Processo nº 6071.2018/0000038-7
Parecer PGM/CGC Nº 6839170
INTERESSADA: Secretaria Municipal de Desestatização e Parcerias
ASSUNTO: Consulta sobre a incidência de IPTU sobre os parques municipais cuja gestão será delegada à iniciativa privada por meio de concessão de serviços.
Informação n° 194/2018-PGM.AJC
PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO
COORDENADORIA GERAL DO CONSULTIVO
Senhor Coordenador Geral
O presente foi iniciado pela Secretaria Municipal de Desestatização e Parcerias, que tem tomado as providências preparatórias a fim de efetivar a concessão de serviços relativa a parques municipais, com base no art. 9º da Lei n° 16.703/17. Apontando recentes decisões do Supremo Tribunal Federal - STF que admitiram a cobrança de Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana - IPTU sobre bens federais cedidos a terceiros, questiona a Secretaria, de modo objetivo, quanto à incidência de IPTU sobre os parques municipais cuja gestão será delegada à iniciativa privada por meio de concessão de serviços.
SUREM entendeu que a hipótese em exame seria semelhante aos casos analisados pelo STF (Recursos Extraordinários n° 594.015/SP e 601.720/RJ), pois a posse decorrente do contrato, por ser permanente e de longa duração, poderia ser equiparada a uma "quase propriedade", semelhante ao domínio útil. Na qualidade de possuidor, o concessionário seria contribuinte do tributo e não mero responsável.
SF-COJUR observou que os precedentes do STF mencionados ainda não transitaram em julgado, havendo notícia de novas discussões a respeito, que poderão ser analisadas no julgamento final dos casos. Apontou a Coordenadoria, ainda, diferenças entre a situação em exame e a tese discutida nos precedentes referidos, nos quais se considerou ter havido a perda da pertinência dos imóveis em questão com vertentes do interesse público primário, de modo que haveria conflito com o valor constitucional subjacente à imunidade recíproca. Segundo a Coordenadoria, o vetor hermenêutico das decisões do STF teria sido afastar a imunidade recíproca no casos de posse direta de bens públicos por pessoas jurídicas de direito privado para o exercício de atividade econômica, o que não implicaria superação, para todas as situações, da jurisprudência até então dominante, mas apenas redução de seu alcance, retirando de seu âmbito os casos analisados e outros estritamente idênticos. No caso em exame, contudo, embora os concessionários se tornem possuidores diretos, sem animus domini, dos parques públicos onde exercerão atividade econômica, tais parques não perderão seu caráter de bem de uso comum do povo, cujo acesso será franqueado gratuitamente à população. Sendo de propriedade municipal os parques e mantida a finalidade pública correspondente, entendeu SF-COJUR que não haveria a incidência do IPTU em tais casos.
É o breve relato.
Assiste inteira razão a SF-COJUR no sentido de apontar, com adequada prudência, as características dos precedentes do STF e as dificuldades para estendê-los a situações que não sejam perfeitamente idênticas àquelas ali analisadas. De fato, ainda que o entendimento da Corte Suprema tenha de estar baseado em alguma espécie de flexibilização das noções subjacentes à qualificação da posse necessária à incidência do IPTU, não parece estar afastada, por completo, a necessidade do animus domini para possibilitar a incidência do tributo com base na posse. Nesse sentido, os precedentes do STF não ensejam uma conclusão no sentido de que todo desdobramento da posse viabilizará a incidência do IPTU sobre a posse direta sempre que o possuidor indireto seja uma entidade pública. Na verdade, a fim de prestigiar, ao máximo, os julgados da Corte Suprema, devem ser consideradas suscetíveis de tributação a posse com animus domini, segundo a jurisprudência tradicional, bem como a posse de bens públicos pertencentes a outras entidades para fins de exploração de atividade econômica.
No entanto, em nenhuma dessas hipóteses se enquadra o caso dos parques cuja manutenção pode ser concedida à iniciativa privada, nos termos do art. 9º da Lei n° 16.703/17. Por um lado, independentemente do prazo de concessão, o concessionário não atuará com aparência de proprietário, não havendo como considerar a existência de posse com animus domini[1], mas de mero desdobramento da posse. Por outro lado, o caso em exame não parece assemelhar-se suficientemente àqueles que ensejaram as referidas decisões do STF, de modo a ensejar a tributação apenas da posse direta. A esse respeito, cabe acrescentar algumas ponderações em relação àquelas que já foram adequadamente apresentadas por SF-COJUR.
O primeiro ponto diz respeito ao fato de que eventual tributação dos bens em questão dependeria não exatamente da extensão do entendimento do STF a outros casos de imunidade recíproca, mas efetivamente de uma nova compreensão global da posse exigida para fins de incidência de IPTU, uma vez que o caso em exame não envolve propriamente a tributação de outros entes, mas a incidência de IPTU sobre bens municipais. Seria preciso, assim, entender como tributável a posse direta de tais bens, por meio de uma relação em que figuraria como contribuinte apenas o possuidor, a qual seria constituída nos casos em que houvesse exploração de atividade econômica por terceiros.
É necessário apontar, então, outra diferença fundamental entre as situações consideradas. De fato, ainda que possa haver entendimento no sentido de que todo serviço público constitui, no final das contas, uma atividade econômica, a diferença entre essas categorias é relevante e serve como discrímen para fins de submissão a este ou àquele regime jurídico. Não é possível, assim, afirmar que o concessionário dos serviços relacionados a parques municipais virá a explorar atividade econômica em sentido estrito. Será, na verdade, um delegatário de serviço público.
A discussão é relevante, tendo servido de referência até mesmo para o próprio STF, pois um dos pontos considerados nos julgados em questão foi o fato de que o possuidor devia sujeitar-se ao pagamento de IPTU a fim de evitar uma situação de favorecimento perante a concorrência[2]. No caso das atividades concedidas relacionados a parques, essa preocupação concorrencial simplesmente não existe, eis que se trata de serviços públicos, prestados em regime administrativo e que se situam à margem de qualquer espécie de concorrência. Mesmo que se considere a existência de outros parques, estes também estão situados em áreas públicas e seu operador, ente público ou concessionário, não será igualmente atingido pelo IPTU, de modo que não há motivo concorrencial para aplicar o entendimento do STF, surgido a partir de situações de exploração de atividades econômicas em regime de mercado.
Além disso, a aplicação do entendimento do STF ao caso sob consulta é fundamentalmente prejudicada pelo fato de não se tratar de uma concessão de bem público, mas de uma concessão de serviços, conforme apontado na consulta que inaugurou o presente expediente. É por isso que, conforme observou SF-COJUR, o parque sob gestão privada manterá sua natureza de bem de uso comum, o que significa, em última análise, que o bem está na posse da coletividade, e não na posse de um concessionário. Não é outorgado ao concessionário um uso privativo, mas sim lhe é confiada a missão de prestar os serviços relacionados ao parque, de modo a viabilizar a própria destinação do bem ao uso comum.
Convém observar, no mais, que essa conclusão não se mostra restrita aos aspectos da concessão que envolvam bens de uso comum do povo. Em verdade, a concessão de serviços não implica a posse de bens pelo concessionário em nome próprio, já que o uso dos bens é feito pela própria Administração, por meio de um delegatário. É justamente por esse motivo que a concessão de serviços públicos não constitui uma modalidade de uso de bens públicos por terceiros, nos termos do art. 114 da Lei Orgânica do Município (cf. Informação n° 167/2016 - PGM-AJC). Assim sendo, mesmo que o concessionário acabe por utilizar o bem público com alguma exclusividade, como ocorre na parcela dos bens a ele confiados que possam configurar-se como bens de uso especial, ele o fará apenas para o fim de prestar o serviço a ele incumbido, não sendo o caso de formalizar uma cessão especificamente relativa ao
bem, já que este continua na posse do próprio poder concedente[3].
A propósito, ainda que possa haver entendimento doutrinário no sentido de que a utilização de bens públicos pelo concessionário configuraria posse, a vinculação de tais bens à prestação de serviços públicos parece afastar, por completo, o entendimento que viabilizou excepcionar a imunidade recíproca por conta da perda de sua "pertinência com elementos do interesse público"[4]. De fato, em se tratando de bem afetado à prestação de serviço público, o fato de ele ser utilizado incidentalmente para a viabilização de tais atividades concedidas não o afasta de um regime administrativo, pautado estritamente pelo interesse público. Em outras palavras: ainda que se considerasse possível a posse pelo concessionário, esta não ocorreria em proveito próprio, ensejando a imposição do dever tributário correspondente, mas em proveito da coletividade, destinatária do serviço em questão.
Por fim, é preciso notar que as situações analisadas pelo STF implicavam, de fato, efeitos patrimoniais em relação aos municípios, tendo em conta que não se tratava de bens próprios, mas de outros entes públicos. No caso em exame, contudo, não é isso que se verifica: de fato, caso a Municipalidade viesse a cobrar IPTU dos concessionários, esse pagamento teria de ser considerado nos custos da concessão, diminuindo o valor de uma possível outorga pela assunção dos serviços ou tornando necessário um incremento na contraprestação pública oferecida ao concessionário. Dessa sorte, os valores eventualmente recebidos a título de IPTU seriam repassados ao próprio concessionário, revertendo para a equação econômico-financeira do contrato.
Mais que um argumento de ordem prática, essa evidência reforça a constatação de que não se trata de uma relação com um terceiro qualquer, que ocupa o bem em nome próprio, mas de um vínculo com um concessionário, que atua como delegatário de serviços públicos municipais. O reconhecimento da ausência de posse que habilite a incidência do IPTU, no caso sob consulta, acaba por constituir não somente a solução mais prática, mas aquela que se mostra mais coerente com as estruturas e conceitos jurídicos envolvidos.
Destarte, não há como deixar de acompanhar SF-COJUR em seu entendimento no sentido da não incidência de IPTU na hipótese sob consulta, sugerindo-se o retorno do presente à Pasta consulente, para os devidos fins.
São Paulo, 21 / 02 /2018.
JOSÉ FERNANDO FERREIRA BREGA
PROCURADOR ASSESSOR – AJC
OAB/SP 173.027
PGM
Processo nº 6071.2018/0000038-7
Encaminhamento PGM/CGC N° 6839771
INTERESSADA: Secretaria Municipal de Desestatização e Parcerias
ASSUNTO: Consulta sobre a incidência de IPTU sobre os parques municipais cuja gestão será delegada à iniciativa privada por meio de concessão de serviços.
Cont. da Informação n°194/2018-PGM.AJC
PGM
Senhor Procurador Geral
Encaminho-lhe o presente, com o entendimento da Assessoria Jurídico-Consultiva desta Coordenadoria Geral do Consultivo, que endosso, no sentido da não incidência de Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana - IPTU na hipótese de delegação da gestão de parques municipais à iniciativa privada por meio de concessão de serviços.
São Paulo, 21 de fevereiro de 2018.
TICIANA NASCIMENTO DE SOUZA SALGADO
PROCURADORA ASSESSORA CHEFE - AJC
COORDENADOR GERAL DO CONSULTIVO SUBSTITUTA
OAB/SP 175.186
PGM
Processo nº 6071.2018/0000038-7
Encaminhamento PGM/CGC N° 6840331
INTERESSADA: Secretaria Municipal de Desestatização e Parcerias
ASSUNTO: Consulta sobre a incidência de IPTU sobre os parques municipais cuja gestão será delegada à iniciativa privada por meio de concessão de serviços.
Cont. da Informação n°194/2018-PGM.AJC
SMDP
Senhor Secretário
Encaminho-lhe o presente, com a manifestação da Coordenadoria Geral do Consultivo, que acolho, no sentido de que não incidirá Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana - IPTU caso venha a ser delegada a gestão de parques municipais à iniciativa privada por meio de concessão de serviços, nos termos do art. 9° da Lei n° 16.703/17.
São Paulo, 21 de fevereiro de 2018.
RICARDO FERRARI NOGUEIRA
PROCURADOR GERAL DO MUNICÍPIO
OAB/SP 175.805
PGM
Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo