneo no artigo 42, § 1º, da Lei Orgânica do Município de São Paulo, devolvo o assunto ao reexame dessa Colenda Casa de Leis.

Na oportunidade, renovo a Vossa Excelência protestos de elevado apreço e distinta consideração.

MARTA SUPLICY

Prefeita

Ao

Excelentíssimo Senhor

ARSELINO TATTO

Presidente da Câmara Municipal de São Paulo

 

Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo