Razões de Veto ao Projeto de Lei nº 62/00
OF ATL Nº 047/04
Senhor Presidente
Nos termos do Ofício nº 18/Leg.3/0792/2003, Vossa Excelência encaminhou à sanção cópia autêntica da lei decretada por essa Egrégia Câmara, relativa ao Projeto de Lei nº 62/00, proposto pelo Vereador José Olímpio, que institui o Projeto Viver, destinado ao amparo e proteção dos idosos carentes.
Não obstante os meritórios propósitos de que se imbuiu seu ilustre autor, impõe-se o veto total ao texto aprovado, com fulcro no § 1º do artigo 42 da Lei Orgânica do Município de São Paulo, por inconstitucionalidade, ilegalidade e contrariedade ao interesse público, nos termos das razões a seguir aduzidas.
A mensagem institui programa para o amparo e proteção de idosos, dando prioridade para áreas de maior inclusão social e incidência de pessoas maiores de 60 anos.
O projeto aprovado carece de detalhes relativos a sua implementação. No entanto, a instituição do referido programa, com todos os seus desdobramentos, inclusive o financeiro, diz respeito a assunto relacionado à organização administrativa e à prestação de serviços públicos, bem como a matéria orçamentária, cuja iniciativa legislativa acha-se privativamente atribuída ao Chefe do Poder Executivo, a teor do disposto no artigo 61, inciso II, alíneas “a”, “b” e “c”, da Constituição da República, reproduzido no artigo 37, § 2º, incisos I, II, III e IV, da Lei Orgânica do Município de São Paulo.
Patente, pois, que ao pretender dispor sobre matéria cuja iniciativa legislativa encontra-se legalmente atribuída ao Chefe do Executivo em caráter privativo, o projeto em questão ofende o salutar princípio constitucional da independência e harmonia entre os Poderes, consagrado no artigo 2º da Constituição da República e transposto para a órbita do Município de São Paulo nos termos do artigo 6º de sua Lei Maior.
Por outro lado, é mister ressaltar que a medida pressupõe a existência de verbas, importando aumento de despesas, sem a indicação dos correspondentes recursos, achando-se francamente em desacordo com o artigo 25 da Constituição do Estado de São Paulo e com a Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, em seus artigos 15 a 17.
A propósito, vale lembrar que o Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, em casos análogos, tem proclamado reiteradamente a inconstitucionalidade de textos legais como o ora vetado:
“Desta forma, determinando por meio de lei a adoção de medidas específicas de execução, houve ingerência de um Poder em relação ao outro, com nítida invasão de competência e infringência ao artigo 5º, “caput”, da Constituição do Estado.
....................................................................................A par disso, é evidente que a execução da indigitada lei iria provocar despesas. Sem constar a indicação dos recursos disponíveis próprios para atender aos novos encargos, era de rigor o veto, nos termos do artigo 25 da Constituição do Estado” (ADIN nº 44.255.0/5-00 – Rel. Franciulli Neto, v.u., j. em 19.05.99; no mesmo sentido: ADIN nº 59.744.0/01 – Rel. Des. Mohamed Amaro, ADIN nº 11.676-0; Rel. Des. Milton Coccaro; ADIN nº 11.803-0, Rel. Des. Yussef Cahali; ADIN nº 65.779-0/0, Rel. Des. Flávio Pinheiro).
A propositura é inconstitucional, também, pois fere o princípio da isonomia, consagrado no “caput” do artigo 5º da Constituição Federal, na medida em que restringe a idosos carentes os benefícios do programa. De fato, não há correlação lógica entre a condição sócio-econômica dos beneficiários do programa e o tipo de atividades a serem desenvolvidas para amparo e proteção das pessoas enquadradas no projeto aprovado.
Não bastassem os vícios de inconstitucionalidade e de ilegalidade acima apontados, a propositura em comento, no mérito, contraria o interesse público.
Com efeito, segundo a lição de James Giacomoni (Orçamento Público, 11ª ed., Atlas) a criação de um programa municipal dessa natureza deve definir precisamente os objetivos e propósitos perseguidos pela instituição e para cuja consecução são utilizados os recursos orçamentários. Deve, também, definir o conteúdo do programa, isto é, os instrumentos de integração dos esforços governamentais, no sentido da concretização dos objetivos. Além disso, é de rigor a mensuração dos custos do programa medidos por meio da identificação dos meios ou insumos (pessoal, material, equipamentos, serviços, etc.) necessários para a obtenção dos resultados e, finalmente, as medidas de desempenho com a finalidade de medir as realizações (produto final) e os esforços despendidos na execução do programa.
Esse método de instauração de um programa tem em mira garantir o interesse público consistente na otimização do uso dos recursos financeiros oriundos dos tributos pagos pela população.
É necessário dizer, por outro lado, que o objetivo da propositura está contemplado nos serviços da Rede de Proteção Social ao Idoso, da Secretaria Municipal de Assistência Social – SAS, nos quais as atenções de assistência social buscam produzir condições para alcance de padrões sociais básicos e a garantia, como direito de cidadania da população, dos denominados “mínimos sociais”.
A mencionada rede é constituída por 96 Núcleos de Convivência com 6880 beneficiários, oferece espaços de estar e convívio, trabalho social e socieducativo para maiores de 60 anos, de ambos os sexos, em diversas modalidades (educativas, sociais e políticas, recreativas e de lazer), objetiva a promoção do autoconhecimento para favorecer o processo de envelhecimento ativo e saudável.
O Centro de Referência do Idoso, por sua vez, oferece a pessoas idosas acesso e referência aos serviços socioassistenciais e demais serviços públicos, em local com infra-estrutura para o trabalho socioeducativo em período integral, com previsão diária de atendimento para 200 idosos.
Cabe mencionar, também, os 15 Núcleos de Atendimento à Família (NAF), com capacidade de 75 idosos, para atuar junto a outros idosos da comunidade local, recebendo bolsa auxílio de R$ 150,00 por mês, pelo período de um ano.
Aos idosos em situação de maior vulnerabilidade, enfim, a Secretaria de Assistência Social oferece a rede de 26 Núcleos de Serviços com Albergue, incluindo abrigamento e acolhida em padrões de dignidade; 2 abrigos com atendimento diferenciado para resgate da autonomia e moradia provisórias (residências subsidiadas por SAS) em condições de realizarem a gestão cotidiana para o desenvolvimento gradativo da autonomia pessoal e social.
Pelo exposto, estou impedida de acolher o texto vindo à sanção, o que me compele a vetá-lo inteiramente, por inconstitucionalidade, ilegalidade e contrariedade ao interesse público, com fulcro no artigo 42, § 1º, da Lei Orgânica do Município de São Paulo.
Devolvo o assunto, pois, à apreciação dessa Egrégia Câmara que, com seu elevado critério, se dignará a reexaminá-lo.
Na oportunidade, renovo a Vossa Excelência protestos de elevado apreço e distinta consideração.
MARTA SUPLICY
Prefeita
Ao
Excelentíssimo Senhor
ARSELINO TATTO
Presidente da Câmara Municipal de São Paulo
Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo