Processo nº 6510.2019/0004192-7
INTERESSADO: SECRETARIA MUNICIPAL DE MOBILIDADE E TRÂNSITO
ASSUNTO: Regulamentação da Lei n° 16.010, de 9 de junho de 2014, que inclui ao Sistema de Transporte Coletivo Urbano de Passageiros de que trata a Lei n° 13.241/01, o Sistema de Transporte Público Hidroviário. Consulta quanto à possibilidade de implantação de linhas de transporte hidroviário no Município de São Paulo pela iniciativa privada, mediante autorização do Poder Público municipal. Interpretação da Lei Municipal n. 16.010/14, em especial a seu artigo 6°.
Informação n° 136/2022 - PGM.AJC
PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO
Coordenadoria Geral do Consultivo Senhor
Coordenador Geral
Trata-se de processo iniciado para fins de regulamentação da Lei n° 16.010, de 9 de junho de 2014, que inclui ao Sistema de Transporte Coletivo Urbano de Passageiros de que trata a Lei n° 13.241/01, o Sistema de Transporte Público Hidroviário.
Inicialmente, a SPTrans entendeu que a eventual regulamentação para implementação do transporte hidroviário seria da competência de SMT, considerando que a experiência e atribuições da SPTrans se resumiriam ao transporte coletivo sobre pneus (SEI 025023360). SMT, assim, elaborou a minuta SEI 025899302, prevendo que o transporte hidroviário seria prestado por particulares, mediante autorização municipal, condicionada ao preenchimento de alguns requisitos.
O processo foi novamente encaminhado à SPTrans, que falou o seguinte no SEI 056586645:
"Quanto ao teor da minuta, entendemos que não encontra alinhamento com os termos da Lei N° 16.010 e demais instrumentos legais aplicáveis, que estabelecem, em sínese, que o Sistema de Transporte Hidroviário será composto por um conjunto de linhas que deverão estar integradas, física e tarifariamente, ao Sistema de Transporte Coletivo Urbano de Passageiros de que trata a Lei n° 13.241/01, seguindo conceitos os estabelecidos para as linhas da nova rede previstas nos contratos de concessão, inclusive quanto à alocação nos lotes de contratação.
Importante destacar, ainda, que conforme as diretrizes do Plano de Metas da Prefeitura de São Paulo - PdM 2021-2024, estão sendo conduzidos estudos visando a formulação do Plano Integrado dos Sistemas de Transportes por Ônibus e Hidroviário, considerando a ligação por meio de embarcação de passageiros para travessia na Represa Billings, entre as regiões de Cocaia e Pedreira, com projeto envolvendo toda a infraestrutura de terminais de ônibus, atracadouros e viários de acesso.
Diante do exposto, sugerimos que a regulamentação da Lei 16.010 seja oportunamente retomada após a conclusão dos estudos envolvendo o serviço de transporte hidroviário, inclusive considerando (i) o futuro e completo embasamento técnico, que não era disponível na época em que a minuta em questão foi formulada pela Assessoria Jurídica da SMT, e considerando (ii) o envolvimento de outros órgãos e demais Secretarias envolvidas no assunto, que é interdisciplinar, sob a coordenação da SETRAM."
A Superintendência Jurídica da SPTrans aprofundou o entendimento a respeito da inviabilidade de prestação do serviço mediante autorização no SEI 056813187, apontando que a melhor interpretação da Lei municipal n° 16.010/14, e mais consentânea com a Lei municipal n° 13.241/01 e com o atual PDE, instituído pela Lei 16.050/14, é a de que o transporte aquaviário integra o sistema de transporte coletivo público de passageiros, o qual deve ser prestado pelo Município ou por concessionários ou permissionários, mediante licitação, mesmo que qualificado pela Lei n° 16.010/14 como 'complementar' à rede municipal de transporte. Anota, ainda, que o plano de metas de 2021-2024 é expresso ao prever a implantação de um serviço de transporte coletivo hidroviário na represa Billings denominado Aquático, o qual "será um sistema de transporte público por embarcações na represa Billings, integrado ao Bilhete Único. Associa-se à construção de atracadouros integrados a terminais de ônibus, viário de acesso e corredores de ônibus para conectividade à rede de transporte público."
A assessoria jurídica de SMT esclareceu que a minuta de regulamentação proposta se alinha com parecer proferido em outro processo, no qual particular interessado questionava quanto à necessidade de autorização municipal para transporte de passageiros entre as margens da represa de Guarapiranga. Segundo concluiu SMT/AJ na ocasião: "Com esses parâmetros, temos a esclarecer, quanto aos questionamentos formulados: a) que compete ao Município de São Paulo autorizar a realização da atividade econômica de transporte coletivo hidroviário privado na represa de Guarapiranga/SP, considerando que os pontos de saída e chegada das embarcações nas travessias estão localizados às margens do Município de São Paulo; b) a regulamentação que autoriza o Município de São Paulo a delegar a terceiros a execução do serviço de transporte coletivo hidroviário, quando se tratar de transporte coletivo privado, é o disposto no artigo 6° da Lei n° 16.010, de 9 de junho de 2014, c/c artigo 2°, inciso II, da Lei n° 13.241, de 12 de dezembro de 2001, dependendo para tanto da regulamentação mediante ato editado pela atual Secretaria Executiva de Transporte e Mobilidade Urbana ante a reorganização administrativa promovida pelo Decreto n° 60.448, de 9 de agosto de 2021; c) para fins de autorização, é imprescindível a edição de ato regulamentar por SETRAM, de modo a disciplinar o serviço hidroviário de natureza privada como complementar ao serviço de transporte coletivo público de passageiros, fixando-se os marcos necessários para seu atendimento.". Ainda, para SMT/AJ, o art. 6° da Lei municipal n° 16.010/14 afirma expressamente que o serviço poderia ser explorado pela iniciativa privada, desde que isentando o Poder Público de qualquer ônus e mediante prévia aprovação do Poder Público - o que seria compatível com o regime de autorização. No final, diante da divergência acerca da possibilidade de implantação de linhas de transporte hidroviário no Município de São Paulo pela iniciativa privada, mediante autorização do Poder Público municipal, propôs encaminhamento a esta Coordenadoria.
É o relato do necessário. Os argumentos e disposições jurídicas citadas pelas partes serão analisados ao longo da manifestação.
Preliminarmente, é importante salientar que o escopo da presente consulta é a análise de se a legislação citada admite - ou não - a prestação do serviço de transporte coletivo hidroviário de passageiros mediante autorização. Não nos cabe dizer qual seria o melhor regime (ou quais seriam os melhores regimes) para a execução do referido sistema de transporte; tal decisão cabe aos órgãos de cúpula da Administração Municipal e aos órgãos especializados de SMT e SPTrans, após os devidos estudos necessários. O esclarecimento de tal ponto é relevante na medida em que a SPTrans ventilou disposições do Plano de Metas 2021-2024 do Município e do Plano Municipal de Mobilidade Urbana de 2015, que dizem respeito justamente a opções técnicas e políticas públicas as quais, embora mereçam ser observadas, não constrangem a própria Administração Municipal na elaboração de decretos - o Plano de Mobilidade, aliás, também foi instituído mediante decreto, podendo ser alterado pela mesma via. Portanto, uma coisa é a possibilidade jurídica do Município instituir, mediante decreto, regime de autorização para prestação do transporte coletivo hidroviário pela iniciativa privada; outra coisa, é a conveniência de instituição desse regime ou da amplitude deste regime.
Outra observação preliminar relevante diz respeito ao momento de edição da regulamentação do transporte hidroviário de passageiros. A SPTrans alude que seria necessário aguardar os estudos em curso (mencionou dois estudos e projetos, um referente a parceria com a FAU-USP, e outro de implementação do 'Aquático' na represa Billings). Embora também não nos caiba decidir acerca do momento da regulamentação, a princípio devemos concordar com a empresa municipal quanto à inconveniência de regulamentação de um modelo que ainda se encontra em estudo. No caso de projetos complexos, como parece ser o caso, convém que a proposta de regulamentação integre um relatório final, com as definições mais relevantes acerca da política pública estudada.
Feitas estas observações, passamos à análise da questão submetida à consulta. Reproduzimos os dispositivos mais relevantes da Lei municipal n° 16.010/14, que tratou do transporte coletivo aquaviário:
Art. 1° Fica incluído ao Sistema de Transporte Coletivo Urbano de Passageiros de que trata a Lei n° 13.241/01, que organiza os serviços de transportes coletivos do Município, o Sistema de Transporte Público Hidroviário - STPHSP.
(...)
Art. 3° O Sistema de Transporte Público Hidroviário - STPHSP do Município de São Paulo deverá:
I - articular o transporte por embarcações com o Sistema Integrado de Transporte de Passageiros - SITP, viabilizando os deslocamentos com segurança, eficiência, conforto e rapidez para o usuário;
II - ser implantado na área composta pelos leitos navegáveis das represas e dos rios da cidade de São Paulo, de modo articulado com os terminais de ônibus e as estações do Metrô.
Art. 4° Todo o sistema de que trata esta lei terá natureza complementar e integrada à Rede Municipal de Transportes e ao sistema viário da Cidade.
Art. 5° São objetivos da implantação do Sistema de Transporte Público Hidroviário - STPHSP do Município de São Paulo:
I - propiciar ao usuário uma opção de meio de transporte alternativo seguro, econômico, rápido, confortável, de fluxo constante e regular;
II - melhorar o acesso de veículos particulares de passeio e transporte leve às regiões da cidade, melhorando a circulação e o estacionamento no local, pela oferta de um meio de transporte alternativo mais rápido e mais seguro;
III - disciplinar o ambiente urbano e melhorar a paisagem e o meio ambiente.
Art. 6° A implantação e operação do transporte hidroviário poderá ser construído e operado diretamente pelo Poder Público ou pela iniciativa privada, isentando a Municipalidade de qualquer ônus financeiro, exigindo a prévia aprovação pelo órgão Executivo Municipal competente, nos termos da legislação vigente.
Parágrafo único. Este Sistema terá como fonte básica de receita a tarifa.
Enquanto a SPTrans destacou que, nos termos da referida lei, o sistema de transporte coletivo aquaviário deve ser integrado à rede municipal de transportes coletivos já existente (v. art. 3°, inc. I, e art. 4°), e deve ter como receita a tarifa (art. 6°, parágrafo único), o que demandaria a sua prestação em regime de direito público, diretamente ou mediante concessão ou permissão municipal; por outro lado SMT salientou que o caput do art. 6° prevê de forma expressa a possibilidade de construção e operação do sistema pelo Poder Público ou pela iniciativa privada, bem como a indenidade do Poder Público a qualquer ônus financeiro decorrente da operação, o que demonstraria compatibilidade com o regime de autorização.
A SPTrans apontou, ainda, que a Lei municipal n° 16.010/14 tratou o transporte coletivo hidroviário como público (em diversos artigos menciona "Sistema de Transporte Público Hidroviário - STPHSP") e previu, no art. 1°, que ele ficará incluído no Sistema de Transporte Coletivo Urbano de Passageiros de que trata a Lei municipal n° 13.241/01. Anotou que esta lei, que dispõe sobre o transporte coletivo no Município, previu dois regimes de prestação do serviço de transporte coletivo, o público e o privado (e mesmo os tratados pela lei como de natureza complementar são prestados em regime público).
Nos termos da Lei n° 13.241/01:
Art. 1° - Os serviços do Sistema de Transporte Coletivo Urbano de Passageiros na Cidade de São Paulo serão prestados sob os regimes público e privado.
§ 1° - O Transporte Coletivo Público de Passageiros é serviço público essencial, cuja organização e prestação competem ao Município, conforme disposto no artigo 30, inciso V, da Constituição Federal e no artigo 172 da Lei Orgânica do Município de São Paulo.
§ 2° - O Transporte Coletivo Privado, destinado ao atendimento de segmento específico e pré-determinado da população, inclusive de escolares e de fretamento, está sujeito à regulamentação e à prévia autorização do Poder Público, conforme disposto no artigo 179, inciso II, da Lei Orgânica do Município de São Paulo.
O serviço de transporte público, nos termos do art. 6° do referido diploma legal, deve ser delegado mediante concessão ou permissão:
Art. 6° - Fica o Poder Público autorizado a delegar a terceiros, por meio de concessão ou permissão, a prestação e a exploração do Serviço de Transporte Coletivo Público de Passageiros, no todo ou em parte, conforme disposto nos artigos 128 e 172 da Lei Orgânica do Município de São Paulo: (...)
Da referida lei, podemos citar ainda o art. 27, que, no §2°, alínea 'c', previu que o valor fixado para a tarifa deve suportar o "gerenciamento das receitas e pagamentos comuns ao Sistema Integrado e aos Serviços Complementares".
Assim, segundo a SPTrans, a Lei n° 16.010/14, ao conceituar o transporte coletivo aquaviário como público (ainda que de natureza complementar) e prever sua integração com o sistema de transporte coletivo previsto na Lei 13.241/01, trouxe a necessidade de que eventuais delegações sejam feitas mediante regime concessório ou permissório, afastando a possibilidade de regime de autorização para a iniciativa privada, como previsto na minuta de decreto elaborada por SMT.
Pois bem. Parece-nos que, em parte, assiste razão à SPTrans, mas, por outro lado, SMT também tem razão ao não vislumbrar, na Lei n° 16.010/14, um afastamento do regime de autorização. Expliquemos.
Diversos serviços públicos admitem, por força de previsão legal, regimes distintos de prestação das atividades (serviços públicos geralmente abarcam um complexo de atividades). Essa assimetria regulatória está presente em uma infinidade de setores econômicos, mesmo os considerados, por força de lei ou da própria Constituição da República, como 'serviços públicos'. Assim, por exemplo, instalações portuárias podem ser exploradas pela iniciativa privada mediante simples autorização, segundo a Lei federal n° 12.815/13: terminais portuários privados convivem (na Lei federal n° 12.815/13 e na realidade brasileira) com terminais públicos explorados por particulares mediante concessão, inclusive concorrendo entre si. O mesmo acontece com os serviços de telecomunicações, disciplinados na Lei federal n° 9.472/97, os quais podem ser explorados por particulares mediante concessão, ou simplesmente autorizados a potenciais interessados, dependendo do tipo específico de serviço prestado.
Aliás, cada vez mais tem se utilizado da autorização para delegação da exploração de serviços e utilidades públicas, que passam a ser prestados em regime privado (ainda que regulados pelo ente público). A recentíssima Lei federal n° 14.273/21 (Lei das Ferrovias) passou a possibilitar a exploração do transporte ferroviário em regime privado, mediante autorização, ao lado da exploração em regime público, outorgada mediante concessão. A MP n° 1.089/2021 foi além e extinguiu a autorização para construção e operação de aeroportos privados, aboliu a distinção entre transporte aéreo regular e não regular, bem como a necessidade de concessão para a prestação do transporte aéreo regular.
Portanto, é possível arriscar dizer que, hoje em dia, a assimetria regulatória é mais a regra do que a exceção. E, repare, ela existe mesmo no serviço de transporte coletivo aqui do Município de São Paulo, eis que a Lei municipal n° 13.241/01 contemplou a prestação de transporte coletivo em regime privado (que, conforme mencionado pela SPTrans, alberga o transporte escolar privado e o fretamento), ao lado da prestação em regime público, feita pelos ônibus regulares. Em cidades como o Rio de Janeiro, o transporte coletivo chamado local é feito por meio de autorizatários, que exploram certas linhas regulares com o emprego de vans.
E novas tecnologias tem possibilitado a existência de entrantes em mercados regulados ou não regulados, que passam a concorrer diretamente com prestadores de serviços públicos, tanto concessionários como autorizatários. Citemos como exemplo (para nos atermos aos serviços de transporte) o transporte remunerado individual e coletivo de passageiros intermediado por plataformas digitais.
Toda essa exposição tem a intenção de apontar que, no nosso entendimento, as relevantes colocações de SMT ou de SPTrans pecam apenas por tentar enquadrar todo o transporte coletivo aquaviário em um único regime (público ou privado), quando nos parece que a Lei municipal n° 16.010/14 admite ambos, público e privado, e nada obsta que ambos os regimes coexistam, cabendo aos órgãos técnicos avaliar onde e para que tipos de linhas será melhor um ou outro.
Parece-nos - como pareceu à SMT/AJ - que o art. 6° da Lei n° 16.010/14 é expresso neste sentido, ao prever que "a implantação e operação do transporte hidroviário poderá ser construído e operado diretamente pelo Poder Público ou pela iniciativa privada, isentando a Municipalidade de qualquer ônus financeiro, exigindo a prévia aprovação pelo órgão Executivo Municipal competente, nos termos da legislação vigente". A interpretação de que a alusão à iniciativa privada seria restrita aos particulares concessionários ou permissionários não nos convence por três razões: (i) quando normas aludem à 'iniciativa privada', geralmente é no sentido de abertura do mercado a ela; quando as leis querem se referir à prestação direta ou indireta de uma atividade em regime público, não falam em iniciativa privada, mas em concessionários e permissionários; (ii) em serviços explorados em regime público, via concessões ou permissões, é praticamente impossível deixar o poder concedente indene de qualquer ônus financeiro, mormente no setor de transporte coletivo, em que a tarifa é altamente subsidiada e há subsídios cruzados entre linhas mais e menos rentáveis, e que, em razão da sua essencialidade, cabe ao Poder Público garantir a sua prestação adequada e contínua, ainda que isso acarrete ônus extras; (iii) a disposição legal acima reproduzida também fala em 'prévia aprovação pelo órgão Executivo Municipal competente', o que é compatível como o regime de autorização, eis que, na concessão, não há uma aprovação para prestação do serviço, mas um contrato no qual o particular se obriga à execução, garantido o equilíbrio econômico-financeiro do contrato.
Portanto, entendemos que o caput do art. 6° da lei admite a autorização, assim como admite a prestação direta pelo Poder Público. É preciso notar que há uma pequena lacuna com relação à prestação indireta pelo Poder Público, ou seja, com relação à concessão do serviço, eis que o referido artigo apenas fala em prestação direta ou abertura à iniciativa privada. Porém, não nos parece que a falta de menção à possibilidade de delegação mediante concessão ou permissão as impeça. Primeiro porque a Lei n° 16.010/14 faz remissão à Lei n° 13.241/01, que prevê a concessão ou permissão de transporte coletivo público de passageiros. Segundo porque não é necessário autorização legal para a execução indireta dos serviços públicos (ou seja, para a sua delegação à um particular): a Constituição da República já autoriza a delegação no art. 175 ("Art. 175. Incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos") e, no que toca aos serviços municipais, no art. 30, inc. V ("Art. 30. Compete aos Municípios: V - organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse local, incluído o de transporte coletivo, que tem caráter essencial). O STF, a propósito, já se posicionou diversas vezes acerca da desnecessidade de lei autorizativa para celebração de contratos, inclusive concessões. Nesse sentido: a ADI n° 472/BA, que pode ser apontada como leading case, o AI n° 755.058/MG, a ADI n° 676/RJ, a ADI n° 342/PR, etc. Segundo Marcos Juruena Villela Souto: "A delegação de serviço público mediante concessão configura ato de gestão, que, na sistemática constitucional da separação de Poderes, cabe, principiologicamente, ao Poder Executivo. Desta forma, não deve o Poder Legislativo interferir em atribuição de outro Poder, já que, não obstante os controles constitucionais recíprocos, são ambos independentes e autônomos no exercício de suas respectivas funções" (Direito Administrativo das concessões. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004, p. 48).
A discussão a respeito de em quais casos haverá prestação direta ou indireta pelo Município, em quais casos haverá autorização, ou mesmo se, no caso de serviços abertos à iniciativa privada, haverá necessidade de autorização ou não, compete aos órgãos técnicos municipais de SMT e SPtrans, pois isso demanda estudos de viabilidade técnica e econômica, bem como avaliação da premência e utilidade pública do serviço. Frise-se que a Lei n° 16.010/14 admite a prestação direta ou indireta da utilidade, não havendo óbice à continuidade dos estudos a respeito da implantação do 'Aquático' na represa Billings ou de outros meios de transporte coletivos hidroviários prestados pelo Município ou por terceiros, mediante concessão ou permissão, integrados ao sistema de transporte coletivo urbano.
Por outro lado, enquanto não implementados meios de transporte coletivo públicos, com integração tarifária e física com a rede municipal de transporte, o Município poderia, em tese, regulamentar a prestação da atividade (de transporte coletivo regular de passageiros) pela iniciativa privada, mediante uma autorização temporária. E, mesmo depois da efetiva implantação do transporte coletivo público, poderiam coexistir autorizatários que, com liberdade quanto aos preços praticados, operem 'linhas' não atingidas pelo sistema público aquaviário.
Em conclusão, respondendo ao questionamento de SMT, parece-nos que há, em tese, a possibilidade jurídica de implantação de linhas de transporte hidroviário no Município de São Paulo pela iniciativa privada, bem como de previsão da necessidade de autorização do Município para tal fim, o que não afasta, contudo, a possibilidade de implantação de linhas de transporte coletivo público pelo Município, integradas física e tarifariamente à rede de transporte coletivo existente, operadas diretamente pelo Município ou por particulares por meio de concessão ou permissão, cabendo aos órgãos competentes efetuar os estudos necessários e decidir a respeito da extensão dos regimes (público e/ou privado) de prestação do serviço. Sub censura.
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São Paulo, 20/09/2022
RODRIGO BRACET MIRAGAYA
Procurador Assessor - AJC
OAB/SP n° 227.775
PGM
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Processo nº 6510.2019/0004192-7
INTERESSADO: SECRETARIA MUNICIPAL DE MOBILIDADE E TRÂNSITO
ASSUNTO: Regulamentação da Lei n° 16.010, de 9 de junho de 2014, que inclui ao Sistema de Transporte Coletivo Urbano de Passageiros de que trata a Lei n° 13.241/01, o Sistema de Transporte Público Hidroviário. Consulta quanto à possibilidade de implantação de linhas de transporte hidroviário no Município de São Paulo pela iniciativa privada, mediante autorização do Poder Público municipal. Interpretação da Lei Municipal n. 16.010/14, em especial a seu artigo 6°.
Cont. da Informação n° 136/2022 - PGM.AJC
PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO
Senhora Procuradora Geral
Encaminho a Vossa Senhoria a manifestação da Assessoria Jurídico-Consultiva desta Coordenadoria Geral, que acompanho, no sentido da possibilidade jurídica de implantação de linhas de transporte hidroviário no Município de São Paulo pela iniciativa privada, bem como de previsão da necessidade de autorização do Município para tal fim, o que não afasta, contudo, a possibilidade de implantação de linhas de transporte coletivo público pelo Município, integradas física e tarifariamente à rede de transporte coletivo existente, operadas diretamente pelo Município ou por particulares por meio de concessão ou permissão, cabendo aos órgãos competentes efetuar os estudos necessários e decidir a respeito da extensão dos regimes (público e/ou privado) de prestação do serviço.
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São Paulo, 20/09/2022
CAYO CÉSAR CARLUCCI COELHO
Coordenador Geral do Consultivo
OAB/SP 168.127
PGM
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Processo nº 6510.2019/0004192-7
INTERESSADO: SECRETARIA MUNICIPAL DE MOBILIDADE E TRÂNSITO
ASSUNTO: Regulamentação da Lei n° 16.010, de 9 de junho de 2014, que inclui ao Sistema de Transporte Coletivo Urbano de Passageiros de que trata a Lei n° 13.241/01, o Sistema de Transporte Público Hidroviário. Consulta quanto à possibilidade de implantação de linhas de transporte hidroviário no Município de São Paulo pela iniciativa privada, mediante autorização do Poder Público municipal. Interpretação da Lei Municipal n. 16.010/14, em especial a seu artigo 6°.
Cont. da Informação n° 136/2022 - PGM.AJC
SECRETARIA MUNICIPAL DE MOBILIDADE E TRÂNSITO
Senhor Secretário
Encaminho, a Vossa Senhoria, manifestação da Coordenadoria Geral do Consultivo, que acolho, no sentido da possibilidade jurídica de implantação de linhas de transporte hidroviário no Município de São Paulo pela iniciativa privada, bem como de previsão da necessidade de autorização do Município para tal fim, o que não afasta, contudo, a possibilidade de implantação de linhas de transporte coletivo público pelo Município, integradas física e tarifariamente à rede de transporte coletivo existente, operadas diretamente pelo Município ou por particulares por meio de concessão ou permissão, cabendo aos órgãos competentes efetuar os estudos necessários e decidir a respeito da extensão dos regimes (público e/ou privado) de prestação do serviço.
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São Paulo, 22/09/2022
MARINA MAGRO BERINGHS MARTINEZ
PROCURADORA GERAL DO MUNICÍPIO
OAB/SP 169.314
PGM
Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo