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PARECER PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO - PGM Nº 11.548 de 27 de Janeiro de 2011

EMENTA Nº 11.548
Servidor público. Averbação de tempo de serviço extramunicipal. Tempo fictício obtido antes do advento da Emenda Constitucional nº 20/1998. Possibilidade. Direito adquirido configurado. Precedentes do Supremo Tribunal Federal. Proposta de revisão da norma contida no art. 22 do Decreto nº 46.861, de 27 de dezembro de 2005.

Memorando n° 61/08 (TID 2494094)

INTERESSADA: MÁRCIA CRISTINA PEREIRA DOS REIS

ASSUNTO: Averbaçao de tempo de serviço extramunicipal

Informação nº 131/2011-PGM.AJC

PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO

ASSESSORIA JURÍDICO-CONSULTIVA

Senhora Procuradora Assessora Chefe

1 - A controvérsia jurídica exposta no presente diz respeito à possibilidade de a Administração Municipal averbar, como tempo de serviço extramunicipal, os 193 dias que foram concedidos à interessada em 1989 pelo Município do Rio de Janeiro, onde ela exercia o cargo de Professor II, nos termos do art. 8º da Lei Municipal carioca nº 1.376/89 e do respectivo decreto regulamentador nº 8443/89.

Estes 193 dias correspondem a diferenças remuneratórias pretéritas que foram legalmente convertidas em dias de efetivo exercício, em 1989, "para efeito de percepção, no que couber, de triênios, enquadramento, incorporação, licença especial e aposentadoria" (art. 8º da Lei nº 1.376/89).

Trata-se, portanto, de tempo ficto de serviço anterior à Emenda Constitucional nº 20/98, que aboliu o seu cômputo, para quaisquer efeitos, a partir da sua promulgação, ocorrida em 16 de dezembro de 1998.

Entendendo que o referido tempo foi averbado pelo Município do Rio de Janeiro em 1989, portanto antes do advento da EC 20/98, a Assessoria Jurídica de SME opinou pelo deferimento do pedido (fls. 21/23).

Deste entendimento divergiu o DRH, que, levando em conta que o pedido de averbação, no Município de São Paulo, é posterior à EC 20/98, opinou pelo seu indeferimento (fls. 41/42).

Por fim, adotando tese nova, que ganhou corpo no Poder Judiciário nos últimos anos, a Assessoria Jurídica da Secretaria de Planejamento, Orçamento e Gestão sustentou que o pedido deverá ser deferido porque "a incorporação ao patrimônio do servidor, do tempo de serviço, ocorre sob a égide da lei vigente ao tempo em que prestado o serviço e não por ocasião de sua averbação", consoante iterativa jurisprudência colacionada ao presente, motivo pelo qual sugeriu, também, seja alterada a redação do art. 22 do Decreto nº 46.861/05, conforme minuta de fl. 106, uma vez que a redação em vigor é contrária à jurisprudência hoje pacífica tanto no STF e quanto no STJ (fls. 107/112).

Solicitado o pronunciamento desta Procuradoria Geral, passo a opinar.

2 - O cerne da questão diz respeito ao momento em que o direito à averbação de tempo de serviço passa a integrar o patrimônio do servidor. O assunto não é novo, tendo sido abordado por esta Assessoria nos precedentes que serão expostos a seguir.

Antes, porém, de examinar o mérito da consulta, alerto para a possibilidade de haver sobreposição de tempo de serviço, caso o pedido de averbação formulado pela interessada venha a ser acolhido. Isto porque, tendo sido nomeada em 05/10/2004 para exercer o cargo de Professor de Desenvolvimento Infantil, ela iniciou o exercício, junto à Administração Municipal (São Paulo), em 10/11/2004, conforme está informado no memorando inaugural. Sucede que, na ocasião, ela ainda mantinha vínculo funcional junto ao Município do Rio de Janeiro. A certidão de tempo de serviço que ora se pretende averbar, referente ao exercício do cargo de Professor II, no Rio de Janeiro, inclui a totalidade de dias do exercício de 2004 (366 dias) e mais 348 dias do exercício de 2005, período em que a interessada já estava em exercício em São Paulo. No verso da certidão de fl. 02 está dito que a interessada esteve licenciada, no Rio de Janeiro, para tratar de assuntos particulares, entre 08/09/2004 e 14/12/2005, sendo este período computado para fins de aposentadoria. Ocorre que a partir de 10/11/2004, como visto, ela já estava em exercício no cargo de Professor de Educação Infantil, em São Paulo, não podendo haver sobreposição desse tempo.

3 - Feita esta observação, volto ao exame do mérito da questão, adiantando desde já que a razão está com a Assessoria Jurídica da Secretaria Municipal de Planejamento, Orçamento e Gestão, pelos motivos bem articulados no pronunciamento de fls. 107/112.

O cerne da controvérsia, vale destacar, reside na possibilidade de se averbar, após o advento da Emenda Constitucional nº 20/98, o chamado "tempo ficto" de serviço produzido antes da norma que proibiu a sua utilização para qualquer efeito1. Logo, a questão jurídica diz respeito ao direito adquirido.

Quando da promulgação da EC 20/98, foi constituído Grupo de Trabalho encarregado de estudar as inovações da Reforma Previdenciária. Em seu relatório final, que foi aprovado pelo Prefeito, o Grupo sustentou uma tese que mais tarde se revelou equivocada - como, aliás, esta Assessoria já teve a oportunidade de demonstrar, anos atrás, na criteriosa manifestação exarada no processo 2003-0.008.550-4 (informação nº 929/2003).

O fato é que, na interpretação do Grupo de Trabalho oficialmente acolhida pela Administração, o direito adquirido ampararia apenas "tempo ficto" que já estivesse averbado na data da promulgação da EC 20/98, 16 de dezembro de 1998 (v. excerto do relatório às fls. 31/36). Qualquer averbação estaria vedada após esta data, mesmo que relativa a período anterior à EC 20/98.

Esta Assessoria, a bem da verdade, jamais compartilhou deste entendimento, ainda que ele tivesse sido reafirmado, mais tarde, pela norma contida no art. 22 do Decreto nº 46.861/052, que ora se pretende alterar.

De fato, o desacerto da conclusão do GT foi bem exposto no percuciente manifestação exarada, anos atrás, pelo ilustre Procurador Marcos Geraldo Batistela nos autos do processo 2003-0.008.550-4. As razões lá expostas merecem ser reproduzidas, na medida em que elas elucidam também a controvérsia aqui examinada, dada a similitude das situações cotejadas:

"Ao se confrontar com o novo texto constitucional, o Grupo de Trabalho constituído naquela ocasião entendeu que:

"Logo, as normas que previam tais contagens de tempo de serviço não foram recepcionadas pela Emenda Constitucional nº20, e então só podem eles ser considerados como tempo de contribuição se já estiverem incorporados ao patrimônio do servidor, mediante publicação do deferimento do pedido de averbação, até o dia 16/12/98, inclusive."(fls. 05)

Ainda que concorde com a primeira parte do texto, aquela que conclui que o novo art. 40, § 10, da Constituição teve o efeito de revogar por incompatibilidade da legislação anterior que dispunha em sentido contrário, não compartilho a opinião exposta no final porque a mesma ordem constitucional que passou a proibir a contagem de "tempo de contribuição fictício" resguarda o direito adquirido.

Várias são as ordens de consideração. A primeira delas é que o novo texto do artigo 40, § 10, da Constituição proíbe a contagem de "tempo de contribuição fictício", e isto não pode ser jamais entendido como sinônimo de "tempo de serviço fictício", como parece ter feito o Grupo de Trabalho ("... podemos asseverar que tal tempo é ficto, pois a mera inscrição nos quadros da OAB não leva a concluir que tenha ocorrido o efetivo exercício profissional" - fls. 08). Houve, com a reforma previdenciária de 1998, uma mudança de paradigma, de forma que não se pode tratar o conceito atual de "tempo de contribuição" como sucedâneo do antigo "tempo de serviço", e foi por trilhar nesta senda que o Grupo de Trabalho incidiu no equívoco que deu ensejo a este processo e à divergência que agora exponho. Um sintoma desta mudança conceitual que passou desapercebida está na necessidade que teve de fazer a distinção entre "tempo fictício próprio" e "tempo fictício impróprio". O que passou a importar é o tempo de contribuição, não o tempo ou a contribuição individualmente considerados, e tanto faz se o contribuinte do sistema previdenciário dedicou-se ao trabalho físico ou intelectual, ou entregou-se ao ócio, produtivo ou não.

Mas os fatos do passado já estão consolidados, e esta certeza não foi abalada pelo texto da Emenda nº 20/98, não apenas pela redação do novo art. 40, § 10, da Constituição (conjugação do verbo no futuro do indicativo), como também pelo disposto em seu art. 4º, ao qual não parece ter sido dada a importância devida:

"Art. 4º - Observado o disposto no art. 40, § 10, da Constituição Federal, o tempo de serviço considerado pela legislação vigente para efeito de aposentadoria, cumprido até que a lei discipline a matéria, será contado como tempo de contribuição."

Ou seja, desde a promulgação da Emenda Constitucional nº 20/98, não pode mais ser considerado para efeito de aposentadoria "tempo de contribuição ficto", mas ainda assim será considerado o "tempo de serviço" (sem contribuição) até que a lei discipline a matéria. Portanto, o texto constitucional não pretendeu em nenhum momento alterar a qualificação jurídica dos fatos anteriores a sua vigência, mantendo, ao contrário, os seus efeitos.

Depois, também não posso aceitar como válida a data definida pelo Grupo de Trabalho para incorporação do direito ao patrimônio dos servidores, que ficou definida como sendo a publicação da averbação até 16/12/1998, quando foi publicada a Emenda Constitucional nº 20.

Se fosse assim, bastaria a administração, por ineficiência ou resistência indevida, postergar a publicação do deferimento da averbação e um direito que seria legítimo deixaria de existir, o que não é razoável.

Na verdade, o Grupo de Trabalho considerou a averbação como ato constitutivo do direito do servidor, quando não é isto o que ocorre. De fato, a averbação em questão é mero ato de controle formal do requerimento e do atendimento das condições estabelecidas pela Lei nº 10.182/86, possuindo, então, caráter declaratório de um direito preexistente, mas que é condição para o seu exercício.

A averbação, então, não pode ser tida como o momento em que ocorre a incorporação do direito à contagem do tempo para efeito de aposentadoria ao patrimônio do servidor, porque ela tem caráter meramente declaratório, constitui um simples controle formal.

Neste ponto, parece que se evidencia o que me parece a maior falha do raciocínio exposto pelo Grupo de Trabalho, que é a confusão entre direito adquirido e direito já consumado ou exercido.

Com efeito, não é passível de dúvida que o direito brasileiro reconhece e resguarda o direito adquirido, inclusive entre os direitos e garantias constitucionais (art. 5º, XXXVI, da Constituição). Os problemas relativos ao direito adquirido surgem quando há uma alteração legal que deixa de reconhecer um direito anteriormente admitido mas que ainda não foi exercido ou consumado, pois de outra forma não se trataria de direito adquirido, mas de direito efetivamente exercido. Em outras palavras, só se pode cogitar da existência de direito adquirido quando ainda não tenha sido exercido ou consumado.

O direito adquirido é assim definido pela Lei de Introdução ao Código Civil (Decreto-lei nº 4657, de 04 de setembro de 1942, com redação determinada pela Lei Federal nº 3.238, de 15 de agosto de 1957):

"Art. 6º - A lei em vigor terá efeito imediato e geral, respeitados o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada.

(...)

§ 2º Consideram-se adquiridos assim os direitos que o seu titular, ou alguém por ele, possa exercer, como aqueles cujo começo do exercício tenha termo prefixo, ou condição preestabelecida inalterável, a arbítrio de outrem."

O assunto é objeto de amplo tratamento doutrinário, destacando-se a renomada monografia de Rubens Limongi França, "A irretroatividade das leis e o direito adquirido" (edição atualizada de "Direito intertemporal brasileiro"). O conceito proposto pelo autor é o seguinte:

"É a conseqüência de uma lei, por via direta ou por intermédio de fato idôneo; conseqüência que, tendo passado a integrar o patrimônio material ou moral do sujeito, não se fez valer antes da vigência de lei nova sobre o mesmo objeto."

O autor, não é demais recordar, segue a teoria clássica, cujo expoente foi Gabba, oposta à teoria objetiva, da qual o mais destacado formulador foi Paul Roubier e que entre nós obteve acolhimento apenas na vigência do texto original da Lei de Introdução ao Código Civil de 1942, até a sua alteração pela Lei Federal nº 3.238, de 1º de agosto de 1957, que estabeleceu o texto atual do art. 6º, já transcrito, e restabeleceu a adesão do direito intertemporal brasileiro à teoria clássica.

Assim exposto o tema, é necessário perquirir se o direito cujo reconhecimento pretende o interessado decorre da lei por "via direta" ou depende da verificação de "fato idôneo", para usar as expressões de Limongi França. De acordo com o texto do art. 18 da Lei nº 10.182/86, já transcrito, me parece que o direito a contar o tempo de inscrição na OAB nele regulado se adquire por simples aplicação da lei, sem necessidade de qualquer fato idôneo, pois basta o início de exercício no cargo efetivo de Procurador do Município para que se possa exercê-lo a qualquer tempo, desde que antes da aposentadoria ou da disponibilidade, uma vez que não existe qualquer prazo fixado para isto. Reforça este entendimento o que já foi exposto acima acerca do caráter de mero controle formal, de ato declaratório, que possui o deferimento da averbação (palavra cujo significado, aliás, é o de anotar, registrar, escrever à margem de alguma coisa).

A averbação mencionada - por ser ato administrativo vinculado - é apenas uma condição suspensiva para o exercício do direito, que não lhe retira a condição de direito adquirido. (...)

(...)    

Feitas estas considerações, resta apenas opinar pela revisão da conclusão alcançada pelo Grupo de Trabalho e pelo deferimento parcial do pedido do interessado - desde que satisfeitos os requisitos legais, o que será apurado oportunamente - não para todos os efeitos legais, como pretende, mas apenas para fins de aposentadoria e disponibilidade, como lhe garantiu o art. 18 da Lei nº 10.182/86."

É bom que se diga que a aludida manifestação deixou de ser acolhida pelo então Secretário dos Negócios Jurídicos, que, conquanto admitisse a plausibilidade dos argumentos expostos, preferiu manter a interpretação que já havia sido fixada pelo Prefeito, anos antes, quando da aprovação do relatório apresentado pelo Grupo de Trabalho.

Entretanto, o tempo revelou que os motivos expostos por esta Assessoria eram irrefutáveis.

4 - De fato, como bem demonstrou a Assessoria Jurídica da Secretaria Municipal de Planejamento, Orçamento e Gestão, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça evoluiu, passando a acolher a tese que já vinha sendo sustentada por esta Assessoria, não só no pronunciamento acima transcrito, mas também, em tempos mais recentes, no parecer de ementa nº 11.365, aqui juntado por cópia:

EMENTA Nº 11.365: Servidor público. Averbação de tempo de serviço extramunicipal para fins de aposentadoria, disponibilidade, adicional por tempo de serviço e sexta-parte, antes da Reforma da Previdência levada a cabo pela Emenda Constitucional nº 20/98. Posterior condicionamento da eficácia do ato à apresentação de certidão do tempo de serviço averbado, expedida pelos órgãos públicos junto aos quais os servidores tenham mantido vínculo celetista, com filiação ao Regime Geral de Previdência Social. Invocação dos Decretos Federais nº 3.048/99 (art. 130) e 3.112/99 (art. 10, IV). Inviabilidade. Inteligência do art. 4º da Emenda Constitucional nº 20/98. Ofensa a direito adquirido

No referido precedente, esta Assessoria já chamava a atenção para a aplicação, ao caso, do princípio "tempus regit actum", tal como agora observou a Assessoria Jurídica de SEMPLA, tendo mencionado, aliás, o mesmo acórdão aqui reproduzido às fls. 88/96:

Ementa: PREVIDENCIÁRIO. TEMPO DE SERVIÇO. MAGISTRADA FEDERAL ATIVIDADE DE SOLICITADORA ACADÊMICA. CONTRIBUIÇÃO. RECOLHIMENTO. DESNECESSIDADE. EMENDA CONSTITUCIONAL 20/98.

-    Admite-se o cômputo do tempo de serviço em favor de magistrados que exerceram antes da investidura a advocacia ou atuaram como solicitadores sem a obrigatoriedade do recolhimento das contribuições exigidas pelo INSS para fins de averbação do referido tempo laboral.

-    Com o advento da Emenda Constitucional nº 20 de 1998, o sistema previdenciário tornou obrigatório o recolhimento das contribuições para fins de contagem de tempo de serviço, resguardando, entretanto, as situações já consolidadas.

-    As alterações na Lei Previdenciária não podem retroagir para alcançar fatos anteriores a ela, em face do princípio do tempus regit actum.

-    Recurso Especial improvido.

(STJ-6ª Turma, REsp 627.472/RS, Relator Min. Paulo Medina, julg. 26/05/2004).

5 - Vale aqui observar que o argumento invocado pelo DRH para sugerir o indeferimento do pedido de averbação dos 193 dias de serviço, obtidos pela interessada no ano de 1989, não encontra sustentação lógica (fls. 39/41).

Vergando-se ao entendimento do Grupo de Trabalho, aquele Departamento observou que tal pedido não poderia ser acolhido porque se trata de tempo de serviço não averbado (em São Paulo) até 15 de dezembro de 1998.

Ocorre que o referido tempo de serviço foi, sim, averbado em 1989; foi, porém, averbado pela Prefeitura do Rio de Janeiro, com quem a interessada mantinha vínculo funcional na época. Já vimos que ela só foi nomeada para exercer o cargo de Professor de Educação Infantil, em São Paulo, no final de 2004. Seria, portanto, incongruente exigir que ela averbasse, em São Paulo, antes de 15 de dezembro de 1998, o tempo de serviço obtido em 1989, na medida em que ela só passou a manter vínculo com a administração paulistana em 2004.

6 - Cumpre destacar, por fim, que o entendimento ora proposto aplica-se também para fins de aposentadoria especial do magistério, em benefício dos professores, como é o caso da interessada, pois neste sentido orienta-se a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, como se pode observar na decisão abaixo transcrita, proferida pelo Ministro Dias Toffoli no RE 445.986/MF (DJe 17/12/2009):

Vistos.

Estado de Minas Gerais interpõe recurso extraordinário, com fundamento na alínea "a" do permissivo constitucional, contra acórdão da Segunda Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, assim ementado:

"AÇÃO ORDINÁRIA - PROFESSORES ESTADUAIS - FÉRIAS-PRÊMIO - CONTAGEM EM DOBRO PARA FINS DE APOSENTADORIA - DIREITO ADQUIRIDO - EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 20/98. I - Os professores públicos que implementaram todas as condições para pleitearem o benefício das férias-prêmio até 16.12.1998, tendo em vista o advento da Emenda Constitucional 20/1998, terão os seus direitos garantidos com fundamento nos critérios até então vigentes. Na hipótese em tela, a concessão do gozo das férias-prêmio, computadas em dobro, é direito que se incorporou aos patrimônios dos autores, porque restaram obedecidos os pressupostos exigidos até o advento da Emenda Constitucional nº 20/98. Essa situação a lei nova não pode alcançar, por evidente o direito adquirido. II - Em reexame necessário, confirma-se a sentença recorrida" (fl. 306).

Colhe-se do voto condutor:

"Conforme se depreende do conjunto probatório acostado aos autos, verifica-se que os autores atenderam os requisitos previstos no artigo 31, II, da Constituição do Estado de Minas Gerais, conforme se vê às fls. 13 a 30, 34 a 37, 60 a 67, 73 a 77, 93 a 98 e 107, 111 a 124 e 128 a 138. Desse modo, eles detêm o direito de contar em dobro as férias-prêmio, não gozadas, para fins de aposentadoria, até 16 de dezembro de 1998. Conclui-se, portanto, que, com o advento da Emenda Constitucional nº 20/98, os direitos dos autores já estavam consolidados em relação às férias-prêmio adquiridas até 16.12.98. Ora, uma vez preenchidos os requisitos legais à época da vigência da citada emenda constitucional, o direito ao cômputo das férias-prêmio em dobro se incorpora aos patrimônios dos autores, consubstanciando-se em direito adquirido" (fls. 311/312).

Alega contrariedade ao artigo 40, § 10º, da Constituição Federal, e 3º da Emenda Constitucional 20/98, haja vista que "a tese jurídica a ser submetida à apreciação do Supremo Tribunal Federal diz respeito a impossibilidade de averbação, para fins de aposentadoria, das férias-prêmio adquiridas e não gozadas até a data da Emenda Constitucional 20/98, quando não implementados, até a data dessa Emenda, os requisitos necessários à obtenção do benefício da aposentadoria segundo as leis vigentes" (fl. 334).

Contra-arrazoado (fls. 344 a 348), o recurso extraordinário (fls. 331 a 340) foi admitido (fls. 350/351).

Decido.

Anote-se, primeiramente, que o acórdão dos embargos de declaração, conforme expresso na certidão de fl. 329, foi publicado em 30/4/04, não sendo exigível, conforme decidido na Questão de Ordem no Al 664.567, Pleno, Relator o Ministro Sepúlveda Pertence, DJ de 6/9/07, a demonstração da existência de repercussão geral das questões constitucionais trazidas no recurso extraordinário.

Não prospera a irresignação, uma vez ser pacífica a jurisprudência deste Tribunal no sentido de que há direito adquirido do servidor publico à conversão de licença-prêmio não gozada em tempo de serviço, quando a aquisição ocorreu em período anterior à EC nº 20/98, como no caso dos autos. Nesse sentido, anote-se:

"Agravo regimental em agravo de instrumento. 2. Recurso que não demonstra o desacerto da decisão agravada. 3. Conversão da licença-prêmio não gozada em tempo ficto. Aposentadoria. Período anterior à EC 20/98. Possibilidade. Precedente. 4. Agravo regimental a que se nega provimento" (Al nº 666.942/GO-AgR, Segunda Turma, Relator o Ministro Gilmar Mendes, DJ de 28/3/08).

"SERVIDOR PÚBLICO. CONVERSÃO DE LICENÇA-PRÊMIO NÃO GOZADA EM TEMPO DE SERVIÇO. DIREITO ADQUIRIDO ANTES DA VIGÊNCIA DA EMENDA CONSTITUCIONAL N. 20/98. PRECEDENTES. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO" (Al nº 540.075/RS-AgR, Primeira Turma, Relatora a Ministra Cármen Lúcia, DJ de 9/2/07).

"CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. CONVERSÃO DE LICENÇA-PRÊMIO NÃO GOZADA EM TEMPO DE SERVIÇO. DIREITO ADQUIRIDO ANTES DA VIGÊNCIA DA EMENDA CONSTITUCIONAL 20/98. I. - Conversão de licença-prêmio em tempo de serviço: direito adquirido na forma da lei vigente ao tempo da reunião dos requisitos necessários para a conversão. Precedentes do STF. II. -Agravo não provido" (RE 394.661/RS-AgR, Segunda Turma, Relator o Ministro Carlos Velloso, DJ de 14/10/05).

Ante o exposto, nos termos do artigo 557, caput, do Código de Processo Civil, nego seguimento ao recurso extraordinário.

Publique-se.

Brasília, 30 de novembro de 2009.

Ministro DIAS TOFFOLI

Relator

7 - Assim, na esteira dos precedentes citados, e levando especialmente em consideração a farta jurisprudência trazida à colação pela Assessoria Jurídica de SEMPLA - a demonstrar, claramente, o entendimento atual das mais altas Cortes do país acerca do assunto -, é de se concordar não só com a possibilidade de averbação do tempo de serviço fictício anterior à Emenda Constitucional nº 20/98, mas também com a proposta de revisão da norma contida do art. 22 do Decreto nº 46. 861/05, conforme minuta de fl. 106 (desnecessária a revisão do despacho do Prefeito, que acolheu as conclusões do Grupo de Trabalho, pois o referido decreto lhe é posterior, de forma que a mudança do texto do decreto é suficiente para caracterizar a mudança do entendimento da Administração a respeito do assunto).

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São Paulo, 27/01/2011.

LUIZ PAULO ZERBINI PEREIRA

Procurador Assessor - AJC

OAB/SP 113.583

PGM

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De acordo.

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São Paulo, 28/01/2011.

LILIANA DE ALMEIDA F. DA SILVA MARÇAL

Procuradora Assessora Chefe - AJC

OAB/SP nº 94.147

PGM

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1 Art. 40. § 10, da Constituição: "A lei não poderá estabelecer qualquer forma de contagem de tempo de contribuição fictício" (incluído pela EC 20/98).

2 Art. 22: "Para os fins exclusivos deste decreto e para efeito de contagem do tempo de efetivo exercício no serviço público, de efetivo exercício no cargo, de contribuição previdenciária e de carreira, não será considerado o tempo ficto averbado após 16 de dezembro de 1998".

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Memorando n° 61/08 (TID 2494094)

INTERESSADA: MÁRCIA CRISTINA PEREIRA DOS REIS

ASSUNTO: Averbaçao de tempo de serviço extramunicipal

Cont. da informação nº 131/2011-PGM.AJC

SECRETARIA DOS NEGÓCIOS JURÍDICOS

Senhor Secretário

Encaminho o presente a Vossa Excelência com a manifestação da Assessoria Jurídíco-Consultiva, que acolho, não só concluindo ser juridicamente possível a averbação do tempo de serviço fictício anterior à Emenda Constitucional nº 20/98, por força do direito adquirido assegurado pela Constituição, mas também endossando a proposta de revisão da norma contida do art. 22 do Decreto nº 46. 861/05, conforme minuta elaborada por SEMPLA (fl. 106), à vista da jurisprudência pacífica dos Tribunais Superiores acerca da matéria.

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São Paulo, 28/01/2011.

MARCIA HALLAGE VARELLA GUIMARÃES

PROCURADORA GERAL DO MUNICÍPIO SUBSTITUTA

OAB/SP 98.817

PGM

Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo