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RAZÕES DO VETO AO PROJETO DE LEI Nº 537/2017; OFÍCIO DE 20 de Abril de 2023

Razões de veto ao Projeto de Lei nº 537/17

RAZÕES DE VETO

Projeto de Lei nº 537/17

Ofício ATL SEI nº 081967411

Ref.: Ofício SGP-23 nº 245/2023

 

Senhor Presidente,

 

Por meio do Ofício acima referenciado, essa Presidência encaminhou à sanção cópia do Projeto de Lei nº 537/17, aprovado em sessão de 28 de março de 2023, de autoria dos Vereadores Eduardo Matarazzo Suplicy, Patrícia Bezerra, Professor Toninho Vespoli, Sâmia Bomfim e Soninha Francine, que institui a Política Municipal de Atenção às Pessoas Egressas e seus Familiares, e dá outras providências.

Embora reconhecendo o mérito da iniciativa, esta não possui condições de ser sancionada em sua totalidade, impondo-se seu veto parcial, nos termos das considerações a seguir aduzidas.

O parágrafo único do art. 1º é dispositivo de competência exclusiva do Poder Executivo, sendo matéria a ser definida por decreto. Além disso, o aspecto temporal deve ser apurado na experiência dos casos concretos e também definido pelo Poder Executivo de acordo com a capacidade de atendimento.

Também pode-se levantar que o parágrafo único do art. 2º, o parágrafo único do art. 3º e o § 1º do art. 5º, assim como o parágrafo único do art. 1º, aviltam o Princípio da Separação de Poderes, infringindo frontalmente a iniciativa exclusiva do Chefe do Poder Executivo.

Nessa esteira, cabe asseverar ,em complemento, que ao Executivo é destinado estabelecer a forma de como se dará o cumprimento dos ditames legais, em face da disponibilidade orçamentária e a ponderação de outras políticas que devem se simultaneamente atendidas.

O inciso II do art. 2º é dispositivo desnecessário, tendo em vista que a previsão do princípio da voluntariedade da adesão é inócua. A previsão em Lei seria indicada se fosse imposta a obrigatoriedade, o que não é o caso.

Em relação ao inciso IV do art. 3º, não se pode considerar que tal disposição é uma diretriz. O Município não se exime de manter atendimentos na rede municipal a pessoas que são enquadráveis nas respectivas políticas, sejam elas egressas ou não. Em outras palavras, não se trata de fator de discrímen de atendimento o fato de ser um egresso do sistema penitenciário.

Cumpre destacar que os incisos do art. 4° do Projeto de Lei n° 537/17 estabelecem uma série de objetivos a serem observados pela Administração Pública quanto à persecução da Política Municipal de Atenção às Pessoas Egressas e seus Familiares.

A partir disso, podemos observar que tais incisos podem ser classificados doutrinariamente como normas de caráter programático. Isso quer dizer que o projeto de lei positivou determinadas metas a serem efetivadas pela Administração Pública Municipal, mediante o cumprimento de políticas públicas.

Todavia, importante destacar que, em nosso sistema constitucional, os Poderes devem trabalhar de forma harmônica entre si, de forma a não ocorrer uma sobreposição de um em detrimento do outro. Como decorrência lógica desse raciocínio, temos o fato de que, embora seja da competência do Poder Legislativo elaborar normas programáticas, recai na esfera do Poder Executivo, em consonância com todos os demais objetivos de interesse público atribuídos a ele, decidir sobre o funcionamento prático da Administração, realizando o planejamento e a execução das políticas públicas que foram legitimadas pela escolha democrática dos representantes da sociedade, sempre dentro dos parâmetros da constitucionalidade e da legalidade.

A Prefeitura detém a sua esfera de liberdade para decidir sobre o modo que considera melhor e também mais apropriado para desempenhar a sua função de garantidor do interesse público. Os incisos VII e VIII do art. 4º do projeto de lei aprovado adentram no campo de políticas públicas, que são de competência da Administração Pública, a quem cabe avaliar a conveniência e oportunidade dos atos.

A prerrogativa de escolha conferida pelas noções de conveniência e oportunidade está vinculada à obediência do regime jurídico de direito administrativo, marcado pela supremacia e indisponibilidade do interesse público. Dessa forma, é possível verificar que, ainda que vetados os incisos II, V, VI, VII, VIII e XI do artigo 4° do Projeto de Lei n° 537/17, não haverá lesão ao interesse maior da sociedade e nem desvirtuamento da proposta da Política Municipal de Atenção às Pessoas Egressas e seus Familiares.

Adentrando ainda mais especificamente nos dispositivos penais que dizem respeito à política carcerária, podemos estabelecer os seguintes apontamentos quantos aos incisos objetos do veto:

Os incisos II, V e VI do art.4º espelham políticas públicas já disponíveis no Município. Desta feita, não se afigura necessário positivar as mesmas ações, as quais possuem ato normativo e execução já definidos, posto que são objeto de tutela da Secretaria Municipal de Assistência Social e da Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania.

O inciso VII do art. 4º da propositura estabelece o seguinte objetivo: “promover condições para convivência familiar, inclusive para crianças e adolescentes separados de suas mães e pais em cumprimento de pena em regime fechado”.

Nesse espeque, é importante trazer o art. 41, X, da Lei de Execuções Penais (Lei 7.210/84) e os artigos 227, CF e 19, § 4º, ECA, os quais preveem o direito de visitação do preso e o princípio da convivência familiar, vejamos:

 

Art. 41 - Constituem direitos do preso:

X - visita do cônjuge, da companheira, de parentes e amigos em dias determinados;

Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

Art. 19. É direito da criança e do adolescente ser criado e educado no seio de sua família e, excepcionalmente, em família substituta, assegurada a convivência familiar e comunitária, em ambiente que garanta seu desenvolvimento integral.

§ 4º Será garantida a convivência da criança e do adolescente com a mãe ou o pai privado de liberdade, por meio de visitas periódicas promovidas pelo responsável ou, nas hipóteses de acolhimento institucional, pela entidade responsável, independentemente de autorização judicial.

 

Como se pode observar a partir da legislação federal, o inciso VII do art. 4º é genérico e está voltado para o bem estar das crianças e adolescentes, sendo impertinente quanto à temática e escopo do projeto de lei. Isso porque a garantia da primazia no atendimento da criança e do adolescente deve ser alvo de política pública específica, o que se distancia dos objetivos voltados para os egressos e seus familiares.

Já no tocante ao inciso VIII, que determina “garantir apoio para cumprimento das condicionalidades impostas judicialmente, como comparecimento periódico ao Fórum, infere-se que as condicionalidades citadas dizem respeito às condições impostas pelo juiz para a concessão de saídas temporárias ao preso em regime semiaberto, concessão de regime aberto e do livramento condicional, nos termos dos arts. 115, 124, § 1º e 132, § 1º, respectivamente, todos da Lei de Execuções Penais.

Da leitura desses dispositivos da lei federal, conclui-se que variadas são as condições que devem (ou podem) ser impostas pelo juiz, além do “comparecimento periódico ao Fórum”, o que torna o inciso VIII do art. 4º do projeto de lei de alto grau de generalidade, dificultando ou até mesmo obstando sua plena aplicabilidade a casos concretos.

A política de apoio ao egresso não deve ter o condão de substituir a responsabilidade deste no cumprimento das condições judiciais para a execução completa da pena imposta. Caso contrário, a transferência da responsabilidade para o Poder Público esvazia o objetivo das condicionante e prejudica a avaliação da reabilitação do egresso e sua reintrodução na sociedade.

Ainda, no presente caso, verifica-se que já existem meios a serem utilizados por aqueles que necessitam cumprir condicionalidades impostas judicialmente, a exemplo do requerimento para troca de Comarca para comparecimento obrigatório em juízo, de modo a informar e justificar suas atividades.

Nessas condições, evidenciada a motivação que me conduz a apor veto ao parágrafo único do art. 1º; inciso II do art. 2º; parágrafo único do art. 2º; inciso IV do art. 3º; parágrafo único do art. 3º; incisos II, V, VI, VII, VIII e XI do art. 4º e parágrafo 1º do art. 5º, portanto, veto parcial ao Projeto de Lei nº 537/17, e com fundamento no artigo 42, § 1º, da Lei Orgânica do Município de São Paulo, devolvo o assunto ao reexame dessa Egrégia Casa Legislativa.

Na oportunidade, renovo a Vossa Excelência os meus protestos de elevado apreço e distinta consideração.

 

 

RICARDO NUNES

Prefeito

 

Ao

Excelentíssimo Senhor

MILTON LEITE

Digníssimo Presidente da Câmara Municipal de São Paulo

 

Documento original assinado nº 081967411

Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo