Razões de Veto ao Projeto de Lei nº 547/06
OF ATL nº 12/09
Ref.: Ofício SGP-23 nº 00083/2009
Senhor Presidente
Reporto-me ao ofício em epígrafe, por meio do qual Vossa Excelência encaminhou à sanção cópia autêntica da lei decretada por essa Egrégia Câmara, em sessão de 16 de dezembro de 2008, relativa ao Projeto de Lei nº 547/06, de autoria do Vereador Aurélio Nomura.
A propositura aprovada institui trabalho de conscientização sobre a importância da doação de órgãos nas escolas da Rede Municipal de Ensino, o qual deverá ser praticado na semana referente ao Dia Municipal do Doador de Órgãos para Transplantes, mediante a realização de atividades pelos alunos matriculados nas unidades do Ensino Fundamental, a serem desenvolvidas preferencialmente por professor da área de ciências ou biologia, nos moldes minudentemente descritos no inciso II de seu artigo 1º.
Não obstante o meritório intuito da iniciativa, que pretende tornar a escola a propagadora, esclarecedora e divulgadora da relevância do tema, conforme declinado pelo autor na respectiva justificativa, a medida já se acha devidamente disciplinada na esfera municipal, impondo-se, assim, seu veto total, por inconstitucionalidade e ilegalidade, nos termos das considerações a seguir aduzidas.
De fato, o assunto objeto da propositura em apreço encontra-se inteiramente abarcado pela Lei nº 13.685, de 19 de dezembro de 2003, a qual institui, no Município de São Paulo, o “Dia Municipal do Doador de Órgãos para Transplantes” e a “Semana de Incentivo à Doação de Órgãos para Transplantes”, que integram também o Calendário de Eventos da Cidade de São Paulo, nos termos da Lei nº 14.485, de 19 de julho de 2007.
Cabe destacar que a Lei nº 13.685, de 2003, estabelece, no parágrafo único de seu artigo 1º, que a semana supracitada é dedicada à realização de eventos culturais, palestras, cartazes, folhetos educativos, trabalhos escolares e campanhas, contemplando plenamente o trabalho de conscientização a que se referem o “caput” e o inciso I do artigo 1º do texto aprovado, do que deflui sua desconformidade com a norma estampada no inciso IV do artigo 4º da Lei Complementar Federal nº 95, de 26 de fevereiro de 1998.
No âmbito da educação municipal, o tema é tratado de forma diferenciada em cada unidade escolar, conforme as prioridades por ela estabelecidas no respectivo Projeto Pedagógico, por meio de ações em parceria com a Secretaria Municipal da Saúde ou mediante a abordagem dos temas transversais do currículo.
Dessa forma, a fim de cumprir as finalidades de pleno desenvolvimento do educando e seu preparo para a cidadania, expressas na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei Federal nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996), cada instituição de ensino, no exercício da autonomia que lhes conferem os artigos 12 e 15 da LDB, define, em seu Projeto Pedagógico, os conteúdos a serem trabalhados dentro das diversas áreas do conhecimento, de acordo com as características de sua comunidade.
Por outro lado, a conscientização sobre a importância da doação dos órgãos também se apresenta no contexto dos temas que permeiam todas as áreas do conhecimento, dada a sua importância na formação geral dos alunos, assim chamados de “Temas Transversais” dos Parâmetros Curriculares Nacionais, que elegem, como princípios orientadores da educação escolar, a dignidade da pessoa humana, a igualdade de direitos, a participação e a co-responsabilidade pela vida social.
A propositura aprovada, porém, a par de disciplinar matéria já legislada, determina, no inciso II de seu artigo 1º, estratégias a serem adotadas para o desenvolvimento do trabalho educacional, impondo sistemática que desconsidera o Projeto Pedagógico de cada unidade escolar e que acaba por ferir a autonomia pedagógica assegurada pela LDB.
Nesse sentido, constata-se que, ao interferir em atribuições próprias das unidades educacionais e da Administração Municipal, o projeto de lei dispõe sobre assunto vinculado à organização administrativa, contrariando o princípio constitucional da independência e harmonia entre os Poderes, ao mesmo tempo em que desatende preceitos e diretrizes da legislação federal que rege a educação nacional.
Ante todo o exposto, explicitados os óbices que impedem a sanção do texto aprovado, vejo-me na contingência de vetá-lo na íntegra, com fundamento no artigo 42, § 1º, da Lei Orgânica do Município de São Paulo.
Assim sendo, devolvo o assunto à apreciação dessa Egrégia Câmara que, com seu elevado critério, se dignará a reexaminá-lo, renovando a Vossa Excelência, na oportunidade, protestos de apreço e consideração.
GILBERTO KASSAB
Prefeito
Ao
Excelentíssimo Senhor
ANTONIO CARLOS RODRIGUES
Digníssimo Presidente da Câmara Municipal de São Paulo
Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo