CASA CIVIL DO GABINETE DO PREFEITO

Acessibilidade

PARECER PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO - PGM Nº 11.300 de 24 de Abril de 2008

EMENTA N° 11.300
Licitação Atestado de execução apresentado pela empresa vencedora do certame e cuja falsidade foi descoberta posteriormente, mediante confissão do próprio emitente do mesmo. Hipótese em que caberia a invalidação do certame desde a fase a habilitação, bem como a aplicação de penalidade à empresa contratada, inclusive mais gravosa, em nome do princípio da auto-tutela e da não vedação da reformatio in pejus em processo administrativo não disciplinar. Existência, todavia, de ação judicial proposta pela contratada apenada visando à anulação da penalidade sofrida. Impossibilidade de exercício da autotutela quando a questão seja levada ao Poder Judiciário. Renúncia pelo administrado do Recurso Administrativo proposto. Aplicação analógica do parágrafo único do artigo 38 da lei nº 8.630/80.

Processo nº 2005-0.241.169-0

INTERESSADO: SECRETARIA MUNICIPAL DE COORDENAÇÃO DAS SUBPREFEITURAS - SMSP

ASSUNTO: Possibilidade de anulação dos atos desde a apresentação de atestado falso na fase de habilitação. Limites ao exercício da autotutela.

Informação n° 741/2008 - PGM.AJC

PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO

Assessoria Jurídico-Consultiva

Senhora Procuradora Assessora Chefe

Trata o presente de consulta formulada pela Secretaria Municipal das Subprefeituras sobre a possibilidade de aplicação de penalidade mais gravosa à empresa EINEN SERVIÇOS AMBIENTAIS LTDA. na fase recursal ora em trâmite, bem como da viabilidade de anulação de todos os atos posteriores à fase de habilitação da mencionada empresa, tendo em vista a constatação de falsidade do atestado de execução então apresentado pela mesma.

A questão envolve diversos fatos que devem ser primeiramente narrados a fim de que se compreenda de modo apropriado o atual estágio em que se encontra o caso, para que só então se possa chegar ao deslinde da situação ora em tela.

I - UM BREVE RELATO DOS FATOS

A SMSP publicou no Diário Oficial da Cidade de São Paulo do dia 03 de dezembro de 2005 (pg. 68) o Edital de Licitação (Pregão n° 17 / SMSP / COGEL / 2005), que teve por objeto o "registro de preços para a prestação de serviços de limpeza mecânica de sistema de drenagem, constituído de galerias de águas pluviais, ramais, poços de visita, bocas de lobo, tubos e conexões, com fornecimento de equipamento combinado (hidrojato de alta pressão/sugador de alta potência) e mão de obra especializada, observadas as especificações constantes do anexo III do Edital" (fls. 108 a 150 - vol. 01).

O certame em questão foi do tipo menor preço por agrupamento, e a empresa EINEN SERVIÇOS AMBIENTAIS S/A, cujo nome de fantasia é "HIDROJET S/A", sagrou-se vencedora do agrupamento X - SÉ/NEC" (fls. 1.028 - vol. 04), tendo apresentado na fase habilitatória os documentos exigidos no Edital, comprovando pois, APARENTEMENTE, sua inidoneidade jurídica, financeira e técnica.

Dentre os tais documentos de habilitação, a empresa em apresentou, a fim de comprovar sua capacidade técnica, a Certidão de Acervo Técnico - CAT n ° SZC - 06589 e a Certidão de Acervo Técnico - CAT n° SZL -02092, expedidas em 04.10 e 15.12.2005, respectivamente, pelo Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia de São Paulo - CREA-SP, em nome do Eng° Civil Jorge Shigeru Nakano, tudo na conformidade com o atestado técnico emitido pela empresa Tecnoserv Construções e Serviços Ltda, no qual a mesma declara que os ''serviços de desobstrução, esgotamento e limpeza mecanizada de rede de tubulação de galeria de águas pluviais, incluindo as bocas de lobo, poços de visita (caixas de passagem), através do processo de hidrojateamento da alta pressão e sugador, utilizando caminhão combinado hidrojato/sugador e inspeção por televisionamento, utilizando o sistema de CFTV" teriam sido prestados pela empresa autora EIEN à empresa TECNOSERV na Rodovia Raposo Tavares (SP - 270), como pode ser verificado às fIs. 543.

Estando os documentos acima mencionados supostamente em conformidade com o que determina a lei, a EINEN SERVIÇOS AMBIENTAIS LTDA celebrou então com a Secretaria da Coordenação das Subprefeituras a Ata de Registro de Preços n° 77/SMSP/COGEL/2005 (fls. 1139 a 1148 - vol. 04), e, segundo consta, cumpriu satisfatoriamente os serviços em decorrência dela contratados durante todo seu período de validade, o que, inclusive, ensejou sua prorrogação. Ressalte-se que o processo n° 2005-0.241.169-0 foi até mesmo objeto de auditoria pelo TCM (fIs. 1219 a 1229 vs.), tendo o mesmo concluído por sua regularidade.

Ocorre, contudo, que o Sr. Jaime Shigueru Mitiue, sócio da empresa Tecnoserv, que outrora atestara que a EINEN prestara-lhe serviços, denunciou - JÁ NA ÉPOCA EM QUE PRORROGADA A VALIDADE DA ATA DE REGISTRO DE PREÇOS - ter a EINEN feito uso de "certidão fa!sa", confessando expressamente que sua empresa emitira atestado por serviço não prestado, fazendo ainda outras acusações, tais como as de fraude licitatória, fraude fiscal, uso de laranjas, etc1.

Diante de tão séria denúncia, a Administração Municipal então, em diligência, consultou o DER - Departamento de Estradas de Rodagem de São Paulo quanto à ocorrência de qualquer contratação da TECNOSERV ou da EIEN para o período compreendido entre 24/10/2005 a 25/11/2005.

Em resposta, o DER confirmou não terem as empresas Tecnoserv Construções e Serviços Ltda. e EIEN Serviços Ambientais S.A. executado quaisquer serviços para o Departamento - DR 10, conforme pode ser verificado a fls. 1461.

Tendo em vista a resposta do DER e a denúncia oferecida pefo Sr. Jaime, concluiu a COGEL que, tendo a HIDROJET apresentado dois atestados técnicos, sendo um deles insuficiente para comprovar sua qualificação e o outro supostamente falso, seria o caso de aplicação da penalidade prevista no item 14.3 do Edital de Pregão, qual seja:

"14.3. A licitante que ensejar o retardamento da execução do certame, deixar de entregar ou apresentar documentação falsa exigida neste edital, não mantiver a proposta/lance, comportar-se de modo inidôneo, fizer declaração falsa ou cometer fraude fiscal, garantido o direito de ampla defesa, serão aplicadas penalidades referidas nos subitens 14.2.1. e 14.2.2., a critério da Administração."

Foi então a empresa apenada com suspensão temporária do direito de licitar pelo prazo de cinco anos (fls. 1485}, tendo sido aberto prazo para defesa prévia. Apresentada a defesa prévia (fls. 1492 a 1499), novas diligências foram realizadas e restou definitivamente confirmado que o atestado emitido pela TECNOSERV era falso, pois o serviço não fora executado.

A Ata foi então suspensa "ad cautelam" a fls. 1611 e, após exaustivas manifestações de todos os envolvidos, foi por fim acolhida a proposta de aplicação da penalidade de suspensão do licitar e de contratar com a Administração por 5 (cinco) anos à empresa TECNOSERV CONSTRUÇÕES E SERVIÇOS LTDA, (que emitiu o falso atestado), bem como à empresa EINEN SERVIÇOS AMBIENTAIS LTDA. (que apresentou o atestado falso na fase de habilitação), conforme pode ser verificado às fls. 1697 a 1698.

Inconformada, a EINEN interpôs RECURSO ADMINISTRATIVO contra a aplicação da penalidade (fls. 1704 a 1720) e, ANTES QUE O MESMO FOSSE DECIDIDO, ENTROU COM AÇÃO ORDINÁRIA DE EXTINÇÃO DE SANÇÃO ADMINISTRATIVA com pedido de antecipação dos efeitos da tutela (fls. 1765 a 1784).

O pedido de tutela antecipada foi deferido e a Municipalidade não conseguiu cassar-lhe os efeitos, o que resultou na participação da empresa EINEN no novo certame feito pela Municipalidade (Pregão Presencial n°031/SMSP/COGEL/2007) e que se encontra atualmente suspenso pelo fato de que nenhuma das empresas ofertantes atingiu os valores estabelecidos como limites máximos a serem aceitos pelo Município, como pode ser verificado em publicação no Diário Oficial da Cidade de São Paulo do dia 06/02/2008 à fls. 52.

II - DA DESISTÊNCIA DO RECURSO ADMINISTRATIVO

Ora, uma vez que a empresa EINEN SERVIÇOS AMBIENTAIS LTDA. levou sua inconformidade quanto à sanção aplicada ao crivo do Poder Judiciário, temos que a mesma acabou por renunciar ao Recurso Administrativo interposto e ainda pendente de julgamento, uma vez que o uso da via judiciária impede a apreciação do mesmo pela Administração.

Com efeito, uma vez que vige no Brasil o princípio da "Inafastabilidade do Poder Judiciário", explicitamente consignado no inciso XXXV do artigo 5º da Constituição Federal, temos que ao submeter o tema ao crivo judicial, não há mais como haver decisão no âmbito administrativo, que deve submeter-se à decisão lá exarada e que possui a qualidade única de fazer coisa julgada material.

Destarte, nada mais cabe à Administração que aplicar aquilo que o Poder Judiciário tiver definido, e que, no caso, é pelo deferimento de tutela antecipada a suspender os efeitos da penalidade aplicada.

III - DA IMPOSSIBILIDADE DE INVALIDAÇÃO DOS ATOS ILEGAIS: LIMITES À AUTOTUTELA

É interessante, no momento, compreender que a proposta de anulação de todos os atos desde a fase de habilitação apresenta, no presente momento, um impeditivo legal, qual seja, o fato de que a penalidade aplicada foi levada ao Judiciário.

Com efeito, a autotutela, isto é, o poder que possui a Administração de, sponte propria, revogar seus atos por razões de conveniência e oportunidade, ou o dever que a mesma tem de anular seus atos quando eivados de ilegalidade não é algo absoluto.

Possui como limites a obrigatoriedade de garantia da ampla defesa e do contraditório, o ingresso do administrado ao Judiciário para questionamento do tema (caso em que se aplica, analogicamente, o disposto no parágrafo único do artigo 38 da lei n° 6.830/802} ou, ainda, uma certa limitação temporal, que na lei federal n° 9.784/99 é de cinco anos (artigo 54). e que tem sido aplicada pelo STJ subsidiariamente à seara municipal e estadual quando essas nada falarem a respeito (o que por certo é de duvidosa legalidade, mas privilegia a segurança jurídica).

Temos, portanto, que não fosse o fato de ter o administrado ingressado em juízo, a fim de questionar a penalidade aplicada, e tendo sido plenamente garantida a ampla defesa e o contraditório, estando ainda perfeitamente dentro do lapso temporal para seu exercício, a anulação do ato eivado de ilegalidade seria de rigor.

Ressalte-se, ademais, e apenas a título de esclarecimento, que, caso não tivesse o administrado ingressado em juízo, não haveria outra coisa a fazer senão invalidar toda a licitação a partir da fase de habilitação, resolvendo-se as demais pendências em eventual apuração de haveres. Não seria o caso de convalidação, frise-se, pois já haveria terceiro (o Sr. Jaime) a argüir a ilegalidade no certame, o que impediria o uso desse instrumento.

IV-CONCLUSÃO

Assim sendo, diante da renúncia do administrado ao Recurso Administrativo por ele interposto a partir do momento em que levou a questão ao crivo do Judiciário, bem como tendo em vista a limitação que a apreciação judicial impõe ao exercício da autotutela, temos que todo e qualquer ato referente à empresa EINEN daqui em diante (e que pode inclusive implicar na celebração de contrato com a empresa em questão caso a mesma venha a ser vencedora no certame de que participou em razão de ordem emanada do Poder Judiciário), nada mais será que obediência à uma decisão judicial, contra a qual não pode opor-se a Administração.

Eis o nosso parecer, que submetemos ao crivo de V. Sª.

.

São Paulo,       /       /2008.

FLÁVIA MORAES BARROS

Procuradora Assessora - AJC

OAB/SP nº 190.425

PGM

.

De acordo.

São Paulo, 24/04/2008.

LEA REGINA CAFFARO TERRA

PROCURADORA ASSESSORA CHEFE - AJC

OAB/SP 53.274

PGM

.

1 Num primeiro momento, como pode ser observado pela denúncia feita a fls. 1435 e 1436 do vol. 04, o denunciante limitou-se a dizer que sua empresa emitira atestado sem validade, tendo em vista que o sócio que a assinou, segundo ele, não teria poderes para tanto. Mais tarde, ele expressamente afirma que o serviço em questão, outrora atestado pela empresa TECNOSERV. da qual é sócio-gerente, não foi exeeulado (fls. 534)

2 RE 233.582, 234.277, 234.798, 267.140 e 389.893

.

.

Processo nº 2005-0.241.169-0

INTERESSADO: SECRETARIA MUNICIPAL DE COORDENAÇÃO DAS SUBPREFEITURAS - SMSP

ASSUNTO: Possibilidade de anulação dos atos desde a apresentação de atestado falso na fase de habilitação. Limites ao exercício da autotutela.

Informação n° 741/2008 - PGM.AJC

SNJ

Senhor Secretário de Negócios Jurídicos

Remeto o presente a V, Sa., com o parecer da Assessoria Jurídico-Consultiva desta Procuradoria Geral do Município, que acolho, pela impossibilidade de invalidação do certame desde a fase de habilitação, quando fora emitido o atestado falso, tendo em vista que o ingresso do administrado no Judiciário constitui limite ao exercício da autotutela pela Administração, bem como implica renúncia pela empresa EINEN SERVIÇOS AMBIENTAIS LTDA. ao Recurso Administrativo por ela interposto.

.

São Paulo, 25/04/2008.

CELSO AUGUSTO COCCARO FILHO

PROCURADOR GERAL DO MUNICÍPIO

OAB/SP 98.071

PGM

.

.

Processo nº 2005-0.241.169-0

INTERESSADA: SECRETARIA MUNICIPAL DE COORDENAÇÃO DAS SUBPREFEITURAS - SMSP

ASSUNTO: Possibilidade de anulação dos atos desde a apresentação de atestado falso na fase de habilitação. Limites ao exercício da autotutela.

Informação n.º 1230/2008-SNJ.G.

SECRETARIA MUNICIPAL DE COORDENAÇÃO DAS SUBPREEFEITURAS

Senhor Secretário

Retorno o presente processo a essa Pasta, com o parecer de Ementa nº 11.300 da Procuradoria Geral do Município, que acolho, o qual conclui pela impossibilidade de invalidação do certame desde a fase de habilitação, quando fora emitido o atestado falso, tendo em vista que o ingresso do administrado no Judiciário constitui limite ao exercício da autotutela pela Administração, bem como implica renúncia pela empresa EINEN SERVIÇOS AMBIENTAIS LTDA. ao Recurso Administrativo por ela interposto.

.

São Paulo, 05/05/2008.

RICARDO DIAS LEME

Secretário Municipal dos Negócios Jurídicos

Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo