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RAZÕES DO VETO AO PROJETO DE LEI Nº 489/2005; OFÍCIO DE 20 de Julho de 2009

Razões de Veto ao Projeto de Lei nº 489/05

 

Ofício ATL nº 109/09

Ref.: Ofício SGP-23 nº 02160/2009

Senhor Presidente

Reporto-me ao ofício em epígrafe, por meio do qual Vossa Excelência encaminhou à sanção cópia autêntica do Projeto de Lei nº 489/05, aprovado por essa Egrégia Câmara em sessão de 25 de junho de 2009, de autoria do Vereador Domingos Dissei, que objetiva dispor sobre o “check up” das edificações no âmbito do Município de São Paulo.

Sem embargo dos meritórios propósitos que certamente nortearam o seu autor, a medida aprovada não reúne as condições necessárias à sua conversão em lei, ante os vícios de inconstitucionalidade e ilegalidade que a maculam, bem assim em face do seu descompasso com o interesse público, pelo que sou compelido a vetá-la integralmente com supedâneo no § 1º do artigo 42 da Lei Orgânica do Município de São Paulo, na conformidade das razões a seguir aduzidas.

O texto aprovado, motivado pela preocupação de evitar a ocorrência de acidentes e tragédias, de acordo com a justificativa apresentada por seu autor, objetiva tornar obrigatória a realização de vistorias em edificações e equipamentos públicos e privados no âmbito do Município de São Paulo, a cada 5 (cinco) anos, para detecção de irregularidades na parte física do imóvel e seus equipamentos, registradas em laudos técnicos, de responsabilidade de seus proprietários ou gestores, conforme o caso, a serem executadas por engenheiros, arquitetos ou empresas de engenharia, com registro no Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia – CREA-SP e cadastrados na Prefeitura, sem prejuízo das vistorias que, a qualquer tempo, possam ser realizadas pelo Poder Público Municipal.

Discrimina a propositura, ainda, as edificações, equipamentos ou espaços que não poderão ser utilizados para a finalidade a que se destinam sem a assistência permanente de profissional técnico habilitado na manutenção das perfeitas condições de segurança de uso, tais como indústrias, oficinas e depósitos, nas condições que especifica, postos de abastecimento de veículos automotores, indústrias, oficinas, depósitos e estabelecimentos comerciais com mais de 1.500 metros de área construída ou que utilize mais de 3 (três) andares, hospitais, e pronto-socorros, dentre outros.

Por fim, estabelece a mensagem as condições técnicas para a validade dos laudos e dos demais atos que venham a ser praticados, observados os termos da legislação em vigor, assim como define as infrações e as sanções administrativas aplicáveis nas hipóteses de descumprimento das disposições constantes da nova lei.

Patente, pois, que o projeto em lei em foco intenta dispor a respeito do controle e fiscalização das condições de segurança de uso das edificações e, nesse sentido, legislar sobre assunto inserido no campo da organização administrativa, com evidente interferência nas atividades e competências de órgãos municipais, na medida em que transfere para os particulares a incumbência de realizar vistorias em imóveis, a qual, conforme a complexidade da situação fática, compete atualmente ou ao Departamento de Controle de Uso de Imóveis – CONTRU, da Secretaria Municipal de Habitação, por força do disposto no artigo 28 da Lei nº 10.237, de 17 de dezembro de 1986, ou às Coordenadorias de Planejamento e Desenvolvimento Urbano – CPDUs das Subprefeituras, nos termos do inciso II do artigo 1º do Decreto nº 48.379, de 25 de maio de 2007.

Com efeito, as leis que tratam de organização administrativa são de iniciativa privativa do Prefeito, "ex vi" do disposto no artigo 37, § 2º, inciso IV, da Lei Orgânica do Município de São Paulo, razão pela qual a propositura extrapola as atribuições do Legislativo e invade a esfera de competências do Executivo, malferindo o princípio constitucional da independência e harmonia entre os Poderes, consagrado no artigo 2º da Carta Magna e reproduzido no artigo 5º da Constituição do Estado de São Paulo e no artigo 6º da Lei Maior local.

A par da apontada inconstitucionalidade, o texto vindo à sanção incide também em ilegalidade, vez que em desacordo com o vigente ordenamento legal do Município, além de conflitar com o interesse público.

Primeiramente, cabe apontar que o Código de Obras e Edificações - COE (Lei nº 11.228, de 25 de junho de 1992) é a lei fundamental que, no âmbito local, estabelece as disposições construtivas das edificações e de instalação de equipamentos considerados essenciais à circulação e à segurança de seus ocupantes.

Ocorre que o rol das edificações e equipamentos sujeitos às normas de segurança de uso e de funcionamento, conforme previsto no COE, é significativamente inferior àquele referido no artigo 1º da mensagem aprovada, consideradas as exceções constantes de seu artigo 2º, haja vista que a legislação municipal isenta da obrigatoriedade de instalação de sistemas de segurança as edificações consideradas de menor risco, como aquelas que apresentam pequena área construída, baixa altura e população e ausência de utilização de produtos químicos perigosos, dentre outros aspectos.

A par dessa divergência, a medida também contraria o COE ao atribuir ao proprietário e ao profissional encargos e responsabilidades diversos daqueles fixados por aquela codificação edilícia, em seus itens 2.1, 2.2, 2.3 e 2.4, impondo, ainda, a teor dos artigos 4º, 5º e 6º, obrigações e procedimentos a categorias profissionais cujos estatutos e normas de conduta são regidos por legislação federal própria, de competência privativa da União, com isso incidindo, mais uma vez, em reiterada ilegalidade.

Demais disso, impende salientar que, no Município de São Paulo, a matéria versada no texto aprovado já se encontra devidamente disciplinada na legislação em vigor, que prevê os procedimentos administrativos e ficais instituídos com a finalidade de garantir a segurança de uso e de funcionamento das edificações.

A propósito, observa-se que a obrigatoriedade de afixação, no acesso principal dos edifícios, do documento que comprova o atendimento às normas de segurança de uso e de funcionamento, para os edifícios sujeitos àquelas normas, conforme preconizado no parágrafo único do artigo 1º da proposta legislativa em comento, já está contemplada na Lei nº 8.432, de 8 de setembro de 1976.

Já o Decreto nº 17.216, de 9 de março de 1981, que regulamenta a Lei nº 8.432, de 1976, instituiu o Auto de Verificação de Segurança - AVS, que se consubstancia no documento municipal de verificação de segurança de uso, enquanto que o Decreto nº 49.969, de 28 de agosto de 2008, disciplina a expedição de Auto de Licença de Funcionamento e de Alvará de Funcionamento como os documentos hábeis, relativamente às hipóteses por eles abrangidas, para fins de comprovação do atendimento das condições mínimas de segurança das edificações e locais de reunião, expedidos pelo Departamento de Controle de Uso de Imóveis - CONTRU, salvo nas situações previstas no artigo 1º, inciso II, alíneas “c” e “d”, do Decreto nº 48.379, de 2007, sob a competência das Coordenadorias de Planejamento e Desenvolvimento Urbano - CPDUs das Subprefeituras.

Ressalte-se que referido Decreto nº 49.669, de 2008, já contempla, em seus artigos 23, 26 e 27, todo o regramento aplicável à segurança das edificações, estabelecendo todos os documentos exigidos para a expedição e a renovação das licenças, em consonância com as normas estipuladas pelo Código de Obras e Edificações.

Cita-se, ainda, a Lei nº 9.433, de 1º de abril de 1982, que estabelece as penalidades para as infrações referentes às normas especiais de segurança de uso das edificações.

Assim, se o intuito é garantir a segurança de uso das edificações e de seus usuários, o assunto já está amplamente regulado pela legislação municipal, que lhe confere tratamento normativo específico e apropriado, com o qual não se coaduna a propositura.

Por outro lado, é imperativo ressaltar que, ao transferir obrigações de órgãos públicos para os particulares, o texto aprovado acaba por delegar o poder de polícia, constitucionalmente outorgado ao Município e privativo do Executivo, a profissionais liberais sem vínculo funcional com a Administração Municipal, em desconformidade não apenas com os preceitos constitucionais, mas também com o próprio interesse público, por impor pesados ônus e acarretar novas despesas aos munícipes, compelindo-os à contratação de profissionais ou empresas para a realização de vistorias e laudos que se inserem na esfera de responsabilidade do Poder Público.

No que se refere à obrigação de cadastramento desses profissionais pela Administração Municipal, tal como previsto no “caput” do artigo 1º e no § 1º do artigo 6º do projeto de lei, cabe assinalar que a Secretaria Municipal de Habitação desativou, há anos, o antigo "Registro de Profissionais e Firmas", por constituir-se em procedimento burocrático e inócuo, dada a impossibilidade de sua sobreposição às competências legais afetas ao Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia – CREA-SP.

Por derradeiro, vale relembrar, conforme já fora asseverado nas razões de veto ao Projeto de Lei nº 407/01, de idêntico teor ao constante da propositura em questão, que medidas como a que ora se apresenta recomendam equacionamento no bojo de uma revisão geral da legislação de regência da matéria, de maneira a evitar conflitos, sobreposições de atribuições, imposição de ônus econômico aos munícipes e instituição de documentos com as mesmas finalidades.

Nessas condições, evidenciados os óbices que impedem a sanção do texto aprovado, seja por contrariar os princípios constitucionais e as normas legais acima especificados, seja em virtude do seu descompasso com o interesse público, vejo-me na contingência de vetar o seu inteiro teor, o que faço com fundamento no § 1º do artigo 42 da Lei Orgânica do Município de São Paulo.

Assim sendo, devolvo o assunto ao reexame dessa Colenda Casa de Leis, renovando, na oportunidade, a Vossa Excelência meus protestos de apreço e consideração.

GILBERTO KASSAB

Prefeito

Ao

Excelentíssimo Senhor

ANTONIO CARLOS RODRIGUES

Digníssimo Presidente da Câmara Municipal de São Paulo

 

Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo