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RAZÕES DO VETO AO PROJETO DE LEI Nº 72/2002; OFÍCIO DE 13 de Janeiro de 2004

Razões de Veto ao Projeto de Lei nº 72/02

OF ATL Nº 045/04

Senhor Presidente

Nos termos do Ofício nº 18/Leg.3/0773/2003, Vossa Excelência encaminhou à sanção cópia autêntica da lei decretada por essa Egrégia Câmara, relativa ao Projeto de Lei nº 72/02, proposto pelo Vereador Edivaldo Estima, que torna obrigatória a proteção com tampa plástica em todas as bebidas enlatadas comercializadas no âmbito do Município de São Paulo.

Não obstante os meritórios propósitos de que se imbuiu seu ilustre autor, impõe-se o veto total ao texto aprovado, com fulcro no § 1º do artigo 42 da Lei Orgânica do Município de São Paulo, por inconstitucionalidade, ilegalidade e contrariedade ao interesse público, nos termos das razões a seguir aduzidas.

A propositura, além de obrigar a colocação de tampa plástica nas bebidas enlatadas, proíbe sua fabricação, venda, distribuição e comercialização no Município se estiverem desprovidas da referida proteção. Também estabelece penalidades aos infratores da lei.

Inserindo-se a orientação preconizada em matéria relativa a serviço de natureza sanitária, ainda que materialmente exercida por particulares, mas com fiscalização a cargo do Poder Público, fica patente que a medida legisla sobre organização administrativa e serviços públicos, com evidente ingerência nas atividades dos órgãos administrativos, impondo, por via de conseqüência, procedimentos e encargos geradores de despesas para o erário, o que é vedado ao Legislativo, por expressa disposição legal.

Assim sendo, ao pretender dispor sobre a citada matéria, a propositura incorre em vício de iniciativa por contrariar o disposto no artigo 37, § 2°, inciso IV, da Lei Orgânica do Município de São Paulo, que estabelece serem de iniciativa do Prefeito as leis que disponham sobre organização administrativa e serviços públicos.

Com efeito, a efetivação da medida preconizada na lei aprovada demandará recursos humanos e materiais, tendo em vista a necessidade de fiscalização da obediência dos titulares dos estabelecimentos fabricantes, vendedores e distribuidores ao comando legislativo. Isto implica dotar as unidades competentes de condições para tanto necessárias, levando à realização de despesas, com reflexo nas finanças municipais. Tal matéria também é de iniciativa privativa do Chefe do Executivo, a teor do disposto no artigo 70, inciso VI, da Lei Orgânica.

Destarte, indiscutivelmente, a propositura extrapola as atribuições do Legislativo e invade a esfera de competências do Executivo, configurando infringência ao princípio constitucional da independência e harmonia entre os Poderes, consagrado no artigo 2° da Constituição Federal e reproduzido nos artigos 5° da Constituição Estadual e 6° da Lei Maior local.

Por outro lado, é mister ressaltar que a medida pressupõe a existência de verbas, importando aumento de despesas, sem a indicação dos correspondentes recursos, achando-se francamente em desacordo com o artigo 25 da Constituição do Estado de São Paulo e com a Lei Complementar n° 101, de 4 de maio de 2000, em seus artigos 15 a 17.

A medida, finalmente, é também inconstitucional uma vez que, nos termos do artigo 24, inciso V, da Carta Magna, compete concorrentemente à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar sobre produção e consumo, em cujas categorias se enquadram as atividades de fabricação, venda, distribuição e comercialização de produtos.

Dessa forma, a proposta legislativa interfere na produção e consumo de bebidas enlatadas, e, assim, desborda da competência do Município de São Paulo para disciplinar as atividades econômicas desenvolvidas em seu território, nos termos do artigo 160 de sua Lei Orgânica.

Cabe ressaltar também que muitas vezes a fabricação, a venda e mesmo a distribuição de certos produtos não ocorrem dentro dos limites de um Município, o que impossibilitaria a fiscalização e a apuração das respectivas responsabilidades.

Não obstante as razões de inconstitucionalidade e ilegalidade apontadas sejam suficientes para fundamentar o veto integral do texto aprovado, a propositura desatende, ainda, ao interesse público.

Impende assinalar que a matéria, por ser de natureza sanitária, já tem sua previsão legal estabelecida pela Lei nº 13.725, de 10 de janeiro de 2004 - Código Sanitário do Município de São Paulo. Tal Código, em seus artigos 116 e seguintes, caracteriza as infrações de natureza sanitária e comina as penalidades.

Assim sendo, a eventual desobediência às normas de higiene poderá ser enquadrada no artigo 118 do Código Sanitário Municipal. Por se tratar de higiene de produtos comestíveis, a matéria deve ser disciplinada em legislação específica e não de maneira isolada como é o caso do projeto aprovado.

Por outro lado, a simples proteção de tampa plástica não vai solucionar uma possível contaminação, pois o problema está na falta de higiene nos locais de armazenamento e venda das latas de bebidas. Isto decorre da desobediência, por parte das empresas, ao artigo 46 do Código Sanitário Municipal e ao item 2 da Portaria SMS nº 2535/03, que estabelecem as boas práticas de organização e higiene que são imprescindíveis para comercialização de alimentos seguros, nas quais se inclui a limpeza das embalagens rígidas e impermeáveis, antes de serem abertas, nos termos do item 12.3 da citada portaria. Os ambulantes também devem portar água potável para higienização dos utensílios e das mãos.

Assim, se os locais de armazenagem, distribuição e venda estiverem em desacordo com a legislação sanitária, as embalagens, providas ou não de tampas, permanecerão com sujidades e possivelmente contaminadas.

Finalmente, necessário é dizer que a edição de normas esparsas sobre determinado tema, como ocorre no caso, contraria as normas federais de técnica legislativa, consubstanciadas na Lei Complementar nº 95, de 26 de fevereiro de 1998, uma vez que a matéria concernente à orientação sobre normas sanitárias encontra seu campo adequado no Código Sanitário, consoante já demonstrado.

Conclui-se, portanto, que sob os aspectos apresentados o projeto aprovado revela-se inconstitucional, ilegal e contrário ao interesse público, pelo que vejo-me na contingência de vetá-lo integralmente, nos termos do artigo 42, § 1º, da Lei Orgânica Municipal e, assim sendo, devolvo o assunto à apreciação dessa Egrégia Câmara que, com seu elevado critério, se dignará a reexaminá-lo.

Na oportunidade, renovo a Vossa Excelência protestos de elevado apreço e distinta consideração.

MARTA SUPLICY

Prefeita

Ao

Excelentíssimo Senhor

ARSELINO TATTO

Presidente da Câmara Municipal de São Paulo

 

Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo