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PARECER PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO - PGM Nº 492 de 21 de Março de 2014

Informação n° 492/2014-PGM.AJC
Solicitação de alteração da Orientação Normativa n° 02/2013. Acesso de advogados aos autos dos processos administrativos.

 

Ofício n° 142/2014/CGM-G

INTERESSADO: CONTROLADORIA GERAL DO MUNICÍPIO

ASSUNTO: Solicitação de alteração da Orientação Normativa n° 02/2013. Acesso de advogados aos autos dos processos administrativos.

Informação n° 492/2014-PGM.AJC

PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO

Assessoria Jurídico-Consultiva

Senhor Procurador Assessor Chefe

O Excelentíssimo Senhor Controlador Geral do Município solicita análise sobre a possibilidade de alteração da Orientação Normativa n° 2/13-PREF, que garante aos advogados o acesso aos autos dos processos administrativos em geral, incluindo aqueles sujeitos a sigilo.

Baseando-se em julgados do Supremo Tribunal Federal (STF), argumenta que a Súmula Vinculante n° 14 não se aplica a "procedimentos investigativos de natureza civil", razão pela qual sugere "a inclusão de um item na referida Orientação Normativa esclarecendo que suas disposições não se aplicam aos procedimentos disciplinares preparatórios e investigativos voltados à apuração de eventual responsabilidade funcional".

A Secretaria Municipal dos Negócios Jurídicos que foi a responsável pela redação da minuta da aludida Orientação Normativa - fez anexar aos autos cópias da Informação n° 1.385/13-PGM/AJC (fls. 02/04), da Informação n° 2905/2013-SNJ.G (fls. 05/07), da ON n° 2/13 - PREF (fls. 08/09) e da Ementa n° 11.152-PGM/AJC (que trata do direito dos advogados de retirar autos de procedimentos administrativos das repartições).

E o relatório.

A edição da Orientação Normativa n° 2/13 - PREF foi sugerida por esta Procuradoria Geral no bojo de expediente no qual a Ordem dos Advogados do Brasil, Seção de São Paulo (OAB/SP), afirmava que a vista de processos administrativos municipais vinha sendo constantemente negada aos advogados.

Consoante se depreende da Informação n° 1.385/2013 - PGM.AJC (fls. 02/04)1, concluiu-se que a legislação municipal estava em plena consonância com o Estatuto da Advocacia - Lei Federal n° 8.906/94, razão porque não havia necessidade de modificá-la. Diante das inúmeras reclamações, contudo, sugeriu-se a edição de orientação normativa dirigida a todas as repartições municipais.

A elaboração da referida orientação normativa mereceu ainda as doutas considerações da Secretaria dos Negócios Jurídicos (SNJ)2, após o que foi editada com fundamento no artigo 1-, incisos XIII a XV da Lei Federal n° 8.906/94 (Estatuto da Advocacia), na Lei Municipal n° 14.141/06 - e seu decreto regulamentar n° 51.714/10 (processo administrativo municipal) e no Decreto Municipal n° 53.623/12 (regulamento da lei federal de acesso à informação).

Em obediência à legislação acima mencionada, a ON n° 2/13 - PREF reconheceu aos advogados o direito à vista de processos administrativos em geral, inclusive daqueles cuia matéria estiver sujeita a sigilo(fls. 08)3.

A Súmula Vinculante n° 14, de 2 de fevereiro de 2009, do Supremo Tribunal Federal (STF), por sua vez, dispõe (in verbis):

"E direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que, já documentados em procedimento investiga-tório realizado por órgão com competência de polícia judiciária, digam respeito ao exercício do direito de defesa".

A referida súmula realmente não parece aplicável às sindicâncias administrativas propriamente ditas, ou seja, àqueles procedimentos que funcionam como mera investigação preparatória (em regra, prepara-se um outro processo) e nos quais não se possibilita a aplicação de penalidade. Isto porque neste tipo de procedimento ainda não há a figura do investigado-representado, nem os órgãos administrativos municipais realizam atividade de polícia judiciária.

As decisões citadas pela CGM afastaram duas Reclamações contra a não aplicação da Súmula 14/STF, ao argumento de que os casos ali examinados não eram da esfera penal. O primeiro tratou de uma sindicância administrativa; o segundo, de um inquérito civil. Vale destacar o trecho de um dos julgados, no voto do Min. Relator Marco Aurélio:

"No caso, o acesso pretendido - à sindicância para apuração de falta administrativa - não tem respaldo nas premissas do citado verbete, a saber -procedimento investigatório, realizado por órgão com competência de polícia judiciária, relativo ao requerente. O fundamento a atrair a adequação do verbete está claro no próprio enunciado: a existência de acusado. Simples sindicância repousa em notícia de fatos a serem elucidados quanto à materialização de infração administrativa, inclusive no tocante a indícios de envolvimento de servidores, por ora indefinidos. O descompasso mostra-se inafastável"4.

Como se vê, a Súmula Vinculante n° 14/STF foi afastada no indigitado precedente, uma vez que a sindicância não é um procedimento da esfera penal e não possui acusado, verificando-se ainda no caso concreto que ela não se revestia de caráter punitivo, mas meramente investigativo.

A respeito das sindicâncias, é preciso recordar que muito já se discutiu acerca de sua natureza sigilosa e estranha ao princípio do contraditório. Existem decisões do STF e do STJ que reconhecem neste tipo de sindicância (preliminar, preparatória e investigativa) a não incidência, em toda a sua amplitude, do contraditório e da ampla defesa:

EMENTA: SERVIDOR PÚBLICO. Pena. Demissão. Penalidade aplicada ao cabo de processo administrativo regular. Suposto cerceamento da ampla defesa e do contraditório na sindicância. Irrelevância teórica. Procedimento preparatório inquisitivo e unilateral. Não ocorrência, ademais.

Servidor ouvido em condição diversa da testemunhal. Nulidade processual inexistente. Mandado de segurança denegado. Interpretação dos arts. 143, 145, II, 146, 148, 151, II, 154, 156 e 159, caput e § 2°, todos da Lei federal n° 8.112/90. A estrita reverência aos princípios do contraditório e da ampla defesa só é exigida, como requisito essencial de validez, assim no processo administrativo disciplinar, como na sindicância especial que lhe faz as vezes como procedimento ordenado à aplicação daquelas duas penas mais brandas, que são a advertência e a suspensão por prazo não superior a trinta dias. Nunca, na sindicância gue funcione apenas como investigação preliminar tendente a coligir, de maneira inguisitorial, elementos bastantes à imputação de falta ao servidor, em processo disciplinar subsequente (MS 22791, Relator(a): Min. CEZAR PELUSO, Tribunal Pleno, julgado em 13/11/2003, DJ 19-12-2003 PP-00050 EMENT VOL-02137-02 PP-00308).

E ainda:

"A sindicância que vise apurar a ocorrência de infrações administrativa, sem estar dirigida, desde logo, à aplicação de sanção, prescinde da observância dos princípios do contraditório e da ampla defesa, por se tratar de procedimento inquisitorial, prévio à acusação e anterior ao processo administrativo disciplinar". (MS 7983/DF, Rel. Ministro HÉLIO QUAGLIA BARBOSA, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 23/02/2005, DJ 30/03/2005, p. 131 )5.

A legislação municipal converge com o entendimento acima referido, pois sempre considerou a sindicância um procedimento sigiloso e desprovido de contraditório.

Diz o artigo 204 da Lei Municipal n° 8.989/79:

"Art. 204 - A sindicância não comporta contraditório e.tem caráter sigiloso, devendo ser ouvidos, no entanto, os envolvidos nos fatos".

No mesmo sentido o Decreto Municipal n° 43.233/03:

Art. 103. A Sindicância é o procedimento disciplinar de preparação e investigação instaurado pelo Presidente da Comissão Processante, quando os fatos não estiverem esclarecidos ou faltarem elementos indicativos de autoria.

(...)

Art. 104. A Sindicância não comporta o contraditório e tem caráter sigiloso, devendo ser ouvidos todos os envolvidos nos fatos, se necessária a prova testemunhal.

Diferentemente da legislação federal, que prevê duas espécies de sindicância (a inquisitorial, de natureza investigativa e preparatória, e a denominada sindicância contraditória, que pode acarretar punição, desvirtuando-se neste último caso a utilização da terminologia usual)6, os supramencionados atos normativos municipais só prevêem a sindicância propriamente dita, que não pode culminar na aplicação de pena.

A definição de sindicância na legislação municipal, por sua vez, parece harmônica com as lições doutrinárias a respeito das sindicâncias stricto sensu.

Conforme Odete Medauar:

"(...) a sindicância não se instaura contra um servidor: visa apurar possíveis fatos irregulares e seu possível autor. Se o objetivo é apurar fato relativo a determinado servidor ou determinados servidores, cabem as garantias do contraditório e da ampla defesa"7.

José dos Santos Carvalho Filho, por seu turno, diz:

" (...) a sindicância reveste-se de caráter inquisitório, porque é processo não-litigioso; como consequência, não incide o princípio da ampla defesa e do cóntraditório. Caracteriza-se por ser procedimento preparatório, porque objetiva a instauração de um processo principal, quando for o caso, obviamente". (....) "Lamentavelmente, para aumentar a confusão, nem sempre os procedimentos preparatórios são nominados de sindicância, e, o que é pior, há alguns casos em que processos denominados de sindicância não tem a natureza clássica desse procedimento preparatório. Como enfrentar essa dúvida? Do modo mais simples possível, ou seja, dando maior relevo ao aspecto da natureza do processo, e não ao da sua denominação. Quer dizer: mesmo que o processo seja denominado de sindicância, deverá ser tratado como processo disciplinar principal no caso de ter o mesmo objeto atribuído a esta categoria de processos" 8.

Diante desse quadro, cotejando-se, de um lado, a natureza da sindicância, e, de outro, o conteúdo dos precedentes jurisprudenciais mencionados pela CGM, pode ser posta uma primeira premissa: a Súmula Vinculante n° 14/STF realmente não se aplica às sindicâncias propriamente ditas (procedimentos investigativos e preparatórias); ela se destina aos inquéritos policiais e procedimentos investigativos de natureza penal.

Desta premissa, entretanto, não se pode deduzir a conclusão extraída pela E. Controladoria Geral do Município - CGM: a de que, a partir de agora, não mais é necessário conceder vista aos advogados em toda e qualquer sindicância (e procedimentos de mesma natureza9).

Daí que, salvo melhor juízo, não parece recomendável alterar-se a indigitada orientação normativa para nela incluir uma ampla exceção ao dever de conceder vista aos advogados, dever este que, antes de tudo, não é senão um reflexo do princípio constitucional da ampla defesa.

É preciso uma certa cautela na leitura do mencionado precedente, a fim de que se evite estender os efeitos de uma decisão particular a um tal ponto que ela elasticamente se transforme em uma nova regra geral.

Nas Reclamações interpostas contra a não aplicação da Súmula Vinculante n° 14, o STF restringiu-se a responder que naqueles casos concretos (uma sindicância e um inquérito civil) o verbete da súmula não havia sido descumprido, simplesmente porque ela "somente é aplicada a procedimentos de natureza penal10" e diante da "existência de acusado"11.

Negar-se a aplicação de uma súmula vinculante não conduz necessariamente à criação de uma nova norma de caráter geral. Não há uma ligação automática entre uma coisa e outra. Em outras palavras, tais decisões - de caráter marcadamente formal/processual - não têm o poder de produzir uma alteração no ordenamento jurídico. O dever de dar vista de processos aos advogados continua obrigatório como regra geral, de acordo com princípios constitucionais e com a legislação infra-constitucional. A negação deste direito, ao revés, deve ser sempre excepcional.

O cerne da dúvida trazida pela Egrégia Controladoria Geral pode ser assim resumido: os supramencionados precedentes do STF têm a força de impor uma alteração da Orientação Normativa n° 2/13 -PREF? Tais precedentes podem implicar uma mudança nos parâmetros jurídicos subjacentes à matéria? O fato de as sindicâncias não comportarem o contraditório autoriza uma proibição geral do acesso dos advogados aos seus autos?

A resposta é negativa, conforme já se havia mencionado. As decisões não alteraram o cenário jurídico sobre a questão: nenhuma regra nova foi criada a partir delas.

Aliás, quando da edição da referida orientação normativa, a Superior Administração certamente levara em conta não apenas o princípio constitucional da ampla defesa e o estatuto da advocacia, mas também a particular natureza das sindicâncias e procedimentos assemelhados, especialmente a propalada ausência de contraditório.

Isto porque a própria legislação municipal à época já previa expressamente que a sindicância é processo sigiloso e sem contraditório (vide artigo 104 do decreto - já transcrito acima). E nem por isso existia a previsão de que o acesso aos autos era proibido. Ao contrário, o artigo 105 da mesma norma permite a vista dos autos nas sindicâncias:

Art. 105. É assegurada vista dos autos da Sindicância àquele que, mediante requerimento justificado, comprove seu legítimo interesse no feito e a finalidade do pedido.

Não podia ser outro, portanto, o viés adotado na ON n° 2/13-PREF. A despeito do caráter sigiloso de algumas espécies de processo, optou-se por privilegiar uma interpretação conforme a Constituição e convergente com a Lei Federal n. 8.906/94 e com a própria legislação municipal: o amplo acesso às informações é a regra geral imposta à Administração, 

Vale destacar, a respeito, a conclusão desta PGM/AJC, que enfatizou a harmonia existente entre os dispositivos do Estatuto da Advocacia e a Lei Municipal n° 14.141/06, bem como a possibilidade de vista dos autos (mesmo nos casos de sigilo):

"Portanto, os três dispositivos tratam do assunto do mesmo modo, já que garantem ao advogado o direito de obter vista de processos administrativos, exigindo a apresentação de instrumento de mandato somente se a matéria estiver sujeita a sigilo".

E os indigitados precedentes do STF, como já mencionado, não trouxeram inovação jurídica capaz de ensejar uma alteração da ON n° 2/13-PREF para nela incluir uma exceção de amplo alcance. A abertura de uma exceção de tamanha magnitude, para abarcar de plano todo e qualquer procedimento preparatório e investigativo, afrontaria o ordenamento, uma vez que o acesso,à informação deve ser sempre a regra; o sigilo, a exceção.

O princípio democrático mostra-se incompatível com a fixação de uma regra geral vedando o acesso aos autos de sindicâncias administrativas. Se até em procedimentos da esfera penal - em regra mais graves - o acesso dos advogados deve ser permitido, não se vislumbra porque isto haveria de ser diferente no caso das sindicâncias administrativas deste Município.

A esse respeito, merece ser transcrito o alerta do Ministro Celso de Mello12:

"É preciso não perder de perspectiva que a Constituição da República não privilegia o sigilo, nem permite oue se este se transforme em "práxis" governamental, sob pena de grave ofensa ao princípio democrático, pois, consoante adverte Norberto Bobbio, em lição magistral sobre o tema ("O Futuro da Democracia, 1986, Paz e Terra), não hános modelos políticos que consagram a democracia, espaço possível reservado ao mistério".

Não por outro motivo diversos julgados de nossos tribunais enfatizam a obrigatoriedade de se conceder vista aos advogados em quaisquer processos administrativos (inclusive sindicâncias).

Confira-se, nesse sentido, alguns julgados do Superior Tribunal de Justiça (STJ):

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. PROCESSO ADMINISTRATIVO. VISTAS DOS AUTOS E CÓPIAS DE PEÇAS PROCESSUAIS.PODER LEGÍTIMO DO ADVOGADO. LEI N° 8.906/94.

1. Mandado de segurança impetrado no intuito de determinar que a autoridade coatora conceda vistas imediatamente dos autos de Processo Administrativo Disciplinar instituído pela Portaria Ministerial n° 612/98 às advogadas legalmente constituídas pelo Impetrante, bem como o fornecimento de cópia do Relatório Final e demais peças dos aludidos autos.

2. A Lei n° 8.906/94 dispõe que: "Art. 7° - São direitos do advogado: I - exercer, com liberdade, a profissão em todo o território nacional; (...); XIII - examinar, em Qualquer órgão dos Poderes Judiciário e Legislativo, ou da administração pública em geral, autos de processos findos ou em andamento, mesmo sem procuração, quando não estejam sujeitos a sigilo, assegurada a obtenção de cópias, podendo tomar apontamentos; (...); XV - ter vista dos processos judiciais ou administrativos de qualquer natureza, em cartório ou na repartição competente, ou retirá-los pelos prazos legais".

3. Comprovado o desrespeito do direito garantido ao advogado da parte pela Lei n° 8.906/94. impõe-se o deferimento de mandado de segurança, asseaurando-lhe o poder legítimo de tomar conhecimento dos atos processuais iá praticados no Processo Administrativo em ouestão e obter cópias das peças gue entender.

4. Segurança concedida.

(MS 6.356/DF, Rel. Ministro JOSÉ DELGADO, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 22/09/1999, DJ 17/12/1999, p. 312). 

 

PROCESSUAL CIVIL. ADVOGADO. DIREITO DE RETIRAR AUTOS PROCEDIMENTO

ADMINISTRATIVO. LEI N° 8.906/94.

1.0 direito de vista dos autos fora do Cartório pelo advogado devidamente constituído, encontra-se devidamente fundamentado na Lei n° 8.906/94, independentemente de processo judicial ou administrativo.

2. Recurso provido.

(RMS 11.085/RJ, Rel. Ministro EDSON VIDIGAL, QUINTA TURMA, julgado em 01/03/2001, DJ 02/04/2001, p. 312).

E também dos Tribunais Regionais Federais:

Ementa: ADMINISTRATIVO - MANDADO DE SEGURANÇA - VISTA DE PROCESSO

ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR A ADVOGADO - POSSIBILIDADE - LEI N° 8.906 /94. 1. Os termos do inciso XV do art. 7° da Lei n. 8.906/94, permitem ao advogado obter vista de processos administrativos de qualquer natureza, na repartição competente, ou retirá-los pelo prazo legal* ressalvadas as hipóteses de segredo de justiça ou existência de documentos originais de difícil restauração e ocorrência de circunstância que justifique a permanência dos autos na repartição, que não restou comprovada. 2, Precedentes. 3. Apelação e remessa oficial, tida por interposta, desprovidas. (TRF-1 - APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA AMS 29001 DF 2004.34.00.029001-2; publicação: 14/11/2005).

Ementa: MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. SINDICÂNCIA. OBTENÇÃO DE CÓPIAS DOS AUTOS DO PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. PRERROGATIVA DO ADVOGADO CONSTITUÍDO PELOS SERVIDORES INVESTIGADOS. PRINCÍPIOS DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA. VIOLAÇÃO. REMESSA OFICIAL IMPROVIDA. - Administrativo. Processo administrativo disciplinar. Exame e obtenção de cópias pelo advogado do servidor público investigado em sindicância. Direito constitucionalmente garantido. - A Sindicância, enquanto modalidade sumária do processo administrativo disciplinar, deve obedecer aos Princípios da Ampla Defesa e do Contraditório, nos termos do previsto no art. 5°, inc. IV , da Constituição Federal. Os documentos que compõem a sindicância instaurada para fins de responsabilização de servidor público por irregularidades porventura praticadas não possuem caráter sigiloso e constitui direito do investigado e de seu advogado à vista dos autos do procedimento para melhor análise e a obtenção de cópias para a elaboração da defesa escrita, nos termos do art. 7°, inc. XIII, da Lei n° 8.906 /94. - Remessa oficial improvida. (TRF-5 - Remessa Ex Offício REOMS 93949 PE 2005.83.00.012544-0; publicação: 31/07/2008).

Merece ser esclarecido, por fim, a questão da terminologia empregada pela CGM: pleiteia-se que a ON n° 2/13-PREF não se aplique "aos procedimentos preparatórios e investigativos voltados à apuração de eventual responsabilidade funcional'.

O termo poderia induzir a alguma dúvida porque a lei que criou a CGM (Lei n° 15.764/13) parece, a partir de uma leitura mais apressada, ter incluído os inquéritos administrativos como uma espécie do gênero procedimentos preparatórios13.

Esta possível interpretação não merece prevalecer. Como se sabe, os inquéritos não são procedimentos de investigação e preparação, mas sim procedimentos punitivos. Utilizando como parâmetro a tèrminologia do Decreto Municipal n° 43.233/03, que trata dos procedimentos disciplinares, percebe-se com facilidade que os inquéritos não estão incluídos no capítulo destinado aos "procedimentos de investigação e preparação" e sim no capítulo denominado "procedimentos disciplinares de exercício de pretensão punitiva"14.

É importante deixar registrada a ressalva, por cautela, pois a competência da CGM é muito ampla, nela se incluindo até mesmo 3 instauração de inquérito15. Fica, portanto, ressalvado que o presente parecer trata apenas dos procedimentos estritamente preparatórios e investigativos sem conteúdo punitivo. Daí que as menções feitas à inexistência de contraditório nas sindicâncias referem-se exclusivamente a estas espécies de procedimento, não se podendo estender tais observações a todas as investigações conduzidas pela CGM.

Ante o exposto, pode-se que concluir que:

(i) a Súmula Vínculante n° 14/STF realmente não parece aplicável às sindicâncias administrativas, pois, segundo precedentes do próprio STF, ela se aplica apenas a investigações da esfera penal.

(ii) a conclusão acima, porém, não autoriza a Prefeitura a alterar a Orientação Normativa n° 2/13-PREF, pois os referidos precedentes jurisprudenciais trazidos pela consulente não provocaram uma alteração do panorama jurídico relativo à matéria: o dever de franquear aos advogadas acesso aos autos de proccssos administrativos (mesmo os sigilosos) continua sendo a regra geral e obrigatória.

Com estas considerações, encaminho o presente para deliberação do Sr. Procurador Geral do Município.

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São Paulo, 21/03/2014.

FERNANDO HENRIQUE MINCHILLO CONDE

Procurador do Município OAB/SP n° 195.025

PGM/AJC

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De acordo.

São Paulo, 16/04/2014.

TIAGO ROSSI

PROCURADOR ASSESSOR CHEFE

AJC OAB/SP 195.910

PGM

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1 Lavrada pelo i. procurador Ricardo Gauche de Matos.
2 Informação n° 2905, da lavra do i. procurador Guilherme Bueno de Camargo (fls. 05/07)
3 A única dilerença é que nos casos de sigilo se exige a apresentação de procuração. Diz a referida Orientação Normativa:
1- Sem prejuízo das normas reguladoras dos processos administrativos de caráter geral ou especial e das que tratam de acesso a informação, todas as unidades da Prefeitura do Município de São Paulo deverão autorizar o advogado, mediante requerimento e independentemente da apresentação de instrumento de procuração, a examinar autos de processos, findos ou não, e de obter certidões ou cópias reprográficas de dados e documentos que o integram, quando não esteiam sujeitos a sigilo:
2- Quando tratar-se de matéria sujeita a sigilo ou de interesse pessoal, nos termos do § 2°, artigo 17, do Decreto Municipal 53.623/12, a vista será permitida a advogado mediante apresentação de identificação profissional e instrumento de procuração, que deverá ser juntado ao respectivo processo;
3- O acesso do advogado a informações de caráter sigiloso obedecerá o estabelecido no Decreto 53623/12; 
4 Ag. Reg. na Reclamação 10.771/RJ, Min. Marco Aurélio, j. 04.02.2014.
5 A citação refere-se a apenas um dos trechos da Ementa.
6 Cf. artigo 145 da Lei Federal n° 8.112/90.
7 Direito Administrativo Moderno, 17a ed, São Paulo, RT, 2013, p. 352.
8 Manual de Direito Administrativo, 17° ed. 2007, Lúmen Júris, RJ, p. 848.
9 Como se verá adiante, a expressão "procedimentos disciplinares preparatórios e investigativos" engloba tão-somente os procedimentos que não possam de antemão redundar na aplicação db penalidades ou restringir direitos dos servidores.
10 Ag. Reg. na Reclamação 8.458, ES, Min. Rel. Gilmar Mendes.
11 Ag. Reg. na Reclamação 10.771, RJ Min. Rel. Marco Aurélio.
12 Extraído do corpo do seu voto na Proposta de Súmula Vinculante 16,DF (relativa à edição da Súmula n° 14/STF.
13 Segundo o artigo 138, compete ao Controlador Geral determinar a instauração de "apurações preliminares, inspeções, sindicâncias e demais procedimentos disciplinares de preparação e investigação, inclusive inquéritos administrativos para o exercício da pretensão punitiva"
14 Cf. artigo 96 e ss. do Decreto 43.233/03.
15 Além disso, há o Decreto n° 54.838/14, que trata da "sindicância patrimonial".

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Ofício n° 142/2014/CGM-G

INTERESSADO: CONTROLADORIA GERAL DO MUNICÍPIO

ASSUNTO: Solicitação de alteração da Orientação Normativa n° 02/2013. Acesso de advogados aos autos dos processos administrativos.

Cont. da Informação n9 492/2014-PGM.AJC

SECRETARIA DOS NEGÓCIOS JURÍDICOS

Senhor Secretário

Encaminho estes autos a Vossa Excelência, com a manifestação da Assessoria Jurídico-Consultiva desta Procuradoria Geral, com a qual concordo, no sentido de que não se mostra recomendável a alteração da Orientação Normativa n° 2/13 - PREF, salientando que as regras excepcionais de restrição de acesso poderão ser aplicadas, se presentes, no caso concreto, os pressupostos do Decreto n° 53.623/2012 (e alterações posteriores), nos termos do item 3 da citada Orientação Normativa.

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São Paulo,   /  /2014.

ROBINSON SAKIYAMA BARREIRINHAS

PROCURADOR GERAL DO MUNICÍPIO

OAB/SP n° 173.521

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Ofício 142/2014/CGM-G 

INTERESSADO: CONTROLADORIA GERAL DO MUNICÍPIO E DEPARTAMENTO DE PROCEDIMENTOS DISCIPLINARES.

ASSUNTO: Solicitação de alterações da Orientação Normativa n° 02/2013. Consulta à AJC-PGM que conclui não ser recomendável. Acolhimento.

Informação n.° 1396/2014 -SNJ.G.

CGM

Senhor Controlador

Devolvo o presente, acolhendo integralmente, por seus próprios fundamentos, o parecer da AJC-PGM.

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São Paulo, 04/06/2014.

LUIS FERNANDO MASSONETO

Secretário Municipal dos Negócios Jurídicos

SNJ.G.

Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo