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PARECER PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO - PGM Nº 11.828 de 30 de Janeiro de 2018

EMENTA N° 11.828.
Faltas ao serviço por mais de sessenta dias interpolados durante o ano (art. 188, II, da Lei 8989/79). Reiteração da conduta em período não abrangido pelo indiciamento, mas alcançado pelo despacho da autoridade competente que determinara a instauração de inquérito administrativo. Desnecessidade de instauração de novo processo administrativo disciplinar. Possibilidade de aditamento e reabertura de instrução no processo em curso (a) desde que o procedimento esteja ainda pendente de decisão da autoridade competente e (b) desde que se renove ao indiciado a oportunidade do contraditório e ampla defesa, dando-lhe a conhecer formalmente as circunstâncias acrescidas ao indiciamento original. Entendimento extensivo, em situação similar, à hipótese de faltas consecutivas.

Processo nº 2016-0.120.931-9

INTERESSADO: xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx

ASSUNTO: Inquérito administrativo. Faltas interpoladas. Reabertura de procedimento disciplinar para apuração de fatos não descritos no termo de instauração

Informação n° 0070/2018-PGM.CGC.AJC

PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO

COORDENADORIA GERAL DO CONSULTIVO

Senhor Coordenador,

Trata-se de consulta sobre a possibilidade de reabertura de procedimento disciplinar para inclusão de fatos não previstos no respectivo termo de instauração.

No caso concreto, com fundamento no art. 188, II, da Lei 8989/791, instaurou-se procedimento para apuração de sessenta faltas interpoladas cometidas por servidor no período de 26/1/2016 a 29/4/2016. Verificou-se em instrução, contudo, que ainda durante o ano de 2016, mas para além do período declinado, registraram-se novas faltas interpoladas suficientes para abertura de persecução disciplinar autônoma.

 Pondera a diretoria de PROCED que, "ao invés de promover um novo processo administrativo disciplinar, consoante sugerido à fl. 199, penúltimo parágrafo, pelo princípio da economicidade e eficiência, seria razoável que nos procedimentos em curso em que houve a indicação de períodos fixos de faltas nos termos de instauração e havendo notícia durante a instrução de que o servidor persiste no cometimento da conduta além do período indicado, se possibilitasse a reabertura da instrução de com o propósito de que o servidor fosse chamado a justificar as faltas subsequentes, as quais seriam consideradas em conjunto com aquelas já descritas no termo de instauração, para análise da aplicação da pena" (fl. 202).

Pois bem. Consoante disposto na Lei 8.989/79, o procedimento disciplinar é deflagrado pelo despacho da autoridade competente (art. 208) cabendo à Comissão Processante (art. 210), nos limites da decisão que lhe incumbe cumprir, promover o indiciamento do servidor por meio do termo de instauração, que especificará as circunstâncias da acusação, bem como os dispositivos legais infringidos, de modo a possibilitar ao acusado o exercício do direito amplo de defesa2. Transcrevo:

Art. 208. A determinação de instauração de inquérito administrativo e sua decisão competem ao Prefeito que, no entanto, poderá delegar essas atribuições, respeitado o disposto no parágrafo único do artigo 195.

Parágrafo Único. O inquérito administrativo será conduzido por Comissão Processante, permanente ou especial, presidida obrigatoriamente por Procurador Municipal e composta sempre por funcionários efetivos.

Art. 210. Recebidos os autos, a Comissão promovera o indiciamento do funcionário, apontando o dispositivo legal infringido.

Verifica-se na hipótese que o indiciamento descreveu os fatos de forma mais tímida do que lhe era lícito fazer. O art. 188, II, da Lei 8989/79 referido no despacho de fl. 74, publicado em 22/10/2016, não limitava a apuração disciplinar das faltas no período restrito de janeiro a abril: a oração adverbial contida no tipo infracional permitia o escrutínio das faltas verificadas durante o ano de 2016.

Cabe indagar, portanto, se seria possível na presente fase processual ampliar o indiciamento de forma a harmonizá-lo com o despacho que o fundamenta, reabrindo-se a instrução. Creio que a resposta será positiva (a) desde que o procedimento esteja ainda pendente de decisão da autoridade competente e (b) desde que se renove ao indiciado a oportunidade do contraditório dando-lhe a conhecer formalmente as circunstâncias acrescidas ao indiciamento original.

Observadas tais condições, não haverá prejuízo à defesa que será exercida com a mesma amplitude que o seria se, para finalidade idêntica, fosse instaurado procedimento autônomo a partir de novo despacho; não parece razoável que a conduta do servidor — porque única (faltar ao serviço interpoladamente por mais de sessenta dias durante o ano) — seja seccionada para deliberação da autoridade competente.

Se no processo penal admite-se o aditamento da denúncia depois de encerrada a instrução e antes da sentença (artigos 384 e 569 do CPP)3, não há razão para afastar tal salutar possibilidade do procedimento disciplinar municipal; o interesse da Administração na celeridade dos processos por ela conduzidos não implica afronta às garantias constitucionais do acusado:

"O momento escolhido pelo legislador, ao que parece, é dirigido precipuamente ao juiz, voltando-se, portanto, ao aditamento provocado. Quanto ao aditamento espontâneo, defende-se seja feito logo que apareça motivo para tanto. Normalmente, é bem verdade, ele surge depois de encerrada a instrução, mas, se ocorrer antes, deve ser feita de pronto a correção. E, preferencialmente, que se o faça antes das razões finais, malgrado possa ter lugar também nessa oportunidade, em casos extremos, por obediência ao princípio da obrigatoriedade.

Ainda assim, em qualquer fase, será sempre possível a mutatio libelli, por questão de celeridade processual, evitando-se, sempre que possível, a instauração de um novo processo para apuração do novo fato surgido. Essa nova acusação contudo deverá ter algum vínculo de conexão ou continência com a primitiva. O fato principal deve permanecer o mesmo. Do contrário, somente poderá ser objeto de nova ação penal. Frise-se também que, em alguns casos, se o aditamento vier causar tumulto processual (processos volumosos, numerosos acusados, coréus presos, muitos incidentes, etc.) ou mudança no rito procedimental, o bom senso recomendará a separação dos processos (como faculta, inclusive, o art. 80, do CPP), ou seja, a provocação do Estado mediante nova ação, pois em nenhuma hipótese o Ministério Público poderá abrir mão da acusação.

Pelo juiz, o aditamento provocado caberia mesmo na fase da sentença. E é também por esse motivo que se desaconselha o aditamento provocado. Nessa fase, pode trazer prejuízo irremediável para o acusado, surpreendido com uma possível mudança de rumo da acusação, dificultando-lhe adaptar sua linha de defesa aos novos caminhos aventados pelo magistrado." (Danielle Souza de Andrade e Silva, in "A emendado libelli e a mutatio libelli na reforma do código de processo penal", Revista do Conselho da Justiça Federal, Brasília, Ano XIII, n° 44, p. 11-19, jan/mar 2009)

Há decisão do Superior Tribunal de Justiça albergando a contrario sensu a possibilidade de aditar-se o indiciamento do servidor no trâmite de processo disciplinar, ou seja, consoante baliza traçada pela lei processual penal, a todo tempo, antes da decisão final da autoridade municipal competente:

"(...) Diligências determinadas pela autoridade competente em processo disciplinar já com a instrução processual encerrada somente é possível através de portaria aditiva, com menção aos novos fatos, para permitir ao acusado manejar sua defesa, havendo expansionismo dos fatos ou de acusados, o aditamento, tanto objetivo quanto subjetivo, deve guardar o toque de conveniência do processo. Significa dizer que, conforme o estado do processo, deverá ser tomada a medida do aditamento (quando a instrução ainda esteja no início), instauração de um novo processo (quando os  trabalhos apuratórios já estejam bem avançados)." (apud REsp n° 1.061.228, DJe 24/2/2014)

Posto isso, observadas as condições acima alinhadas e a dicção do art. 188, II, da Lei 8989/79, não se vislumbram óbices à sugestão de PROCED de — coerentemente com o despacho de fl. 74 — promover-se o aditamento do termo de instauração, com a reabertura da instrução, de modo a incluir em seu âmbito também as faltas cometidas pelo servidor interpoladamente a partir de 29/4/2016.

Pelas mesmas razões, o entendimento aqui expresso poderá, em situação similar, ser estendido à hipótese de faltas consecutivas tipificada no art. 188, I, §1°, da Lei 8.989/79.

São Paulo, 30/01/2018

ANTONIO MIGUEL AITH NETO

Procurador Assessor - AJC

OAB/SP n° 88.619

PGM

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De acordo.

São Paulo, 05/02/2018

TICIANA NASCIMENTO DE SOUZA SALGADO

PROCURADORA ASSESSORA CHEFE-AJC

OAB/SP 175.186

PGM

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 1Será aplicada ao funcionário a pena de demissão nos casos de: (...) II - faltas ao serviço, sem justa causa, por mais de 60 (sessenta) dias interpolados durante o ano; (...).
2 O despacho da autoridade municipal equivale, no Processo Administrativo Disciplinar previsto na Lei 8112/91, à sua denominada "Portaria de Instauração" e o termo de instauração municipal, ao "indiciamento" previsto na legislação federal. É entendimento jurisprudencial assente que a sede para descrição minuciosa dos fatos é o indiciamento, rectius, o termo de instauração municipal: "A Portaria de instauração do Processo Administrativo Disciplinar dispensa a descrição minuciosa da imputação, exigida tão somente após a instrução do feito, na fase de indiciamento, o que é capaz de viabilizar o exercício do contraditório e da ampla defesa. Precedentes." (STJ, RO nos EDcl nos EDcl no MS 11493, DJe 6/11/2017); "A portaria inaugural de instauração de PAD tem como principal objetivo dar início ao Processo Administrativo Disciplinar, conferindo publicidade à constituição da Comissão Processante. Nela não se exige a exposição detalhada dos fatos imputados ao servidor, o que somente se faz indispensável na fase de indiciamento, a teor do disposto nos arts. 151 e 161, da Lei n° 8.112/1990. Precedentes. Caso em que a portaria de indiciamento foi suficientemente detalhada" (MS 20.615, DJe 31/03/2017); "A portaria inaugural tem como principal objetivo dar início ao Processo Administrativo Disciplinar, conferindo publicidade à constituição da Comissão Processante, nela não se exigindo a exposição detalhada dos fatos imputados ao servidor, o que somente se faz indispensável na fase de indiciamento, a teor do disposto nos arts. 151 e 161, da Lei n° 8.112/1990" (MS 9.668/DF, DJe 01/02/2010); etc.
3 Art. 384. Encerrada a instrução probatória, se entender cabível nova definição jurídica do fato, em conseqüência de prova existente nos autos de elemento ou circunstância da infração penal não contida na acusação, o Ministério Público deverá aditar a denúncia ou queixa, no prazo de 5 (cinco) dias, se em virtude desta houver sido instaurado o processo em crime de ação pública, reduzindo-se a termo o aditamento, quando feito oralmente. § 1° Não procedendo o órgão do Ministério Público ao aditamento, aplica-se o art. 28 deste Código. § 2° Ouvido o defensor do acusado no prazo de 5 (cinco) dias e admitido o aditamento, o juiz, a requerimento de qualquer das partes, designará dia e hora para continuação da audiência, com inquirição de testemunhas, novo interrogatório do acusado, realização de debates e julgamento. § 3° Aplicam-se as disposições dos §§ 1° e 2° do art. 383 ao caput deste artigo. § 4° Havendo aditamento, cada parte poderá arrolar até 3 (três) testemunhas, no prazo de 5 (cinco) dias, ficando o juiz, na sentença, adstrito aos termos do aditamento. § 5° Não recebido o aditamento, o processo prosseguirá. (...) Art. 569. As omissões da denúncia ou da queixa, da representação, ou, nos processos das contravenções penais, da portaria ou do auto de prisão em flagrante, poderão ser supridas a todo o tempo, antes da sentença final.

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Processo nº 2016-0.120.931-9

INTERESSADO: xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx

ASSUNTO: Inquérito administrativo. Faltas interpoladas. Reabertura de procedimento disciplinar para apuração de fatos não descritos no termo de instauração

Informação em continuação n° 0070/2018-PGM.CGC.AJC 

PROCURADOR GERAL DO MUNICÍPIO

Senhor Procurador,

Encaminho o presente com a manifestação da Assessoria Jurídico-Consultivo desta Coordenadoria Geral do Consultivo, que acolho.

São Paulo, 05/02/2018.

TIAGO ROSSI

COORDENADOR GERAL DO CONSULTIVO

OAB/SP 195.910

CGC.G

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Processo nº 2016-0.120.931-9

INTERESSADO: xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx

ASSUNTO: Inquérito administrativo. Faltas interpoladas. Reabertura de procedimento disciplinar para apuração de fatos não descritos no termo de instauração. 

Continuação da informação n° 0070/2018-PGM.AJC

PROCED

Sr. Diretor,

Encaminho-lhe o presente em devolução para prosseguimento com a manifestação da Coordenadoria Geral do Consultivo desta Procuradoria Geral do Município, que acolho, a qual opina pela possibilidade de reabertura de procedimento disciplinar para inclusão de fatos não previstos no respectivo termo de instauração (a) desde que o procedimento esteja ainda pendente de decisão da autoridade competente e (b) desde que se renove ao indiciado a oportunidade do contraditório dando-lhe a conhecer formalmente as circunstâncias acrescidas ao indiciamento original.

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São Paulo, 08/02/2018

RICARDO FERRARI NOGUEIRA

PROCURADOR GERAL DO MUNICÍPIO

OAB/SP 175.805

PGM

Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo