CASA CIVIL DO GABINETE DO PREFEITO

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RAZÕES DO VETO AO PROJETO DE LEI Nº 110/2001; OFÍCIO DE 20 de Março de 2003

Razões de Veto ao Projeto de Lei nº 110/01

Ofício ATL nº 098/03

Senhor Presidente

Por meio do Ofício nº 18/Leg.3./0035/2003, Vossa Excelência encaminhou à sanção cópia autêntica da lei decretada por essa Egrégia Câmara na sessão de 15 de fevereiro de 2003, relativa ao Projeto de Lei nº 110/01.

De autoria do Vereador Wadih Mutran, objetiva o projeto proibir a exposição, na parte externa das bancas de jornais e revistas, de publicações cuja composição de capa utilize fotos ou ilustrações de cunho pornográfico ou violento, devendo esses materiais ser expostos e comercializados no interior dos referidos estabelecimentos.

Não obstante os meritórios propósitos que certamente nortearam o seu autor, a medida não reúne condições para ser convertida em lei, pelo que, nos termos do § 1º do artigo 42 da Lei Orgânica do Município de São Paulo, se lhe impõe veto total, ante sua inconstitucionalidade, ilegalidade e contrariedade ao interesse público, na conformidade das razões abaixo aduzidas.

Cumpre apontar, em primeiro lugar, que o assunto já se encontra disciplinado no âmbito local e federal, relativamente à imposição de condições para a comercialização de publicações em geral cuja capa ou conteúdo contemple material nocivo à moral e aos bons costumes, com especial proteção às crianças e adolescentes.

De fato, a Lei Municipal nº 10.066, de 14 de maio de 1986, veda a exposição, nas bancas de jornais e revistas ou bancas de feiras livres, de publicações nocivas ou atentatórias à moral pública e aos bons costumes, entendidas estas como as que retratem pessoas em posição, poses ou trajes eróticos e pornográficos, cabendo aos responsáveis cuidar para que referidos materiais sejam lacrados e tenham suas capas completamente cobertas, nas poses, por papel ou plástico opaco, de modo a tornar totalmente ocultas as figuras que as capas estampam, sob pena de apreensão das mercadorias e sem prejuízo da sanção administrativa ou penal cabível na espécie. No mesmo sentido é a Lei Municipal nº 10.072, de 9 de junho de 1986, que, no seu artigo 14, inciso II, veda, aos permissionários de espaços públicos destinados à instalação de bancas de jornais e revistas, vender a menores ou violar invólucros de publicações nocivas ou atentatórias à moral.

A seu turno, em nível nacional, o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei Federal nº 8.069, de 13 de julho de 1990) estabelece que as revistas e publicações contendo material impróprio e inadequado a crianças e adolescentes deverão ser comercializadas em embalagens lacradas, com advertência a respeito de seu conteúdo, e, em se tratando de capas com mensagens pornográficas ou obscenas, acondicionadas em invólucros opacos (artigo 78), sujeitando-se os infratores à cominação de multa pecuniária e à apreensão do material (artigo 257).

Como se pode observar, a legislação em vigor efetivamente já dispõe sobre a matéria objeto da propositura em questão, no aspecto relativo à comercialização de publicações que contenham fotos ou ilustrações de cunho pornográfico, sendo totalmente contrária ao interesse público a superveniente edição de norma legal que, mais uma vez, venha a dispor acerca de assunto já assim normatizado, tornando esparso e confuso o seu regramento no âmbito local, bem assim dificultando sobremaneira a necessária ação fiscalizatória, em evidente detrimento do interesse maior na busca pela sua consolidação, consoante acha-se previsto na Lei Complementar Federal nº 95/98 (alterada pela Lei Complementar Federal nº 107/01), editada em obediência ao parágrafo único do artigo 59 da Constituição da República, segundo a qual as leis conexas ou afins devem ser reunidas, mediante sua integração em diplomas legais únicos relativos a temas específicos.

Ainda que assim não fosse, o texto aprovado, ao determinar, no parágrafo único do seu artigo 1º, que as publicações cuja composição de capa utilize fotos ou ilustrações de cunho pornográfico sejam expostas e comercializadas, sem qualquer restrição, no interior das bancas de jornais e revistas, além de revogar parcialmente a legislação municipal vigente sobre a matéria (referidas publicações, expostas dentro ou fora das bancas de jornais e revistas, só podem ser comercializadas em invólucros de papel ou plástico opaco) afronta o princípio federativo, estampado no artigo 1º da Magna Carta de 1988, bem assim encontra-se em descompasso com o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei Federal nº 8.069/90), daí a sua inconstitucionalidade e ilegalidade.

Realmente, em consonância com o disposto no artigo 24, inciso XV, da Constituição da República, compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre a proteção à infância e à juventude, circunstância esta, que, a toda evidência, torna inconstitucional a legislação local que venha dispor de modo contrário ao estabelecido na Legislação Federal ou Estadual, como é o caso do projeto de lei em apreço, relativamente ao tópico acima destacado, eis que, segundo o precitado artigo 78 do Estatuto da Criança e do Adolescente, já examinado, as revistas e publicações contendo material impróprio e inadequado a crianças e adolescentes, inclusive as que contemplem capas com mensagens pornográficas ou obscenas, deverão ser comercializadas em embalagens opacas e lacradas, não importando se sua exposição ocorra dentro ou fora das bancas de jornais e revistas.

Por derradeiro, importa registrar que a aplicação de idêntico regramento às publicações com capas contendo fotos ou ilustrações de cunho violento, na forma como se encontra disposta na mensagem aprovada, igualmente se apresenta contrária ao interesse público e à sobredita Lei Complementar Federal nº 95/98.

Isso porque, na hipótese dessas normas serem observadas, até os jornais, que costumam retratar imagens de guerra, ocorrências policiais, etc., não poderiam mais ser expostos em bancas, contrariando, como se vê, o interesse público na defesa da liberdade de imprensa.

Demais disso, considerando a ausência de critérios claros e precisos, a operacionalização da lei ficaria seriamente comprometida, em especial no que concerne à ação fiscalizatória, porquanto, em muitos casos, seria muito difícil chegar-se a uma conclusão segura a respeito do cunho violento ou não de determinado material, contrariando, dessa forma, o teor do artigo 11 da supramencionada Lei Complementar Federal, o qual exige que os textos legais sejam elaborados com clareza e precisão.

Nessas condições, restando fartamente explicitadas a inconstitucionalidade e a ilegalidade do texto encaminhado à sanção, bem assim a sua contrariedade ao interesse público, vejo-me compelida a vetá-lo integralmente, devolvendo o assunto ao reexame dessa Egrégia Casa de Leis.

Na oportunidade, renovo a Vossa Excelência protestos de elevado apreço e distinta consideração.

MARTA SUPLICY

Prefeita

Ao Excelentíssimo

Senhor ARSELINO TATTO

Presidente da Câmara Municipal de São Paulo

 

Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo