Consulta s/n° (TlD 17289651)
INTERESSADO: SECRETARIA MUNICIPAL DE SAÚDE
ASSUNTO: Realização de obras por meio de contrato de gestão de serviços de saúde.
Informação n° 102/2018-PGM.AJC
COORDENADORIA GERAL DO CONSULTIVO
Senhor Coordenador Geral
A d. assessoria jurídica da pasta interessada nos questiona a respeito da possibilidade de contratos de gestão para a execução de serviços de saúde contemplarem a realização de obras.
Após análise da necessidade de intensificar e melhorar a qualidade da fiscalização sobre os contratos de gestão, SMS/COJUR expõe que, inobstante as normas federais e municipais preverem, em tese, a possibilidade das organizações sociais realizarem obras, há que se interpretar a autorização legal de forma razoável para que não seja desvirtuado o objeto do contrato, que consiste na prestação de serviços de saúde.
Ademais, segundo colocado na consulta, atualmente compete à SMS 'apenas' a realização das obras de primeiro e segundo escalão (definidas pelo Decreto n° 29.929/91), sendo possível, à Secretaria, a sua delegação por meio do contrato de gestão. Já as obras de terceiro escalão, que compreendem reparos de vulto, reformas gerais ou ampliações, permanecem na competência de EDIF. No caso de delegação das obras de primeiro e segundo escalão, a sua execução deverá ser fiscalizada, sendo recomendável a utilização como parâmetro as atas de registro de preços vigentes no Município e as tabelas de preços médios (de EDIF e o CADTERC).
A pasta interessada propõe, ao final, como razoável, a realização de obras e serviços de engenharia de pequeno vulto por meio de contrato de gestão, desde que diretamente vinculadas aos serviços prestados e não abarquem unidades administrativas da entidade (cf. acórdão n° 2.832/14-TCU), observando, em regra, os parâmetros de preços utilizados pela Administração Direta.
É o relato do necessário.
Como bem acentua o órgão consulente, tanto a lei federal como a municipal que regulam o contrato de gestão admitem, ainda que não diretamente, a realização de obras pelas organizações sociais contratadas, custeadas com os recursos repassados pelo contratante, na medida em que, ao tratar do regulamento próprio para contratações, mencionam como possíveis objetos "obras e serviços". Assim dispõe a Lei federal n° 9.637/98:
"Art. 17. A organização social fará publicar, no prazo máximo de noventa dias contado da assinatura do contrato de gestão, regulamento próprio contendo os procedimentos que adotará para a contratação de obras e serviços, bem como para compras com emprego de recursos provenientes do Poder Público".1
Nada obstante, tal como ponderado por SMS/COJUR, a permissão legal para a realização de obras por meio de contrato de gestão deve ser interpretada de acordo com a finalidade do contrato de gestão: diga-se, gerir a prestação de serviços de saúde nas unidades de uma dada região (modelo adotado pelo Município). O contrato de gestão tem como finalidade exclusiva a prestação de certas atividades, ligadas a áreas como cultura, saúde ou esporte.
Nos termos da Lei federal n° 9.637/98:
"Art. 5°. Para os efeitos desta Lei, entende-se por contrato de gestão o instrumento firmado entre o Poder Público e a entidade qualificada como organização social, com vistas à formação de parceria entre as partes para fomento e execução de atividades relativas às áreas relacionadas no art. 1°."
A Lei municipal segue redação semelhante:
"Art. 5°. Para os efeitos desta lei, entende-se por contrato de gestão o instrumento firmado entre o Poder Público e a entidade qualificada como organização social, com vistas à formação de parceria entre as partes para fomento e execução de atividade relativa à relacionada em seu art. 1°."
Por sua vez, dispõe o art. 1° da lei municipal, referido no art. 5° suprarreproduzido:
"Art. 1°. O Poder Executivo poderá qualificar como organizações sociais pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, cujas atividades sejam dirigidas às áreas de saúde, de cultura e de esportes, lazer e recreação, atendidos os requisitos previstos nesta lei."
A prestação de serviços de saúde presume, é verdade, uma série de obrigações específicas que demandam contratações entre a organização social e pessoas físicas ou outras entidades privadas. Assim, é natural - e esperado - que a organização social, para prestar a atividade, tenha que contratar equipes médicas, de enfermagem, de nutrição, de limpeza, etc., além dos insumos necessários e bens duráveis porventura contemplados no plano de trabalho.
É possível argumentar que não há razão relevante para admitir a contratação de todos esses serviços e bens pela entidade e afastar a contratação de obras, seja quais forem, quando feitas nos imóveis onde é prestado o serviço, desde que para melhorar ou ampliar o atendimento. Cremos, porém, que existe uma diferença: os bens ou serviços mencionados no parágrafo anterior relacionam-se diretamente com a gestão dos serviços de saúde - ou seja, estão inclusos no próprio conceito de gestão de equipamentos da área de medicina. Já a realização de reformas abrangentes, construções de novas edificações ou ampliação de instalações, não. No mais das vezes, o contrato de gestão tem como objeto exatamente a administração de um dado equipamento público de saúde, cultura, esporte, etc., de forma que o imóvel onde se desenvolverá a atividade serve justamente como um delimitador das atribuições da entidade.
A realização de alterações substanciais no imóvel onde se desenvolverá a atividade não nos parece, portanto, compreendido no conceito de ato de gestão na área da saúde. Tanto assim que, conforme dispõe a Lei federal n° 9.637/98, os bens públicos podem ser destinados para o uso pelas contratadas (nos contratos de gestão), na medida do necessário para o cumprimento do contrato de gestão:
"Art. 12. Às organizações sociais poderão ser destinados recursos orçamentários e bens públicos necessários ao cumprimento do contrato de gestão.
(...)
§ 3° Os bens de que trata este artigo serão destinados às organizações sociais, dispensada licitação, mediante permissão de uso, consoante cláusula expressa do contrato de gestão."
Tais bens, portanto, consistem em pressuposto para a sua execução, quando assim previsto.
Ademais, a interpretação da Lei federal n° 9.637/98 e da Lei municipal n° 14.132/06 deve ser feita em consonância com o disposto no art. 37, caput e inciso XXI, da Constituição2, nos termos dos quais a Administração Pública deve observar os princípios da impessoalidade e eficiência, e tem o dever de licitar, excetuados os casos previstos na legislação. Como é sabido, as organizações sociais, na qualidade de agentes privados, não tem a obrigação de lançar processo público de licitação, sujeito aos mais diversos controles, muito embora operem com recursos públicos. Elas seguem regulamentos próprios de compras que, por sua própria natureza, não contam com as diversas garantias do procedimento licitatório. Daí porque revela-se necessária uma interpretação restritiva - ou, pelo menos, não ampliativa - das atribuições das organizações sociais nos contratos de gestão.
Caso admitíssemos a possibilidade irrestrita das entidades realizarem obras por meio do contrato de gestão, a Administração Pública simplesmente não precisaria mais contratar obras mediante licitação nas áreas de saúde, cultura, esportes, etc., eis que bastaria delegar a atividade para alguma organização social no âmbito de um contrato de gestão. Isso poderia importar na caracterização de burla ao procedimento licitatório e, consequentemente, aos preceitos constitucionais.
Vale ressaltar que os próprios contratos de gestão não são precedidos de licitação, mas de procedimento competitivo simplificado em que o critério de julgamento não é o preço oferecido. Isso nos parece extremamente relevante: em licitações ordinárias há um controle prévio acerca do preço, derivado da própria competição do certame, uma vez que o critério de g julgamento costuma ser o preço, sendo a qualidade pré-fixada no edital. Já nos chamamentos públicos para contratos de gestão o preço (o valor dos serviços prestados) não costuma ser utilizado como critério de seleção, de forma que o controle é feito - ou deveria ser feito - a posteriori, com base nas prestações de contas. Ocorre que, por restrições de recursos e assimetrias informacionais, raramente é feito um trabalho aprofundado de verificação das despesas e do seu montante, como muitas vezes destacam os Tribunais de Contas em inúmeros acórdãos.
Por outro lado, não nos parece razoável afastar do contrato de gestão a realização de todo e qualquer tipo de obra. Atividades relacionadas à manutenção (preventiva e corretiva) e conservação do imóvel, necessárias para manter a integridade do bem e a qualidade dos serviços de saúde, parece-nos inclusas - ou passíveis de inclusão - no contrato de gestão, por se relacionarem diretamente com a finalidade do contrato. Da mesma forma, pequenas reformas de adaptação do imóvel (por exemplo, suprimir um consultório subutilizado para ampliar a área de espera, ou a substituição do piso dos banheiros), quando recomendáveis para a qualidade dos serviços, também, segundo cremos, podem ser incluídas em contratos de gestão.
Parece-nos, assim, que podemos empregar como parâmetros os conceitos de obras de primeiro, segundo e terceiro escalão previstos no Decreto n° 29.929/91: as de primeiro e segundo escalão poderiam ser executadas por meio das organizações sociais; as de terceiro, não. Mas o ideal, como alertou a d. assessoria jurídica de SMS, seria a edição de norma interna prevendo de forma objetiva limites e condicionantes para a realização de obras por meio dos contratos de gestão e parâmetros nos quais se baseará a fiscalização. A utilização do CADTERC ou da tabela EDIF pode ser um dos parâmetros para aferição da razoabilidade do preço da obra, mas convém lembrar que, nas licitações municipais, comumente são oferecidos 'descontos' sobre o preço do projeto, estimado com base em tais tabelas, de forma que estas não refletem a maior economia passível de ser extraída.
No mais, cremos que o entendimento aqui exposto pode ser aplicado tanto para imóveis municipais cedidos às entidades para o cumprimento do objeto do contrato de gestão como para os imóveis da própria entidade ou locados por estas. Porém, nestes últimos casos, há uma peculiaridade que demandará uma justificação mais apurada pelo gestor público, na medida em que as melhorias não se incorporarão em um bem municipal - ou seja, ao final do contrato de gestão, elas não reverterão necessariamente para o público.
Ademais, embora já tenha ficado implícito ao longo desta manifestação, convém reforçar que as obras passíveis de serem realizadas por contrato de gestão - as obras de primeiro e segundo escalão, nos termos desta manifestação - apenas poderão ser realizadas em bens geridos diretamente pela entidade (cf. acórdão proferido pelo TCM em 2014 no TC n° 72-000.032.09-903), e desde que afetados especificamente para as atividades objeto do contrato de gestão (cf. determinações do acórdão 2.942/2013 - TCU4, cujas conclusões foram reafirmadas no acórdão 2.832/14, mencionado por SMS/COJUR).
Em síntese conclusiva, entendemos que, doravante, a realização de obras de vulto - sendo que, na falta de outros parâmetros legais, valemo-nos do conceito de obras de terceiro escalão, nos termos do Decreto n° 29.929/91 - não devem ser incluídas como obrigação do contratado em contratos de gestão. As obras de pequeno vulto - de primeiro e segundo escalão -, por outro lado, poderiam ser imputadas aos contratados, desde que vinculadas diretamente à prestação do serviço objeto do ajuste, devendo haver fiscalização pela Administração Pública, tanto em relação ao preço e ao procedimento adotado, como em relação à sua necessidade.
Sub censura.
São Paulo, 24/01/2018.
RODRIGO BRACET MIRAGAYA
Procurador Assessor - AJC
OAB/SP n° 227.775
PGM
De acordo.
São Paulo, 30/01/2018.
TICIANA NASCIMENTO DE SOUZA SALGADO
Procuradora Assessora Chefe - AJC
OAB/SP 175.186
PGM
Consulta s/n° (TID 17289651)
INTERESSADO: SECRETARIA MUNICIPAL DE SAÚDE " AGPPPSS
ASSUNTO: Realização de obras por meio de contrato de gestão de serviços de saúde.
Cont. da Informação n° 102/2018-PGM.AJC
PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO
Senhor Procurador Geral
Encaminho, a Vossa Senhoria, manifestação da Assessoria Jurídico-Consultiva desta Coordenadoria Geral do Consultivo, que acompanho, no sentido de que, doravante, a realização de obras de vulto - sendo que, na falta de outros parâmetros legais, valemo-nos do conceito de obras de terceiro escalão, nos termos do Decreto n° 29.929/91 - não sejam incluídas como obrigação do contratado em contratos de gestão. As obras de pequeno vulto - de primeiro e segundo escalão -, por outro lado, poderiam ser imputadas aos contratados, desde que vinculadas diretamente à prestação do sen/iço objeto do ajuste, devendo haver fiscalização pela Administração Pública, tanto em relação ao preço e ao procedimento adotado, como em relação à sua necessidade.
Endosso, ainda, a sugestão de SMS/COJUR de regulamentação da matéria.
São Paulo, 01/02/2018.
TIAGO ROSSI
Coordenador Geral do Consultivo
OAB/SP 195.910
PGM
Consulta s/n° (TlD 17289651)
INTERESSADO: SECRETARIA MUNICIPAL DE SAÚDE
ASSUNTO: Realização de obras por meio de contrato de gestão de serviços de saúde.
Cont. da Informação n° 102/2018-PGM.AJC
SECRETARIA MUNICIPAL DE SAÚDE
Senhor Secretário
Encaminho, a Vossa Senhoria, manifestação da Coordenadoria Geral do Consultivo, que acolho, no sentido de que, doravante, a realização de obras de vulto - sendo que, na falta de outros parâmetros legais, valemo-nos do conceito de obras de terceiro escalão, nos termos do Decreto n° 29.929/91 - não sejam incluídas como obrigação do contratado em contratos de gestão. As obras de pequeno vulto - de primeiro e segundo escalão -, por outro lado, poderiam ser imputadas aos contratados, desde que vinculadas diretamente à prestação do serviço objeto do ajuste, devendo haver fiscalização pela Administração Pública, tanto em relação ao preço e ao procedimento adotado, como em relação à sua necessidade.
Endosso, ainda, a sugestão de SMS/COJUR de regulamentação da matéria.
São Paulo, 02/02/2018.
RICARDO FERRARI NOGUEIRA
PROCURADOR GERAL DO MUNICÍPIO
OAB/SP n° 175.805
PGM
Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo