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RAZÕES DO VETO AO PROJETO DE LEI Nº 702/2005; OFÍCIO DE 31 de Agosto de 2006

Razões do Veto ao Projeto de Lei nº 702/05

OF ATL nº 123/06

Ref.: Ofício SGP-23 nº 2758/2006

 

Senhor Presidente

 

Reportando-me ao ofício em referência, mediante o qual Vossa Excelência encaminhou à sanção cópia autêntica do Projeto de Lei nº 702/05, de autoria da Vereadora Claudete Alves, aprovado por essa Egrégia Câmara na sessão do dia 2 de agosto do corrente ano, sirvo-me do presente para comunicar minha deliberação pelo veto total do texto aprovado, ante sua contrariedade ao interesse público e inconstitucionalidade, na conformidade das razões adiante aduzidas.

Em síntese, nos termos do seu artigo 1º, objetiva o texto aprovado reduzir, de 12 (doze) para 10 (dez) horas diárias, o período de funcionamento dos centros de educação infantil (antigas creches municipais) da rede direta do Município de São Paulo, passando seus usuários – crianças de 0 (zero) a 6 (seis) anos – a serem atendidos apenas e tão-só no horário das 7:00 às 17:00 horas. Ainda de acordo com o artigo 2º da propositura, as 2 (duas) horas assim subtraídas do período de atendimento a essas crianças – uma hora no período da manhã e outra no da tarde – serão destinadas aos Professores de Desenvolvimento Infantil, a título de horas-atividade, para a preparação de atividades, reflexão do trabalho, trocas pedagógicas e avaliação, executadas interna ou externamente.

No entanto, ao pretender reduzir o período de funcionamento diário dos centros de educação infantil, a propositura contraria a toda evidência o interesse público, vez que, mormente no caso das crianças da faixa etária de 0 (zero) a 6 (seis) anos, o serviço público municipal de educação infantil deve ser prestado pelo Município durante a maior parte do tempo em que os pais ou responsáveis permaneçam trabalhando para garantir o sustento de suas famílias.

De fato, na rotina dos centros de educação infantil, as crianças ali são diariamente deixadas muito cedo e voltam para seus respectivos lares no final do período com toda a parte referente a cuidados garantida, vale dizer, banho, higiene e alimentação. Além disso, como é de conhecimento geral, as dificuldades por que passam as famílias trabalhadoras, com condições limitantes e renda familiar insuficiente para prover os meios adequados ao cuidado e educação de seus filhos pequenos, impedem que a maioria dos pais ou responsáveis adquiram conhecimentos acerca do processo de desenvolvimento das crianças oferecidos pela pedagogia. Esses fatores têm, pois, sido determinantes para a crescente disponibilização de instituições de educação infantil que aliem o binômio cuidar e educar.

Em face dessas circunstâncias, os centros de educação infantil são objeto de especial atenção por parte da Secretaria Municipal de Educação, tanto no que se refere à formação dos servidores que atuam naqueles equipamentos, quanto na definição de um atendimento que considere o desenvolvimento integral das crianças e as necessidades de suas famílias.

Nesse sentido, ao contrário da redução do horário de atendimento às crianças nos centros de educação infantil, como proposto no projeto de lei ora vetado, a Secretaria Municipal de Educação vem trabalhando para ampliar o tempo de permanência na escola dos alunos de todas as áreas educacionais (ensinos infantil, fundamental e médio) da rede municipal, visando a constante melhoria de qualidade de ensino e até mesmo a diminuição da violência urbana. Em conseqüência, os Professores também vêm ampliando suas jornadas de trabalho e as escolas oferecendo maior carga horária aos alunos ou atividades de caráter educacional, social, cultural ou esportivo por meio de programas específicos.

Em suma, todos esses esforços da Secretaria Municipal de Educação estão voltados para oferecer equipamentos adequados, com a organização de horários de atividades que devem refletir propostas pedagógicas de qualidade, onde as crianças possam ser cuidadas e educadas pelos esforços comuns de suas famílias, da sociedade civil e do Município, propiciando-lhes a inclusão em uma vida de participação cidadã.

Por conseguinte, reduzir o tempo de permanência das crianças nos centros de educação infantil vai na contramão dessa política educacional, ferindo os princípios da responsabilidade, solidariedade e respeito ao bem comum que a iluminam, não consultando, em última análise, o interesse público.

Por outro lado, no que concerne à destinação das horas-atividade aos Professores de Desenvolvimento Infantil, o texto aprovado é inconstitucional por dispor sobre forma de cumprimento de jornada de trabalho semanal de servidores públicos, cuja matéria é de iniciativa legislativa exclusiva do Chefe do Executivo, consoante previsto no artigo 61, § 1º, inciso II, alínea “c”, da Constituição Federal, também constante do artigo 37, § 2º, inciso III, da Lei Orgânica do Município.

Em virtude dessa invasão de competência, resta violado, portanto, o princípio constitucional da independência e harmonia entre os Poderes, consignado no artigo 2º da Carta Magna de 1988, de igual modo reproduzido no artigo 6º da Lei Maior Local.

Demais disso, no mérito, de acordo com o disposto no artigo 8º da Lei nº 13.574, de 12 de maio de 2003, aliás de autoria da própria Vereadora Claudete Alves, o Professor de Desenvolvimento Infantil encontra-se sujeito à jornada básica de 30 (trinta) horas de trabalho semanais (J-30), das quais 3 (três) destinam-se ao desenvolvimento de atividades educacionais e pedagógicas (parágrafo único do artigo 8º). Para o cumprimento dessas 3 (três) horas, as portarias de organização das unidades educacionais, anualmente editadas pela SME, prevêem que os centros de educação infantil devem organizar-se de maneira a garantir 1h30min de trabalho coletivo destinado à formação continuada desses Professores e 1h30min para o preparo de atividades, pesquisas e estudos. Com o propósito de viabilizar o usufruto dessas horas sem prejudicar o atendimento às crianças, cada centro de educação infantil deve distribuir os Professores em grupos por turno de funcionamento, podendo inclusive reagrupar os alunos de modos diferenciados.

Em outras palavras, quer isso significar que a finalidade perseguida pelo artigo 2º da propositura já se acha devidamente alcançada pelo artigo 8º da citada Lei nº 13.574, de 2003. Bom é dizer, neste passo, que, ao prever a destinação de 1 (uma) hora-atividade diária para cada Professor de Desenvolvimento Infantil, sujeito, como se disse, a uma jornada de 30 horas de trabalho semanais (J-30), o projeto de lei aprovado acaba por reduzir em 5 (cinco) horas semanais o contato desse profissional com as crianças, distanciando-se em muito, relativamente a esse aspecto, dos demais Professores da rede municipal da educação, os quais, para uma jornada básica de 20 horas de trabalho semanais, têm, a título de horas-atividade, apenas e tão-só 2 (duas) horas, sendo inconcebível tal diferenciação.

Finalmente, acresce dizer que, não tendo a propositura previsto a revogação do parágrafo único do artigo 8º daquele diploma legal, a sua conversão em lei acarretaria, na prática, a destinação de 8 (oito) horas semanais de horas-atividade para os Professores de Desenvolvimento Infantil, sendo 3 (três) pela lei atualmente em vigor (Lei nº 13.574/03, artigo 8º) e 5 (cinco) pela nova lei, circunstância que prejudicaria sobremaneira o atendimento das crianças pelos centros de educação infantil.

Nessas condições, evidenciadas as razões de cunho constitucional e de interesse público que me compelem a vetar integralmente o texto aprovado, o que faço com supedâneo no artigo 42, § 1º, da Lei Orgânica deste Município, devolvo o assunto ao reexame dessa Colenda Casa de Leis.

Na oportunidade, renovo a Vossa Excelência meus protestos de elevado apreço e consideração.

 

GILBERTO KASSAB

Prefeito

Ao

Excelentíssimo Senhor

ROBERTO TRIPOLI

Digníssimo Presidente da Câmara Municipal de São Paulo

Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo