CASA CIVIL DO GABINETE DO PREFEITO

Acessibilidade

RAZÕES DO VETO AO PROJETO DE LEI Nº 539/2002; OFÍCIO DE 8 de Janeiro de 2004

Razões de Veto ao Projeto de Lei nº 539/02

OF ATL nº 028/04

Senhor Presidente

Por meio do Ofício nº 18/Leg.3/0762/2003, cujo recebimento acuso, Vossa Excelência encaminhou à sanção cópia autêntica do Projeto de Lei nº 539/02, de autoria do Vereador Roger Lin, aprovado por essa Egrégia Câmara na sessão de 27 de novembro de 2003, que objetiva estabelecer o prazo de 7 (sete) dias para a realização, pela rede municipal de saúde, de consultas médicas e exames de saúde quando o paciente tiver idade igual ou superior a 65 (sessenta e cinco) anos, sob pena de cominação da multa correspondente a R$ 1.800,00 (um mil e oitocentos reais), anualmente atualizada em função da variação do IPCA, dobrando-se o valor no caso de reincidência.

Entretanto, embora reconhecendo os meritórios propósitos que com certeza nortearam o seu proponente, a medida não reúne as condições necessárias para sua conversão em lei, ante sua inconstitucionalidade, ilegalidade e contrariedade ao interesse público, na conformidade das razões adiante explicitadas, pelo que me vejo compelida a vetá-la totalmente com fundamento no artigo 42, § 1º, da Lei Orgânica deste Município.

Sob o prisma formal, cumpre primeiro aduzir que a propositura acha-se eivada de vício de inconstitucionalidade por ferir o princípio constitucional da independência e harmonia entre os Poderes, expressamente previsto no artigo 2º da Constituição Federal.

Com efeito, o pretendido estabelecimento de prazo para a realização de consultas médicas e exames de saúde, na hipótese que especifica, constitui, a toda evidência, alteração da atual forma de prestação de serviços públicos na área da saúde, cuja iniciativa legislativa compete privativamente ao Poder Executivo, conforme previsão contida no artigo 61, inciso II, alínea “b”, da Constituição Federal, matéria essa igualmente disciplinada pelo artigo 37, § 2º, inciso IV, da Lei Orgânica do Município de São Paulo.

Patente é, como se vê, a usurpação, pelo Legislativo, de competência constitucionalmente reservada ao Executivo, daí a inconstitucionalidade do texto aprovado.

Mas não é só. A inconstitucionalidade atinge também o mérito do comando legal proposto, na medida em que o seu conteúdo contraria o disposto no artigo 196 da Constituição Federal, segundo o qual a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

Emerge desse dispositivo constitucional o princípio que prevê o acesso igualitário de todos às ações e serviços de saúde sem privilégios de qualquer ordem, abrangendo, inclusive, as pessoas com idade igual ou superior a 65 (sessenta e cinco) anos, objeto da mensagem aprovada.

Além de inconstitucional, o projeto, ainda sob esse aspecto, é também ilegal por encontrar-se referido princípio igualmente previsto no artigo 7º, “caput” e inciso IV, da Lei Federal nº 8.080, de 19 de setembro de 1990, que dispõe, dentre outras providências, sobre a organização e funcionamento do Sistema Único de Saúde – SUS, ao qual se vincula o Município de São Paulo.

Demais disso, bom é dizer que a extensão do benefício apenas e tão-só às pessoas com idade igual ou superior a 65 (sessenta e cinco) anos acaba por conflitar com o Estatuto do Idoso (Lei Federal nº 10.741, de 1º de outubro de 2003), cuja disciplina considera idosa a pessoa com idade igual ou superior a 60 (sessenta) anos. Inadmissível, portanto, a exclusão dos cidadãos pertencentes à faixa etária compreendida entre 60 (sessenta) e 65 (sessenta e cinco) anos.

Impende asseverar, ainda, que, até em virtude do já mencionado princípio constitucional do acesso igualitário de todos às ações e serviços de saúde, o Estatuto do Idoso não agasalha privilégios dessa natureza, mas apenas assegura, no seu artigo 15, a atenção integral à saúde do idoso, por meio do Sistema Único de Saúde – SUS, garantindo-lhe o acesso universal e igualitário, em conjunto articulado e contínuo das ações e serviços, para a prevenção, promoção, proteção e recuperação da saúde, incluindo o atendimento especial às doenças que afetam preferencialmente os idosos.

Importa destacar, por derradeiro, que, ao pretender criar privilégio calcado exclusivamente na idade do paciente, a medida aprovada contraria o interesse público consubstanciado na política de atendimento prioritário às pessoas cujo diagnóstico de saúde (tipo de patologia e agravos constatados nos usuários dos serviços públicos de saúde) reclama maior atenção e rapidez, independentemente de suas idades, política essa prevalecente na área da saúde de todos os níveis do governo.

Evidenciadas as razões que me conduzem a vetar integralmente o texto aprovado, devolvo o assunto ao reestudo dessa Egrégia Casa de Leis.

Na oportunidade, renovo a Vossa Excelência protestos de consideração e apreço.

MARTA SUPLICY

Prefeita

Ao

Excelentíssimo Senhor

ARSELINO TATTO

Presidente da Câmara Municipal de São Paulo

 

Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo