Processo n° 6013.2019/0004375-8
Informação n° 639/2020
PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO
COORDENADORIA GERAL DO CONSULTIVO
Senhor Procurador Coordenador
Trata-se de consulta do Departamento Judicial (JUD) sobre o disposto no parágrafo primeiro do art. 21 da Lei 8.213/91, abaixo transcrito, de modo a estabelecer, e resumo, "se o acidente de trabalho ocorrido no intervalo da jornada de trabalho e fora do local de trabalho também pode ser equiparado a acidente de trabalho":
Art. 21. Equiparam-se também ao acidente do trabalho, para efeitos desta Lei:
(...)
§1° Nos períodos destinados a refeição ou descanso, ou por ocasião da satisfação de outras necessidades fisiológicas, no local de trabalho ou durante este, o empregado é considerado no exercício do trabalho.
A resposta é afirmativa.
Os acidentes ocorridos nos intervalos de jornada reservados ao atendimento de necessidades inerentes à condição humana do trabalhador, independentemente de onde os desfrute, podem ser equiparados ao acidente de trabalho. É o que deflui da locução "no local de trabalho ou durante este" — ou seja, "durante este trabalho" — inserida no texto legal. O acidente ocorrido no período de tempo destinado às refeições, que não necessariamente se realizam no espaço de trabalho, é identificável como acidente de trabalho por equiparação:
"Retomando o conceito atribuído pelo legislador, também se considera acidente do trabalho o ocorrido no local e no horário de trabalho por agressão, sabotagem ou terrorismo praticado por terceiro ou companheiro de trabalho; ofensa física intencional, inclusive de terceiro, por motivo de disputa relacionada com o trabalho; ato de imprudência, negligência ou imperícia de terceiro ou companheiro de trabalho; ato de pessoa privada do uso da razão; casos fortuitos ou de força maior; em quaisquer local e horário, em caso de contaminação acidental do segurado no exercício de sua atividade; na execução de ordem ou realização de serviço sob a autoridade da empresa; na prestação espontânea de qualquer serviço à empresa para lhe evitar prejuízo ou proporcionar proveito; em viagem a serviço da empresa, inclusive para fins de estudo quando financiada por esta; no percurso residência-local de trabalho e vice-versa; nos períodos destinados à refeição ou descanso intrajornada, ou satisfação de outras necessidades fisiológicas, no local do trabalho ou durante este, sendo nessas oportunidades considerado no exercício do trabalho - art. 21 da Lei n. 8.213/1991." (Carlos Alberto Pereira de Castro e João Batista Lazzari, Manual de Direito Previdenciário, Forense, 21ª ed., 2019, p. 552, destacamos)
"O empregado é considerado no exercício do trabalho no intervalo para refeições e descanso, ou para qualquer outro período em que tenha de satisfazer outras necessidades fisiológicas. Dessa forma, quando o empregado está se alimentando ou descansando dentro da jornada de trabalho, ou até mesmo jogando futebol nas dependências da empresa, pode ocorrer acidente de trabalho. O mesmo pode-se dizer quando o empregado está satisfazendo necessidades fisiológicas durante a jornada de trabalho, quando, por exemplo, o empregado está se lavando ou tomando banho." (Sergio Pinto Martins, Direito da Seguridade Social, ed. Atlas, 2009, 27ª ed., p. 412)
O Superior Tribunal de Justiça já esposou compreensão bastante elástica do dispositivo legal em análise, no contexto de ação de indenização movida contra o empregador do trabalhador falecido em acidente ocorrido durante sua jornada:
"(...) É cediço caber ao empregador cumprir e fazer cumprir as normas de segurança do trabalho, como aquelas relativas à instrução de seus empregados quanto às precauções a tomar para se evitar acidentes ou doenças ocupacionais.
Muito pelo contrário, no caso ora examinado, a única exortação realizada pelo empregador aos empregados foi no sentido de 'que poderiam nadar desde que não estragassem a maquiagem', o que, a toda evidência, não guarda nenhuma relação com o dever de informação e prevenção de acidentes laborais.
Na verdade, a permissão para que a vítima ingressasse em rio, sem a devida segurança oferecida pelo empregador e sem informação acerca da periculosidade do local, acabou por criar um risco desnecessário ao empregado, exatamente na contramão do preceito constitucional que prevê como direito do trabalhador a 'redução dos riscos inerentes ao trabalho' (art. 7°, inciso XXII).
Por outro lado, é irrelevante o fato de o infortúnio ter ocorrido em intervalo intrajornada, dedicado às refeições dos empregados, porquanto é dicção literal do art. 21, § 1°, da Lei n.° 8.213/91, a equiparação a acidentes do trabalho os ocorridos 'nos períodos destinados a refeição ou descanso, ou por ocasião da satisfação de outras necessidades fisiológicas, no local do trabalho ou durante este'."
(REsp 1014848/DF, DJe 12/4/2010)
Assim também o Tribunal de Justiça de São Paulo:
ACIDENTE DO TRABALHO. Empregada vitimada por explosão ocorrida no local onde costumeiramente almoçava. Fato que se equipara ao acidente do trabalho. Direito ao benefício acidentário reconhecido, mediante conversão do auxílio-doenca previdenciárío em acidentário, com pagamento das diferenças e abono anual, pois ainda não consolidadas as lesões. Honorários de advogado arbitrados em 15% das parcelas vencidas. Recursos providos em parte. (TJSP; Apelação Sem Revisão 9060357-27.1999.8.26.0000; Relator (a): Gilberto dos Santos; Órgão Julgador: 2ª. Câmara do Primeiro Grupo (Extinto 2° TAC); Foro de Osasco - 4ª V.CÍVEL; Data do Julgamento: 31/01/2000; Data de Registro: 07/02/2000)
Importante lembrar que, dada a especialidade da legislação previdenciária, a polêmica alteração do §2° do art. 58 da CLT que, promovida em 2017 (Lei 13.467), excluiu da jornada de trabalho "o tempo despendido pelo empregado desde a sua residência até a efetiva ocupação do posto de trabalho", não afetou o disposto no art. 21 da Lei 8.213, sobretudo no que tange à integração dos intervalos para refeição e descanso durante a jornada regular. Bem por isso, tentou-se alterar o referido art. 21 pela MP n° 905, de 11/11/2019, de modo a excluir, na rumo da CLT, os acidentes in itinere do rol de acidentes de trabalho. Referida medida veio a ser revogada pela MP 955, de 20/4/2020. Renovou-se, si et in quantum, a atualidade da interpretação ampla da disposição previdenciária em exame.
No caso concreto, verifica-se que a servidora foi atropelada nas proximidades de seu local de trabalho (027986469) quando para lá retornava para consumir a refeição comprada no "Bergamine" (025751473). Os contornos aparentes do episódio confirmam o nexo causal entre a atividade da servidora e a ocorrência do acidente, razão pela qual pode ser identificado como acidente de trabalho por equiparação.
Sugiro, desse modo, o retorno do presente a JUD para prosseguimento com o entendimento de que, nos termos do parágrafo primeiro do art. 21 da Lei 8.213/91, os acidentes ocorridos nos intervalos de jornada reservados ao atendimento de necessidades fisiológicas do servidor (alimentação, descanso etc.), independentemente de onde os desfrute, podem ser equiparados ao acidente de trabalho.
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São Paulo, 27/07/2020
ANTONIO MIGUEL AITH NETO
Procurador Assessor - AJC
OAB/SP n° 88.619
PGM
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De acordo.
TICIANA NASCIMENTO DE SOUZA SALGADO
PROCURADORA ASSESSORA CHEFE - AJC
OAB/SP 175.186
PGM
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Processo n° 6013.2019/0004375-8
Informação em continuação n° 639/2020
PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO
Sr. Procuradora Geral,
Encaminho-lhe o presente nos termos da manifestação retro desta Coordenadoria Geral do Consultivo, que acolho.
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São Paulo, 28/07/2020
TIAGO ROSSI
Coordenador Geral do Consultivo
OAB/SP 195.910
PGM
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Processo n° 6013.2019/0004375-8
Informação em continuação n° 639/2020
DEPARTAMENTO JUDICIAL
Senhor Diretor,
Com meu acolhimento à manifestação da Coordenadoria Geral do Consultivo da Procuradoria Geral do Município, conclusiva no sentido de que, nos termos do parágrafo primeiro do art. 21 da Lei 8.213/91, os acidentes ocorridos nos intervalos de jornada reservados ao atendimento de necessidades fisiológicas do servidor (alimentação, descanso etc.), independentemente do local em que se verifiquem, podem ser equiparados a acidente de trabalho, encaminho-lhe o presente, pela competência, para regular prosseguimento.
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São Paulo, 29/07/2020
MARINA MAGRO BERINGHS MARTINEZ
PROCURADORA GERAL DO MUNICÍPIO
OAB/SP 169.314
Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo