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LEI Nº 17.923 de 10 de Abril de 2023

Institui a Política Municipal de Atenção Integral a Crianças e Adolescentes em Situação de Rua e na Rua, e dá outras providências.

LEI Nº 17.923, DE 10 DE ABRIL DE 2023

(Projeto de Lei nº 253/21, dos Vereadores Juliana Cardoso – PT, Carlos Bezerra Jr. – PSDB, Daniel Annenberg – PSB, Eduardo Matarazzo Suplicy – PT, Elaine Do Quilombo Periférico – PSOL, Fabio Riva – PSDB, Luana Alves – PSOL, Professor Toninho Vespoli – PSOL e Senival Moura – PT)

Institui a Política Municipal de Atenção Integral a Crianças e Adolescentes em Situação de Rua e na Rua, e dá outras providências.

RICARDO NUNES, Prefeito do Município de São Paulo, no uso das atribuições que lhe são conferidas por lei, faz saber que a Câmara Municipal, em sessão de 14 de março de 2023, decretou e eu promulgo a seguinte lei:

CAPÍTULO I

DA POLÍTICA MUNICIPAL DE ATENÇÃO INTEGRAL A CRIANÇAS E ADOLESCENTES EM SITUAÇÃO DE RUA E NA RUA

Seção I

Disposições gerais

Art. 1º Fica instituída a Política Municipal de Atenção Integral a Crianças e Adolescentes em Situação de Rua e na Rua, de acordo com os princípios, diretrizes e objetivos previstos nesta Lei, e em consonância com a Constituição Federal e o Estatuto da Criança e do Adolescente e outras legislações pertinentes.

Art. 2º Para fins desta Lei, consideram-se crianças e adolescentes em situação de rua e na rua os sujeitos de até 18 (dezoito) anos de idade incompletos, em desenvolvimento com direitos violados, em situação de vulnerabilidade e/ou risco pessoal e social por motivo de rompimento ou fragilidade do cuidado e dos vínculos familiares e comunitários, em situação de pobreza ou pobreza extrema, com dificuldade de acesso ou permanência nas políticas públicas, sendo caracterizados por sua heterogeneidade.

§ 1º Para fins desta Lei, entende-se por crianças e adolescentes em situação de rua o grupo populacional heterogêneo que utiliza logradouros públicos ou áreas degradadas como espaço de moradia de forma permanente ou intermitente, sozinhas ou acompanhadas de suas famílias ou responsáveis.

§ 2º Para fins desta Lei, entende-se por crianças e adolescentes na rua como grupo populacional heterogêneo que utiliza logradouros públicos e áreas degradadas como espaço de sobrevivência e trabalho de forma permanente e/ou intermitente.

Seção II

Dos princípios

Art. 3º São princípios da Política Municipal de Atenção Integral a Crianças e Adolescentes em Situação de Rua e na Rua:

I - compreensão da criança e do adolescente em situação de rua e na rua como sujeitos de direitos, pessoas em desenvolvimento e público prioritário das políticas públicas, reconhecendo seu contexto social e familiar, suas trajetórias de vida, suas demandas e interesses como dimensões interdependentes e buscando uma atuação intersetorial na garantia da proteção integral;

II - promoção dos direitos das crianças e dos adolescentes em situação de rua e na rua, mediante atendimento humanizado integral e proteção contra todas as formas de violência;

III - reconhecimento da rua como espaço de violação de direitos e de extremo risco que exige atuação integrada do Poder Público;

IV - respeito às singularidades e diversidades, considerando o ciclo de vida, raça, etnia, identidade de gênero, orientação sexual, identidade territorial, nacionalidade, posição política, religião, deficiência, entre outros, visando ao fortalecimento da identidade e de vínculos de pertencimento socioculturais;

V - reconhecimento de que as crianças e os adolescentes em situação de rua e na rua estão mais sujeitos a serem vítimas de trabalho infantil, principalmente as piores formas definidas pela Convenção 182 da Organização Internacional do Trabalho – OIT, promulgada pelo Decreto nº 10.088, de 2019, sendo elas:

a) todas as formas de escravidão ou práticas análogas à escravidão, como venda e tráfico de crianças, sujeição por dívida, servidão, trabalho forçado ou compulsório, inclusive recrutamento forçado ou obrigatório de crianças para serem utilizadas em conflitos armados;

b) utilização, demanda e oferta de criança para fins de prostituição, produção de pornografia ou atuações pornográficas;

c) utilização, recrutamento e oferta de criança para atividades ilícitas, particularmente para a produção e tráfico de entorpecentes conforme definidos nos tratados internacionais pertinentes;

d) trabalhos que, por sua natureza ou pelas circunstâncias em que são executados, são suscetíveis de prejudicar a saúde, a segurança e a moral da criança;

VI - reconhecimento do direito à sexualidade segura, ao planejamento reprodutivo e à proteção à dignidade sexual;

VII - reconhecimento dos direitos, do livre-arbítrio e da autonomia de gestantes em situação de rua;

VIII - promoção do direito à convivência familiar e comunitária das crianças e adolescentes em situação de rua e na rua, bem como proteção integral da família em situação de vulnerabilidade social;

IX - a corresponsabilidade entre Estado, iniciativa privada e sociedade civil na proteção integral a crianças e adolescentes, especialmente em espaços de acesso público administrados por organizações privadas.

Seção III

Das diretrizes

Art. 4º São diretrizes da Política Municipal de Atenção Integral a Crianças e Adolescentes em Situação de Rua e na Rua:

I - priorizar o atendimento e garantir o acesso e permanência de crianças e adolescentes em situação de rua e na rua nas políticas, programas, planos, projetos e serviços municipais;

II - implementar políticas públicas de forma integral, interdisciplinar e intersetorial com ações territoriais, transversais e articuladas, visando o enfrentamento de situações de risco pessoal e social;

III - integrar esforços com outros entes federativos, sistema de garantia de direitos, sociedade civil e instituições de ensino e pesquisa para elaboração, execução, monitoramento e avaliação das políticas públicas;

IV - respeitar as singularidades de cada território e considerar as potencialidades e os recursos locais na elaboração, execução, monitoramento e avaliação das políticas públicas;

V - promover o enfrentamento do preconceito e discriminação por meio de campanhas, ações educativas e outras estratégias que favoreçam oportunidades efetivas de inclusão cidadã, familiar e de acolhimento humanizado;

VI - fortalecer ações de educação permanente dos agentes públicos para ampliar o acesso a direitos e serviços e qualificar o atendimento deste grupo populacional;

VII - viabilizar o controle social dos direitos de crianças e adolescentes em situação de rua e na rua, promovendo a interlocução e a integração com as instâncias de participação social e processos de escuta de crianças e adolescentes;

VIII - estabelecer fluxos de encaminhamento e acompanhamento da rede de proteção integral;

IX - considerar os princípios, as diretrizes, os objetivos e ações desta política na elaboração dos instrumentos municipais de planejamento e de orçamento.

Seção IV

Dos objetivos

Art. 5º São objetivos da Política Municipal de Atenção Integral a Crianças e Adolescentes em Situação de Rua e na Rua:

I - promover, em todas as suas dimensões, os direitos de crianças e adolescentes em situação de rua e na rua;

II - garantir a atuação na prevenção e promoção dos direitos das famílias de crianças e adolescentes em situação de rua e na rua;

III - enfrentar o trabalho infantil, considerando a pluralidade das demandas das famílias das crianças e dos adolescentes envolvidos;

IV - qualificar de forma continuada os agentes públicos e orientar os serviços para o desenvolvimento de metodologias de educação social de rua e outras abordagens de atendimento;

V - viabilizar a gestão da informação voltada para a integração intersetorial das informações produzidas nos atendimentos e para a produção de indicadores e metas que possibilitem o monitoramento e a avaliação da política;

VI - produzir conhecimento e incentivar a realização de diálogos e pesquisas sobre a temática das crianças e adolescentes em situação de rua e na rua;

VII - promover ações para prevenção do uso de álcool e/ou outras drogas, bem como fortalecer estratégias de cuidado junto às crianças e adolescentes que façam uso dessas substâncias.

CAPÍTULO II

DAS AÇÕES MUNICIPAIS PARA GARANTIA DOS DIREITOS DAS

CRIANÇAS E ADOLESCENTES EM SITUAÇÃO DE RUA E NA RUA

Art. 6º Para a consecução dos objetivos previstos nesta Lei, o Poder Público promoverá políticas setoriais e intersetoriais, de forma transversal e articulada com os demais entes federativos, sistema de garantia de direitos, sociedade civil e instituições de ensino e pesquisa, ofertando serviços diversos, complementares e direcionados para as especificidades e necessidades de crianças e adolescentes em situação de rua e na rua.

§ 1º O Poder Público poderá revisar, ampliar e criar serviços, programas e projetos com vistas a ampliar a proteção social e efetivar a garantia de direitos a crianças e adolescentes em situação de rua e na rua, observados os ritos, as normativas específicas de cada política pública, os resultados e os territórios identificados na pesquisa censitária sobre crianças e adolescentes em situação de rua e na rua e outros estudos e diagnósticos.

§ 2º Para os fins do caput, devem ser implementadas ações conjuntas para elaboração de instrumentos e ferramentas que viabilizem a comunicação intersecretarial e o compartilhamento de informações sobre o atendimento de cada criança e adolescente em situação de rua e na rua, por meio de:

I - protocolos integrados de identificação, de atendimento e de encaminhamento;

II - integração de bases de dados, em conformidade com a Lei nº 13.709, de 2018;

III - ofertas de capacitação;

IV - estratégias de acompanhamento especializado, individualizado e específico.

§ 3º Os protocolos integrados deverão garantir compartilhamento de informações entre os órgãos municipais competentes.

§ 4º Os protocolos integrados deverão contemplar a comunicação ao Conselho Tutelar e ao Ministério Público nas hipóteses de trabalho infantil, exploração sexual e outras violações de direitos.

§ 5º Serão desenvolvidas ações preventivas à situação de rua de crianças e adolescentes a partir de iniciativas intersetoriais que promovam a proteção social a famílias em situação de risco e vulnerabilidade social devido à insuficiência de renda, insegurança alimentar e nutricional, situações de violência intrafamiliar, vulnerabilidades territoriais, condições de saúde e de segurança, entre outras.

§ 6º O Poder Público produzirá anualmente, a partir de metodologia que assegure transparência e controle social, relatório de execução orçamentária dos recursos destinados a projetos e programas das diferentes políticas públicas voltadas para crianças e adolescentes em situação de rua e na rua.

§ 7º O Poder Público viabilizará o acesso de famílias de crianças e adolescentes em situação de rua e na rua a programas de transferência de renda e outros benefícios, garantindo sua orientação e acompanhamento, a fim de promover a segurança de sobrevivência por meio da renda e autonomia.

§ 8º O Plano de Contingência para Situações de Baixas Temperaturas, publicado anualmente, deverá garantir medidas de proteção de crianças e adolescentes em situação de rua e na rua e suas famílias em períodos de baixas temperaturas.

§ 9º Conforme o desenvolvimento do serviço de atendimento, este pode disponibilizar um subsídio financeiro aos adolescentes por tempo delimitado (Bolsa-convivência), a fim de facilitar o processo de retorno à família e/ou comunidade de origem, o fortalecimento dos vínculos e o favorecimento da autonomia.

Art. 7º Compete ao Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente – CMDCA, dentro de suas atribuições, acompanhar e monitorar as ações da Política Municipal de Atenção Integral a Crianças e Adolescentes em Situação de Rua e na Rua.

Parágrafo único. O CMDCA criará instância temporária para implementação da política definida nesta Lei, com a ampliação da participação para outros segmentos e representações, que será sucedido pelo monitoramento permanente, nos termos da regulamentação desta Lei.

Art. 8º Deverá ser realizado, até o final do segundo ano de gestão, preferencialmente no primeiro, em cada mandato do Poder Executivo Municipal, pesquisa censitária sobre crianças e adolescentes em situação de rua e na rua.

Seção I

Das políticas de assistência e desenvolvimento social

Art. 9º É assegurado às crianças e adolescentes em situação de rua e na rua o direito à convivência familiar e comunitária, cabendo ao Poder Público ofertar serviços, programas, projetos e benefícios com vistas à proteção integral da família em situação de vulnerabilidade e risco social, levando sempre em conta os melhores interesses da criança e do adolescente em condição de liberdade e dignidade.

§ 1º As crianças e adolescentes em situação de rua e na rua, inclusive aquelas que se encontram em situação de trabalho infantil, constituem público prioritário para os serviços de convivência e fortalecimentos de vínculos familiares e comunitários.

§ 2º Os serviços de assistência social na execução do trabalho social com famílias, nas ofertas voltadas ao fortalecimento de vínculos e nos atendimentos domiciliares, ao identificar casos de crianças e adolescentes em situação de rua e na rua, devem buscar a garantia dos seus direitos, promovendo reflexões sobre a situação de risco atual junto à família, construindo estratégias para sua superação e intervindo em situações de trabalho infantil e demais violações de direito com os encaminhamentos necessários.

§ 3º Os serviços socioassistenciais devem orientar, apoiar e acompanhar o acesso prioritário de famílias com crianças e adolescentes em situação de rua e na rua aos programas de transferência de renda e outros benefícios, a fim de promover a segurança de sobrevivência por meio da renda e autonomia.

§ 4º A abordagem social a famílias com crianças e adolescentes em situação de rua deverá propor os encaminhamentos emergenciais necessários e enfatizar os serviços de acolhimento para famílias como alternativa para maior proteção social.

Art. 10. O atendimento social a crianças e adolescentes em situação de rua e na rua desacompanhados dos responsáveis, nas várias tipologias cabíveis, deverá ser realizado de maneira personalizada e específica, objetivando a construção de um projeto de vida, junto à criança ou ao adolescente em situação de rua e na rua, que oportunize a saída da situação de rua e viabilize o exercício de seus direitos, respeitando suas singularidades e histórias de vida e compreendendo:

I - construção gradual de vínculos de confiança, recorrendo a atividades lúdicas e pedagógicas;

II - escuta qualificada e sensível associada a uma atitude de compreensão e acolhimento, suscitando reflexões sobre a situação de risco atual e a busca de estratégias para sua superação;

III - estudo dos casos e das propostas de encaminhamento de maneira compartilhada com a equipe e parceiros da rede de políticas públicas, a fim de promover proteção integral à criança ou adolescente;

IV - acompanhamento individualizado, com dimensionamento adequado de equipe técnica e articulação com Sistema de Garantia de Direitos, de modo a promover o acesso e a permanência nos serviços, programas e projetos aos quais as crianças e adolescentes em situação de rua e na rua, e suas famílias, estejam vinculados;

V - planejamento de atividades lúdicas e socioeducativas voltadas para as potencialidades e necessidades das crianças e adolescentes;

VI - garantia do protagonismo da criança e do adolescente na construção do plano de atendimento.

§ 1º A abordagem social à criança e ao adolescente em situação de rua e na rua ocorrerá de forma planejada e continuada, com equipe multiprofissional especializada e específica, a partir do diagnóstico do território e da busca ativa.

§ 2º A abordagem social à criança e ao adolescente desacompanhado ocorrerá de maneira integrada à rede socioassistencial e às demais políticas públicas, promovendo a atenção e proteção integral da criança ou adolescente, articulando-se particularmente com os serviços especializados de atendimento a crianças e adolescentes em situação de rua e na rua.

§ 3º O Poder Público deverá prover serviços de atendimento integral, em espaços estruturados e adequados, que garantam às crianças e adolescentes em situação de rua e na rua acesso à alimentação, higiene pessoal, locais para convivência, associados à escuta qualificada, acompanhamento e orientação individual e grupal, atividades socioeducativas, trabalho social com as famílias, análise das demandas, propostas de encaminhamento e articulação para retorno ao domicílio, atuando de maneira integrada com os serviços de abordagem e de acolhimento e com outras políticas sociais.

§ 4º Aplica-se o disposto nos incisos I a VI do caput ao atendimento a crianças e adolescentes em situação de rua e na rua acompanhados pelos serviços de proteção social a vítimas de violência.

§ 5º Os adolescentes em situação de rua e na rua que se encontram em cumprimento de medidas socioeducativas em meio aberto serão acompanhados com proximidade pelas equipes técnicas de referência da rede socioassistencial, nos termos previstos nos incisos I a VI do caput deste artigo.

Art. 11. O acolhimento de crianças e adolescentes em situação de rua deverá considerar as especificidades da condição e trajetória de vida de cada usuário no atendimento ofertado, podendo ocorrer em distintas tipologias e modalidades de serviço, conforme avaliação de fatores relacionados à situação de cada criança e adolescente, entre os quais:

I - transitoriedade da situação de rua em razão da ruptura de vínculos familiares, impossibilidade temporária de cumprimento das funções de cuidado e proteção pelos responsáveis ou destituição do poder familiar;

II - proximidade do território do serviço em relação à família nuclear ou extensa;

III - faixa etária, gênero, condições físicas, de saúde e de segurança da criança ou adolescente;

IV - presença de pais ou responsáveis em situação de rua.

§ 1º O acolhimento a crianças e adolescentes em situação de rua não se dará em espaços de segregação e isolamento, mas sim de proteção social e garantia de direitos, devendo assegurar o atendimento individual e personalizado, com criação gradual de vínculos de confiança e escuta qualificada e sensível, com uma atitude de compreensão em relação a eventual instabilidade no início do acolhimento.

§ 2º Os serviços de acolhimento institucional para crianças e adolescentes em situação de rua devem favorecer o restabelecimento dos vínculos familiares sempre que possível, realizando trabalho social com as famílias das crianças e adolescentes, e promover o desenvolvimento da autonomia dos acolhidos, com a preparação gradativa para o retorno para suas comunidades de origem e/ou para a vida adulta.

§ 3º Os serviços de acolhimento institucional adotarão metodologia específica de trabalho técnico em articulação com a rede socioassistencial, com outras políticas públicas e com órgãos do Sistema de Garantia de Direitos de modo a proporcionar respostas mais efetivas às demandas das crianças e adolescentes em situação de rua.

§ 4º Os serviços de acolhimento institucional deverão apresentar equipe com formação especializada e dimensionada para atender ao público de crianças e adolescentes em situação de rua e na rua, com capacidade para criar e inovar na metodologia de atendimento visando o acesso e a continuidade do atendimento nos serviços da rede socioassistencial.

Art. 12. Cabe ao Poder Público municipal garantir a educação continuada dos profissionais dos serviços e equipamentos socioassistenciais que atendem crianças e adolescentes em situação de rua e na rua, promovendo o aprimoramento constante de técnicas e recursos metodológicos adequados ao trabalho com este público, bem como a ampliação de olhares e abordagens.

Art. 13. As unidades estatais seguirão o disposto nesta Seção para atendimento da criança e adolescente em situação de rua e na rua e para supervisão técnica dos serviços, cabendo-lhes promover ativamente a articulação da rede socioassistencial com outras políticas públicas e órgãos do Sistema de Garantia de Direitos.

Art. 14. A articulação da rede socioassistencial considerará as dimensões territoriais apontadas pela pesquisa censitária e outros diagnósticos para a implementação de serviços especializados especificados nesta Seção, fluxos e protocolos integrados de modo a favorecer o acompanhamento dos casos de forma individualizada.

Art. 15. Serão desenvolvidas estratégias e ações de enfrentamento ao trabalho infantil em espaços de acesso público administrados por organizações privadas.

Seção II

Das políticas de direitos humanos e cidadania

Art. 16. A política de direitos humanos e cidadania articulará, de maneira intersetorial e transversal, a implementação de políticas, programas, serviços e ações voltadas à promoção dos direitos das crianças e dos adolescentes em situação de rua e na rua e suas famílias e em complementariedade à rede de proteção social prevista nesta Lei.

§ 1º As ações de articulação garantirão a formação de agentes públicos sobre a temática de crianças e adolescentes em situação de rua e na rua, suas singularidades, especificidades, seus direitos e a rede de atendimento municipal.

§ 2º As ações de articulação contarão com campanhas educativas e preventivas para a divulgação dos direitos das crianças e dos adolescentes, bem como informações sobre formas de fortalecimento desses direitos para as crianças e adolescentes em situação de rua e na rua.

§ 3º As políticas municipais de direitos humanos deverão abarcar, em suas ações e planejamentos, recortes transversais em relação à diversidade de raça, etnia, identidade de gênero, sexualidade, uso de álcool e drogas, crença, nacionalidade, ciclos de vida, desaparecimento e educação em direitos humanos.

§ 4º Por meio de articulação com os Conselhos Tutelares da Cidade de São Paulo, a política de direitos humanos e cidadania desenvolverá ações de fortalecimento da rede de proteção e defesa dos direitos das crianças e adolescentes em situação de rua e na rua.

Art. 17. Em articulação e cooperação com o CMDCA, o Comitê Intersetorial da Política Municipal para a População em Situação de Rua – Comitê PopRua, Comissão Municipal de Erradicação do Trabalho Infantil (CMETI), Conselho Municipal de Políticas Públicas de Drogas e Álcool (COMUDA), Comissão Municipal de Enfrentamento à Violência, Abuso e Exploração Sexual contra Crianças e Adolescentes (CMESCA), o Conselho Municipal de Assistência Social (COMAS) e outros conselhos de direitos, a política de direitos humanos e cidadania promoverá o fortalecimento da política municipal de atenção integral a crianças e adolescentes em situação de rua e na rua.

§ 1º O Subcomitê Permanente de Zeladoria Urbana, que integra as ações do Comitê PopRua, assegurará o direito das crianças e adolescentes em situação de rua e na rua e suas famílias em ações de zeladoria urbana de acordo com as legislações vigentes.

§ 2º As comissões permanentes do CMDCA assegurarão, dentro de suas competências, o direito das crianças e adolescentes em situação de rua e na rua e suas famílias, inclusive em ações de planejamento financeiro do Fundo Municipal da Criança e do Adolescente – FUMCAD.

Seção III

Da política habitacional

Art. 18. O Poder Público deverá priorizar o acesso de famílias com crianças e adolescentes em situação de rua na política habitacional, oferecendo soluções habitacionais definitivas e observando as especificidades de cada família, seu grau de autonomia e organização.

§ 1º O atendimento habitacional será realizado prioritariamente em modalidades que favoreçam o acesso à moradia, independente da propriedade do imóvel pelo beneficiário, não excluindo outras modalidades de atendimento.

§ 2º O atendimento habitacional para as famílias com crianças e adolescentes em situação de rua deverá ser articulado com outras políticas setoriais, especialmente com ações de geração de renda, saúde, educação, direitos humanos e assistência e desenvolvimento social.

Seção IV

Das políticas de saúde

Art. 19. Fica garantido o acesso universal e igualitário às crianças e adolescentes em situação de rua e na rua e suas famílias aos equipamentos da Rede de Atenção à Saúde (RAS) e às ações e serviços de promoção, proteção e recuperação da saúde, independente de idade, raça/cor, etnia, crença, nacionalidade, orientação sexual, identidade de gênero, estado de saúde, escolaridade, limitação física, intelectual, funcional e outras, de modo a promover o desenvolvimento físico, cognitivo, psicológico e social.

Art. 20. Será incentivada a atuação dos profissionais de saúde com base na Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares no Sistema Único de Saúde – SUS como forma de favorecer a visão ampliada do processo saúde/doença e da promoção integral da saúde.

Art. 21. A política municipal de saúde deverá viabilizar projetos e ações de enfrentamento aos problemas de saúde de gestantes, crianças e adolescentes em situação de rua e na rua e suas famílias, tais como agravos, transtorno mental, deficiência, situação de risco, vulnerabilidade ou violência, uso de álcool e outras drogas.

Art. 22. As equipes das Unidades Básicas de Saúde e demais unidades da RAS deverão planejar ações conjuntas com os serviços socioassistenciais para acompanhamento em saúde das crianças e adolescentes em situação de rua e na rua e suas famílias.

Parágrafo único. O planejamento das ações conjuntas previstas no caput considerará o compartilhamento de informações com outros órgãos quando pertinente, sobretudo em casos de trabalho infantil, exploração sexual e outras violações de direito.

Art. 23. A política municipal de saúde promoverá estratégias para monitorar o cuidado humanizado às gestantes em situação de rua e na rua durante todas as etapas de acompanhamento do pré-natal, parto, puerpério e no planejamento reprodutivo pós-parto.

§ 1º Serão disponibilizadas orientações sobre os cuidados necessários às gestantes e aos profissionais, de modo a priorizar a segurança e bem-estar da criança e da gestante.

§ 2º Em caso de situações de risco à gestante ou à criança durante qualquer etapa do pré-natal, parto ou puerpério, deverão ser acionados os órgãos responsáveis para garantir a atenção à gestante e à sua rede de apoio.

Art. 24. Serão promovidas ações para prevenção da gravidez na adolescência e de infecções sexualmente transmissíveis – ISTs junto às crianças e aos adolescentes em situação de rua e na rua e suas famílias, com foco nos direitos sexuais e reprodutivos.

Art. 25. Para qualificar a abordagem das crianças e adolescentes em situação de rua e na rua e suas famílias serão realizadas ações de trabalho integrado e articulado entre os Consultórios na Rua e os serviços de abordagem da rede socioassistencial.

Art. 26. Serão criadas estratégias para assegurar o atendimento à saúde bucal preventivo, restaurador e de urgência, de crianças e adolescentes em situação de rua.

Art. 27. A política de saúde deverá estabelecer e monitorar indicadores de acompanhamento em saúde, bem como fomentar espaços junto à rede de políticas públicas para a discussão periódica e análise de estratégias de enfrentamento à situação de rua.

Art. 28. A política de saúde desenvolverá ações de formação e sensibilização dos profissionais da saúde sobre questões inerentes às crianças e aos adolescentes em situação de rua e na rua e suas famílias visando qualificar o atendimento, atentando-se para situações decorrentes de violências, trabalho infantil e outras violações de direito.

Art. 29. As equipes de atenção básica/consultório na rua deverão articular as ações de enfrentamento às situações de violência com as equipes multiprofissionais especializadas, responsáveis pela articulação com os órgãos públicos integrantes da rede de proteção.

Seção V

Das políticas educacionais

Art. 30. A criança e o adolescente em situação de rua e na rua têm direito à educação, visando ao pleno desenvolvimento de sua pessoa, preparo para o exercício da cidadania e qualificação para o trabalho, sendo-lhes assegurado:

I - acesso, permanência e aprendizagem na educação básica (regular ou na modalidade Educação de Jovens e Adultos – EJA), por meio de adoção de procedimentos administrativos específicos que contemplem as especificidades deste público;

II - abordagens pedagógicas que promovam desenvolvimento intelectual, físico, social, emocional e cultural;

III - currículos comprometidos com as diversas formas de aprendizagem dos conteúdos escolares por meio de abordagens pedagógicas que superem as visões hegemônicas e padronizadas sobre o ato de ensinar e aprender;

IV - acesso ao atendimento educacional especializado na perspectiva da educação especial inclusiva e do desenho universal;

V - espaços educativos que incluam e se atentem para as necessidades de crianças e adolescentes refugiados, migrantes e deslocados.

Art. 31. A política de educação deverá desenvolver estratégias para sensibilizar a comunidade educativa sobre as crianças e os adolescentes em situação de rua e na rua no município, particularmente sobre os danos causados pelo trabalho infantil e por outras situações de violência.

Art. 32. Em hipótese alguma a matrícula poderá ser recusada pela unidade educacional por falta de documentação e de comprovação de endereço de residência.

§ 1º Na ausência de documentação, os responsáveis serão orientados sobre a obtenção e entrega posterior à unidade educacional.

§ 2º Caso solicitada a transferência de unidade educacional pelos responsáveis durante o ano letivo, caberá ao órgão competente priorizar e garantir a continuidade de atendimento.

Art. 33. A política de educação promoverá, por meio do apoio e acompanhamento de equipes dimensionadas e multidisciplinares, métodos, recursos e práticas pedagógicas que possibilitem a permanência, o desenvolvimento e a aprendizagem de crianças e adolescentes em situação de rua e na rua que se encontrem com significativos prejuízos no seu processo de escolarização.

Parágrafo único. Para o disposto no caput, a política de educação articulará ações de busca ativa e de atendimento intersetorial para a prevenção e o enfrentamento da evasão e exclusão escolar de crianças e adolescentes em situação de rua e na rua, com especial atenção para distorção idade-ano, desenvolvimento e aprendizagem.

Seção VI

Das políticas de cultura, esportes e lazer

Art. 34. O Poder Público Municipal deverá promover e ampliar o acesso de crianças e adolescentes em situação de rua e na rua e seus familiares a atividades culturais, desportivas e de lazer, por meio de:

I - oferta de ações culturais e formativas promovidas pela política municipal de cultura, a serem realizadas em equipamentos culturais e em territórios de maior concentração de crianças e adolescentes em situação de rua e na rua e nos seus territórios de origem, com foco na preservação ou no fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários;

II - promoção do acesso ao livro, à literatura e à informação;

III - oferta de atividades de esporte e lazer promovidas pela política de esporte e lazer em territórios de maior concentração de crianças e adolescentes em situação de rua e na rua e nos seus territórios de origem;

IV - sensibilização de profissionais de esporte e lazer para realização de ações voltadas para crianças e adolescentes em situação de rua e na rua em parceria com a rede de serviços públicos;

V - adoção de procedimentos administrativos e de atendimento específicos nos equipamentos culturais, esportivos e de lazer, que contemplem e respeitem as especificidades deste público;

VI - estabelecimento de parcerias com outros órgãos e entes federativos visando à disponibilização de ingressos gratuitos a eventos culturais, desportivos e de lazer realizados na cidade;

VII - desenvolvimento de projetos e programas em parcerias com outras secretarias municipais.

Seção VII

Das políticas de geração de emprego e renda

Art. 35. O Poder Público promoverá políticas de geração de renda e empregabilidade para famílias de crianças e adolescentes e jovens em situação de rua e na rua.

§ 1º Serão ofertados cursos de qualificação profissional e geração de renda para famílias de crianças e adolescentes em situação de rua e na rua por meio de projetos intersecretariais específicos no âmbito da legislação dos programas de inclusão no mercado de trabalho.

§ 2º Serão ofertados cursos de qualificação profissional e geração de renda para adolescentes a partir de 16 anos em situação de rua e na rua por meio de projetos intersecretariais específicos no âmbito da legislação dos programas de inclusão no mercado de trabalho.

§ 3º Será promovido o acesso de adolescentes em situação de trabalho infantil, a partir de 14 anos, a programas de aprendizagem, integrados com ações de promoção de escolarização, prevenção de distorção idade-ano e acompanhamento do desenvolvimento e aprendizagem de modo a fortalecer a permanência.

§ 4º Serão desenvolvidas ações em parceria com a iniciativa privada com o objetivo de ampliar o acesso, a permanência e a retenção de adolescentes nos programas de aprendizagem.

Seção VIII

Das violações de direitos

Art. 36. Crianças e adolescentes em situação de rua e na rua têm seus direitos violados e estão expostos a violências em múltiplas dimensões, seja pelo rompimento ou fragilidade do cuidado e dos vínculos familiares e comunitários, pela situação de pobreza e/ou pobreza extrema ou pela dificuldade de acesso e/ou permanência em políticas públicas, podendo estar associadas, entre outras, às seguintes circunstâncias:

I - violência psicológica, sexual, física, química, autoprovocada, abandono, negligência;

II - trabalho infantil, inclusive em suas piores formas;

III - vulnerabilidade a diversas formas de exploração por adultos;

IV - tráfico de pessoas;

V - situação de desaparecimento;

VI - exposição e vulnerabilidade ao álcool e outras drogas;

VII - violência intrafamiliar, institucional e urbana;

VIII - LGBTfobia, racismo, sexismo e misoginia;

IX - encarceramento dos responsáveis;

X - ameaça de morte;

XI - sofrimento e/ou transtorno mental.

Parágrafo único. O Poder Público deverá estabelecer protocolos e fluxos integrados para o atendimento das violações de direitos e violências contra crianças e adolescentes em situação de rua e na rua, divulgando e disponibilizando ouvidorias e canais de comunicação para o recebimento de denúncias e reivindicações de direitos.

CAPÍTULO III

DAS DISPOSIÇÕES FINAIS E TRANSITÓRIAS

Art. 37. As despesas com a execução desta Lei correrão por dotações orçamentárias próprias, suplementadas se necessário, observado o art. 6º desta Lei.

Parágrafo único. Para a consecução dos objetivos previstos nesta Lei, poderão ser recebidas verbas de outros entes federados.

Art. 38. O Poder Executivo regulamentará esta Lei em até 120 (cento e vinte) dias após sua promulgação.

PREFEITURA DO MUNICÍPIO DE SÃO PAULO, aos 10 de abril de 2023, 470º da fundação de São Paulo.

 

RICARDO NUNES

PREFEITO

FABRICIO COBRA ARBEX

Secretário Municipal da Casa Civil

EUNICE APARECIDA DE JESUS PRUDENTE

Secretária Municipal de Justiça

 

Publicada na Casa Civil, em 10 de abril de 2023.

Documento original assinado nº 081329241

Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo