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PARECER PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO - PGM Nº 11.730 de 21 de Junho de 2017

EMENTA N° 11.730
Responsabilidade civil. Telefone celular. Desaparecimento nas dependências de biblioteca municipal. Pedido de indenização. Contrato de depósito. Inexistência. Causa excludente de responsabilidade caracterizada.

Processo n° 2015-0.285.364-3

INTERESSADO: Fernanda Mello Codesso

ASSUNTO: Pedido de indenização.

Informação n° 0816/2017-PGM.AJC

COORDENADORIA GERAL DO CONSULTIVO

ASSESSORIA JURÍDICO-CONSULTIVA

Senhora Procuradora Assessora Chefe

Relata a interessada na inicial, em síntese, que no dia 15/06/2015, entre 20h00 e 22h00, esteve na Biblioteca Mario de Andrade assistindo a um espetáculo, ocasião em que o seu telefone celular marca Motorola, modelo Moto G XT 1033, foi extraviado. O aparelho, no entanto, foi localizado por uma servidora da biblioteca. Ocorre que quando a interessada foi buscá-lo no dia seguinte, o telefone não estava mais na gaveta em que havia sido guardado.

Foi juntada a nota fiscal do aparelho (fls. 03/06), bem como a procuração outorgada pelo pai da interessada (fls. 42), cujo nome consta do documento.

O diretor da Biblioteca Mario de Andrade confirmou a veracidade dos fatos narrados (fls. 13), juntando aos autos o Boletim de Ocorrência Policial lavrado na ocasião (fls. 11/12), que deu origem ao PA 2015-0.162.563-9, autuado para a apuração do fato.

O senhor secretário municipal de Cultura, porém, determinou o arquivamento do feito, com fundamento no artigo 102, inciso II, do Decreto n° 43.233/03, em razão da impossibilidade de determinação da autoria (fls. 29).

Em sua manifestação final, apresentada nos termos do artigo 3º, inciso IV, do Decreto n° 53.066/12, então em vigor, a interessada reiterou o pedido de indenização, sustentando o dever de indenizar do Poder Público por ter o bem permanecido em uma sala trancada que era utilizada somente por servidores (fls. 62/63).

É o relatório.

Ao examinar situação semelhante, na Apelação Cível n° 0021436-50.2013.8.26.0037, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo decidiu não existir dever de indenizar:

RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. Pedido de indenização por danos materiais, decorrentes do sumiço de aparelho celular esquecido nas dependências de Posto de Saúde Municipal. Inadmissibilidade. Hipótese em que não resta configurado o contrato de depósito, com tradição real e assunção, pela ré, da obrigação de guarda e vigilância da coisa. Causa excludente de responsabilidade. Culpa exclusiva da vítima. Ação julgada procedente na 1ª instância. Sentença reformada - Recurso da Municipalidade provido.

A propósito, merece ser transcrito o seguinte trecho da decisão:
"Consta dos autos, que autora compareceu em consulta médica no Posto de Saúde do Iguatemy, na cidade de Araraquara, e, conforme narrou na exordial, esqueceu seu telefone móvel no balcão de atendimento do local. Uma pessoa responsável pela limpeza o encontrou, e a atendente o guardou em gaveta na recepção, de onde posteriormente sumiu sem explicação. Nada se questionou quanto à ocorrência do fato, restando admitida a sua existência, a qual, inclusive, ficou comprovada através das informações prestadas por funcionária do local (fls. 56/57).

Pois bem.

Como é cediço, a Constituição Federal, em seu artigo 37, § 6º, adotou a Teoria da Responsabilidade Objetiva para as pessoas jurídicas de direito público e de direito privado, prestadoras de serviço público, estabelecendo que o dano sofrido por qualquer indivíduo, em decorrência do funcionamento desse serviço, deve ser indenizado, independente de comprovação de culpa, somente podendo ser excluída a responsabilidade em caso de força maior, caso fortuito ou culpa exclusiva da vítima.

Daí porque, mesmo em se tratando de responsabilidade objetiva, as excludentes de culpabilidade têm o condão de romper o nexo de causalidade.

(...)

E, dentre essas excludentes, encontra-se a culpa exclusiva da vitima pelo fato danoso, que é a hipótese em apreço, uma vez que cumpria à autora o dever de vigilância sobre seus bens particulares, o que não o fez, pois esqueceu seu aparelho móvel sobre o balcão de atendimento não havendo como responsabilizar a ré por sua própria negligência.

O mesmo não ocorreu com a atuação da Administração Pública, pois não se pode atribuir omissão aos prepostos da ré de ato a que ela não estava obrigada a proceder: guardar e vigiar bens esquecidos em suas instalações. Na espécie vertente, o Posto de Saúde não se dispôs a receber o objeto com o intuito de guardá-lo e depois restituí-lo a quem o entregou, ou seja, não houve uma violação, por parte da Administração, de um dever preexistente, uma vez que inexistiu o contrato de depósito entre as partes. A culpa pelo ocorrido não está ligada à falha na prestação do serviço público, mas sim à desídia da autora.

Ora, o aparelho celular não foi depositado pela postulante sob os cuidados da ré ou a ela entregue para guardá-lo, não tendo, portanto, assumido qualquer obrigação nesse sentido. Em outras palavras, não havia serviço de depósito nem obrigação de prestá-lo por parte da Municipalidade no Posto de Saúde, de modo que não haveria que se perquirir acerca de eventual falha deste.

Ademais, conforme esclarecimentos prestados pela enfermeira Alessandra C. Campos, o objeto encontrado foi guardado em uma gaveta localizada na recepção do Posto de Saúde, que não tinha vidro de proteção, estava sempre com a porta aberta e localizava-se em frente a uma farmácia onde há grande concentração de pessoas. Ou seja, o sumiço sequer ocorreu em área restrita a pacientes e funcionários".

Portanto, conforme ressaltado no acórdão, não se trata de contrato de depósito, mas de um caso de descoberta, tal como definido no Código Civil.

Com efeito, de acordo com o artigo 1.233 do Código Civil, quem quer que ache coisa alheia perdida tem o dever de restituí-la ao dono ou legítimo possuidor. Não o conhecendo, deverá tentar encontrá-lo. E se não o encontrar, deverá entregar a coisa achada à autoridade competente. O descobridor, no entanto, responde pelos prejuízos causados ao proprietário ou possuidor legítimo, mas somente quando tiver procedido com dolo (art. 1.235).

No caso dos autos, o celular foi guardado em uma gaveta destrancada, em uma sala que, por sua vez, permanecia trancada apenas durante a noite. A sala era, de fato, utilizada apenas por servidores da biblioteca, tendo acesso ao local também as equipes de limpeza e vigilância (fis. 17). No entanto, outros equipamentos valiosos, como notebook e câmeras estavam sobre as mesas na ocasião. E nada mais subtraído (fis. 16).

Portanto, considerando que a servidora não tinha a chave da gaveta onde o celular ficou guardado, parece-me que foram adotadas as cautelas possíveis, ou seja, as mesmas adotadas para a guarda de outros bens valiosos, tendo em vista o horário da ocorrência - aproximadamente 21h30 (fls. 15).

E a apuração preliminar instaurada foi arquivada sob o fundamento da impossibilidade de determinação da autoria (fls. 29).

Diante do exposto, opino no sentido do indeferimento do pedido inicial de indenização formulado por Fernanda Mello Codesso.

Quanto à proposta de reabertura do procedimento de investigação, nos termos do artigo 75, § 1º, do Decreto n° 43.233/03 (fls. 45, último parágrafo), não me parece viável, diante da inexistência de novos elementos, cabendo enfatizar que os funcionários das empresas de vigilância e limpeza não compareceram para prestar depoimento (fls. 28, terceiro parágrafo). Por outro lado, a Biblioteca Mario de Andrade só conta com sistema de vigilância por câmeras no setor de obras raras (fls. 17).

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São Paulo, 21/06/2017.

 RICARDO GAUCHE DE MATOS

PROCURADOR ASSESSOR - AJC

OAB/SP 89.438

PGM

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De acordo.

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São Paulo, 29/06/2017.

TICIANA NASCIMENTO DE SOUZA SALGADO

PROCURADORA ASSESSORA CHEFE - AJC

OAB/SP 175.186

PGM

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Processo n° 2015-0.285.364-3

INTERESSADO: Fernanda Mello Codesso

ASSUNTO: Pedido de indenização. Furto de telefone celular no interior de biblioteca municipal.

DESPACHO n.° 0052/2017-PGM.CGC

I. - Com base na atribuição a mim conferida pelo art. 3º, I, do Decreto n° 57.739/17, e à vista dos elementos constantes do presente, em especial a manifestação da Assessoria Jurídico-Consultiva, INDEFIRO o pedido de indenização formulado pela interessada.

II. - Publique-se e, decorrido o prazo recursal de 15 (quinze) dias, arquivem-se os autos, após as anotações cabíveis.

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São Paulo, 30/06/2017

TIAGO ROSSI

PROCURADOR DO MUNICÍPIO

COORDENADOR GERAL DO CONSULTIVO

OAB/SP 195.910

PGM

 

Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo