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PARECER PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO - PGM Nº 11.610 de 6 de Setembro de 2012

EMENTA Nº 11.610
Servidor público. Acúmulo de dois cargos ou empregos privativos de profissionais da saúde, com profissões regulamentadas. Auxiliar de Laboratório. Profissão considerada não regulamentada. Situação que não se enquadra da exceção contida no art. 37, XVI, "c", da Constituição. Inacumulabilidade reconhecida pela jurisprudência majoritária.

Processo nº 2012-0.192.030-9

INTERESSADA: SECRETARIA MUNICIPAL DA SAÚDE

ASSUNTO: Consulta quanto à possibilidade de os Auxiliares de Laboratório poderem ocupar licitamente dois cargos públicos.

Informação nº 1.538/2012-PGM.AJC

PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO

ASSESSORIA JURÍDICO-CONSULTIVA

Senhora Procuradora Assessora Chefe

1 - O Secretário Municipal da Saúde solicitou o pronunciamento conclusivo desta Procuradoria Geral para solucionar o impasse criado quanto à possibilidade de os Auxiliares de Laboratório poderem acumular licitamente dois cargos públicos, nos moldes permitidos pelo art. 37, XVI, "c", da Constituição.

A consulta decorre da situação concreta da servidora LUZINEIDE CLARA DA SILVA, que teve declarado ilícito, pelo Município, o acúmulo do cargo municipal de Auxiliar de Serviços de Saúde - Laboratório com o cargo estadual de Técnico de Laboratório, regido pela Lei nº 500/74. Como o cargo estadual foi municipalizado, a servidora exerce ambos os vínculos no mesmo local, o Laboratório de São Miguel, presumindo-se haver compatibilidade de horários.

A Coordenadoria de Gestão de Pessoas da Secretaria Municipal de Saúde declarou ilícito o acúmulo desses dois cargos públicos, sob o argumento de que a profissão de Auxiliar de Laboratório não seria regulamentada, como exige a alínea "c" do art. 37, XVI, da Constituição.

Contra este ato a servidora impetrou mandado de segurança, invocando, como precedente, o parecer de ementa nº 11.594, desta Procuradoria Geral, que tratou do acúmulo de cargos de Técnico de Laboratório. Em sede de agravo, o Tribunal de Justiça de São Paulo concedeu liminar para suspender a decisão proferida no processo administrativo que trata do acúmulo.

Tendo examinado previamente a questão, a Assessoria Jurídica de SMS argumentou que a situação da impetrante é distinta daquela examinada no parecer de ementa nº 11.594, acrescentando que a Procuradoria Geral do Estado proferiu parecer sustentando que os cargos de Técnico de Laboratório e de Auxiliar de Laboratório são inacumuláveis, entendimento que prevalece também na jurisprudência.

2 - Muito embora o parecer proferido por esta Assessoria, no processo 2010-0.138.431-4, tenha concluído ser lícito o acúmulo de dois cargos de Técnico de Laboratório - situação objetivamente distinta daquela vivenciada pela servidora LUZINEIDE CLARA DA SILVA -, permanece íntegra a premissa na qual se calcou a referida conclusão, a saber: não é necessária a edição de lei formal para regulamentar as profissões da área da saúde, para que a acumulação de cargos e empregos possa ser tida como lícita.

No caso dos Técnicos de Laboratório, a jurisprudência consolidou-se no sentido de ser suficiente, para os fins do acúmulo admitido na alínea "c" do art. 37, XVI, da Constituição, a regulamentação da profissão feita por meio da Resolução Normativa nº 99, de 1986, do Conselho Federal de Química, e da Resolução nº 276, de 1995, do Conselho Regional de Farmácia (neste sentido: TJSP-4ª Câmara de Direito Público, Apelação nº 0095367-81.2005.8.26.0000, Rel. Des. Osvaldo Magalhães, j. 1º/08/2011).

Impõe-se, pois, verificar se a profissão de Auxiliar de Laboratório é oficialmente regulamentada, senão por lei, ao menos, por resoluções dos Conselhos Regionais. 

A questão, como adiante se verá, é controversa.

3 - Conquanto o parecer de ementa nº 11.594 tenha examinado o acúmulo de dois cargos de Técnico de Laboratório, lá foi mencionado, à guisa de argumentação, um acórdão proferido pela Segunda Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo admitindo a acumulação dos cargos de Auxiliar de Laboratório e de Técnico de Laboratório, porque ambas as profissões seriam regulamentadas pelo Conselho Regional de Farmácia.

O acórdão é o seguinte:

SERVIDOR PÚBLICO MUNICIPAL - Pretensão de acumulação de cargos -Profissionais da saúde - Admissibilidade - Exceção expressamente prevista na Constituição Federal na alínea c, do inciso XVI, do art. 37 - Requisitos preenchidos: profissões regulamentadas pelo Conselho Federal de Farmácia e compatibilidade de horários - Recurso provido. 

(TJSP-2ª Câmara de Direito Público, Apelação Cível com Revisão nº 573.241-5/2-00, Rel. Des. Aloísio de Toledo César, julg. 26/09/2006). 

Do voto-condutor do Relator extrai-se o seguinte:

A pretensão das apelantes de declaração do direito de acumulação dos cargos de auxiliar de laboratório e técnico de laboratório, conjuntamente com pedido de pagamento das parcelas remuneratórias em atraso, merece acolhida, uma vez que se trata de caso que se insere na exceção expressamente prevista na Constituição Federal.

De fato, o artigo 37 da Constituição Federal, em seu inciso XVI, estabelece o princípio geral da não cumulatividade de cargos públicos. No entanto, o próprio inciso prevê exceções à regra geral, entre as quais se encontra o caso das apelantes. Isso porque a acumulação pretendida se insere na alínea c, ou seja, os cargos em questão são privativos de profissionais da saúde, com profissões regulamentadas, além do que há compatibilidade de horários.

As profissões de Auxiliar e de Técnico de Laboratório encontram-se regulamentadas pelo Conselho Federal de Farmácia, que foi criado pela Lei nº 3.820/60, já que são por ele fiscalizadas. Tanto é assim que a Resolução 311/97 estabeleceu a exigência de diploma de curso técnico para tais atividades, sendo tal exigência acolhida pela Administração e imposta às apelantes.

No Art. 14, letra "a", da Lei 3820 acima referida há menção expressa aos "auxiliares técnicos de laboratório", com o reconhecimento formal, portanto, de sua existência como profissão.

A Constituição Federal não exigiu forma específica de regulamentação das profissões da área da saúde, podendo, então, tal legislação ser acolhida como regulamentadora.

(grifei)

À luz do precedente acima transcrito, o acúmulo de cargos da impetrante poderia ser considerado lícito.

4 - Todavia, a questão não se revela pacífica, nem administrativamente, nem no campo da jurisprudência.

De fato, no âmbito do Governo Estadual, a Procuradoria Geral do Estado proferiu, em 2003, o parecer nº 221/2003, concluindo que os cargos de Auxiliar de Laboratório e Técnico de Laboratório são inacumuláveis, porque a profissão de Auxiliar de Laboratório não seria regulamentada.

Extrai-se do referido parecer o seguinte:

(...)

10. De qualquer sorte, para o deslinde do caso concreto torna-se prescindível a análise dessa questão, na medida em que as pesquisas realizadas pela diligente Unidade Central de Recursos Humanos evidenciam que a função de Auxiliar de Laboratório não atende os requisitos necessários para ser considerada profissão regulamentada.

11. Com efeito. Constata-se do edital do concurso realizado em 1993 (fls. 9/10) que as atribuições da função são de caráter auxiliar, a serem desenvolvidas sob a orientação de um Técnico de Laboratório (item 3). Tanto assim que se exigiu escolaridade equivalente ao 1º Grau (Subitem 5.4).

12. O Conselho Regional de Farmácia do Estado de São Paulo, atendendo consulta que lhe foi formulada, esclarece que "dentro do quadro de profissionais inscritos no Conselho Regional de Farmácia com profissão regulamentada temos os Farmacêuticos e os Auxiliares Técnicos de Laboratório de Análises Clínicas e Patologia" (fls. 61).

13. Ademais, os Auxiliares Técnicos de Laboratório de Análises Clínicas e Patologia devem ter curso técnico de 2º grau (atual ensino médio), sendo obrigatória sua inscrição nos Conselhos Regionais de Farmácia, nos termos regrados pela Resolução CFF nº 311/97 (fls. 33/37).

14. Como se vê, a atividade de Auxiliar de Laboratório desenvolvida pela interessada perante a Secretaria da Saúde desde 1993 não se confunde com a atividade regulamentada de Auxiliar Técnico de Laboratório de Análises Clínicas e Patologia. Tanto assim é, que apenas em 1996 habilitou-se a servidora em curso técnico de Patologia Clínica, requerendo sua inscrição no Conselho Regional respectivo em setembro de 2002 (fls. 18/20).

15. Decorre do exposto, na linha das opiniões precedentes, que a situação de acumulação em que se encontra a interessada é inconstitucional porque uma das atividades por ela ocupada, Auxiliar de Laboratório, perante a Secretaria da Saúde, não configura profissão regulamentada, nos termos exigidos pelo texto constitucional.

Tal parecer foi aprovado pelo Procurador Geral do Estado no processo GG nº 1.589/2002.

5 - No Judiciário, a questão não se revela pacífica. Ao lado do precedente acima transcrito, do Tribunal paulista, admitindo o acúmulo, existem diversas outras decisões que se orientam no mesmo sentido do parecer da PGE.

Neste sentido:

EMENTA: CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. ACUMULAÇÃO REMUNERADA DE DOIS CARGOS PÚBLICOS PRIVATIVOS DE PROFISSIONAIS DA SAÚDE. ART. 37. XVI, DA CF/88. AUXILIAR DE LABORATÓRIO. PROFISSÃO NÃO REGULAMENTADA. ACUMULAÇÃO INDEVIDA COM O CARGO DE TÉCNICO DE LABORATÓRIO. AGRAVO PROVIDO.

1. A acumulação remunerada de mais de um cargo público é vedada pela Constituição Federal, exceto nos casos enumerados pela própria Carta Magna em seu art. 37, XVI.

2. O cargo de auxiliar de laboratório não pode ser considerado profissão regulamentada, nos termos do art 37, XVI, "c", da CF/88, uma vez que o seu desempenho não necessita de especialização acadêmica ou mesmo técnica, podendo ser exercido por, profissional não habilitado na área da saúde.

3. "In casu", tendo em conta que o cargo de auxiliar de laboratório não pode ser considerado profissão regulamentada, é indevida a sua cumulação com o cargo de técnico de laboratório, razão pela qual não deve prevalecer a decisão vergastada.

4. Agravo de instrumento provido.

(TRF-5ª Região, 1ª Turma, Agravo de Instrumento nº 122381-CE, 0001207-38.2012.4.05.0000, Rel. Juiz Francisco Cavalcanti, julg. 31/05/3012)

CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. CUMULAÇÃO DE CARGOS. TÉCNICO EM SAÚDE. MOTORISTA DE AMBULÂNCIA E AUXILIAR DE LABORATÓRIO. RAIOS X. ARTIGO 37, INCISO XVI, ALÍNEA "C", DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL NÃO CARACTERIZAÇÃO. INVIABILIDADE.

1. Os cargos em comento não são considerados cargos privativos dos profissionais da saúde, como expressado na r. sentença recorrida. Por outro lado, exige-se que as profissões sejam regulamentadas, o que não é o caso dos cargos ocupados pelo Apelante, principalmente, com relação ao cargo de técnico em saúde, especialidade motorista, que não pode ser caracterizado como privativo de profissional da saúde.

2. Recurso desprovido. Unânime.

(TJDF-5ª Turma Cível, Apelação Cível 20090110131358APC, Rel. Des. Romeu Gonzaga Neiva, julg. 12/05/2011)

6 - No que toca ao Município de São Paulo cabe observar que o mandado de segurança impetrado pela servidora LUZINEIDE CLARA DA SILVA não é o primeiro a discutir a possibilidade de acúmulo do cargo de Auxiliar de Laboratório.

Consta, de fato, que, no passado, as servidoras MARIA SOCORRO BRAGA FERNANDES CRUZ E OUTRAS impetraram mandado de segurança contra o ato do Secretário de Saúde do Município de São Paulo que considerou ilícitos os acúmulos de cargos. Como se lê no relatório do incluso acórdão proferido pela 1ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo, o Município prestou informações sustentando que "a profissão de técnico em laboratório não é regulamentada, fato que afronta a condicionante constitucional que acena com a possibilidade de acúmulo na área da saúde se, além da compatibilidade de horários, for a profissão devidamente regulamentada, acrescentando que possuir habilitação profissional específica não implica ter profissão regulamentada".

O acórdão deu guarida à tese de defesa sustentada pelo Município, considerando ilícito o acúmulo que compreenda o cargo de Auxiliar de Laboratório. Confira-se:

MANDADO DE SEGURANÇA - ATO ADMINISTRATIVO - ACUMULAÇÃO DE CARGOS - PROFISSIONAIS DA SAÚDE - PROFISSÕES NÃO REGULAMENTADAS - INADMISSIBILIDADE - A regra estabelecida pelo artigo 37, XVI da Constituição é da proibição da acumulação remunerada de cargos públicos. As exceções são aquelas previstas nas três alíneas do dispositivo, devendo o jurisconsulto, bem assim o administrador público, interpretar sempre restritivamente, observando todas as condições fixadas pelo legislador, sem ignorar qualquer delas. Direito líquido e certo, ademais, que não restou demonstrado pelos impetrantes, tampouco a ilegalidade do ato ou qualquer outra mácula.

RECURSO AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO, REJEITADAS AS PRELIMINARES DE MÉRITO. DECISÃO MANTIDA.

(TJSP-1ª Câmara de Direito Público, Apelação nº 990.10.276195-9, Rel. Des. Regina Capistrano, julg. 28/09/2010)

7 - Constata-se, pois, que a jurisprudência majoritária orienta-se no sentido de que a profissão de Auxiliar de Laboratório não é regulamentada, e justamente por isso o respectivo cargo não é acumulável, nos termos do art. 37, XVI, da Constituição.

Este o entendimento adotado desde 2003 pela Procuradoria Geral do Estado, que, no parecer ora anexado, tomou o cuidado de consultar previamente o Conselho Regional de Farmácia, sendo informada que apenas os Farmacêuticos e os Auxiliares Técnicos de Laboratório de Análises Clínicas e Patologia têm profissões regulamentadas pelo órgão, sendo que este último (regrado pela Resolução CFF nº 311/97) não se confunde com a profissão de Auxiliar de Laboratório.

Ademais, o próprio Município de São Paulo, em situações análogas, defendeu a ilicitude do acúmulo em questão, obtendo êxito perante o Poder Judiciário.

Neste cenário, entendo correta a decisão da Administração que declarou a ilicitude do acúmulo de cargos da servidora LUZINEIDE CLARA DA SILVA, observando que ela não informou, sequer no mandado de segurança, se o Estado de São Paulo declarou o mesmo acúmulo lícito ou ilícito. Neste sentido é que devem ser prestadas as informações da autoridade coatora no aludido "mandamus".

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São Paulo, 06/09/2012.

LUIZ PAULO ZERBINI PEREIRA

Procurador Assessor - AJC

OAB/SP 113.583

PGM

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De acordo.

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São Paulo, 11/09/2012.

LILIANA DE ALMEIDA F. DA SILVA MARÇAL

Procuradora Assessora Chefe - AJC

OAB/SP nº 94.147

PGM

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Processo nº 2012-0.192.030-9

INTERESSADA: SECRETARIA MUNICIPAL DA SAÚDE

ASSUNTO: Consulta quanto à possibilidade de os Auxiliares de Laboratório poderem ocupar licitamente dois cargos públicos.

Cont. da informação nº 1.538/2012-PGM.AJC

SECRETARIA DOS NEGÓCIOS JURÍDICOS

Senhor Secretário

Encaminho o presente a Vossa Excelência com a manifestação da Assessoria Jurídico-Consultiva, que acolho, concluindo que o cargo de Auxiliar de Laboratório é inacumulável, não se enquadrando na exceção contida no art. 37, XVI, "c", da Constituição Federal, uma vez que a profissão não é regulamentada, segundo o entendimento da jurisprudência majoritária.

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São Paulo, 11/09/2012.

CELSO AUGUSTO COCCARO FILHO

Procurador Geral do Município

OAB/SP 98.071

PGM

Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo