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RAZÕES DO VETO AO PROJETO DE LEI Nº 661/2006; OFÍCIO DE 14 de Janeiro de 2008

Razões de Veto ao Projeto de Lei nº 661/06

OF ATL nº 09/08

Ref.: Ofício SGP-23 nº 6194/2007

Senhor Presidente

Nos termos do ofício referenciado, Vossa Excelência encaminhou a esta Chefia do Executivo cópia autêntica da lei decretada por essa Egrégia Câmara na sessão de 7 de dezembro de 2007, relativa ao Projeto de Lei nº 661/06, de autoria do Vereador José Ferreira – Zelão, que dispõe sobre o Bilhete Criança Cidadã.

A propositura, ao instituir o referido bilhete, estipula que sua finalidade é a de conferir às “crianças” o acesso gratuito, digno e cidadão ao Sistema de Transporte Público Integrado da Prefeitura, determinando a utilização de estruturas e tecnologias disponíveis do Bilhete Único e do referido Sistema.

Sem embargo dos meritórios propósitos que nortearam seu autor, a medida não reúne condições de ser convertida em lei, impondo-se seu veto total, com fulcro no § 1º do artigo 42 da Lei Orgânica do Município de São Paulo, por inconstitucionalidade, ilegalidade e contrariedade ao interesse público, nos termos das considerações a seguir aduzidas

Preliminarmente, observo que a propositura, embora em sua Justificativa indique seu alcance a crianças de até 5 (cinco) anos, não trouxe em seu texto essa referência. Desse modo, o conceito deverá ser retirado do artigo 2º da Lei Federal nº 8.069, de 13 de julho de 1990 – Estatuto da Criança e do Adolescente, isto é, “a pessoa até doze anos de idade incompletos”. Diante disso, o projeto aprovado abrange uma faixa etária bem maior do que a intenção do legislador, com impacto substancial nos custos do transporte público.

A medida amplia extremamente o universo de beneficiários de passagens gratuitas. Estima-se que haja, no Município de São Paulo, cerca de 2,3 milhões de crianças (cidadãs na faixa etária de até 12 anos de idade). Dessas, 1,1 milhão estaria na faixa de até 5 anos. Da outra parcela, de 1,2 milhão, muitos são beneficiados com a isenção de 50% no pagamento da passagem, por se tratarem de estudantes.

Nesse sentido, a concessão de isenção, ainda que não pretendida pelo legislador, mas realizada efetivamente como efeito concreto do projeto aprovado, além de configurar ingerência direta no serviço de transporte coletivo de passageiros, envolve questão que repercute em matéria orçamentária e de organização administrativa, em termos de recursos humanos e materiais, reformulação de sistemas de trabalho e outras decorrências, matérias de iniciativa legislativa exclusiva do Chefe do Executivo (artigo 37, § 2º, inciso IV, e artigo 69, inciso IX, ambos da Lei Orgânica do Município de São Paulo), bem como interfere na fixação das tarifas dos serviços públicos de transporte, atribuição própria do Executivo (artigo 178 da Lei Maior local).

Por conseguinte, o texto vindo à sanção extrapola as atribuições do Legislativo, incorrendo em inconstitucionalidade, ferindo o Princípio da Independência e Harmonia entre os Poderes, consagrado no artigo 2º da Carta Magna e reproduzido no artigo 6º da Lei Orgânica Municipal.

Por outro lado, a Lei nº 13.241, de 12 de dezembro de 2001, que dispõe sobre a organização dos serviços do Sistema de Transporte Coletivo Urbano de Passageiros na Cidade de São Paulo e autoriza o Poder Público a delegar sua execução, estabelece, em seu artigo 27, § 4º, que “as dispensas ou reduções tarifárias de qualquer natureza, além daquelas já vigentes na data da promulgação desta lei, deverão dispor de fontes específicas de recursos”. Nesse sentido, a medida também padece de ilegalidade ao não indicar as exigidas fontes.

A outorga de novas gratuidades ou descontos demanda, obrigatoriamente, o aporte de recursos por parte da Administração Municipal ou a majoração da tarifa visando aumentar a fonte de receita do Sistema com o fim de atender à despesa consistente na remuneração do operador, resultante do benefício.

Acresça-se que descontos e isenções relativos aos interesses sociais mais relevantes já são assegurados por lei, tais como os concedidos a estudantes, idosos, portadores de necessidades especiais, integrantes das Forças Armadas, entregadores de correspondência do Correio e oficiais de justiça, os quais, inclusive, oneram sobremaneira o custo da tarifa de ônibus vinculado ao Sistema de Transporte Coletivo de Passageiros na Cidade de São Paulo.

A ampliação do universo de gratuidades, trazida pela proposta, concorreria para o acréscimo de novos gastos ao Sistema, já bastante sobrecarregado, vindo a comprometer a sua saúde financeira e causando o desequilíbrio econômico-financeiro dos contratos de concessão e permissão, sem falar nos ônus que recairiam sobre os usuários, por meio do reajuste tarifário.

Por fim, é patente que a medida infringiria os preceitos da Lei de Responsabilidade Fiscal. Com efeito, haveria uma perda de receita estimada em cerca de R$ 274 milhões/ano, em razão de que uma parcela dos usuários entre 6 e 12 anos, formada por estudantes, que atualmente efetuam o pagamento de 50% do valor da passagem e que, por se beneficiarem da gratuidade prevista, deixariam de efetuar tal pagamento.

Há que serem levados em conta, ainda, os custos com a fabricação dos cartões, cadastramento dos usuários, logística de captação dos cadastros, impressão de dados e fotografia, entrega e substituição de cartões extraviados/danificados, bem como outras atividades relacionadas ao fornecimento de cartões aos usuários, que exigiriam, como investimento inicial, um valor estimado em R$ 10,350 milhões, sem contar os custos posteriores de manutenção anual.

Em face das considerações já exaradas, percebe-se que a iniciativa é contrária tanto à legislação vigente quanto ao interesse público, a impor necessariamente seu veto integral, o que faço com fulcro no artigo 42, § 1º, da Lei Orgânica do Município de São Paulo.

Assim sendo, devolvo o assunto ao reexame dessa Egrégia Câmara, renovando a Vossa Excelência protestos de apreço e consideração.

GILBERTO KASSAB

Prefeito

Ao

Excelentíssimo Senhor

ANTONIO CARLOS RODRIGUES

Digníssimo Presidente da Câmara Municipal de São Paulo

 

Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo