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PARECER PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO - PGM Nº 11.854 de 18 de Abril de 2018

EMENTA N° 11.854
Doação com encargo. Inviabilidade de mero cancelamento da cláusula de reversão. Possibilidade de transferência do encargo para imóvel de valor equivalente ou superior. Necessidade de autorização legislativa.

processo n° 2018-0.035.545-5

INTERESSADO: Comando da Aeronáutica.

ASSUNTO: Cláusula de reversão de doação. Cancelamento ou transferência.

Informação n. 448/2018-PGM.AJC

PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO

COORDENADORIA GERAL DO CONSULTIVO

Senhor Coordenador Geral

O presente foi iniciado a partir de ofício advindo do Comando-Geral de Apoio do Comando da Aeronáutica, ligado ao Ministério da Defesa, no qual se solicita o cancelamento ou transferência, para outro bem, de cláusula de reversão imposta por ocasião da doação de imóvel situado na Avenida Dom Pedro I, feita pela Municipalidade em favor da União Federal, com base na autorização dada pela Lei n. 7.543/70 (fls. 3/4).

Recebido em SMUL, o pedido foi em seguida encaminhado a CGPATRI, que juntou cópia da escritura de doação correspondente (fls. 13/16) e propôs a remessa à PGM (fls. 18/19), o que, com a concordância de SMG-COJUR (fls. 21), foi efetuado (fls. 24/25).

É o relatório do essencial.

A solução para o caso envolve a adequada compreensão dos direitos que a Urbe ainda detém sobre o imóvel doado. Com efeito, embora não seja mais a proprietária do bem, a Municipalidade pode voltar a essa posição, caso o imóvel não seja mais de utilidade para a União.

Em verdade, havendo uma cláusula de reversão da espécie, verifica-se um caso de propriedade resolúvel1, em que a condição para o desfazimento da doação é o descumprimento do encargo. É certo que não se pode afirmar provável a resolução da propriedade, mas não há como negar que se trata de um direito com alguma expressão patrimonial.

Por outro lado, a atual Lei Orgânica do Município (art. 112, § 1°, II, "c") exige que a doação a outras pessoas estatais seja feita com encargo correspondente ao interesse público subjacente, de modo que não se pode desprezar a seriedade do dispositivo e a importância de que a Municipalidade faça valer os direitos decorrentes de uma cláusula de reversão dessa espécie.

Isso parece suficiente para concluir que não é possível simplesmente cancelar a cláusula, pois isto implicaria renúncia a um ativo integrante do patrimônio municipal.

Surge então a necessidade de avaliar a possível transferência da cláusula de reversão para outro imóvel que venha a ser recebido em permuta. Em tese, parece razoável que a Municipalidade tenha o mesmo direito em relação a outro bem de propriedade da União, caso o bem antes doado venha a ser alienado a terceiro, com o recebimento de outro bem em troca.

Em tese, a alienação do bem doado a terceiro implicaria alteração da destinação prevista na Lei n. 7543/70 (art. 2o). Por isso, tal permuta precisaria também ser autorizada em lei. Em seguida, seria possível que a Municipalidade interviesse, como anuente, em tal escritura de permuta, celebrada entre o terceiro e a União, da qual constaria expressamente a obrigação, por parte desta, de cumprir no imóvel recebido em permuta a mesma destinação hoje imposta ao bem recebido em doação, sendo o descumprimento dessa obrigação causa de resolução da propriedade em favor do Município - ao qual reverteriam, nesta hipótese, o bem e suas acessões e benfeitorias, independentemente de indenização.

Uma possível objeção ao negócio consistiria na origem distinta da obrigação referente à destinação. Com efeito, na situação desenhada, o bem que seria da União não teria mais origem em doação, mas na permuta. Bem por isso, a condição resolutiva não corresponderia ao descumprimento do encargo da doação, mas ao inadimplemento de uma obrigação assumida pela União no contrato de permuta, no qual a Municipalidade figuraria como interveniente.

Essa diferença não parece, contudo, inviabilizar o novo ajuste, uma vez que a posição da Municipalidade, como beneficiária da condição resolutiva, seria idêntica em ambos os casos. Em verdade, não importa a origem da posição jurídica em questão, mas o benefício que ela possa eventualmente oferecer ao Município. Ademais, a estipulação em favor de terceiro é expressamente admitida pelo Código Civil (art. 436).

Assim, a questão fundamental diz respeito ao próprio valor do bem, ao qual corresponde o proveito econômico que a Municipalidade teria com a resolução da propriedade em uma e outra hipótese. De fato, se a Municipalidade tem a expectativa de se tornar proprietária de um bem de determinado valor, não poderia optar pela transferência desse direito para um bem de menor valor. Dessa sorte, a concordância da Municipalidade com a permuta em questão e a constituição de uma cláusula de reversão sobre o novo bem pressuporia a demonstração de que o imóvel recebido em permuta seria de valor igual ou maior ao do bem doado.

Não parece que a Municipalidade possa interferir com o mérito da permuta, que seria feito no âmbito da União. O interesse da Urbe em relação ao bem é meramente patrimonial, correspondente ao proveito que teria com o recebimento do bem em caso de resolução da propriedade. Sendo o novo bem de valor igual ou maior que o anterior, é possível afirmar que se encontra preservada a esfera patrimonial da Municipalidade.

Vale observar, ainda, que, caso viesse a ser viabilizada a proposta, a União terá de efetuar o desdobro de seu imóvel, que corresponde a duas transcrições distintas - ao que parece, o trecho de interesse é referido pela Transcrição n. 99.470, do 6o Cartório de Registro de Imóveis (fls. 15). Aberta matrícula em separado para a área a ser permutada, o contrato poderia ser objeto do necessário registro.

Nada disso impede, contudo, que as áreas sejam avaliadas, a fim de que se demonstre a viabilidade do negócio. Neste caso, a Municipalidade poderia tanto decidir com base em uma avaliação providenciada pela União - órgão público, cuja atuação também é pautada pela presunção de legitimidade - quanto com amparo em uma avaliação feita em âmbito municipal.

A avaliação pode ser relevante até mesmo para uma revisão dos imóveis a serem permutados, uma vez que não parece provável que áreas situadas em quadras distintas, com diferentes características (v.g., testada), apresentem valores exatamente idênticos. Caso uma primeira avaliação revele que o imóvel cogitado para ser dado em permuta tem um valor maior que o outro, poderá ser considerada a diminuição das dimensões a serem adotadas no possível desdobro, para que o novo lote já surja com dimensões que levem a um valor igual ou menor que o do imóvel a ser recebido na referida permuta.

Posteriormente, caso a avaliação demonstre a referida equivalência de valores e caso realmente haja interesse da União Federal num negócio a ser celebrado nos termos considerados, a Superior Administração poderá deliberar quanto à oportunidade e conveniência do negócio para a Urbe. Em caso positivo, poderia ser submetida uma proposta de alteração da lei, com a inclusão de um novo parágrafo ao art. 2o da Lei n. 7.543/1970 (fls. 7), facultando à donatária o cumprimento do encargo sobre outro imóvel de sua propriedade de valor não inferior ao doado, desde que se pactue que esta última propriedade se resolverá, em favor do Município, caso não haja o cumprimento de tal destinação.

Assim sendo, sugere-se o retorno do presente para CGPATRI, sugerindo-se que o caso seja submetido à Administração Superior para deliberação quanto à resposta a ser dada à autoridade oficiante, para que se possa das prosseguimento às medidas referidas.

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São Paulo, 18/04/ 2018.

JOSÉ FERNANDO FERREIRA BREGA

PROCURADOR ASSESSOR - AJC

OAB/SP 173.027

PGM

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De acordo.

São Paulo, 20/04/2018.

TICIANA NASCIMENTO DE SOUZA SALGADO

PROCURADORA ASSESSORA CHEFE - AJC

OAB/SP 175.186

PGM

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1 Cf. Bevilaqua, Clóvis. Direito das Coisas, 1o vol. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1941, p. 266.

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processo n° 2018-0.035.545-5

INTERESSADO: Comando da Aeronáutica.

ASSUNTO: Cláusula de reversão de doação. Cancelamento ou transferência.

Cont. da Informação n. 448/2018-PGM.AJC

PGM

Senhor Procurador Geral

Encaminho-lhe o presente, com o entendimento da Assessoria Jurídico-Consultiva desta Coordenadoria Geral do Consultivo, que acolho, no sentido de que seria possível a transferência do encargo para imóvel de valor igual ou superior ao que foi objeto de doação, desde que com autorização legislativa, podendo-se prosseguir na instrução do presente para futura deliberação a respeito.

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São Paulo, 23/04/2018.

TIAGO ROSSI 

PROCURADOR DO MUNICÍPIO

COORDENADOR GERAL DO CONSULTIVO

OAB/SP 195.910

PGM

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processo n° 2018-0.035.545-5

INTERESSADO: Comando da Aeronáutica.

ASSUNTO: Cláusula de reversão de doação. Cancelamento ou transferência.

Cont. da Informação n. 448/2018-PGM.AJC

CGPATRI

Senhora Coordenadora

Encaminho-lhe o presente, com o entendimento da Coordenadoria Geral do Consultivo, que acolho, no sentido de que é viável, em tese, a transferência do encargo imposto na doação em questão para outro imóvel a ser recebido em permuta pela União, desde este tenha valor igual ou superior ao bem doado e que tal avença seja objeto de autorização legislativa, podendo ser dado prosseguimento à instrução do presente.

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São Paulo,  /  /2018.

GUILHERME BUENO DE CAMARGO

PROCURADOR GERAL DO MUNICÍPIO

OAB/SP 188.975

PGM

Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo