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RAZÕES DO VETO AO PROJETO DE LEI Nº 577/2007; OFÍCIO DE 22 de Janeiro de 2010

Razões de Veto ao Projeto de Lei nº 577/07

OF ATL nº 30/10

Ref.: Ofício SGP-23 nº 04446/2009

Senhor Presidente

Reporto-me ao ofício acima referenciado, por meio do qual Vossa Excelência encaminhou à sanção cópia autêntica da lei decretada por essa Egrégia Câmara na sessão de 10 de dezembro de 2009, relativa ao Projeto de Lei nº 577/07, de autoria dos Vereadores Gilson Barreto e Claudinho, que “dispõe sobre a obrigatoriedade de substituição, pelos estabelecimentos comerciais no Município de São Paulo, de embalagens plásticas por reutilizáveis ou confeccionadas em materiais de fontes renováveis ou recicláveis para o acondicionamento de mercadorias adquiridas pelo consumidor”.

A propositura, ao determinar a substituição das referidas embalagens, confere aos estabelecimentos o prazo de um ano para essa finalidade, proibindo, também, o emprego de jornais, impressos, papéis reciclados ou quaisquer outros materiais que contenham substâncias químicas prejudiciais à saúde para embalar os produtos. Além disso, impõe à Supervisão Geral de Abastecimento, da Secretaria Municipal de Coordenação das Subprefeituras, a normatização, orientação e fiscalização quanto ao cumprimento da lei. Ainda, comina as penalidades de multa de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), cobrada em dobro em caso de reincidência, e de suspensão do alvará de funcionamento na próxima reincidência. Finalmente, dirige a aplicação da lei apenas às embalagens fornecidas pelos estabelecimentos, excetuando as originais (de fábrica), os alimentos líquidos e os que, por sua própria natureza, liberam substâncias líquidas, bem como os produtos que, por determinação de autoridade sanitária, necessariamente devam ser acondicionados em embalagens plásticas.

No entanto, embora reconhecendo o mérito da medida proposta, sou compelido a vetá-la integralmente nos termos do § 1º do artigo 42 da Lei Orgânica do Município de São Paulo, na conformidade nas razões adiante explicitadas.

De início, observo que vigora no ordenamento jurídico brasileiro o princípio da legalidade, expresso no artigo 5º, inciso II, da Constituição Federal, bem como o da liberdade econômica como instrumento de uma sociedade que tem por fundamentos, dentre outros, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, nos termos do artigo 1º, inciso IV, cumulado com o artigo 3º, inciso II, ambos também da Carta Magna.

Por outro lado, cumpre asseverar que o Município possui competência legislativa para disciplinar matéria pertinente ao meio ambiente. Com efeito, afora a expressa competência material comum estabelecida no artigo 23, inciso VI, da Constituição Federal, a leitura sistemática de seus artigos 24 e 30 ensejam a inequívoca conclusão de que a esse ente federativo igualmente foi conferida competência legislativa para tratar do assunto, obviamente limitada ao âmbito local.

De outra parte, ao instituir a obrigatoriedade de substituição de embalagens (sacolas plásticas) por outras reutilizáveis ou confeccionadas com materiais provenientes de fontes renováveis ou recicláveis para o acondicionamento de mercadorias adquiridas pelo consumidor, o projeto de lei aprovado efetivamente dispõe sobre matéria relativa ao meio ambiente.

No entanto, a imposição dessa obrigação nova às empresas requer melhor exame, com vistas à comprovação da sua real eficácia, no sentido de não agravar a poluição do meio ambiente.

Realmente, manifestando-se a respeito do assunto, o órgão técnico da Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambiente assinala que a questão relativa ao uso de embalagens confeccionadas com materiais oriundos de fontes renováveis necessita de estudos mais aprofundados, pois, para a prevenção da poluição e a proteção do meio ambiente e da saúde humana, o interesse maior reside no reaproveitamento e na adoção de medidas que evitem desperdícios, bem como promovam a utilização sustentável dos recursos naturais, de modo que os esforços devem ser direcionados à adoção de sacolas retornáveis.

Isso porque não há garantia de que a substituição proposta pela mensagem resulte em prevenção, controle da poluição ambiental e proteção da qualidade do meio ambiente, uma vez que mesmo os materiais biodegradáveis geram resíduos tóxicos.

Para ocorrer a biodegradação, é necessária a conjugação de vários fatores, além da não liberação de substâncias tóxicas e poluentes, pois a rotulagem das embalagens não informa sobre sua composição química, nem sobre a tinta empregada na estampa e, tampouco, se foram utilizados aditivos químicos aceleradores da reação do polímero com o oxigênio, que, embora diminua o tempo de decomposição, pode contaminar o meio ambiente com metais pesados.

Ainda que se tivesse certeza das condições não poluentes do processo de degradação desses materiais, a depender dos sobreditos estudos, sempre haverá impactos associados ao ciclo de vida dessas embalagens – envolvendo produção, uso, coleta, disposição final, demanda de tempo da decomposição, espaço nos aterros ou no processo de compostagem – devendo, também, ser considerados os custos e a demanda de recursos empregados no processo de reciclagem. As sacolas plásticas, por exemplo, são recicláveis, porém não podem ser recicladas para a produção de novas sacolas, mas apenas de outros produtos, como baldes e sacos de lixo, conforme determinação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária.

Cabe observar, outrossim, no tocante às sanções preconizadas pela propositura, que, no campo da legislação sanitária, o Município já dispõe sobre diversos tipos de embalagens, visando a segurança e a higiene dos consumidores, nos termos do artigo 93 da Lei nº 13.725, de 9 de janeiro de 2004, regulamentada pelo Decreto nº 50.079, de 7 de outubro de 2008. Essa legislação estabelece as penalidades pelo descumprimento das normas, em caráter gradativo, prevendo, nos casos mais graves, a cassação do alvará do estabelecimento, e não a aplicação de pena de suspensão.

Finalmente, anoto que a propositura dispõe sobre matéria atinente a organização administrativa, como é a situação prevista no seu artigo 4º, incorrendo em clara ingerência nas atividades e atribuições de órgãos municipais, vez que lhes impõe novos encargos e procedimentos. De fato, como se sabe, as leis que tratam de organização administrativa são de iniciativa privativa do Prefeito, “ex vi” do disposto no inciso IV do § 2º do artigo 37 da Lei Orgânica do Município de São Paulo. Nesse sentido, a medida extrapola as atribuições do Legislativo e invade a esfera de competências do Executivo, violando o princípio constitucional da independência e harmonia entre os Poderes.

Por conseguinte, pelas razões expendidas, vejo-me compelido a vetar integralmente o texto aprovado, devolvendo o assunto ao reexame dessa Egrégia Câmara, renovando a Vossa Excelência protestos de apreço e consideração.

GILBERTO KASSAB

Prefeito

Ao

Excelentíssimo Senhor

ANTONIO CARLOS RODRIGUES

Digníssimo Presidente da Câmara Municipal de São Paulo

 

Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo